sexta-feira, abril 05, 2013

Sem "milagre", taxa Selic deve subir - CLAUDIA SAFATLE

VALOR ECONÔMICO - 05/04

Não existe ministro da Fazenda fraco. Existe ministro da Fazenda", costumava dizer o notável ministro Mário Henrique Simonsen. O mesmo se pode dizer do Banco Central. Não há presidente do BC fraco. Há presidente do BC. Se for fraco, não dura muito tempo.

Uma forma de reduzir a polêmica, incômoda e onerosa discussão sobre se o BC tem autonomia para perseguir a meta de inflação ou, ao contrário, o atual BC - tutelado pelo Palácio do Planalto - busca crescimento, seria a institucionalização da autonomia operacional. Não que ela seja uma solução definitiva. Mesmo com autonomia, o governo de La Rua, na Argentina, arranjou um jeito de defenestrar o presidente do BC, Pedro Poul. Mas, com certeza, melhoraria o ambiente no qual opera a autoridade monetária num regime em que a coordenação das expectativas do mercado é parte importante do seu trabalho.

Depois de dormir seis anos nas gavetas do Senado, o projeto de lei complementar que regula o sistema financeiro nacional - e trata da autonomia do BC - recebeu parecer favorável do senador Francisco Dornelles (PP-RJ) e seguiu, na quarta-feira, para a Comissão de Assuntos econômicos (CAE), onde Dornelles espera que seja, no mínimo, amplamente discutido.

O projeto estabelece mandato de seis anos para a diretoria do BC, não coincidente, portanto, com o mandato presidencial. A demissão de um membro da diretoria do BC teria que ser aprovada em decisão secreta do Senado, o que tiraria do Palácio do Planalto o poder de pressionar ou constranger o BC. Nesse arcabouço, ao BC caberia cuidar da estabilidade de preços e da solidez do sistema financeiro nacional.

Nesses seis anos os senadores tentaram ouvir as opiniões do governo sobre a proposta. Não tiveram retorno. Agora, com o projeto na CAE, o governo será convidado para o debate e terá que expor suas opiniões. O assunto pode avançar ou não, o que é mais provável. O país não parece maduro para tal institucionalidade.

Um dos ganhos de uma autonomia operacional do BC para perseguir e cumprir a meta de inflação de 4,5% seria de credibilidade e, portanto, melhor desempenho no controle das expectativas. Essa dificuldade não é específica do atual comando do BC. Durante o regime de metas, em apenas três anos as expectativas contribuíram para baixar a inflação efetiva - em 2006, 2007 e 2009. Nos últimos três anos, ao contrário, a desancoragem das expectativas foi responsável por agregar à inflação anual 0,21, 0,51 e 0,48 ponto percentual, respectivamente.

Um BC com autonomia para perseguir a meta de inflação muito provavelmente submeteria a política cambial à sua missão primordial. A desvalorização da taxa de câmbio em 2012, feita por decisão política e não por condições de mercado, adicionou mais 0,60 ponto percentual no IPCA, que encerrou o ano em 5,84%.

Nada disso, porém, resultou em impulso ao crescimento econômico. O PIB cresceu modestos 0,9%.

Nesse período, contudo, foi possível tirar algumas importantes lições que ampliam o conhecimento do governo sobre a complexa questão econômica.

Uma delas é a de que o corte de 525 pontos base na taxa de juros Selic, que hoje está em seu mais baixo patamar - 7,25% - pode ser condição necessária, mas está longe de ser suficiente para produzir crescimento sustentável.

Outro fato pedagógico diz respeito à taxa de câmbio. Desvalorização da moeda para dar competitividade à indústria doméstica só contribuiu para acirrar as pressões inflacionárias. No fim do ano passado ainda houve uma forte especulação de que o governo deixaria a taxa de câmbio chegar a R$ 2,30. Isso, na avaliação do BC, produziu estrago maior do que se imaginava e estendeu o repasse do câmbio para os preços até os dias de hoje.

Um terceiro elemento na decomposição da inflação mostra que os choques de oferta estão cada vez mais presentes. A margem de tolerância de 2 pontos percentuais para a inflação foi criada para acomodar choques inesperados de oferta. De 2003 para cá, só em 2005 e 2009 houve choque de oferta positivo, que contribuiu para a queda da inflação.

Os três elementos - expectativa, câmbio e choque de oferta - estão presentes na aceleração da inflação corrente.

O presidente do BC, Alexandre Tombini, durante as três horas em que esteve na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, nesta semana, deixou claro que a inflação está alta demais, que o índice de difusão de 74% é preocupante, e que a inflação de março, mas não só ela, será importante para uma decisão do Comitê de Política Monetária (Copom).

Ele insistiu que não está parado vendo a inflação subir. Desde janeiro trocou o sinal da política monetária, ao mudar a comunicação do BC. O próximo passo deve ser o aumento da Selic, já que o BC ainda pretende entregar, neste ano, um IPCA abaixo tanto dos 5,84% do ano passado quanto dos 5,7% estimados pelo último Relatório de Inflação para o cenário de referência.

O que leva a diretoria do BC a se mover com "cautela" é a ainda frágil reação da atividade econômica e não um eventual receio de que a presidente da República, Dilma Rousseff, venha a desautorizar o Copom a elevar a Selic em abril ou maio em nome do crescimento.

Depois da queda inesperada da produção industrial em fevereiro, os dados divulgados ontem pela indústria automobilística foram surpreendentes. As montadoras fabricaram 319,1 mil unidades em março, aumento de 3,4% da produção sobre igual período de 2012 e de 39,2% sobre fevereiro. Assim, encerraram o primeiro trimestre com produção de 827,7 mil, 12,1% a mais do que no primeiro trimestre do ano passado. Essas informações renovaram a expectativa de crescimento de 1% do PIB no trimestre.

Com uma política fiscal expansionista e medidas macroprudenciais inócuas para um momento de fraca expansão do crédito, restou para combater a inflação apenas a taxa de juros.

Só um evento, ou um "milagre", poderia dissuadir o Copom a iniciar o aperto monetário: a inflação despencar nas próximas semanas e o índice de difusão cair substancialmente para, por exemplo, a casa dos 60%.


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