terça-feira, maio 07, 2013

Há hora para tudo - BENJAMIN STEINBRUCH

FOLHA DE SP - 07/05

Será um erro andar novamente na contramão do mundo, como já ocorreu durante longos anos


Olhemos para a Europa. A população começa a perder a paciência com a política anticrise imposta principalmente pela liderança alemã no continente. Há 19 milhões de desempregados nos países da zona do euro, 12,1% da população economicamente ativa.

Na Grécia e na Espanha, a taxa de desemprego já se aproxima dos 30%. Entre os jovens que tentam entrar no mercado de trabalho, o índice passa do nível assustador de 60%. Cenários um pouco menos dramáticos se espalham por França, Itália e Portugal, mas com níveis também muito elevados.

Prevaleceu até agora na União Europeia a política imposta pela líder alemã Angela Merkel, a "chanceler da austeridade", segundo a qual a retomada do crescimento ocorre apenas depois que a economia perfaz um ciclo completo de rigorosa contração fiscal. Ou seja, não há sucesso sem sacrifício.

Pode ser que essa política funcione no longo prazo. Mas, enquanto os efeitos práticos não se dão, o que se vê na Europa são índices como os citados, que podem levar essas vítimas da austeridade a revoltas sociais de desfecho imprevisível.

Por isso, líderes europeus começam a clamar contra o rigor fiscal que pretende trazer o deficit público ao nível tradicionalmente determinado pela UE, de 3% do PIB.

O presidente da França, François Hollande, em carta aberta, pediu reorientação das políticas econômicas europeias em direção ao crescimento. E ganhou apoio de Itália, Holanda e Espanha. A própria diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, e o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, tradicional aliado de Merkel, fizeram declarações simpáticas à proposta de afrouxamento fiscal.

Olhemos para os Estados Unidos. Não há lá um cenário tenebroso como o da Europa. O desemprego recuou e a economia cresceu a uma taxa anualizada de 2,5% no primeiro trimestre, nível um pouco abaixo do esperado. Mas houve crescimento contínuo nos últimos 15 trimestres, a uma taxa média de 2%.

Apesar dessa melhora, o banco central americano continua em sua política heterodoxa. Obama trava uma batalha fiscal no Congresso contra os cortes de gastos preconizados pelos republicanos.

Olhemos agora para o Japão, onde o BC comprometeu-se no mês passado com um vigoroso plano de flexibilização pela compra de títulos até dobrar a base monetária (para US$ 2,7 trilhões) no fim de 2014. O objetivo é elevar a inflação para 2% ao ano e acabar com a doença do baixo crescimento que atinge o país há 15 anos.

Isso que ocorre no mundo ainda em crise deveria servir de reflexão por aqui. Radicalismos monetários e fiscais estão fora de lugar. Será um erro andar novamente na contramão do mundo, como já ocorreu durante longos anos, quando o Brasil perdeu oportunidades para baixar os juros para níveis civilizados. Na área fiscal, a política anticíclica parece ser a opção mais razoável no momento.

Não é o caso, naturalmente, de defender leniência com inflação nem irresponsabilidade fiscal. Mas também não se pode incentivar o avanço de discursos monetaristas e fiscalistas radicais.

O gasto público, no momento, é importante para reidratar a economia, desde que direcionado a investimentos e não a despesas com custeio da máquina ineficiente do governo --no primeiro trimestre, os gastos com investimento tiveram um crescimento de apenas 7,4%, metade da expansão dos dispêndios com custeio. É inegável que a oferta de recursos para investimentos em infraestrutura, por exemplo, dá impulsos duradouros à economia.

Há hora para estímulo fiscal e hora para contração, porque os gastos levam ao endividamento público excessivo, que pode provocar o baixo crescimento --embora alguns economistas preguem o contrário, que o baixo crescimento é a causa do endividamento. Estudo recente que tentou demonstrar a relação entre baixo crescimento e elevada dívida pública em relação ao PIB foi desacreditado por erros metodológicos.

Sobre esse tema, vale citar uma frase do comentarista econômico Martin Wolf. Em artigo no "Financial Times", ele lembrou que em 1816 a dívida pública líquida do Reino Unido chegou a 240% do PIB, como parte do legado fiscal da guerra de 125 anos com a França. "E qual foi o desastre econômico que se seguiu a esse fardo esmagador das dívidas? A revolução industrial."

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