quinta-feira, janeiro 17, 2013

A denúncia do “jeitinho monetário” brasileiro - RICARDO GALUPPO

BRASIL ECONÔMICO - 17/01


Não é segredo que no Brasil vigora uma espécie de culto às soluções fáceis e engenhosas. "Não conseguiu ingressos para um show nem passou no exame para motorista?

Não se preocupe; você precisa apenas encontrar um jeitinho", disse o diário inglês Financial Times, num artigo publicado no dia 15 de janeiro sobre a economia brasileira.

O artigo - que se chama "O jeitinho monetário brasileiro" - explica mas não traduz o hábito nacional de se apoiar numa criatividade que chega a resvalar na ilegalidade para resolver desde os problemas mais prosaicos do dia a dia até as questões mais delicadas de política monetária.

Cita como exemplo o pedido feito pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, ao prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, para que não aumentasse já as passagens de ônibus para que a decisão não tivesse impacto sobre as taxas de inflação.

É claro que as autoridades reagiram. Haddad disse que o pedido de Mantega não significa jeitinho, mas gestão. A questão é que, incomodando ou não, é impossível deixar de dar razão ao Financial Times.

E os exemplos de jeitinho que o jornal citou são esclarecedores, sem dúvida. Mas estão longe de representar uma relação abrangente desse hábito que, convenhamos, já passou da hora de ser eliminado da vida brasileira.

O Brasil parece ter a mania de produzir leis apenas pelo prazer de vê-las burladas. Um princípio universal transformado em lei diz, por exemplo, que o orçamento de um determinado exercício tem que ser aprovado no ano anterior.

Acontece, porém, que até agora o Congresso Nacional não se dignou a aprovar a relação de receitas e despesas públicas previstas para o ano de 2013. E, para não cometer uma ilegalidade, Brasília deu um jeitinho.

E baixou uma medida provisória que autoriza que os gastos prossigam até a chegada de uma lei que será aprovada Deus sabe quando. Para tentar aquecer a economia, o governo recorre com frequência ao jeitinho da renúncia fiscal a determinados setores em lugar de abrir uma discussão séria e profunda em torno de uma alteração para valer na ordem tributária.

E assim, de jeitinho em jeitinho, os problemas vão sendo empurrados com a barriga até o dia que for possível.

Visto pelo ângulo da necessidade de mudança de rumos, até que o artigo do Financial Times pode produzir resultados positivos. Mesmo porque, na medida em que o hábito começa a ser percebido e apontado como um problema por observadores internacionais influentes, a possibilidade de se encontrar uma solução aumenta.

O Brasil precisa deixar de recorrer à meia-sola para resolver os problemas de sua economia. Reformas consistentes e profundas são mais do que necessárias para que o jeitinho deixe de ser a ferramenta principal e passe a ser apenas - e em casos absolutamente secundários - um traço do bom humor brasileiro.

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