sexta-feira, maio 31, 2013

CRISTOPHER VLAVIANOS - Energia em desequilíbrio

FOLHA DE SP - 31/05

Se há energia elétrica não aproveitada pelo mercado cativo, por que não destiná-la ao mercado livre? É preciso financiar empreendimentos


O mercado livre de energia floresceu no Brasil após o fim do racionamento de energia, em fevereiro de 2002. A redução do consumo elétrico pela população foi tão exitosa que sobrou energia no mercado. O excedente alimentou a fase de maior expansão do mercado livre, que, desde então, vem atuando com os grandes consumidores de energia de diversas cadeias produtivas.

O diferencial para uma empresa aderir ao mercado livre é a possibilidade de poder escolher seu fornecedor de energia, assim como o preço, o prazo e o montante a ser consumido, favorecendo a competitividade. Hoje, o mercado livre responde por 27% do consumo brasileiro.

Por outro lado, no mercado cativo ou regulado, compra-se energia da concessionária sem a possibilidade de negociar preço, ficando-se sujeito às tarifas de fornecimento. Os consumidores residenciais estão no mercado cativo.

O contexto atual brasileiro, porém, revela certo desequilíbrio no setor de energia e entre os mercados cativo e livre. Em novembro de 2012, o governo federal reduziu as tarifas de energia para o consumidor (e agora promete manter a redução por decreto, pois a medida não chegou a ser votada pelo Senado). Era um momento crítico, em que os reservatórios se encontravam em níveis baixíssimos. O sinal implícito era de que "o custo caiu, podem consumir mais".

Para não correr o risco de desabastecimento energético, o governo então colocou em operação usinas térmicas ineficientes e caras, mas necessárias para garantir o fornecimento de energia. O custo desse acionamento para a sociedade é superior a R$ 1 bilhão por mês.

Não faz sentido pagarmos um custo tão alto em uma energia suja quando se tem uma oferta de energia limpa reprimida e pouco estimulada.

No último leilão para o mercado cativo, por exemplo, havia uma oferta de cerca de 14 mil megawatts, predominantemente de energia eólica, para uma demanda declarada de 500 megawatts --os leilões para novos empreendimentos energéticos no mercado cativo se baseiam nas previsões de demanda futura.

Não incluir essa oferta de energia limpa na matriz elétrica brasileira resulta em uma maior dependência das usinas térmicas, mais custos para o sistema e, pior, em um aumento da emissão de gases poluentes para a atmosfera.

Mas, se há oferta de energia elétrica não aproveitada pelo mercado cativo, por que não destiná-la ao mercado livre?

A resposta paira sobre a dificuldade em financiar novos empreendimentos para o mercado livre. As empresas consumidoras geralmente celebram contratos de médio prazo, de três a cinco anos, no ambiente livre, renovando-os de acordo com sua estratégia de mercado e procurando uma menor exposição aos reajustes da inflação, de modo a manter a sua competitividade.

Para os agentes que financiam os empreendimentos, porém, esse prazo é insuficiente para garantir o retorno do investimento. Isso explica a falta de oferta de novos empreendimentos para o mercado livre, enquanto sobra para o mercado cativo, que conta com prazos contratuais maiores e, por consequência, com mais garantias de retorno.

A solução para esse desequilíbrio seria a entrada de agentes financiadores, em especial o BNDES, em projetos de energia para o mercado livre.

Em uma só "tacada", o governo estimularia a oferta, reduziria os custos financeiro e ambiental advindos do acionamento das térmicas, geraria empregos, recolheria impostos, manteria a segurança do sistema elétrico e eliminaria o desequilíbrio entre oferta e demanda dos mercados cativo e livre.

Para que seja factível, porém, o agente financiador precisará se certificar de que o empreendimento será, de fato, entregue, contando com a fiscalização da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). E, como em todos os demais casos, terá seus contratos baseados no valor da commodity "energia".

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