FOLHA DE SP - 06/04
O que definitivamente não se pode é, também nessa área da economia, ser indiferente à China
A China não está acostumada a primeiras-damas. As mulheres dos governantes nunca aparecem.
Contudo, no final de março, em mais uma manifestação de que a política está mudando de tom -e de hábitos- o presidente Xi Jinping, em sua primeira viagem internacional, desceu do avião em Moscou ao lado da mulher, Peng Liyuan.
Os chineses notaram, com surpresa, que, ao invés de ostentar as grandes grifes estrangeiras que estão no imaginário das pessoas bem-sucedidas, Peng vestia marcas nacionais.
Foi o suficiente para que o Weibo (Twitter local) corresse a divulgar quem produziu suas peças e, a partir daí, começasse uma grande discussão sobre "buy China".
A primeira-dama Peng Liyuan é uma figura conhecida. Militar, general de brigada, cantora nas Forças Armadas, integra o Comitê Consultivo do Partido. Sempre se achou que ela adicionaria leveza à figura do presidente. Mas nunca que sua primeira aparição pública tivesse tanto impacto.
No meio de comparações de seu perfil com Carla Bruni e Michelle Obama, não faltaram artigos para lembrar que a China já teve produtos nacionais valorizados. De repente, apaixonou-se pelo que vem de fora. Mas isso pode mudar.
A China é uma grande exportadora de vestimentas e acessórios. As vendas externas desses itens totalizaram US$ 159 bilhões em 2012. O que sai não tem marca. Ganha etiquetas coladas por quem importa.
Ao mesmo tempo, a febre do consumo fez dos chineses os segundos maiores compradores do luxo no mundo. O cálculo mais comumente divulgado é que eles consomem 25% dos bens nessa categoria, sendo que 55% dos consumidores das grandes grifes na Europa e nos Estados Unidos são turistas chineses.
O fator primeira-dama pode não mudar radicalmente o panorama do negócio da moda e da vestimenta. Mas traz um dado novo a um mercado já agitado.
Recentemente, alguns dos conglomerados internacionais do luxo começaram a investir em marcas chinesas de melhor qualidade, possivelmente antecipando um consumidor mais voltado para produtos locais. A Hermès, num movimento diferente, criou a Shang Xia, que nasceu em Xangai, estendeu-se a Pequim e está abrindo em Paris.
Na direção contrária, grupos chineses compraram marcas europeias que perdiam brilho, para levantá-las em casa. Os exemplos são vários: Cerruti e Gieves and Hawks, adquiridas pelo Trinity, o Lanvin, pelo taiwanês Shaw Lan Wang, a Sonya Rykiel pelo Fung Brands, a Miu Miu pelo fundo Fosun.
Em complemento a tudo isso, a China agora ganhou uma defensora poderosa das suas próprias grifes, ainda muito desconhecidas dos nacionais, apesar de algumas delas já estarem abrindo na Europa. E os analistas mais alertas dizem aos designers estrangeiros que passem a olhar o gosto oriental.
Na esteira da São Paulo Fashion Week, não há como ignorar o que está ocorrendo no negócio da moda do outro lado do mundo. Tudo leva a crer que haverá espaço para todos, inclusive para os que ainda não chegaram. O que definitivamente não se pode é, também na moda, ser indiferente à China.
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