segunda-feira, janeiro 28, 2013

Os “doidos” e Dilma - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 28/01

O ônibus alugado para levar os meninos a um simples passeio escolar estaciona no local designado pela escola. Não passam cinco minutos e, antes de as crianças entrarem, uma das mães “invade” o veículo, verificando o estado dos bancos, se tem cinto de segurança, etc. O motorista olha meio incrédulo para um dos monitores do passeio, como quem diz: “É doida”.

A cena acima aconteceu de fato. Não só comigo, mas com vários pais e mães que, às vezes, são tachados de malucos por aí apenas porque exigiram o mínimo de precaução para um caso de emergência. Invariavelmente, muita gente tacha de “doidos” aqueles que se preocupam com algo básico, como equipamentos de segurança e prevenção.

A boate Kiss, em Santa Maria (RS), é um exemplo da falta que faz um “doido”, digo, precavido. Uma cidade daquele tamanho jamais poderia admitir um estabelecimento com capacidade para mais de mil pessoas e apenas uma saída. O “esperto” há de responder: “Ah, depois de ocorrida a tragédia é fácil falar. O difícil é prever”. Mas é aí que entram os “doidos”. Ou, na melhor linguagem, os previdentes.

Talvez agora vire lei — temos tantas, uma a mais não faz diferença — que uma boate tenha saídas mais acessíveis em caso de incêndio, ou que os donos sejam obrigados a manter equipes de resgate a postos no local para atendimentos de emergência. E, se a prefeitura tem leis nesse sentido, que coloque fiscais “doidos”, capazes de cobrar os cumprimentos das medidas básicas de segurança.

O mesmo vale para as pessoas contratadas para trabalhar nesses locais. Quantas vezes não nos deparamos com verdadeiros “armários”, de pé nas portas das boates, apenas para evitar os “prejuízos”? Por um acaso foram treinados para lidar com situaçãoes desse tipo? Têm o bom senso de perceber uma situação de emergência em vez de simplesmente trancarem as portas a fim de evitar que as pessoas saiam sem pagar a conta? Ao que tudo indica, há muito por fazer em relação às casas de espetáculos. Enquanto isso, é melhor prestar atenção no que dizem os “doidos”.

Por falar em conta…

Talvez muitos critiquem a atitude da presidente Dilma Rousseff, de cancelar a agenda no Chile e voar até Santa Maria para prestar solidariedade aos familiares das vítimas da tragédia na boate Kiss. Mas, se alguém tiver o cuidado de ouvir a população, verá que a maioria aplaudiu o gesto presidencial. E, se há algo a se elogiar diante do jeitão da presidente, é a sua incapacidade de esconder emoções. Quando da tragédia da escola de Realengo, no Rio, Dilma falou com a voz embargada.

Ontem, sua tristeza era perceptível. Dilma tem um quê de quem não consegue disfarçar quando não gosta de algo, quando se emociona ou ainda quando uma conversa lhe agrada. Ponto para a presidente. Em meio a tantas tragédias que o país vive e viveu, é um alento ter alguém que esteja atento e sensível à realidade das pessoas e àquilo que as comove. Oxalá ajude para que isso não se apague daqui para frente.

No mais…

A semana, que seria marcada pelas eleições no Senado e na liderança do PMDB, agora será pautada pela apuração de responsabilidades sobre a tragédia. Em Rhode Island, nos Estados Unidos, em 2003, houve tragédia semelhante. Todas as pessoas envolvidas no evento foram punidas, dos patrocinadores e músicos aos donos da boate. Espera-se que por aqui não seja diferente. Meus sinceros e profundos sentimentos a todos os familiares das vítimas do incêndio na boate Kiss.


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