quinta-feira, junho 20, 2013

Blatter e a revolta popular - KENNETH MAXWELL

FOLHA DE SP - 20/06

Joseph "Sepp" Blatter, o presidente da Fifa, criticou os torcedores brasileiros de futebol na inauguração do Estádio Nacional Mané Garrincha, em Brasília, quando eles vaiaram a presidente Dilma Rousseff.

O Brasil derrotou o Japão, mas Blatter deveria ter ficado quieto. Enquanto ele falava, a polícia usava balas de borracha e gás lacrimogêneo para dispersar os manifestantes que estavam do lado de fora do estádio para expressar a raiva do público pelas quantias gastas no estádio e nos preparativos para a Copa do Mundo. Aldo Rebelo, o ministro do Esporte, declarou que "o governo não tolerará manifestações".

Nos dias seguintes, o povo saiu às ruas de Belém a Salvador, de Natal a Florianópolis e Porto Alegre, e do Rio a São Paulo, em um movimento que tomou as autoridades federais, estaduais e municipais de surpresa --e o mesmo vale para os partidos políticos. A violenta reação inicial da PM no Rio e em São Paulo só fez aumentar a conflagração.

O movimento popular está sendo coordenado por meio das mídias sociais e, aparentemente, não tem liderança clara. Foi estimulado pelo aumento nos preços das passagens do transporte público, pela preocupação quanto aos gastos excessivos com as instalações esportivas novas e reformadas, pelas exigências e pelo comportamento da Fifa e pela raiva quanto à corrupção continuada e endêmica.

Uma revolta popular, a Revolta do Vintém, acontecida no Rio no final de 1879 e no começo de 1880, começou quando foi apresentado um imposto de 20 réis sobre todos os passageiros que usavam os bondes puxados a mula na cidade. Os manifestantes se reuniram diante do palácio de São Cristóvão. O imperador d. Pedro 2º queria ser conciliador. Mas, quando a polícia não se provou capaz de conter a multidão furiosa no largo de São Francisco, o ponto inicial e final das linhas de bonde, a polícia chamou o Exército e mais de uma dúzia de manifestantes foram mortos e feridos quando os soldados abriram fogo.

A revolta popular em São Paulo em 2013 começou como movimento de protesto contra aumento nas tarifas de transporte público, e a PM reagiu com violência, disparando granadas de gás lacrimogêneo contra a multidão. Muitas pessoas foram feridas, entre as quais diversos jornalistas.

A Revolta do Vintém terminou tão rápido quanto tinha começando, quando o imposto de 20 réis foi retirado. Mas ela chocou o regime imperial. Cerca de nove anos mais tarde, o imperador seria substituído por um governo republicano.

As demandas da atual revolta popular nas ruas do Brasil urbano são incoerentes, até o momento. Mas o movimento é nacional. Os políticos não serão capazes de evitar as consequências.
Tradução de PAULO MIGLIACCI

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