sábado, abril 13, 2013

Abaixo o tabu - ALBERTO DINES

GAZETA DO POVO - PR - 13/04

Já se pode falar abertamente no assunto, encará-lo sem preconceitos, discuti-lo sem medo de ser amaldiçoado pelas vestais dos direitos difusos. A questão da diminuição da maioridade penal saiu, enfim, da clandestinidade e não foi por um passe de mágica. Desta vez a violência, a perversidade e o sangue derramado conseguiram vencer a hipocrisia e permitir que uma controvérsia legítima circule livremente numa sociedade que se pretende democrática e seja tratada sem interdições de espécie alguma.

A participação de um menor no estupro da turista americana e o espancamento do seu namorado no Rio seguiu-se ao assassinato, em São Paulo, de um estudante universitário por outro menor que estava às vésperas de completar 18 anos. A soma de horrores acrescentou-se à generalizada sensação de medo que domina o país de ponta a ponta. Desqualificá-la simplesmente como “histeria” é um artifício perverso e pseudo-humanitário.

A questão não pode ficar enrustida na retórica bacharelesca daqueles que imaginam que os criminosos de menor idade estão sendo piedosamente reeducados pelas entidades previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente. Os menores em questão eram reincidentes e perigosos. Classificá-los beatificamente de “crianças” é desconhecer o número de fugas dos estabelecimentos destinados aos menores transgressores. A maioria recusa a ressocialização; prefere a rua, onde eles serão aliciados, protegidos e muito bem remunerados pelas facções criminosas.

É enganoso o argumento de que a diminuição da maioridade penal de 18 para 16 anos será seguida por sucessivas reduções para 14, 12 ou 10 anos. Os constituintes de 1988 foram criteriosos ao estabelecer um marco para o exercício da cidadania: aos 16 anos o jovem recém-saído da adolescência já está em condições de votar. Considerado apto a escolher os governantes, em condições de discernir e selecionar os melhores legisladores; por que, então, estaria desobrigado de respeitar suas leis?

A questão não se situa no âmbito da pedagogia ou da psicologia. Está no campo do direito, da isonomia, princípio fundamental do Estado democrático onde todos são iguais perante a lei. O jovem eleitor de 16 anos é um cidadão pleno, como outro qualquer. Aprendeu a respeitar os códigos eleitorais, não vende o seu voto, não ataca os mesários, não rouba as urnas nem assassina os militantes de partidos adversários. Qual a lógica de liberá-lo para matar, roubar e estuprar em outras esferas e situações?

O governador paulista Geraldo Alckmin não prima pela audácia, mas agora sentiu a pressão popular e retomou a promessa feita em novembro para aumentar o rigor contra criminosos adolescentes. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, pediu cautela. Decisões impensadas, ponderou, correm o risco de sobrecarregar ainda mais nosso precário sistema penitenciário.

Menos cauteloso que o colega de governo, o ministro-chefe da Secretária Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho – e, tal como Alckmin, identificado com o pensamento católico tradicionalista –, apelou para a manutenção do tabu: anunciou que “está torcendo para que a iniciativa do governador não prospere no Congresso”.

O ponderado Gilberto Carvalho não percebeu que está na contramão da sociedade brasileira. Carecemos justamente de mais debates, menos interdições e preconceitos. O tartufismo, o farisaísmo e a dissimulação têm sido os incubadores do atraso e das injustiças.

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