sábado, agosto 24, 2013

Hora de negociar - KÁTIA ABREU

FOLHA DE SP - 24/08

Uma agenda comum para o agronegócio é possível entre os gigantes Brasil e EUA


O Brasil participou de 1,3% do comércio mundial em 2012, segundo dados da OMC (Organização Mundial do Comércio). Apesar disso --e paradoxalmente--, a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) indica que a América Latina, e principalmente nosso país, tem potencial para se converter no maior centro de produção agropecuária do mundo.

De fato, há um enorme espaço para o crescimento, especialmente no agronegócio, que tem sustentado a balança comercial e já gerou um superavit de quase US$ 50 bilhões, no primeiro semestre deste ano. Mas falta integração.

Hoje, as cadeias globais de valor unem países e regiões em processos integrados de produção. O comércio internacional mudou, na direção de uma maior interdependência entre os mercados.

Mais comércio não significa apenas redução de tarifas aduaneiras. É preciso compartilhar políticas para favorecer a livre circulação de bens e serviços. É preciso fazer acordos e mais acordos.

A formação de blocos comerciais ambiciosos implica abrir mão de preferências ou crenças puramente nacionais. O acordo entre os Estados Unidos e a União Europeia vai forçar os europeus a rever sua intolerância em relação aos produtos transgênicos, sem o que as exportações agrícolas americanas ficarão bloqueadas e o acordo geral não prosperará.

Não há mais lugar para o ranço europeu contra a transgenia, que é muito mais preconceituoso e protecionista do que cientifico.

Os acordos comerciais de agora são movidos pelo interesse econômico e buscam tecer redes de dependência virtuosas. É isso ou o isolamento e a irrelevância.

Não podemos insistir na teimosa escolha de um Mercosul, onde os parceiros não acreditam nas vantagens do livre comércio, na economia de mercado e nos benefícios da integração econômica em escala global.

Não podemos mais ficar restritos a mercados inexpressivos só por uma questão de afinidades políticas. Até porque essas afinidades são de alguns; não da nação como um todo.

Recebi recentemente, na CNA, o secretário de Estado da Agricultura dos Estados Unidos, Thomas Vilsack, acompanhado de importantes senadores ligados ao setor.

Dialogamos como parceiros, apesar de existirem contenciosos entre os países, como é o caso do algodão. No campo do agronegócio, temos interesses comuns e não devemos temer um ao outro, pois há espaço bastante para estas duas potências.

Juntos, produzimos 49% da safra mundial de soja e milho e 27% da proteína animal disponível para consumo. Respondemos por metade das exportações de carne no mercado internacional.

A segurança alimentar do planeta é uma enorme responsabilidade dos dois países. China e Índia não têm mais terras ou água para expandir sua produção.

No resto do mundo, tampouco, há espaço para a expansão da agricultura.

Brasil e Estados Unidos, nesse contexto, não são mais concorrentes, como no passado. Ao caminharem juntos, terão muito a oferecer e a ganhar. E a população mundial mais pobre também, porque podemos evitar a escassez de alimentos e a explosão dos preços.

O agronegócio, hoje joia da coroa da economia do país, não pode mais ser punido pela política, seja no mercado interno ou no externo. Ao ouvir minha explanação sobre a falta de logística no Brasil, a senadora democrata Debbie Stabenaw, presidente da Comissão de Agricultura do Senado americano, disse que também eles têm problemas, pois lhes faltam recursos para renovar a infraestrutura construída há cem anos.

Quem dera o Brasil tivesse ao menos uma velha e centenária logística em seus Mississippis, em vez de pagar até US$ 85 de frete por tonelada de grãos exportada, pelas más condições dos portos e estradas

. Ainda bem que agora o governo está empenhado em buscar investimentos que viabilizem uma revolução nos transportes.

Uma agenda comum é possível entre esses dois gigantes, desde que a falta de visão não atrapalhe. O secretário norte-americano e sua comitiva vieram negociar. Bem-vindos!

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