FOLHA DE SP - 09/06
Um dos aspectos mais extraordinários da ciência é como ela nos permite ampliar nossa visão do real
Costumamos achar que sabemos o que é o mundo real, esse que vemos à nossa volta. Basta abrir os olhos, apurar os ouvidos, e temos esse retrato do que é a realidade, baseado na nossa percepção sensorial. Mas será que é só isso? Será que o que vemos e ouvimos pode ser chamado de realidade? Um dos aspectos mais extraordinários da ciência é como ela nos permite ampliar nossa visão do real. E um dos aspectos mais paradoxais é que quanto mais aprendemos sobre o mundo, menos clara nos é a natureza da realidade.
Platão, na Grécia Antiga, já antecipara o problema. Em sua alegoria da caverna, ele imagina um grupo de "escravos" acorrentados em uma caverna desde o nascimento. A percepção da realidade deles se restringe à parede da caverna, que é tudo que podem ver. Para eles, o que aparece na parede é o mundo real. Sem que os presos soubessem, atrás deles um grupo de filósofos fizera uma fogueira que lançava luz na parede. Em frente ao fogo, os filósofos seguravam objetos e os escravos viam as sombras projetadas na parede, achando que os objetos eram reais. Obviamente, a projeção não correspondia ao objeto: por exemplo, uma bola aparecia como um círculo. O ponto de Platão é que nossa percepção sensorial cria uma noção falsa do real. Como disse a raposa ao Pequeno Príncipe, "o essencial é invisível aos olhos".
Na história da física, o que chamamos de realidade também muda. Antes de Copérnico, o Cosmo tinha a Terra no centro e o Sol e planetas girando à sua volta. O Universo era fechado na forma de uma esfera e Deus e sua corte habitavam a esfera mais externa. Quando Newton propôs sua teoria da gravitação, percebeu que o Cosmo não poderia ser finito. Apenas um Cosmo infinito, onde as estrelas estavam separadas e equilibradas (precariamente), seria estável. De repente, a realidade muda e o homem se vê num Universo infinito, envolto em trevas. Qual o lugar do homem nesse novo Universo? Para complicar, as ideias de Newton levaram a um determinismo radical em que o futuro poderia ser calculado, ao menos em princípio, a partir do presente. Se isso fosse verdade, não haveria mais o livre arbítrio; todas as ações estariam predeterminadas pela precisa maquinaria cósmica. A liberdade que achamos ter seria uma ilusão.
Felizmente, esse determinismo não durou muito. No início do século 20, a física quântica pôs fim à noção de que podemos usar a física como oráculo. O princípio de incerteza de Heisenberg mostrou que não podemos medir a posição e a velocidade de uma partícula conjuntamente, o que torna a determinação precisa de seu futuro impossível.
Ademais, o mundo quântico nos mostra que a própria natureza da realidade é elusiva: não vemos um elétron ou um fóton, sua existência é medida com detectores, aferida indiretamente. O mundo do muito pequeno, que tanto define nossas vidas através das tecnologias digitais que usamos, é um mundo inacessível aos sentidos. Não podemos nem mesmo atribuir existência a uma partícula antes de a detectarmos: a realidade é definida pelo modo como interagimos com ela.
Isso cria um novo modo de ver o mundo: sempre existirão aspectos da realidade que são desconhecidos. Mas o surpreendente é que existem outros que são inacessíveis.
Ótimo texto.
ResponderExcluirNo entanto, no que tange à minha simples maneira de pensar, defendo que:
1) Observar, estudar e ampliar o conhecimento científico é algo TOTALMENTE necessário e sadio à civilização humana.
2) O aumento do conhecimento, principalmente à partir do Sec. XX, aumentou as incógnitas; afinal, o contexto é de "mente finita" na tentativa de "conter o infinito".
3)Em decorrência, a evolução científica humana SEMPRE estará apresentando upgrade e novas teorias.
4)ENTÃO, assim como hoje se sabe que muitas teorias de 1970 estavam equivocadas - a despeito de serem "doutrinas" dos cientistas à época - é certo que as certezas e as afirmações científicas atuais já estão equivocadas; e isto será confirmado em poucos anos à frente...
5) Diante deste contexto, entendo que o pesquisar e o ampliar o conhecimento é louvável, NO ENTANTO, fiar no conhecimento humano o fim maior da vida e das suas incógnitas não é prudente; nem matemático, nem racional...
6)Particularmente, vejo em Gleiser um grande cientista, porém, uma pessoa muito segura de si mesma para difundir descrédito a outras linhas de pensamentos; e ele faz isto com base no seu conhecimento atual - o qual será caduco em breve...
Grato pelo espaço para este comentário.
www.cihgral.com
nao vi gleiser "difundir descredito a outras linhas de pensamentos". vc está interpretando coisas que ele nao disse.
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