quarta-feira, agosto 28, 2013

Fundamentos do câmbio - ARMANDO CASTELAR

CORREIO BRAZILIENSE - 28/08
Durou pouco a trégua conseguida com o anúncio de que, até o fim do ano, o Banco Central (BC) vai ofertar semanalmente US$ 3 bilhões em contratos de swap. Esta semana, o dólar voltou a se valorizar, devolvendo parte da queda observada na sexta-feira. Isso não diminui a importância da iniciativa, mas mostra que não será o BC, mas os fundamentos da economia, que vão determinar onde a taxa de câmbio vai parar.
Nas operações de swap cambial, o BC promete entregar a variação da taxa de câmbio entre hoje e uma data futura determinada. Em troca, recebe a remuneração obtida com os juros acumulados no período. Os dois pagamentos são feitos em reais. A operação tranquiliza o mercado de câmbio, pois permite às empresas com passivos líquidos em dólar obter proteção e limitar suas perdas. Ao mesmo tempo, como não envolve a venda de dólares, mantém as reservas internacionais intactas.

Porém, isso não altera o fato de que está em curso uma deterioração dos fundamentos externos, que vai exigir um real mais fraco. Basta ver que a venda pelo BC de quase US$ 40 bilhões em swaps, além de outras medidas, como o fim do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) na compra de títulos por estrangeiros, não impediram que o real se desvalorizasse 18% nos últimos seis meses.

O principal motivo para a desvalorização do real é a perda de atratividade dos ativos brasileiros. De um lado, isso está relacionado à piora do desempenho econômico do país e à percepção de que esse não deve melhorar tão cedo. Pelo contrário, os índices de confiança de empresários e consumidores continuam em queda, prenunciando um segundo semestre bastante fraco. As projeções para o crescimento em 2014 também seguem caindo. O Brasil passou a ser uma economia de baixo crescimento e, portanto, menos interessante para o investidor estrangeiro.

De outro lado, e mais importante no curto prazo, os EUA e, em menor medida, a Europa estão ficando mais interessantes para os investidores. Os EUA serão, por assim dizer, o grande mercado emergente dos próximos anos, devendo absorver parte significativa dos recursos que até ontem procuravam países como o Brasil.

Os sinais de recuperação da economia americana vão se avolumando e é provável que, em setembro ou outubro, o Federal Reserve (FED), o banco central americano, comece a desmontar o programa de afrouxamento quantitativo. Em um horizonte de dois anos, deve começar a subir os juros. Refletindo essa perspectiva, o retorno dos títulos americanos de 10 anos subiu de 1,7% no início de maio para quase 3% semana passada, antes de cair um pouco esta semana. Isso já derrubou o valor dos títulos de renda fixa no Brasil, elevando o custo para o governo e as empresas de captar recursos.

Todos os emergentes estão passando por um processo semelhante de perda relativa de atratividade dos ativos locais. Só que uns sofrem mais do que os outros. O Brasil está entre os países mais afetados. Além do baixo crescimento e das dúvidas quanto ao futuro da política econômica, contribui para isso o crescente deficit das contas externas.

Nosso saldo em conta corrente, medido como proporção do PIB, vem piorando há vários anos, saindo de um resultado positivo de 1,8% do PIB em 2004 para um deficit de 2,4% do PIB em 2012. Grosso modo, uma queda média anual de 0,5% do PIB ao ano. Mais recentemente, porém, esse deficit começou a aumentar mais rápido, pulando de 2,24% do PIB nos sete primeiros meses de 2012 para 3,95% do PIB no acumulado de janeiro a julho deste ano. E, ao contrário dos últimos anos, ele não está mais sendo integralmente financiado pelos investimentos diretos estrangeiros.

A piora nas contas externas reflete a baixa competitividade e o desempenho mais fraco da Ásia emergente. O primeiro problema será parcialmente compensado pela desvalorização do real. Já o impacto do crescimento mais lento de países como China e Índia sobre o preço e o volume de nossas exportações será mais duradouro. É provável que, no próximo par de anos, devolvamos parte do extraordinário ganho nos termos de troca registrado desde o início da crise.

A desvalorização do câmbio é positiva para a economia brasileira, pois é a forma mais fácil de o país se ajustar a um ambiente externo menos benigno do que foi na última década. Não obstante, ela vai pressionar a inflação e piorar o quadro macroeconômico doméstico, já complicado. Pode ser que o ajuste que se esperava adiar para 2015, em termos de melhorar a política econômica e retomar o processo de reformas, tenha de ser antecipado.

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