sábado, fevereiro 16, 2013

Um estilo próprio - MIRIAM LEITÃO


O GLOBO - 16/02

A ideia por trás da oferta de compra da Heinz pelo fundo 3G e pelo grupo de Warren Buffett é a que tem acompanhado o grupo brasileiro: os investidores mais ativos estão olhando bons gestores e o mercado de alta tecnologia; por isso eles apostam em gestão de excelência, mas em mercados de consumo de massa. Assim eles construíram um império com vários ramos.

Portanto, não é estranho que eles tenham olhado para a Heinz. O movimento tem coerência com o que fizeram quando compraram o Burger King, vindos do setor de bebidas. Aliás, ontem o Burger King anunciou em Nova York um aumento de 94% no lucro do último trimestre do ano.

O empresário Jorge Paulo Lehmann começou com o Banco Garantia nos anos 1980, que acabou vendendo para o Credit Suisse, banco no qual havia iniciado como estagiário. Lehmann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, os três do 3G, estão há bastante tempo em mercados de consumo de massa com as Lojas Americanas e a velha Brahma. Quando o "Financial Times" deu como manchete que Buffett e Brazil Tycoon (Buffett e magnata brasileiro) fizeram uma oferta pela Heinz, estava simplificando o que é complexo. Lehmann não é apenas um magnata brasileiro indo às compras.

O 3G é um grupo formado por brasileiros com uma rede de negócios globalizados. Eles continuam tendo escritório no Brasil, parte dos negócios é aqui, mas a sede do 3G é Nova York. A cervejaria, que um dia foi do Rio e depois comprou a paulista Antartica e se transformou na Ambev, fez novas compras no exterior, inclusive a americana Anheuser Busch. Hoje, o grupo AB Inbev é controlado pelo 3G e por 300 famílias belgas. A maioria do capital é dos belgas mas a gestão ficou sempre com os brasileiros. Virou a maior cervejaria do mundo em volume de vendas.

Eles são, como disse Warren Buffett em entrevista, "os caras da operação" ou "os que farão todo o trabalho". Essa sempre foi a marca que levaram do Brasil: uma gestão de resultados. Eles investem muito em "pessoas excelentes que fazem extraordinária diferença", como definem internamente. Acreditam em estrutura de gestão sofisticada, muita disciplina, foco no resultado e estrutura espartana em torno dos seus executivos. Ninguém tem sala, carro, avião. Pelo menos no corporativo. Os luxos são privados.

A imprensa no Brasil diz que os dois investidores - Jorge Paulo e Buffett - se encontraram num voo por acaso, em dezembro, e começaram a conversar sobre isso; o "Financial Times" diz que eles se encontraram no conselho da Gillette, do qual fazem parte. Lehmann e Buffett são amigos, encontram-se com frequência, são sócios, têm inúmeras ocasiões para conversar.

Buffett é o que é: surpreende, ousa, aposta. Seu Berkshire Hathaway é um conglomerado com mais de 70 negócios adquiridos em 40 anos. Na entrevista que concedeu à CNBC, ele disse: "Estou pronto para um novo elefante, se você encontrar algum andando me conte." Portanto, a Heinz foi o elefante da vez, mas não o último do investidor.

O site Beyondbrics avalia que não se deve esperar novas grandes aquisições de brasileiros no exterior, lembrando que a Vale está há dois anos retraída, e o JBS, que fez a compra do Pilgrim´s Pride fortemente apoiado pelo BNDES, não parece estar com novos planos. Qualquer correlação com outros movimentos de empresas brasileiras não faz muito sentido, porque o private equity é há muito tempo um grupo globalizado.

O empresário Jorge Paulo Lehmann e a cultura empresarial que consolidou com seu grupo de amigos e sócios não é o Brasil indo às compras. Ele tem seu jeito de fazer negócios que não se parece muito com a cultura da maioria das grandes empresas brasileiras.

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