segunda-feira, abril 29, 2013

A inflação e o teto do PIB - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S.Paulo - 29/04


A inflação é preocupante e a política de juros pode ficar mais dura, disse em São Paulo, num pronunciamento surpreendente, o diretor de Política Econômica do Banco Central (BC), Carlos Hamilton de Araújo. Sua fala destoou da ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada horas antes, na manhã de quinta-feira, e redigida em linguagem bem mais branda. O mercado reagiu com rapidez. Em pouco tempo aumentaram as apostas em taxas mais altas nos próximos meses. A novidade sobre os juros foi destaque nos meios de comunicação naquele dia e no dia seguinte. Mas o diretor do BC transmitiu um recado bem mais amplo. A economia, segundo ele, tem pelo menos dois graves problemas. Um é a inflação. O outro é a capacidade de crescimento. Há uma ligação entre os dois.

A expansão econômica de 3,1% prevista para este ano está próxima do potencial brasileiro, disse Hamilton, sem apontar um número. Há poucos anos, vários economistas estimavam esse limite na faixa de 4% a 4,5% ao ano. Cálculos mais recentes têm apontado um teto mais baixo, em torno de 3,5%. Esse é o nível provavelmente considerado pelo diretor do BC. Pode-se discutir o cálculo, mas um ponto parece claro: o Brasil está despreparado para sustentar um ritmo de avanço parecido com o de outros países latino-americanos - e nem se fale em padrões chineses ou asiáticos de crescimento.

O conceito de potencial é bastante claro. O PIB de um país pode até crescer além do limite por algum tempo, mas esse esforço acaba levando a desequilíbrios importantes. No Brasil essa tese foi confirmada mais de uma vez, com surtos inflacionários, desarranjos nas contas externas e crises cambiais.

O diretor Carlos Hamilton de Araújo nem precisou ilustrar seu ponto de vista com muitos exemplos. A economia brasileira, segundo ele, tem de se mover sob um teto baixo por causa dos investimentos insuficientes. Até aí, nenhuma grande novidade, exceto a clareza excepcional da linguagem usada por uma autoridade monetária. De certa forma, ele respondeu a quem cobra do BC uma política mais favorável ao crescimento econômico e menos voltada para o combate à inflação. A política monetária, lembrou Hamilton, é impotente quando se trata de vencer limitações da oferta. Sem a eliminação desses limites, qualquer expansão da demanda muito acima dos 3,1% acabará resultando em maiores pressões inflacionárias.

Para romper as barreiras, o País precisa elevar os investimentos e ganhar produtividade. O diretor do BC poderia ter citado, para ilustrar seu raciocínio, um gráfico divulgado na mesma semana pelo Ministério da Fazenda, no boletim Economia Brasileira em Perspectiva. Os autores do relatório projetam para 2013 investimentos maiores que os de 2012, mas ainda abaixo de 20% do PIB. Em 2010 essa relação chegou a 19,5%. Foi a maior alcançada em muitos anos. Segundo a projeção do pessoal da Fazenda, só dentro de uns cinco anos o País investirá algo parecido com 24% do PIB, proporção considerada necessária, mesmo no governo, para um crescimento seguro na faixa de uns 5% ao ano.

O BC pode contribuir para o crescimento, segundo Hamilton, trabalhando para reduzir a inflação e tornar os preços menos instáveis. Mas cabe a outras instâncias o esforço direto para elevar o potencial de crescimento. Sem ser tão direto, ele deixou claro esse ponto. Poderia ter acrescentado: erra quem aponta como exemplo o duplo mandato do Fed, o banco central americano, de defender a estabilidade monetária e preservar o nível de emprego. Mas estabilidade, nesse caso, significa um nível de inflação muito mais baixo que o brasileiro, dificilmente acima de 2% ao ano.

Sem abrir um confronto, o diretor do BC devolveu o desafio às demais áreas do governo. É delas a responsabilidade - por meio do planejamento, do manejo dos instrumentos fiscais e da orientação imposta aos bancos públicos - de promover e estimular os investimentos para destravar a economia. Faltou cuidar de um ponto relevante: até quando a meta de inflação, no Brasil, será muito maior que a de outros países em desenvolvimento com desempenho econômico muito melhor?

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