segunda-feira, junho 17, 2013

Quando Dilma beijará a cruz? - EDITORIAL REVISTA ÉPOCA

REVISTA ÉPOCA

Já passou da hora de ela reavaliar os erros de sua gestão na economia

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso escreveu recentemente que já passou a hora de o petismo beijar a cruz. Era uma referência irônica à relutância dos governos do PT de fazer as concessões de aeroportos, ferrovias e estradas e portos à iniciativa privada. Na prática, apesar de abjurar a palavra, eles já adotaram a demonizada "privatização”. Mas o fazem com tantas reticências que o programa anda aos solavancos — com os de- correntes prejuízos para a modernização da precária infraestrutura nacional.

Da mesma forma, pode-se dizer que chegará uma hora em que a presidente Dilma Rousseff terá de beijar a cruz em relação aos erros de seu governo na gestão da economia. No discurso, ela ainda é reticente em admiti-los, como fez, na semana passada, ao comparar seus críticos ao Velho do Restelo. Era uma referência ao personagem de Os Lusíadas, de Luís de Camões, que agourava os navegadores portugueses de partida da costa lusitana para desbravar mares. Na prática, o governo Dilma já tem dado, ainda que relutantemente, passos atrás na política que adotou em seus dois primeiros anos. É uma política que desajustou a economia brasileira, elevou a inflação, sem aumentara taxa média de crescimento anual do PIB, a menor desde o governo Collor.

Ao respaldar a decisão do Banco Central (BC) de elevar a taxa de juros e deixar a taxa de câmbio flutuar mais livremente, o Palácio do Planalto reconhe tacitamente, a necessidade de uma correção de rumos. As duas medidas representam um recuo na intervenção política do governo no BC, para forçar os juros para baixo e o câmbio para o alto. Os economistas desenvolvimentistas instalados no Ministério da Fazenda acreditavam que tais medidas acelerariam o crescimento brasileiro, ao lado da abertura das comportas dos gastos públicos, por meio de estímulos para certos setores. Tal objetivo foi frustrado. A meia-volta do BC foi ditada pelo crescimento da insatisfação popular com a renitência da inflação (registrada na pesquisa Datafolha que mostrou uma queda de 8 pontos na aprovação à presidente Dilma) e pelas mudanças nas expectativas dos investidores internacionais que valorizam o dólar. Agora, o governo precisa conter seus gastos. Na semana passada, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, numa tentativa de recuperar a credibilidade perdida da política fiscal, anunciou uma meta de 2,3% do PIB de superavit nas contas públicas. Disse que, se necessário, fará cortes para cumpri-la.

Será crível? Mesmo os amigos do Planalto, como o ex-ministro Delfim Netto, não hesitam em criticar os economistas oficiais. Inspirados, segundo ele, num "keynesianismo de pé quebrado", eles acreditam que os financiamentos do Tesouro farão o PIB crescer. O discurso da austeridade fiscal também não é condizente com as medidas em série tomadas pela presidente Dilma para estimular o consumo. Na semana passada, ela lançou mais um programa de crédito subsidiado pelo Tesouro — destinado às famílias beneficiadas pelo Programa Minha Casa Minha Vida comprarem móveis e eletrodomésticos. Enquanto a reeleição estiver na mira prioritária do Planalto, o mais provável é que Dilma continue a se negar a beijar a cruz de um ajuste fiscal firme, a cada dia mais necessário para reequilibrar a economia brasileira.

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