sexta-feira, fevereiro 08, 2013

Na Lapa com Ruy Castro - BARBARA GANCIA

FOLHA DE SP - 08/02

Ninguém usaria da cartada "Sabe com quem está falando?" com o glorioso maître Ronaldo do Copa


Ele já se tornou um colosso de Rodes do colunismo e não precisa que ninguém saia em sua defesa. O faço apenas pela cruzada que nos une, a sangrenta batalha contra o mau humor, e os muitos detratores que sua coluna da última quarta-feira, publicada neste canteiro de obras do caderno Cotidiano, parece ter juntado.

Em texto intitulado "Cliente paulista, garçom carioca", Antonio Prata esquadrinhou as relações entre paulistanos e garçons e constatou que elas quase sempre se dão no âmbito do distanciamento comercial.

Em contraste, concluiu, o cliente carioca não reduz o relacionamento com o garçom a um serviço trivial. Ele não deixa de reconhecer no garçom, que provavelmente já ajudou a enfiar o bundão de Vinícius de Moraes no banco de trás de um táxi ao final de uma noitada, a devida majestade que lhe cabe na ordenação do universo.

Não passaria pela cabeça de um cliente do glorioso maître Ronaldo, que por anos comandou a piscina do Copacabana Palace, usar de inti­midação familiar a quatrocentões e novos ricos paulistas: "Sabe com quem está falando?". Até porque, nem mesmo o segundo ajudante do engraxate que dá ponto ali na frente do Bar do Ernesto, a poucos metros dos Arcos da Lapa, daria a menor pestana se você fosse o príncipe da Pérsia, o sultão de Brunei ou o rei da Cocada Preta.

Dizem que Charlotte Casiraghi, filha de Caroline de Mônaco, ficou estupefata em sua primeira passa­gem pelo Rio e que, por isso, conti­nua voltando a cada verão. A jovem princesa relata que o Rio é a única cidade do mundo onde é tratada co­mo pessoa comum. Na praia, na ba­lada, no calçadão de Ipanema, nun­ca foi abordada por estranhos.

Cariocas são mesmo blasé com fa­mosos, Calvin Klein que o diga. Não vou nem me alongar aqui sobre a mística do doutor e o empregado que se igualam ao se toparem, se­minus, no terreno neutro da praia.

Pois no último fim de semana, an­tes mesmo de ler o que Antonio Prata tinha a dizer, fui esnobada de bom grado por um garçom para lá de decadente do Rio, do tipo que em São Paulo só sobrevive ainda em clube, em bares mais tradicionais ou do centro.

A coisa se deu da seguinte forma: há muito eu vinha me torcendo de inveja do relato de um fim de sema­na sob as bênçãos do Corcovado que meu diretor na Bandnews FM, André Luiz Costa, e sua mulher, a apresentadora da Globo, Mariana Ferrão, tinham passado na compa­nhia do Ruy Castro.

Com a desculpa de uma efeméride compartilhada, consegui persuadir Ruy e sua mulher, Heloísa Seixas, a nos agraciar com o mesmo mimo.

Os sebos da rua do Ouvidor, a primeira casa em que Carmen Miranda morou ao chegar ao Brasil (Ruy, sabemos, é seu biógrafo) e uma visita ao prédio do extinto Correio da Manhã, em que nosso "guia turístico" trabalhou com Francis. Só faltou mesmo passar na casa da Danuza para tomar um suquinho.

Fechamos com almoço no Cosmopolita, o restaurante que deu ao mundo o filé Oswaldo Aranha. O "aplomb" do garçom, para desgosto do Antonio Prata, destoava do cenário, intocado (a não ser talvez por cupins) desde a transferência da capital para Brasília.

Ainda assim, chamou a atenção o uniforme puído e a cara amarrada do indivíduo que jogou várias batatas da travessa inox para cima do meu prato de uma vez só.

Seja como for, ele inspirava mais respeito que os universitários que tiram pedido nos restaurantes da moda dos Jardins. Casas que a gente sempre deixa com a ligeira suspeita de que o principal ramo de atividade ali desenvolvido talvez esteja menos relacionado à gastronomia e mais ligado à tinturaria. De dinheiro.

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