FOLHA DE SP - 22/06
Os jovens acreditaram que o Brasil virou uma potência e querem o tratamento que cidadãos de uma merecem
O Primeiro-Ministro do Japão, Shinzo Abe, não cansa de dizer que os japoneses precisam se globalizar. Estreitar os laços de seu país com o resto do mundo é um dos fundamentos de seu programa de governo.
Essa política de internacionalização tem objetivo econômico. Um de seus eixos é a capacitação profissional. É apoiada pela Keidanren, que reúne os maiores conglomerados industriais do país.
A razão é simples: as empresas locais querem ampliar suas operações no mundo, mas não contam, no Japão, com suficiente mão de obra capaz de dominar ambientes internacionais. É aí que entra o governo: ajuda a financiar esse tipo de qualificação.
O programa japonês quer tirar vantagem de um processo social espontâneo, que já está em curso.
No Japão, a maioria dos universitários entre 18 e 23 anos é internacionalizada. Ainda tem dificuldades com línguas estrangeiras e não conta com as melhores conexões nos centros mundiais de produção de conhecimento.
Mas é a primeira geração do país que cresceu com uma janela aberta para o mundo.
Se quisesse --e muita gente quis--, podia arranjar amigos na Alemanha, comprar livros nos EUA e assistir a vídeos feitos por gente de qualquer lugar do planeta. Bastava uma conexão de internet.
Não é por acaso que, desmentindo o estereótipo de que os japoneses não querem contato com o exterior, pesquisa recente da Universidade de Waseda indicou que 82% de seus alunos gostariam de estudar em outros países.
Esse interesse pelo mundo não é, naturalmente, exclusivo do Japão. Está mais relacionado com a faixa etária e o uso de tecnologia que com a nacionalidade dos indivíduos.
É um fenômeno de jovens e permite àqueles com interesses e causas comuns reconhecerem-se e se organizarem em minutos, independentemente de onde estejam, porque a internet que os conecta chega a todo lugar.
A maior parte dos que iniciaram a onda de protestos no Brasil é jovem e se encaixa nesse perfil. Segundo o Datafolha, na primeira manifestação em SP, 77% dos participantes frequentavam universidades e 53% tinham menos de 25 anos.
É gente que tem mais energia e acesso a informação que a média da população; que sabe que o descaso e o desrespeito com os quais o povo brasileiro é tratado por seus governantes seriam inaceitáveis em qualquer país civilizado. Gente que aprendeu isso por comparação, olhando, como os japoneses, através de janelas abertas para o mundo.
Essa gente reclama que ser brasileiro está custando caro demais, e que, em outras partes do mundo, paga-se menos por qualidade de vida significativamente melhor. Essa gente pergunta com quem, em nosso país, fica a diferença entre o que se paga e o que se recebe.
Disseram que o Brasil tinha virado potência. Os jovens acreditaram. Agora, querem o tratamento que potências devem a seus cidadãos. Em situação semelhante, os jovens japoneses provavelmente agiriam igual.
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