domingo, janeiro 27, 2013

Truques e pajelanças - SUELY CALDAS

O ESTADO DE S. PAULO - 27/01

Ao assumir o governo de São Paulo, em 1995, uma desagradável surpresa aguardava o ex- governador Mário Covas: seu antecessor havia antecipado a venda de energia elétrica a grandes consumidores por prazos de três, quatro anos, oferecendo descontos pra lá de camaradas. Assim o ex-governador Luiz Antônio Fleury foi buscar no futuro recursos para sua gestão, mas as elétricas (então) estaduais (Cesp, Eletropaulo e CPFL) teriam de fornecer energia sem nada receberem durante o mandato de Covas. Dias antes de deixar o governo no Rio, em 2002, o ex-governador Anthony Ga- rotinho retirou dos cofres da Previ-Banerj um lote de títulos públicos que tratou de transformar em dinheiro vivo, vendendo-os no mercado com deságio. Garotinho apropriava-se de dinheiro que não lhe pertencia, tampouco ao Estado já que era destinado exclusivamente a pagar, no futuro, a aposentados do antigo banco estadual, vendido ao Itaú.

Ao antecipar receita dos chamados recebíveis de Itaipu (créditos que o Tesouro tem a receber da hidrelétrica até 2023) para bancar o desconto nas contas de luz, Dilma Rousseff usou o mesmo ardil financeiro de Fleury e Garotinho, com uma diferença: agora, pelo menos, a finalidade é mais nobre. O que não justifica o disfarce. Afinal, em democracias com alternância de poder o governante que antecipa receitas públicas que ultrapassam seu mandato, além de se apropriar indevidamente do que caberia ao sucessor, usurpa o direito de gerações futuras usufruírem o dinheiro.

Energia barata o Brasil inteiro quer. E o governo aproveitou aconcentração de vencimentosde concessões elétricas para obrigar as empresas a reduzir a conta de luz. Poderia ter feito melhor, de for- manegociada, sem imposição, sem traumas e provavelmente sem necessidade de tirar do cofre R$ 8,5 bilhões. No final, apopulação e as empresas saíram beneficiadas.Até hoje não há notícia de nenhuma concessionária ter recorrido à Justiça para reverter a queda da tarifa, como algumas chegaram a ameaçar. E agora é esperar para ver se o encolhimento do faturamento vai ou não prejudicar investimentos em manutenção e geração, como elas alardearam. Mas é preciso que o governo aja respeitando princípios e direitos, não avance sobre a gestão de governantes futuros - sejam da oposição, do PT ou apropria Dilma - nem prejudique gerações que estão por vir.

Aliás, nestes dois anos de gestão Dilma, na direção oposta à do franzino produto interno bruto (PIB), tem crescido com vibrante vigor esse tipo de ação o que alguns chamam de contabilidade criativa, mas, na verdade, não passa de manobras, truques e trapaças para driblara inflação e o resultado fiscal. A palavra-chave da pajelança é postergar. Em vez de combater entraves ao crescimento na sua estrutura, com reformas, redução do custo Brasil, estímulo ao investimento privado em infraestrutura, a equipe econômica tem recorrido à tática de tapar buracos aqui e ali, que viram verdadeiras crateras alimentadas pelo adiamento da solução.

Adiar o aumento do preço da gasolina é o mais grave deles no curto prazo porque está aniquilando a Petrobrás. Mas há outros. Se a inflação ameaça subir, o governo pede a governadores e prefeitos que adiem o aumento de tarifas de ônibus, metrô e trens. O pedido é atendido e mesmo assim o IPCA-15 acelerou para o,88% em janeiro. Se a importação de combustíveis dispara e reduz o saldo comercial, a Receita Federal trata de baixar resolução ampliando o prazo para a Petrobrás contabilizar as importações. Com isso adia para as contas de 2013 o que foi importado em 2012. Resultado: nos primeiros 20 dias de janeiro o saldo comercial já está negativo em U$ 2,7 bilhões. Como não conseguia fechar as contas de 2012, o ministro Mantega dirigiu a pajelança para o BNDES, a Petrobrás e a Caixa Econômica, que, em truques de operações triangulares, propiciaram o cumprimento da meta fiscal. E no Orçamento o item restos a pagar que ficaram para 2013 somou a absurda cifra de R$ 200 bilhões.

Transitando em seguidos adiamentos, o que fará o governo quando chegar a hora da verdade?

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