quarta-feira, junho 19, 2013

A mensagem do novo - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 19/06

Quem tem mais a perder com esse movimento é quem está no poder. Não por acaso, a presidente Dilma Rousseff, pré-candidata à reeleição, discursou ontem em favor das manifestações pacíficas e cívicas que começaram há dois anos e, agora, ressurgiram com força

De dentro do Congresso Nacional, os senadores Eduardo Suplicy e Paulo Paim, ambos do PT, e ainda, Inácio Arruda, do PCdoB do Ceará, observavam a manifestação na noite de segunda-feira com vontade de sair e conversar com os estudantes. Foram desaconselhados. Conformados, assistiram a tudo pelo vidro. De repente, duas moças gritam “vocês não nos representam”. De olhos arregalados, os três recolheram os flaps.

A cena ajuda a explicar por que os manifestantes dispensaram uma conversa com o presidente em exercício da Câmara, André Vargas (PT-PR), e ajuda a entender um pouco mais o que vem por aí, muito diferente do que ocorreu em anos anteriores. Nos anos 1960, o que as marchas da família desejavam era a cabeça do então presidente João Goulart. Na década de 1980, os manifestantes foram até o Congresso e entregaram o pedido de aprovação da emenda das eleições diretas. Nos 90, foi a vez dos caras pintadas pedirem aos congressistas o impeachment do então presidente Fernando Collor. Agora, perguntados, eles disseram apenas que queriam tomar o Congresso, sob os gritos de “ahá-uhú, o Congresso é nosso!”

O recado das ruas, desta vez, é muito diferente dos anteriores. E começou em 2011, com as manifestações contra a corrupção, puxadas pela classe média. Em 8 de setembro, escrevi aqui que havia algo novo no ar, construído a partir das redes sociais. A coluna Entrelinhas, naquele dia, trouxe a seguinte mensagem , sob o título Internautas pintados: “Se os políticos e suas instituições não se aproximarem desses movimentos e passarem a ouvir mais essas vozes que se levantam no mundo virtual e tomam as ruas, eles vão ‘dançar’. (...) A população se levantou da arquibancada e começou a invadir o campo. Resta saber se os políticos vão se mexer e atender ao chamado ou esperar que o internauta aperte o ‘delete’ para os seus mandatos”.

Enquanto isso, no Planalto…
Quem tem mais a perder com esse movimento é quem está no poder. Não por acaso, a presidente Dilma Rousseff, pré-candidata à reeleição, discursou ontem em favor das manifestações pacíficas e cívicas, aproveitando para fazer um comercial das mudanças que acredita em curso por obra de seu governo. Colocou-se lado a lado com os manifestantes. O discurso, preciso do ponto de vista político, foi elaborado ainda na noite anterior, quando a presidente conversou com o antecessor, Lula, e com João Santana. Tão logo o Exército cercou o Planalto, ela saiu pela “rota de fuga” da garagem do palácio. Ontem, voltou a Lula, o que, de pronto, alguns encararam como um recurso constrangedor, porque pode passar a impressão de que ela não anda sem a ajuda dele.

E no PT e no PSDB...
Os petistas nunca estiveram tão consternados nos bastidores. Jorge Samek, presidente da Itaipu Binacional, lembrava ontem, na solenidade do Planalto, que era a primeira manifestação popular que ele ficava de fora, desde os tempos da ditadura. “Estou me sentindo um excluído”, dizia. Ele considera que vem aí um novo paradigma. Vai na mesma direção dos discursos de ontem, pelo aniversário de 25 anos do PSDB, com a presença de Fernando Henrique Cardoso, que vê o movimento como a vontade de construir o Brasil.

O que eles não dizem, mas conversam nos bastidores, é a possibilidade de renovação de quadros e fora dos procedimentos normais. O movimento de 60 gerou José Serra, a própria Dilma, José Dirceu, José Genoino, Ulysses Guimarães.

O movimento pela redemocratização gerou o PT de Lula, Dirceu, Genoino, e o PSDB de Mário Covas, Serra, Fernando Henrique, Franco Montoro. As Diretas Já foram ainda o nascedouro de Aécio Neves e Eduardo Campos que, agora, surgem como opção para presidente da República. O impeachment de Fernando Collor produziu Lindbergh Farias, Randolfe Rodrigues, que chegaram ao Senado. Esse novo movimento, em gestação há dois anos e que ressurge com mais força este mês, vai gerar novos líderes, talvez mais dispostos a se agarrar no serviço de qualidade que os manifestantes desejam, sem ter que negociar na base do toma lá, dá cá. Como os movimentos anteriores, eles se mostram dispostos a formar suas próprias lideranças, deixando quem participou de algo semelhante no passado com ar de excluído. Que venham. O Brasil agradece.

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