sábado, julho 20, 2013

Precipitação inoportuna - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 20/07
As mesmas vozes das ruas que cobram a melhoria do sistema público de saúde preconizam que a pressa é inimiga da perfeição. Mas, na ânsia de conter as manifestações populares, o governo sacou, para jogar de cima para baixo, como os velhos pacotes embrulhados em gabinetes, um programa que estava em gestação havia pelo menos seis meses. Pior: usou a embalagem das medidas provisórias, instrumento pelo qual a Constituição concede ao presidente da República o poder de baixar ato unipessoal com força de lei, deixando ao Congresso Nacional o papel secundário de apenas posteriormente dar ou não a devida chancela. Mais grave ainda: o fez sem observar os pressupostos constitucionais de urgência e relevância.
Para justificar o inexplicável, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, disse que as mudanças apenas valerão a partir de 2015, havendo, portanto, tempo para que sejam amplamente debatidas. Por que, então, passar o carro na frente dos bois, para usar outra expressão popular, nesta hora em que o povo resolveu falar alto no país? Seguir à risca os preceitos da Carta Magna é obrigação inescapável de todo cidadão, que diria dos governantes. Mas, em vez de amadurecer o tema em conversas com a sociedade civil, sobretudo com as universidades, as categorias profissionais da área de saúde e o Congresso, o governo inverteu o processo. Com isso, conseguiu que a primeira consequência do Programa Mais Médicos fosse tornar-se mais um fator de perturbação.

Até a Polícia Federal já teve de ser convocada para pôr alguma ordem na lambança. Isso porque - embora as medidas sejam para 2015, como disse o ministro - as inscrições para participação estão abertas (aliás, encerram-se na próxima quinta-feira) e passaram de 11 mil em pouco mais de uma semana. Logo surgiram boatos nas redes sociais de que médicos estariam se inscrevendo com o intuito de desistirem depois, para tumultuar ainda mais o processo, numa tentativa de boicotar o programa. Resultado: além de abrir inquérito para investigar o caso, o governo já teve de mudar as regras, prevenindo-se contra eventuais sabotagens. Tanto desgaste certamente teria sido evitado com ampla e democrática discussão das providências nos foros adequados.

O atropelo acaba por prevalecer sobre a polêmica em torno das próprias medidas. Em relação ao Mais Médicos - que pretende distribuir melhor esses profissionais no território nacional, suprindo as áreas mais carentes, como o interior e as periferias dos grandes centros urbanos, além das regiões Norte e Nordeste -, a resistência é em torno da abertura do mercado a estrangeiros, sem a revalidação do diploma. De fato, a liberalidade é questionável. Afinal, a comprovação técnica é imprescindível. Já quanto ao Programa de Valorização da Atenção Básica (Provab), a exigência de dois anos de prestação de serviço obrigatório no Sistema Único de Saúde (SUS), mesmo remunerado, seria cabível para formandos em universidades oficiais, não para os da rede privada. Para esses últimos, a ampliação do curso deveria ser facultativa, um atrativo extra, pela experiência a mais e a garantia de emprego imediato.

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