segunda-feira, fevereiro 11, 2013

Dor de cabeça - GEORGE VIDOR

O GLOBO - 11/02

A preocupação era o baixo crescimento, e agora, ao que parece, a agenda da dor de cabeça deve mudar para a trajetória da inflação. Se havia um temor que 2013 pudesse repetir o morno 2012 em relação ao ritmo da produção, os primeiros indicadores do ano surpreenderam positivamente. As montadoras de veículos bateram recordes de produção e vendas em janeiro, os desembolsos do BNDES referentes a empréstimos já aprovados pelo banco aumentaram 25% (quando comparados ao primeiro mês de 2012) e devem repetir a dose em fevereiro, e a entrega de cimento pela indústria, por dia útil, evoluiu 5,9% nesse mesmo tipo de comparação (janeiro/ janeiro). Há boas notícias também na agricultura brasileira, com previsão de safra recorde de 180 milhões de toneladas de grãos e recuperação na colheita de cana-de-açúcar na região Centro-Sul para 580 milhões de toneladas. A economia do país continua gerando muitos empregos formais nos segmentos de serviços, e a indústria da construção se mantém firme no terceiro lugar , com o comércio ocupando a segunda posição.O emprego cresceu 6,6% na construção no ano passado. Esse percentual sobe para quase 9%, se for levada em conta apenas a ocupação relacionada a obras de infraestrutura (nas Regiões Norte e Centro-Oeste, o incremento foi ainda maior , de 12,9%). Com várias obras por terminar para a Copa do Mundo de 2014, e mais outras em andamento nos sistemas de transportes e na área de energia elétrica, estima-se que o pico de contratação do setor será em 2015, sem incluir no-vos empreendimentos.

O que estragou esse começo de ano foi o comportamento da inflação. Já se esperava um índice amargo, mas o número divulgado (IPCA de 0,86%) veio ainda pior , tendo como vilão os alimentos, exatamente o item que mais pode contribuir este ano para derrubar a inflação. Como não é possível estocar hortigranjeiros, as chuvas costumam complicar a oferta desses produtos em janeiro. E quando elas não chegam, é o calor excessivo que acaba atrapalhando a oferta. Os demais alimentos vendidos em supermercados sofrem uma pressão de demanda turbinada pelo aumento real do salário mínimo. Nesse patamar de renda, qualquer ganho salarial vai direto para o consumo. Neste mês de fevereiro, o índice oficial de inflação deve recuar para 0,4%, com a colaboração das tarifas mais baixas de eletricidade. Ainda assim será uma variação incômoda.

A inflação brasileira resiste duramente na faixa de 5% ao ano. Mesmo quando as taxas básicas de juros eram exorbitantes, poucas vezes se conseguiu conter a inflação abaixo desse patamar . A meta oficial estacionou em 4,5%, com tolerância de dois pontos percentuais para cima ou para baixo, devido a essa incapacidade de derrubar a média de preço, sem que a economia caia em uma forte recessão (não se pode tentar curar o doente levando-o à morte). O câmbio às vezes consegue enfraquecer a inflação, mas para tal o real tem de estar supervalorizado, o que é uma faca de dois gumes. Um país do tamanho do Brasil, com população de quase 200 milhões, não pode ser dependente da importação de alimentos, matérias-primas básicas e energia, por exemplo, pois se a maré muda no mercado internacional ficamos fritos. O Chile pode importar a maioria das coisas que precisa, pois tem população de 16 milhões de pessoas e nessa dimensão é mais fácil abastecer o mercado. Mesmo assim, sua receita cambial é dependente do cobre, que responde por cerca de 50% das exportações do país.

Para sair do atual impasse, a economia brasileira terá de ser mais produtiva, o que, por sua vez, depende de avançarmos na qualidade da mão de obra. Isso exige tempo, perseverança, paciência, consistência de políticas públicas, investimento etc. Um processo, como se dizia anos atrás.

Bolivianos topam negociar 

Uma missão técnica da Bolívia, do setor de energia elétrica, esteve no Brasil há poucos dias para reatar entendimentos. Em março retornará, já com possibilidade de avançar nas negociações e assinar alguns protocolos. A Bolívia tem poucas hidrelétricas, que geram cerca de 470 MW. Pelos empreendimentos em construção ou em estudo, essa capacidade poderia ser ampliada para mais de 13 mil MW, incluindo nesse caso, a construção de duas grandes usinas em parceria com o Brasil, uma na fronteira dos dois países, e outra inteiramente em território boliviano, embora próxima à região da fronteira.

Como demonstração de boa vontade das duas partes, a elevação da cota do Rio Madeira de 82 para 90 metros, junto à barragem de Jirau (Porto Velho, em Rondônia), poderia ser negociada. Isso implicaria o alagamento de uma pequena área da Bolívia (mais precisamente, uma praia fluvial), o que envolve iniciativas sérias para se reduzir o impacto ambiental no período de cheia do Madeira.

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