domingo, abril 21, 2013

Brasília, Brasil - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 21/04

Os "escorpiões" não são maioria, mas o veneno que deixam cria uma imagem ruim para todos que aqui trabalham com afinco, escolhem suas profissões por vocação e talento, criam seus filhos, constroem suas famílias


Dia do aniversário de Brasília seria impossível não falar da cidade que chega aos seus 53 como as pessoas que ultrapassam os 50 anos. Sempre aparece uma taxa alterada ali, uma artrite acolá. A capital do país mostra os mesmos problemas de velhos centros urbanos. É transporte coletivo ineficiente, metrô insuficiente, sistema de saúde deficiente e, agora, para completar, chegaram os escorpiões, como o que matou uma criança na creche do Guará. Há o receio de que a cidade esteja infestada deles, depois do relato de moradores de vários bairros.

A capital do Brasil tem "escorpiões" há tempos. Estão por aí, buscando algum meio de burlar leis. Até as de trânsito. Tem gente que só para no sinal vermelho se houver uma câmera capaz de registrar a infração. O que não dizer daqueles que, ao menor sinal de um carro vindo à esquerda, aceleram quando se aproximam dos balões de entrada e saída das quadras? Não deixam de ser "escorpiões".

Muitos citam a cidade ainda como a capital dos concursos. O trágico nessa história, entretanto, é observar jovens que, em vez de buscar uma vocação, uma carreira que os façam felizes, preferem prestar um concurso para trabalhar pouco, ganhar bem e ver a vida passar. Obviamente, se não houver vocação para a carreira - seja procurador, promotor, analista legislativo, auditor - será mais um ser humano frustrado, desmotivado, que trabalha apenas pela obrigação de cumprir horário a fim de receber o contracheque no fim do mês. Brasília, infelizmente, está cheia dessa espécie.

Além desses escorpiõezinhos, a maioria criada aqui mesmo, Brasília convive com alguns políticos (acharam que não falaria deles?) que se transformam em espécies venenosas para a cidade e o país. Observo a classe política há 24 anos. A maioria chega, muitas vezes, idealista, crente que mudará a cidade e o Brasil, seja na Câmara, no Senado, na Presidência da República, nos tribunais superiores ou mesmo na Câmara Distrital e no Palácio do Buriti. Entretanto, ao circular livremente pelas salas a que poucos têm acesso, muitos se perdem. Alguns se deixam embriagar pelos caminhos do poder nos majestosos edifícios, nas curvas, rampas e amplos salões idealizados por Oscar Niemeyer.

Nessa embriaguez, muitos se esquecem quem são, de onde vieram. Jogam no fundo da gaveta do apartamento funcional as fotografias de seus passados, de suas profissões, de sua realidade. Querem a qualquer custo tornar esse papel de inquilino, concedido pelo povo, em algo permanente ou ter a vida de alguns dos milionários com quem passam a conviver.

Enquanto isso, nas ruas da cidade.
Embora esses escorpiões não sejam a maioria, esse veneno cria uma imagem ruim para todos que aqui trabalham com afinco, escolhem suas profissões por vocação e talento, criam seus filhos, constroem suas famílias. E essa maioria de cidadãos apaixonados pela cidade volta e meia reage. A cidade que convive com escorpiões de várias espécies é pródiga em movimentos, como a população que se veste de preto em protesto contra a corrupção em passeatas. São cinco décadas de buzinaços, panelaços, caminhadas - algumas famosas, como aquela em que o ex-ministro Maurício Corrêa, então presidente da OAB-DF, liderou em 1983, depois da interdição do prédio da Ordem pelos militares. Esse movimentos são uma demonstração de que a cidade não se rende aos escorpiões das mais variadas espécies que tentam envenená-la. Que continue assim. E, quanto aos problemas dos grandes centros que entraram no dia a dia do brasiliense, nunca é demais lembrar que 53 anos é uma idade em que ainda há tempo de solucioná-los. Portanto, passadas as comemorações e a pausa de hoje, é hora de se agarrar nesse serviço.

Por falar em serviço.
A semana promete muito barulho em várias frentes. O maior deles virá da Medida Provisória 595, o novo marco regulatório dos portos, que não será pacífico como pretendia o governo. Mas essa é outra história. Hoje, é dia de festa. Parabéns, Brasília!

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