quarta-feira, dezembro 26, 2012
Qual foi o seu melhor presente? - ROBERTO DaMATTA
O Estado de S.Paulo - 26/12
Passado esse Natal de fim de mundo, um jornalista perguntou: professor, em que festa natalina você recebeu o melhor presente?
Respondi:
Num Natal antigo eu ganhei uma bicicleta importada de uma impecável Suécia, conforme papai me falou com aquele tom de voz que situava tudo o que era estrangeiro como superior. Esse foi um presente importante - em Niterói íamos a todos os lugares de bicicleta -, mas, diz um lado meu, não foi o meu melhor presente.
De uma outra feita, moço e apaixonado, ganhei em plena Rua Dr. Romualdo, em Juiz de Fora, o beijo de uma namorada e com ele a promessa esquecida de ser amado para sempre. O beijo natalino foi um belo presente, mas não foi - diz novamente a voz dentro de mim - o meu melhor presente.
Num Natal na casa de meus avós, Raul e Emerentina, na Rua Nilo Peçanha, 31, recebemos todos um presente inesquecível: revólveres de espoleta que reproduziam, a nosso ver perfeitamente bem, a guerra entre o Bem e o Mal - entre os mocinhos e os bandidos que víamos no cinema. Lembro da felicidade de manusear o meu revólver, de nele colocar as espoletas e, ato contínuo, atirar "matando" meus irmãos. Não esqueço o fato de ter sido ferido e de ter morrido muitas vezes por outros tiros naquele calorento Natal numa Niterói sem água, mas com uma praia das Flechas de mar translúcido. Apesar dos tiros, das mortes e das ressurreições, esse também não foi o meu melhor presente.
Num outro Natal, eu ganhei as obras completas de Guy de Maupassant em muitos volumes, mais do que poderia ler. Ao receber os livros de um contista que eu amava - ao lado de gente como O. Henry, Hemingway, Graham Green e Monteiro Lobato do Urupês -, exultei. Jamais me esqueci da luminosidade de Maupassant. Foi um grande presente, mas não foi o meu melhor presente.
Doutra feita, recebi os almanaques do Globo Juvenil e do Gibi. Maravilhado, transformei a varanda onde estava sentado meu avô Raul numa nave especial na qual viajavam Flash Gordon, o Dr. Zarkov e Dale Arden, por quem eu fiquei imediatamente apaixonado. Até hoje eu me lembro da voz calma do Celso Scofield, meu melhor e querido amigo, lendo comigo os quadrinhos. Ficamos, ambos, intrigados com uma história de Brick Bradford na qual ele ia parar num planeta com três gigantes imortais. O que era ser imortal? Celso havia perdido o pai; eu vivia numa casa cheia dos fantasmas dos meus tios mortos. Titia Amália, que era uma grande contadora de histórias, via almas do outro mundo num corredor sem fim, no qual não ousávamos transitar sozinhos de noite. Nem de luz acessa. Foi um excelente presente, mas não foi meu melhor presente.
O meu primeiro Natal com data fixa e certa foi o de 1968 - em Cambridge Massachusetts, aonde fui levado como estudante de uma Harvard perfeita. Fomos para a casa dos Maybury-Lewis. David era o meu orientador e Pia, sua esposa dinamarquesa, preparou a festa como mandava o figurino daquilo que eu só havia visto em tecnicolor e na grande tela do Cinema Icaraí. Havia uma enorme mesa com folhagens se misturando a comidas doces e salgadas. Havia vinho e neve, itens desconhecidos. E havia o amor de Celeste e dos nossos filhinhos. Cantamos músicas de Natal. Eu pude dar presente para todos os meus filhos com o deleite do pai feliz por ter plantado as suas sementes no mundo, e foi assim que eu os vi rasgando o papel dos embrulhos para descobrir o que haviam recebido. Não ganhei nada, mas hoje sei que foi essa a festa.
A partir de um certo Natal, quem tem filhos passa a ser mais um doador do que um receptor de presentes. Comecei a sustentar a crença dos meus filhos em Papai Noel, embora piscando o olho. Afinal, o Natal é apenas na aparência uma festa para crianças. No fundo, ele é uma celebração da paternidade que tenta retribuir o peso indiscutível de sua autoridade distribuindo dádivas. Era maravilhoso ver a crença nos olhos das crianças com aquele brilho que os meus olhos haviam perdido.
Seria mesmo possível responder à questão do jornalista? Afinal de contas, qual foi o melhor presente que recebi em toda a minha vida? Vocês sabem como eu sou ingrato e difícil de satisfazer. Ademais, sejamos realistas, quem é que, na tal "melhor idade" (como é o meu caso), pode se lembrar de tudo o que recebeu ao longo de 76 Natais?
Em alguns, eu tenho agradecido a presença de pessoas queridas. Em todos, eu sofro pela ausência de outros entes amados e perdidos. Meu maior presente tem sido, sem nenhuma dúvida, os livros que me fazem ler e escrever e, pelo milagre da literatura, tentar desenhar dádivas e ter o privilégio de distribuí-las nesta coluna. Esperando, é claro, algum retorno.
O que é que a baiana tinha? - MARTHA MEDEIROS
ZERO HORA - 26/12
Ontem faleceu, aos 105 anos (a mesma idade em que se foi o grande Niemeyer), dona Canô, cuja trajetória acompanhávamos como se fosse a avozinha do Brasil. De onde surgiu sua fama? Nem ela sabia explicar: “Apenas fiquei conhecida por causa de meus dois filhos que nunca se esqueceram de onde vieram nem da mãe que têm”. O curioso é que ninguém nunca ouviu falar sobre a mãe de Gilberto Gil ou de Gal Costa, pra citar os outros “doces bárbaros”. O que é que dona Canô tinha, afinal?
Sem possuir a exuberância dos filhos cantores, dona Canô era, ao contrário, fisicamente minguada, discreta, pequena em estatura. Porém exalava força moral, trabalhava por benfeitorias para sua Santo Amaro e era uma mulher posicionada politicamente, gostassem ou não de suas escolhas – foi íntima amiga do senador Antonio Carlos Magalhães e depois se rendeu a Lula, defendendo-o publicamente, como no episódio em que rebateu as críticas feitas por Caetano, quando esse declarou apoio a Marina Silva dizendo que ela sabia falar, ao contrário do líder petista, que era grosseiro. “Caetano é só um cantor, não precisa ofender nem procurar confusão”, declarou ela na época. Arretada, a velhinha.
Dona Canô era uma mulher de personalidade forte, mas de hábitos simples. Aliás, como Niemeyer. Lógico que o arquiteto está eternizado pela importância incomparável à da baiana que ficou conhecida apenas por ter dado à luz dois filhos talentosos, mas ele compartilhava com ela ao menos uma afinidade: a visão de mundo extremamente humanista e sem afetações.
Quem sabe não está aí o segredo da longevidade? Na surrada lista de atitudes para atingirmos os cem anos (a saber: não fumar, não beber, praticar exercícios, seguir uma dieta balanceada, manter um hobby, conviver mais com os amigos e demais resoluções que, aposto, você pautou para 2013), talvez esteja na hora de incluirmos os cuidados com nosso estado de espírito a fim de envelhecermos com juventude na alma.
Morrer aos 80, que não faz muito tempo parecia pra lá de razoável, está ganhando ares de infanticídio. Dona Canô, Niemeyer e mais uma penca de centenários anônimos têm mostrado que é possível esticar essa corda e seguir contribuindo para a sociedade. O segredo?
Nem tanto as regrinhas de manual, e sim a consciência de que gostar do que se faz, posicionar-se frente às questões cotidianas, enxergar a beleza das coisas prosaicas, se despreocupar diante do que não temos controle, investir nos afetos verdadeiros, cercar-se de gente do bem, amar sem restrições, deixar a vaidade de lado e valorizar aquilo que traz substância à nossa existência formam um conjunto de medidas tão eficaz quanto apagar o cigarro ou comer mais espinafre.
Em tempos de balanço e planos para o futuro, fica a dica da dona Canô, em frase dita por ela em seu último aniversário: “Viver é muito bom, mas saber viver é muito melhor”.
Ontem faleceu, aos 105 anos (a mesma idade em que se foi o grande Niemeyer), dona Canô, cuja trajetória acompanhávamos como se fosse a avozinha do Brasil. De onde surgiu sua fama? Nem ela sabia explicar: “Apenas fiquei conhecida por causa de meus dois filhos que nunca se esqueceram de onde vieram nem da mãe que têm”. O curioso é que ninguém nunca ouviu falar sobre a mãe de Gilberto Gil ou de Gal Costa, pra citar os outros “doces bárbaros”. O que é que dona Canô tinha, afinal?
Sem possuir a exuberância dos filhos cantores, dona Canô era, ao contrário, fisicamente minguada, discreta, pequena em estatura. Porém exalava força moral, trabalhava por benfeitorias para sua Santo Amaro e era uma mulher posicionada politicamente, gostassem ou não de suas escolhas – foi íntima amiga do senador Antonio Carlos Magalhães e depois se rendeu a Lula, defendendo-o publicamente, como no episódio em que rebateu as críticas feitas por Caetano, quando esse declarou apoio a Marina Silva dizendo que ela sabia falar, ao contrário do líder petista, que era grosseiro. “Caetano é só um cantor, não precisa ofender nem procurar confusão”, declarou ela na época. Arretada, a velhinha.
Dona Canô era uma mulher de personalidade forte, mas de hábitos simples. Aliás, como Niemeyer. Lógico que o arquiteto está eternizado pela importância incomparável à da baiana que ficou conhecida apenas por ter dado à luz dois filhos talentosos, mas ele compartilhava com ela ao menos uma afinidade: a visão de mundo extremamente humanista e sem afetações.
Quem sabe não está aí o segredo da longevidade? Na surrada lista de atitudes para atingirmos os cem anos (a saber: não fumar, não beber, praticar exercícios, seguir uma dieta balanceada, manter um hobby, conviver mais com os amigos e demais resoluções que, aposto, você pautou para 2013), talvez esteja na hora de incluirmos os cuidados com nosso estado de espírito a fim de envelhecermos com juventude na alma.
Morrer aos 80, que não faz muito tempo parecia pra lá de razoável, está ganhando ares de infanticídio. Dona Canô, Niemeyer e mais uma penca de centenários anônimos têm mostrado que é possível esticar essa corda e seguir contribuindo para a sociedade. O segredo?
Nem tanto as regrinhas de manual, e sim a consciência de que gostar do que se faz, posicionar-se frente às questões cotidianas, enxergar a beleza das coisas prosaicas, se despreocupar diante do que não temos controle, investir nos afetos verdadeiros, cercar-se de gente do bem, amar sem restrições, deixar a vaidade de lado e valorizar aquilo que traz substância à nossa existência formam um conjunto de medidas tão eficaz quanto apagar o cigarro ou comer mais espinafre.
Em tempos de balanço e planos para o futuro, fica a dica da dona Canô, em frase dita por ela em seu último aniversário: “Viver é muito bom, mas saber viver é muito melhor”.
Raça e genes - HÉLIO SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 26/12
SÃO PAULO - O caderno sobre cotas que a Folha publicou no domingo mostrou, com exemplos de carne e osso, que aquilo que vemos como características raciais não corresponde necessariamente à biologia. A análise de DNA encomendada pelo jornal revelou que a estudante que se declarou negra tinha menos genes de origem africana do que a que se definiu como "muito branca".
A razão para a confusão é que o Brasil é um país miscigenado e a cor da pele, que tomamos como principal indicador de raça, é definida por um conjunto de cinco a dez genes que operam pelo modelo de interação. Se um branco tem um filho com uma negra, é provável que a criança exiba um cor intermediária. Mas, quando os pais são ambos mestiços, o filho pode herdar múltiplas combinações desses genes, ampliando o leque de colorações possíveis.
A questão central é se é lícito ou não falar em raças humanas. E aqui o debate é acirrado. De um lado, há cientistas, encabeçados pelo biólogo Richard Lewontin, que sustentam que raças são meras construções sociais, fruto da imaginação de nossas mentes essencialistas sem significado biológico ou taxonômico.
Do outro lado, estão autores como Anthony Edwards e Richard Dawkins, para os quais as categorias raciais têm algum valor informativo, já que existe correlação entre a frequência dos diferentes alelos de um gene numa população e a sua distribuição geográfica. Em outras palavras, as pessoas se parecem com seus pais e tendem a herdar várias de suas características. É útil para um médico saber se o paciente é negro na hora de diagnosticar uma possível anemia falciforme ou outra doença de maior prevalência nesse grupo.
A polêmica está longe de resolvida, mas, mesmo que a ciência venha a reconhecer a validade do conceito de raça, isso de modo algum legitimaria qualquer forma de discriminação. O argumento contra o racismo é moral, e não biológico.
SÃO PAULO - O caderno sobre cotas que a Folha publicou no domingo mostrou, com exemplos de carne e osso, que aquilo que vemos como características raciais não corresponde necessariamente à biologia. A análise de DNA encomendada pelo jornal revelou que a estudante que se declarou negra tinha menos genes de origem africana do que a que se definiu como "muito branca".
A razão para a confusão é que o Brasil é um país miscigenado e a cor da pele, que tomamos como principal indicador de raça, é definida por um conjunto de cinco a dez genes que operam pelo modelo de interação. Se um branco tem um filho com uma negra, é provável que a criança exiba um cor intermediária. Mas, quando os pais são ambos mestiços, o filho pode herdar múltiplas combinações desses genes, ampliando o leque de colorações possíveis.
A questão central é se é lícito ou não falar em raças humanas. E aqui o debate é acirrado. De um lado, há cientistas, encabeçados pelo biólogo Richard Lewontin, que sustentam que raças são meras construções sociais, fruto da imaginação de nossas mentes essencialistas sem significado biológico ou taxonômico.
Do outro lado, estão autores como Anthony Edwards e Richard Dawkins, para os quais as categorias raciais têm algum valor informativo, já que existe correlação entre a frequência dos diferentes alelos de um gene numa população e a sua distribuição geográfica. Em outras palavras, as pessoas se parecem com seus pais e tendem a herdar várias de suas características. É útil para um médico saber se o paciente é negro na hora de diagnosticar uma possível anemia falciforme ou outra doença de maior prevalência nesse grupo.
A polêmica está longe de resolvida, mas, mesmo que a ciência venha a reconhecer a validade do conceito de raça, isso de modo algum legitimaria qualquer forma de discriminação. O argumento contra o racismo é moral, e não biológico.
O novo pacote aéreo - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 26/12
A exigência de que os participantes dos leilões de concessão dos Aeroportos do Galeão (Rio de Janeiro) e de Confins (Belo Horizonte) comprovem experiência em gestão de aeroportos com movimento anual de mais de 35 milhões de passageiros deve evitar o que aconteceu nos leilões realizados em fevereiro. As disputas pelos Aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Brasília foram vencidas por consórcios dos quais participam operadoras responsáveis por aeroportos menores do que os que passariam a gerir, deixando dúvidas sobre sua capacidade operacional. Esse problema não deve se repetir. Mas o fato de o governo deter 49% do capital do grupo vencedor, por meio da Empresa de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), pode afugentar muitas empresas que poderiam participar da disputa.
O descompasso entre as operações leiloadas no início do ano e a experiência exigida dos interessados era imenso. Embora a Secretaria da Aviação Civil (SAC) estime que, em 2021, o Aeroporto de Guarulhos receberá 50 milhões de passageiros e o de Viracopos, 35 milhões, puderam participar dos leilões operadoras que geriam aeroportos com movimento mínimo de 5 milhões de passageiros. Venceram a disputa, com a oferta do maior valor da outorga, operadoras de aeroportos com movimentos que variam de 5,5 milhões a 18,6 milhões de passageiros por ano. Perderam operadoras maiores e, talvez, detentoras de melhores conhecimentos operacionais.
Desta vez, a exigência supera as necessidades, pois, no ano passado, 9,5 milhões de passageiros passaram pelo Aeroporto de Confins, número inferior à sua capacidade atual, de 10,3 milhões de passageiros/ano, que, com as obras em execução pela Infraero, será aumentada para 17,5 milhões até o fim de 2013. O Aeroporto do Galeão, por sua vez, tem capacidade para 17,4 milhões de passageiros por ano e, com as obras dos dois terminais, atualmente em execução, alcançará 44 milhões de passageiros/ano até a Copa de 2014.
Desse modo, assegura-se que os interessados terão conhecimento, competência, experiência e capacidade para operar os aeroportos que serão licitados. Mas, ao elevar a exigência, o governo limitou drasticamente o número de operadoras que poderão participar dos leilões, previstos para setembro de 2013. Há apenas 33 aeroportos em todo o mundo com movimento superior a 35 milhões de passageiros por ano. Boa parte deles é operada por companhias locais, que nunca demonstraram interesse em atuar em outras regiões e, sobretudo, no exterior.
De acordo com balanço publicado pelo jornal Valor, apenas 13 operadoras poderiam participar das licitações do Galeão e de Confins. Se, em cada leilão, entrarem três ou quatro delas - as que venceram as licitações de fevereiro não poderão participar das novas -, haverá disputa, como quer o governo. Resta saber se elas se interessarão pelo negócio.
O governo manteve, para os novos leilões, a participação da Infraero com 49% do capital da vencedora, que foi muito criticada nos anteriores. A ameaça de interferência estatal na gestão do negócio pode afugentar operadoras experientes, que necessitam de liberdade para decidir as melhores práticas para alcançar seus objetivos financeiros. Além disso, essas operadoras deverão ter pelo menos 25% de participação no negócio, bem mais do que os 10% exigidos nos leilões de fevereiro.
Há um longo processo a ser cumprido até o novo leilão. Só depois de concluídos os estudos de viabilidade econômica será possível definir parâmetros como valor mínimo da outorga e a duração dos contratos de concessão. Então, após aprovação pelo Tribunal de Contas da União, poderão ser publicados os editais, o que poderá ocorrer em agosto de 2013, se tudo correr bem, para a realização do leilão em setembro, como pensa o governo.
Nesse período, o governo ainda terá de detalhar um plano ambicioso de dinamização da aviação regional, por meio da recuperação e melhorias de 270 aeroportos, isenções das tarifas de utilização do sistema aeroportuário e subsídios para os passageiros. Há muitas dúvidas sobre o plano, pois boa parte dele depende de definições que surgirão após consulta pública.
O futuro é coisa do passado - ANTONIO PRATA
FOLHA DE SP - 26/12
Cheguei ao meu destino duas horas e meia antes de partir e até hoje não consigo pensar em outra coisa
Dez dias atrás aconteceu a coisa mais incrível da minha vida. Não, não me refiro ao bicampeonato mundial do Sport Club Corinthians Paulista -um fato esplêndido, decerto, mas que de incrível não tem nada; a vitória era óbvia e evidente como a lua brilhar no negrume da noite ou o sol raiar ao fim da madrugada.
O absurdo se deu na volta do Japão para Chicago, onde, a caminho do Brasil, parei para visitar uns amigos. Eis que peguei um avião em Tóquio às nove horas da manhã de segunda-feira e aterrissei nos Estados Unidos às seis e meia da manhã de... segunda-feira. Sim, meus caros: cheguei ao meu destino duas horas e meia antes de partir e até hoje não consigo pensar em outra coisa.
Ok, eu sei que há uma explicação racional para minha pequena viagem no tempo: calhou de eu e o planeta estarmos indo pro mesmo lado e de eu voar mais depressa, de modo que cheguei ao mundo um pouquinho antes dele próprio. Mas entender racionalmente um fenômeno não diminui o seu mistério - e aí estão o amor, a morte e a batata frita sabor pizza para provarem o que eu digo.
Cruzar um oceano e pousar noutro continente antes de ter partido é tão estranho que nem meu celular, uma máquina que dispõe de mais capacidade de processamento do que todo o programa Apolo, conseguiu entender. Quando liguei o telefone em Chicago ele me informou, em sua tela luminosa e obscura, claramente atordoado com os dados ilógicos que sua lógica impecável o obrigava a exibir: "20:30 PM, Yesterday". Não sei de onde o smart(sic)phone tirou o "20:30 PM", mas o "Yesterday" estava corretíssimo, uma vez que em Tóquio um dia havia se passado, mas eu, furando o tempo como quem fura uma onda, não havia passado com ele.
Impressionante que não tenhamos, até hoje, aproveitado as inúmeras possibilidades que esse truque metaf"ú"sico abre para a humanidade. Por exemplo: eternizar o presente. Por exemplo: não envelhecer. Por exemplo: não morrer. Vamos convencer já nossos 7 bilhões de semelhantes a engajarem-se numa marcha global para a direita, e, orientando os pilotos a irem um pouco mais devagar do que o meu, ficaremos parados num hoje eterno. Sugiro partirmos num sábado à noite: a vida será um sábado que nunca verá a aproximação opressiva de domingo, não sentirá o hálito azedo da segunda.
O leitor acha perda de tempo congelar a história entre cervejas e pistas de dança? Ok. Que pegue o Boeing dos CDFs numa segunda de manhã e na segunda permanecerá, até o fim de seus dias -diria eu, se os dias tivessem fim nesta jornada atemporal. E quando quisermos descansar, seja da balada ou da labuta, é só descer num aeroporto, dormir algumas noites e tomar um avião domingo à tarde, para no domingo ficar, de pantufas, ad infinitum.
O lema da humanidade, de Genghis Khan a Cabral, dos Bandeirantes aos colonos norte-americanos, foi "Go west!". É chegada a hora de inverter este vetor. "Go east, young man! Go east!" é o bordão do futuro. Ou melhor, do presente, pois futuro é coisa do passado, da época em que o sol raiava ao fim da madrugada, iluminando-nos rumo ao inexorável crepúsculo de nossos dias. Inexorável? Não mais. Compremos os tickets e sejamos felizes para sempre.
Cheguei ao meu destino duas horas e meia antes de partir e até hoje não consigo pensar em outra coisa
Dez dias atrás aconteceu a coisa mais incrível da minha vida. Não, não me refiro ao bicampeonato mundial do Sport Club Corinthians Paulista -um fato esplêndido, decerto, mas que de incrível não tem nada; a vitória era óbvia e evidente como a lua brilhar no negrume da noite ou o sol raiar ao fim da madrugada.
O absurdo se deu na volta do Japão para Chicago, onde, a caminho do Brasil, parei para visitar uns amigos. Eis que peguei um avião em Tóquio às nove horas da manhã de segunda-feira e aterrissei nos Estados Unidos às seis e meia da manhã de... segunda-feira. Sim, meus caros: cheguei ao meu destino duas horas e meia antes de partir e até hoje não consigo pensar em outra coisa.
Ok, eu sei que há uma explicação racional para minha pequena viagem no tempo: calhou de eu e o planeta estarmos indo pro mesmo lado e de eu voar mais depressa, de modo que cheguei ao mundo um pouquinho antes dele próprio. Mas entender racionalmente um fenômeno não diminui o seu mistério - e aí estão o amor, a morte e a batata frita sabor pizza para provarem o que eu digo.
Cruzar um oceano e pousar noutro continente antes de ter partido é tão estranho que nem meu celular, uma máquina que dispõe de mais capacidade de processamento do que todo o programa Apolo, conseguiu entender. Quando liguei o telefone em Chicago ele me informou, em sua tela luminosa e obscura, claramente atordoado com os dados ilógicos que sua lógica impecável o obrigava a exibir: "20:30 PM, Yesterday". Não sei de onde o smart(sic)phone tirou o "20:30 PM", mas o "Yesterday" estava corretíssimo, uma vez que em Tóquio um dia havia se passado, mas eu, furando o tempo como quem fura uma onda, não havia passado com ele.
Impressionante que não tenhamos, até hoje, aproveitado as inúmeras possibilidades que esse truque metaf"ú"sico abre para a humanidade. Por exemplo: eternizar o presente. Por exemplo: não envelhecer. Por exemplo: não morrer. Vamos convencer já nossos 7 bilhões de semelhantes a engajarem-se numa marcha global para a direita, e, orientando os pilotos a irem um pouco mais devagar do que o meu, ficaremos parados num hoje eterno. Sugiro partirmos num sábado à noite: a vida será um sábado que nunca verá a aproximação opressiva de domingo, não sentirá o hálito azedo da segunda.
O leitor acha perda de tempo congelar a história entre cervejas e pistas de dança? Ok. Que pegue o Boeing dos CDFs numa segunda de manhã e na segunda permanecerá, até o fim de seus dias -diria eu, se os dias tivessem fim nesta jornada atemporal. E quando quisermos descansar, seja da balada ou da labuta, é só descer num aeroporto, dormir algumas noites e tomar um avião domingo à tarde, para no domingo ficar, de pantufas, ad infinitum.
O lema da humanidade, de Genghis Khan a Cabral, dos Bandeirantes aos colonos norte-americanos, foi "Go west!". É chegada a hora de inverter este vetor. "Go east, young man! Go east!" é o bordão do futuro. Ou melhor, do presente, pois futuro é coisa do passado, da época em que o sol raiava ao fim da madrugada, iluminando-nos rumo ao inexorável crepúsculo de nossos dias. Inexorável? Não mais. Compremos os tickets e sejamos felizes para sempre.
O Brasil e a nova ordem mundial - CRISTIANO ROMERO
Valor Econômico - 26/12
Há muito se fala da decadência do "império americano", hipótese que teria se tornado mais visível neste século graças às consequências da crise financeira de 2007/2008 e à emergência econômica de potências como a China. Sem perder tempo, a intelligentsia americana tem se debruçado sobre o tema não só para compreendê-lo, mas também para indicar caminhos que ajudem os Estados Unidos a manter a hegemonia.
Um desses esforços está sendo empreendido por dois dos principais "think tanks" (numa tradução livre, usinas de ideias, embora centro de influência seja o conceito mais adequado): o Center for a New American Security (CNAS) e o German Marshall Fund of the United States (GMF). As duas entidades criaram projeto, batizado de "Swing States" (Estados decisivos), para examinar como os EUA e seus aliados europeus podem se aproximar de quatro países emergentes para fortalecer a ordem internacional.
Em estudo intitulado "Global Swing States: Brazil, India, Indonesia, Turkey and the Future of Internacional Order", Daniel M. Kliman e Richard Fontaine advogam a tese de que essas quatro nações emergentes têm peso suficiente para influenciar de forma decisiva a trajetória da atual ordem mundial. O que eles sugerem é que o governo americano, bem como seus aliados europeus e asiáticos, coloque esses países no topo das prioridades da política externa.
Entidades sugerem que EUA e aliados deem prioridade ao país
Por que Brasil, Índia, Indonésia e Turquia? A explicação: os quatro possuem uma grande e crescente economia - juntas, somam PIB, medido pelo conceito de paridade do poder de compra (PPP), de quase US$ 8 trilhões -, localização estratégica em suas regiões e compromisso com instituições democráticas. Para Kliman e Fontaine, sua abordagem na ordem mundial é mais fluida e aberta que as da China e Rússia.
"(...) Todos são cada vez mais influentes nos níveis regional e global, e embora desejem mudanças na ordem internacional, não querem desmontá-la", afirmam.
A ordem internacional que os EUA colocaram de pé no pós-guerra enfrenta, de fato, vários desafios. Um deles é a decadência do sistema multilateral de crédito, afetado pelo enfraquecimento de instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (Bird). Outro é a estagnação das negociações comerciais multilaterais. Há também as dúvidas que cercam a emergência da China como potência econômica e política.
Kliman e Fontaine mencionam ainda, como desafios à ordem mundial, as ambições nucleares do Irã e da Coreia do Norte, além da perda de fôlego da democracia em algumas regiões - segundo a Freedom House, o percentual de Estados democráticos caiu de 64% em 2006 para 60% em 2011. Nesse contexto, afetados pela crise, EUA e União Europeia estão sofrendo pressões fiscais e políticas que constrangem sua atuação como principais sustentáculos da ordem global.
Grosso modo, os dois "think tanks" estão propondo ao presidente Barack Obama que atraia para o clube os quatro aliados emergentes, antes que eles tomem decisões que contrariem interesses centrais dos EUA e de seus aliados e, pior, aliem-se a poderes que Washington considera perigosos, pouco confiáveis ou fora de seu controle, casos de Rússia e China.
Kliman e Fontaine definem a ordem mundial por meio de cinco temas: comércio, finanças, questão marítima, proliferação nuclear e direitos humanos. Eles analisam como cada um dos quatro emergentes está lidando com essas questões e recomendam ações concretas de aproximação. É curioso ver como percebem o Brasil, país historicamente amigo dos EUA, mas igualmente relutante a uma aproximação maior, ao contrário do que fazem Índia e Turquia.
O Brasil é visto como uma nação que, nos últimos anos, na esteira de seu relativo sucesso econômico, aprofundou a democracia e reduziu as desigualdades sociais e que, por essas razões, exige reconhecimento internacional. O país aspira a um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU e a um maior peso nas decisões do FMI e do Bird, pleitos que americanos e europeus nunca consideraram seriamente.
No capítulo do comércio, o Brasil é descrito pelos autores como um país que tem trabalhado para desacelerar a liberalização comercial, adotando medidas protecionistas, ainda que dentro das regras da OMC. É lembrada a tentativa de transformar em disputa comercial as políticas adotadas por China e EUA para "artificialmente" desvalorizar suas moedas. Para os brasileiros, um "subsídio às exportações".
Na ordem financeira, o Brasil saiu da posição de recipiente para a de doador líquido de recursos de instituições multilaterais. Tornou-se forte defensor da adoção de controles de capital, tendo obtido sucesso em convencer o FMI a repensar suas recomendações nessa área. O Brasil é lembrado, ainda, por defender o fim da predominância do dólar nas relações comerciais.
Na questão marítima, o país é visto como uma nação que tenta driblar regras internacionais, mas que, ao mesmo tempo, dá contribuições para aumentar a segurança marítima. É signatário da Unclos, convenção da ONU para esse setor, e busca, por meio dela, realizar suas ambições. Uma delas é ampliar, como fez em 2008 de forma malsucedida, a zona de segurança em torno de instalações "offshore" (como plataformas de petróleo).
Na questão nuclear, o Brasil é visto como um ator que, mesmo signatário do TNP (Tratado de Não-Proliferação), defende a soberania, opondo-se a medidas para fortalecer esse acordo. O envolvimento fracassado, juntamente com a Turquia, nas negociações com o Irã em 2010 não é visto como prenúncio de futuras ações nessa área. "Pelo contrário, muitos brasileiros veem hoje esse episódio como um tropeço da política externa", dizem Kliman e Fontaine.
O capítulo de direitos humanos lembra retrocessos do governo Lula (a oposição a resoluções da ONU contra países violadores) e avanços da gestão Dilma, que votou contra os interesses do Irã. A relutância do país em apoiar ações militares contra regimes que cometem atrocidades contra seus cidadãos é lembrada. Aqui, prevalece a ideia da diplomacia brasileira de que direitos humanos não devem ser pretexto para intromissões de caráter geopolítico.
Há muito se fala da decadência do "império americano", hipótese que teria se tornado mais visível neste século graças às consequências da crise financeira de 2007/2008 e à emergência econômica de potências como a China. Sem perder tempo, a intelligentsia americana tem se debruçado sobre o tema não só para compreendê-lo, mas também para indicar caminhos que ajudem os Estados Unidos a manter a hegemonia.
Um desses esforços está sendo empreendido por dois dos principais "think tanks" (numa tradução livre, usinas de ideias, embora centro de influência seja o conceito mais adequado): o Center for a New American Security (CNAS) e o German Marshall Fund of the United States (GMF). As duas entidades criaram projeto, batizado de "Swing States" (Estados decisivos), para examinar como os EUA e seus aliados europeus podem se aproximar de quatro países emergentes para fortalecer a ordem internacional.
Em estudo intitulado "Global Swing States: Brazil, India, Indonesia, Turkey and the Future of Internacional Order", Daniel M. Kliman e Richard Fontaine advogam a tese de que essas quatro nações emergentes têm peso suficiente para influenciar de forma decisiva a trajetória da atual ordem mundial. O que eles sugerem é que o governo americano, bem como seus aliados europeus e asiáticos, coloque esses países no topo das prioridades da política externa.
Entidades sugerem que EUA e aliados deem prioridade ao país
Por que Brasil, Índia, Indonésia e Turquia? A explicação: os quatro possuem uma grande e crescente economia - juntas, somam PIB, medido pelo conceito de paridade do poder de compra (PPP), de quase US$ 8 trilhões -, localização estratégica em suas regiões e compromisso com instituições democráticas. Para Kliman e Fontaine, sua abordagem na ordem mundial é mais fluida e aberta que as da China e Rússia.
"(...) Todos são cada vez mais influentes nos níveis regional e global, e embora desejem mudanças na ordem internacional, não querem desmontá-la", afirmam.
A ordem internacional que os EUA colocaram de pé no pós-guerra enfrenta, de fato, vários desafios. Um deles é a decadência do sistema multilateral de crédito, afetado pelo enfraquecimento de instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (Bird). Outro é a estagnação das negociações comerciais multilaterais. Há também as dúvidas que cercam a emergência da China como potência econômica e política.
Kliman e Fontaine mencionam ainda, como desafios à ordem mundial, as ambições nucleares do Irã e da Coreia do Norte, além da perda de fôlego da democracia em algumas regiões - segundo a Freedom House, o percentual de Estados democráticos caiu de 64% em 2006 para 60% em 2011. Nesse contexto, afetados pela crise, EUA e União Europeia estão sofrendo pressões fiscais e políticas que constrangem sua atuação como principais sustentáculos da ordem global.
Grosso modo, os dois "think tanks" estão propondo ao presidente Barack Obama que atraia para o clube os quatro aliados emergentes, antes que eles tomem decisões que contrariem interesses centrais dos EUA e de seus aliados e, pior, aliem-se a poderes que Washington considera perigosos, pouco confiáveis ou fora de seu controle, casos de Rússia e China.
Kliman e Fontaine definem a ordem mundial por meio de cinco temas: comércio, finanças, questão marítima, proliferação nuclear e direitos humanos. Eles analisam como cada um dos quatro emergentes está lidando com essas questões e recomendam ações concretas de aproximação. É curioso ver como percebem o Brasil, país historicamente amigo dos EUA, mas igualmente relutante a uma aproximação maior, ao contrário do que fazem Índia e Turquia.
O Brasil é visto como uma nação que, nos últimos anos, na esteira de seu relativo sucesso econômico, aprofundou a democracia e reduziu as desigualdades sociais e que, por essas razões, exige reconhecimento internacional. O país aspira a um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU e a um maior peso nas decisões do FMI e do Bird, pleitos que americanos e europeus nunca consideraram seriamente.
No capítulo do comércio, o Brasil é descrito pelos autores como um país que tem trabalhado para desacelerar a liberalização comercial, adotando medidas protecionistas, ainda que dentro das regras da OMC. É lembrada a tentativa de transformar em disputa comercial as políticas adotadas por China e EUA para "artificialmente" desvalorizar suas moedas. Para os brasileiros, um "subsídio às exportações".
Na ordem financeira, o Brasil saiu da posição de recipiente para a de doador líquido de recursos de instituições multilaterais. Tornou-se forte defensor da adoção de controles de capital, tendo obtido sucesso em convencer o FMI a repensar suas recomendações nessa área. O Brasil é lembrado, ainda, por defender o fim da predominância do dólar nas relações comerciais.
Na questão marítima, o país é visto como uma nação que tenta driblar regras internacionais, mas que, ao mesmo tempo, dá contribuições para aumentar a segurança marítima. É signatário da Unclos, convenção da ONU para esse setor, e busca, por meio dela, realizar suas ambições. Uma delas é ampliar, como fez em 2008 de forma malsucedida, a zona de segurança em torno de instalações "offshore" (como plataformas de petróleo).
Na questão nuclear, o Brasil é visto como um ator que, mesmo signatário do TNP (Tratado de Não-Proliferação), defende a soberania, opondo-se a medidas para fortalecer esse acordo. O envolvimento fracassado, juntamente com a Turquia, nas negociações com o Irã em 2010 não é visto como prenúncio de futuras ações nessa área. "Pelo contrário, muitos brasileiros veem hoje esse episódio como um tropeço da política externa", dizem Kliman e Fontaine.
O capítulo de direitos humanos lembra retrocessos do governo Lula (a oposição a resoluções da ONU contra países violadores) e avanços da gestão Dilma, que votou contra os interesses do Irã. A relutância do país em apoiar ações militares contra regimes que cometem atrocidades contra seus cidadãos é lembrada. Aqui, prevalece a ideia da diplomacia brasileira de que direitos humanos não devem ser pretexto para intromissões de caráter geopolítico.
A esperteza da Fazenda - ROLF KUNTZ
O Estado de S.Paulo - 26/12
Ainda há esperteza no Ministério da Fazenda, apesar do fiasco econômico dos últimos dois anos e da colocação do Brasil na corrida global - o último dos Brics e um dos últimos entre os países latino-americanos. O ministro Guido Mantega e sua equipe abstiveram-se espertamente de novas estimativas de crescimento, na edição de dezembro de Economia Brasileira em Perspectiva. Esse boletim, uma das mais engraçadas publicações nacionais, é mais uma tentativa de mostrar a economia no rumo certo, fortalecida por grandes inovações e impulsionada por medidas keynesianas. As reformas são uma piada e o keynesianismo é mais que discutível, porque a grande restrição está obviamente do lado da oferta industrial. Keynes é inocente das tolices de seus "discípulos", assim como Marx, Freud, Adam Smith e Maquiavel.
Ao confrontar oferta e demanda, os autores do boletim concentram a atenção no terceiro trimestre de 2012, dando menos destaque, com muita esperteza, aos dados mais amplos. De janeiro a outubro, o volume de vendas do varejo ampliado - com inclusão de veículos, partes e material de construção - foi 14,5% maior do que o de um ano antes. No mesmo período, a produção geral da indústria diminuiu, apesar do estímulo fiscal concedido a setores importantes, e o investimento encolheu.
A análise do cenário, no discurso oficial, é proporcional ao desempenho da economia. Dos quatro grandes componentes da demanda - consumo privado, gasto geral do governo, investimento privado e exportação -, os dois primeiros continuaram em crescimento. O ministro Guido Mantega chamou a atenção, numa entrevista, para a expansão do consumo familiar e o comparou, em tom triunfal, com os números chineses.
Do lado do investimento privado há um evidente problema de insegurança, reconhecido no último Relatório de Inflação do Banco Central (BC). A linguagem segue o padrão da comunicação tortuosa dos BCs: "Por outro lado, a lenta recuperação da confiança contribuiu para que os investimentos ainda não mostrassem reação aos estímulos introduzidos na economia". Outros fatores podem ter contribuído, mas a desconfiança foi certamente um dos mais importantes.
Um quadro incluído no boletim da Fazenda proporciona algumas indicações ignoradas pelo pessoal do governo. Entre 2002 e os 12 meses terminados em outubro de 2012, o valor importado cresceu 375,6%. O exportado, 307,8%. Não houve maior abertura da economia. Logo, a explicação deve estar em outra variável. A expansão do mercado interno deve ser apenas parte da resposta. Nesse período, a participação de bens importados no consumo interno dobrou e superou 20%.
Quando se comparam os últimos dados com os de 2007, o descompasso entre receita e despesa aumenta muito. Nesse intervalo, o valor das importações aumentou 86,1%, enquanto o das exportações cresceu 53,3%. Entre 2002 e os 12 meses até outubro deste ano, a importação subiu 22% mais que a exportação (diferença proporcional entre 375,6% e 307,8%). Entre 2007 e 2012 essa diferença foi de 61,5%.
Não se trata de efeito da crise. Orgulhosamente, o pessoal da Fazenda menciona um estudo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sobre o efeito da crise nas exportações de emergentes para a zona do euro. Entre o primeiro semestre de 2011 e o primeiro de 2012, o impacto foi de 0,2 ponto porcentual do Produto Interno Bruto (PIB) no Brasil, muito menor do que na China e na Índia (0,5 ponto, nos dois países), na Rússia (0,7) e na África do Sul (0,8).
Os grandes entraves ao crescimento são internos e incluem sérios problemas sistêmicos de competitividade. Menos festivo que a Fazenda quando trata da economia real, o BC projeta para os quatro trimestres até o terceiro de 2013 um crescimento de 3,3% para o PIB e de apenas 1,9% para a indústria de transformação, insuficiente para compensar a contração deste ano (estimada em 2,3%). O investimento deve aumentar apenas 3,1%, depois de uma redução de 3,5% em 2012. Mas isso dependerá, convém acrescentar, de uma gestão pública muito mais competente. Chamar o juro mais baixo e o dólar mais alto de "nova matriz macroeconômica", com inflação distante da meta e contas públicas expansionistas, nem de longe atende a esse requisito.
Desafios dos Brics - MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 26/12
Não está fácil nem para os Brics. Os dirigentes da China deram um sinal de que ficou para trás a era de crescimento em dois dígitos; o Brasil amarga o segundo ano de baixo crescimento; índia e Rússia vão crescer menos; e a África do Sul tem 25% de desemprego. Em níveis diferentes, essas economias enfrentam problemas. O desafio comum é a desaceleração dos países ricos.
Os cinco países — se for incluída a África do Sul — têm problemas diferentes. Mas todos têm. O governo chinês avisou que o país reduzirá o ritmo porque o importante é a "qualidade" do crescimento. Entre os desafios, a China tem um desconcertante: as chamadas "cidades fantasmas" São distritos que tiveram fortes investimentos na construção imobiliária e agora estão vazios. Há residencias, prédios comerciais, rodovias, ferrovias, redes de energia, sistemas de saneamento básico e espaço para lazer. Só falta gente.
Isso e uma contradição em um país populoso, com bolsões de pobreza e com muita gente querendo ir para as cidades. O que explica as cidades vazias?
— A população chinesa não pode se deslocar livremente pelo país. É preciso autorização do governo, um passaporte interno. Sem ele, o cidadão não pode trabalhar, não tem acesso a sistema de saúde. Para o regime, esses bolsões de pobreza são um estoque de mão de obra barata para a indústria e para a construção civil — explica a professora Adriana Abdenur, coordenadora do Centro de Estudos e Pesquisas Brics, ligado à PUC-Rio.
A China quer um crescimento puxado mais por consumo do que por investimento. Lá, a taxa de poupança é muito elevada. A falta de um sistema eficiente de proteção social e previdência pública fortaleceu o hábito cultural de poupar. Já no Brasil, o desafio é aumentar a taxa de poupança.
Como nós, a Rússia é grande exportadora de commodities, mas as suas exportações se concentram em gás natural e petróleo. A Europa é o principal destino dessas exportações. A crise reduziu o consumo e os europeus diversificaram fornecedores, importando gás por navios, e não só pelo gasoduto russo.
Os sul-africanos enfrentam uma taxa grega de desemprego: 25%. A indústria sul- africana tem perdido mercado dentro da África para produtos chineses. Além disso, tem exportado menos minério de ferro por causa da desaceleração da China. Um em cada quatro dólares exportados pela África do Sul vem de lá.
Na índia, o crescimento caiu de 8,2%, em 2011, para 5,3%, este ano, no cálculo do economista indiano Rakesh Vaidyanthan, do Brics Institute. A inflação está acima de 7%. O país tem problemas sérios de abastecimento de energia. Em julho, 50% dos indianos, cerca de 600 milhões de pessoas, ficaram sem luz. A balança comercial tem um déficit de US$ 100 bilhões e as contas públicas, um rombo enorme, de 5,9% do PIB.
— Cerca de 60% da mão de obra indiana está no campo, mas a produtividade agrícola é muito baixa. O país precisa importar alimentos. Há carência de petróleo e carvão, para a matriz energética, e muitos problemas de infraestrutura. O país precisa acelerar o processo de reformas — disse Rakesh.
Rakesh avalia que os Brics precisam agora de aumento de produtividade:
— A montanha do crescimento ficará mais íngreme. Os países chegaram a um novo estágio de desenvolvimento que exige reformas internas. Esse processo é demorado e muito mais difícil.
Os Brics não são um bloco e têm desafios diferentes. Nem integrados estão. Só a China tem forte comércio com todos. Esse é um ponto que poderia ajudar, segundo os especialistas: aumento de comércio entre esses grandes países.
Aeroportos e portos seguros? - JOSEF BARAT
O ESTADÃO - 26/12
Interessante o que acontece em relação aos setores críticos de portos e aeroportos do País. Sabe-se que a ineficiência e os altos custos das operações portuárias reduzem a competitividade das nossas exportações e que os transtornos nos aeroportos tornaram-se rotina para passageiros e cargas. O governo tenta se desvencilhar das amarras ideológicas da era lulopetista, buscando saídas para ampliar as concessões. A meu ver, esse é o sentido dos "pacotes" recentemente lançados pela presidente Dilma para os dois importantes setores. Mas, ao mesmo.tempo, as agências responsáveis pela sua regulação saem do noticiário econômico para ocupar as páginas policiais. Justamente quando mais se precisa delas, repercutem as conseqüências do longo período em que foram submetidas a contínuo descaso e persistente desmoralização.
As agências reguladoras foram concebidas como organizações públicas de Estado, na condição de autarquias especiais, inseridas no quadro da administração pública. No pressuposto original de que representariam uma forma inovadora de gestão pública, deveriam ser independentes e atuar com isenção, gerindo contratos de concessão de serviços públicos que, pela sua longa duração, transcenderiam períodos de governo.
Deveriam, ainda, atuar para prevenir conflitos de interesse e garantir equilíbrio e estabilidade no relacionamento entre as partes envolvidas, mediante credibilidade, competência técnica e imagem pública de isenção.
No entanto, uma vez vinculadas aos ministérios, foram vistas por parlamentares e membros do Executivo pela ótica que sempre marcou a administração pública no País: a do velho patrimonialismo. Tomaram-se, pois, objeto de cobiça e arranjos políticos, ignorando-se a condição de organizações de Estado. A conseqüência óbvia foi a degradação da qualidade técnica, pela interferência política na ocupação de cargos e funções. Ademais, os riscos que ameaçam as agências se ampliaram na medida em que os interesses dos regulados e o aparelhamento partidário - como nos informa o noticiário policial frequentemente caminharam juntos.
Sem autonomia financeira para o livre exercício das suas funções e vítimas das pressões do governo, as agências se tomaram muito vulneráveis e enfraquecidas. E não se pode esquecer de outro fator de vulnerabilidade: a insegurança jurídica gerada pela quebra de regras contratuais ou interferências nas tarifas acordadas, decorrentes de decisões arbitrárias do governo. Se acrescentada a freqüente desqualificação técni ca dos dirigentes, o quadro é muito preocupante para o futuro desses órgãos no Brasil
Em países mais desenvolvidos, a função reguladora baseia-se em modelos institucionais modernos, prevalecendo a competência técnica, a independência decisória, a transparência das ações, a autonomia financeira e, especialmente, o conceito de compartilhar responsabilidades entre governo, sociedade e empresas concessionárias ou parceiras. Num moderno contexto de gestão inteligente de sistemas complexos, cabe às empresas e à sociedade (por meio das suas representações legítimas) ter uma participação mais ativa e aberta no estabelecimento de estratégias e metas para as agências. Com isso, evitam-se os riscos de captura, ampliam-se as bases de prevenção dos conflitos e supera-se a tradicional postura passiva e reativa às imposições do Executivo.
Apesar de inegáveis avanços em poucas agências bem estruturadas, estamos ainda muito longe desse modelo. Prova disso são os recorrentes sobressaltos causados pelas interferências e mudanças nas regras do jogo, sem deixar de mencionar a captura dos agentes políticos e funcionários das agências pelos interesses dos regulados.
Sabe-se que o governo tem uma capacidade de investimento muito limitada e os gargalos nas infraestruturas são gigantescos. Sem entender o papel das agências reguladoras e sem respeitar a sua autonomia, fica difícil levar adiante programas sérios e consistentes de concessões e parcerias.
Interessante o que acontece em relação aos setores críticos de portos e aeroportos do País. Sabe-se que a ineficiência e os altos custos das operações portuárias reduzem a competitividade das nossas exportações e que os transtornos nos aeroportos tornaram-se rotina para passageiros e cargas. O governo tenta se desvencilhar das amarras ideológicas da era lulopetista, buscando saídas para ampliar as concessões. A meu ver, esse é o sentido dos "pacotes" recentemente lançados pela presidente Dilma para os dois importantes setores. Mas, ao mesmo.tempo, as agências responsáveis pela sua regulação saem do noticiário econômico para ocupar as páginas policiais. Justamente quando mais se precisa delas, repercutem as conseqüências do longo período em que foram submetidas a contínuo descaso e persistente desmoralização.
As agências reguladoras foram concebidas como organizações públicas de Estado, na condição de autarquias especiais, inseridas no quadro da administração pública. No pressuposto original de que representariam uma forma inovadora de gestão pública, deveriam ser independentes e atuar com isenção, gerindo contratos de concessão de serviços públicos que, pela sua longa duração, transcenderiam períodos de governo.
Deveriam, ainda, atuar para prevenir conflitos de interesse e garantir equilíbrio e estabilidade no relacionamento entre as partes envolvidas, mediante credibilidade, competência técnica e imagem pública de isenção.
No entanto, uma vez vinculadas aos ministérios, foram vistas por parlamentares e membros do Executivo pela ótica que sempre marcou a administração pública no País: a do velho patrimonialismo. Tomaram-se, pois, objeto de cobiça e arranjos políticos, ignorando-se a condição de organizações de Estado. A conseqüência óbvia foi a degradação da qualidade técnica, pela interferência política na ocupação de cargos e funções. Ademais, os riscos que ameaçam as agências se ampliaram na medida em que os interesses dos regulados e o aparelhamento partidário - como nos informa o noticiário policial frequentemente caminharam juntos.
Sem autonomia financeira para o livre exercício das suas funções e vítimas das pressões do governo, as agências se tomaram muito vulneráveis e enfraquecidas. E não se pode esquecer de outro fator de vulnerabilidade: a insegurança jurídica gerada pela quebra de regras contratuais ou interferências nas tarifas acordadas, decorrentes de decisões arbitrárias do governo. Se acrescentada a freqüente desqualificação técni ca dos dirigentes, o quadro é muito preocupante para o futuro desses órgãos no Brasil
Em países mais desenvolvidos, a função reguladora baseia-se em modelos institucionais modernos, prevalecendo a competência técnica, a independência decisória, a transparência das ações, a autonomia financeira e, especialmente, o conceito de compartilhar responsabilidades entre governo, sociedade e empresas concessionárias ou parceiras. Num moderno contexto de gestão inteligente de sistemas complexos, cabe às empresas e à sociedade (por meio das suas representações legítimas) ter uma participação mais ativa e aberta no estabelecimento de estratégias e metas para as agências. Com isso, evitam-se os riscos de captura, ampliam-se as bases de prevenção dos conflitos e supera-se a tradicional postura passiva e reativa às imposições do Executivo.
Apesar de inegáveis avanços em poucas agências bem estruturadas, estamos ainda muito longe desse modelo. Prova disso são os recorrentes sobressaltos causados pelas interferências e mudanças nas regras do jogo, sem deixar de mencionar a captura dos agentes políticos e funcionários das agências pelos interesses dos regulados.
Sabe-se que o governo tem uma capacidade de investimento muito limitada e os gargalos nas infraestruturas são gigantescos. Sem entender o papel das agências reguladoras e sem respeitar a sua autonomia, fica difícil levar adiante programas sérios e consistentes de concessões e parcerias.
Nosso Maia e a profecia - ZUENIR VENTURA
O GLOBO - 26/12
Nada mais fim do mundo do que o presidente da Câmara dos Deputados —de sobrenome sugestivo —desafiar o STF em defesa de colegas condenados, ameaçando um apocalipse institucional
Sobrevivi ao fim do mundo, ao Natal com todos os excessos e agora estou preparando o fígado para sobreviver ao fim do ano. Enquanto isso, gostaria de ver a cara dos que acreditaram na tal profecia maia, que dava o dia 21 como o do encerramento de nossa passagem por este vale de lágrimas. É impressionante a credulidade das pessoas, a facilidade com que acreditam em qualquer teoria, principalmente se vem envolta num halo místico: milenarismo, adventismo, sebastianismo e até comunismo. Não adianta mostrar que todas as profecias apocalípticas fracassaram — do milenarismo, que previa a volta de Cristo no ano 1000, até o Bug do Milênio, que anunciava o caos eletrônico, passando pela ameaça do cometa Halley em 1910. Esses crentes estão por toda parte. Na China, cerca de mil foram presos acusados de difundir o boato alarmista. A polícia de Pequim teve que divulgar um comunicado de involuntário humor, avisando que "o fim do mundo é um rumor”! Nos EUA, a Nasa precisou reunir cientistas para desmentir na internet a enxurrada de cartas de pessoas em pânico. Algumas das mensagens falavam em suicídio. Um casal queria matar os filhos para que eles não presenciassem o apocalipse, ou seja, que morressem para não ver a morte. Pode?
Na Noruega, um homem fabricou um bote salva-vidas para enfrentar o dilúvio universal. Na França, fanáticos acorreram para um pico de 1.200 metros de altitude, na comuna de Bu-garach, porque ali, segundo a profecia, seriam poupados da tragédia planetária. Para o templo maia Gran Jaguar, na Guatemala, acorreram multidões de estrangeiros. Na Argentina, um usuário anônimo de uma página no Face-book escreveu: "Convidamos a todos os crentes, seres e guerreiros de luz a um suicídio espiritual em massa no morro Uritorco, em Córdoba.” O convite acrescentava: "Abandonemos a nossa carne impura e transportemos nosso espírito através do portal interdimensional às 21h12 minutos de 21/12/12 e dessa forma sejamos o exército de luz que salvará a humanidade.” Se não era uma brincadeira, a iniciativa não teve muito sucesso: o "suicídio mágico” esperava 15 mil seguidores e só teve cerca de 150.
O mais engraçado é que, mesmo desmoralizado, o fim do mundo virou uma metáfora para expressar situações ou atitudes absurdas. Nada mais fim do mundo, por exemplo, do que o presidente da Câmara dos Deputados — de sobrenome sugestivo — desafiar o STF em defesa de colegas condenados, ameaçando um apocalipse institucional, que por enquanto foi evitado.
Nada mais fim do mundo do que o presidente da Câmara dos Deputados —de sobrenome sugestivo —desafiar o STF em defesa de colegas condenados, ameaçando um apocalipse institucional
Sobrevivi ao fim do mundo, ao Natal com todos os excessos e agora estou preparando o fígado para sobreviver ao fim do ano. Enquanto isso, gostaria de ver a cara dos que acreditaram na tal profecia maia, que dava o dia 21 como o do encerramento de nossa passagem por este vale de lágrimas. É impressionante a credulidade das pessoas, a facilidade com que acreditam em qualquer teoria, principalmente se vem envolta num halo místico: milenarismo, adventismo, sebastianismo e até comunismo. Não adianta mostrar que todas as profecias apocalípticas fracassaram — do milenarismo, que previa a volta de Cristo no ano 1000, até o Bug do Milênio, que anunciava o caos eletrônico, passando pela ameaça do cometa Halley em 1910. Esses crentes estão por toda parte. Na China, cerca de mil foram presos acusados de difundir o boato alarmista. A polícia de Pequim teve que divulgar um comunicado de involuntário humor, avisando que "o fim do mundo é um rumor”! Nos EUA, a Nasa precisou reunir cientistas para desmentir na internet a enxurrada de cartas de pessoas em pânico. Algumas das mensagens falavam em suicídio. Um casal queria matar os filhos para que eles não presenciassem o apocalipse, ou seja, que morressem para não ver a morte. Pode?
Na Noruega, um homem fabricou um bote salva-vidas para enfrentar o dilúvio universal. Na França, fanáticos acorreram para um pico de 1.200 metros de altitude, na comuna de Bu-garach, porque ali, segundo a profecia, seriam poupados da tragédia planetária. Para o templo maia Gran Jaguar, na Guatemala, acorreram multidões de estrangeiros. Na Argentina, um usuário anônimo de uma página no Face-book escreveu: "Convidamos a todos os crentes, seres e guerreiros de luz a um suicídio espiritual em massa no morro Uritorco, em Córdoba.” O convite acrescentava: "Abandonemos a nossa carne impura e transportemos nosso espírito através do portal interdimensional às 21h12 minutos de 21/12/12 e dessa forma sejamos o exército de luz que salvará a humanidade.” Se não era uma brincadeira, a iniciativa não teve muito sucesso: o "suicídio mágico” esperava 15 mil seguidores e só teve cerca de 150.
O mais engraçado é que, mesmo desmoralizado, o fim do mundo virou uma metáfora para expressar situações ou atitudes absurdas. Nada mais fim do mundo, por exemplo, do que o presidente da Câmara dos Deputados — de sobrenome sugestivo — desafiar o STF em defesa de colegas condenados, ameaçando um apocalipse institucional, que por enquanto foi evitado.
A política que balança - DENISE ROTHENBURG
CORREIO BRAZILIENSE - 26/12
Analistas das mais variadas matizes passaram 2012 dizendo que o principal desafio de Dilma Rousseff para 2013 era a economia. Nesse campo, ao que tudo indica, ela fez o dever de casa. Em seu pronunciamento de Natal, discorreu sobre todas as medidas adotadas nessa área. Os juros, reforçou, nunca foram tão baixos. Os empregos cresceram, conforme mencionou a presidente coberta de razão. O Brasil que ela pintou tem ainda inflação sob controle, embora este seja um ponto que preocupa os especialistas e os brasileiros de um modo geral, principalmente, aqueles que frequentam os supermercados e vivem estarrecidos com o preço dos alimentos.
Mas, no sentido macro, mesmo os mais estressados, não acreditam que a economia vá desabar ou esteja tão “moribunda” como pintou a revista The Economist, ao pedir a cabeça do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Mas também não está essa maravilha toda que o PT passe 2013 colhendo os louros da vitória. Há um meio-termo aí que põe todos em alerta e é bem possível que fiquemos com o copo pela metade, dando margens à velha teoria do meio cheio, meio vazio.
Feito esse diagnóstico de uma economia bem, mas sem aquele tempero de dar água na boca, há quem diga a presidente terá de se superar na política. As indicações do que vem pela frente, especialmente nos primeiros meses de 2013, não são de dias ensolarados nessa seara. O ano começa com a posse dos prefeitos, evento do qual ela já avisou que não participará. Os novos gestores municipais encontrarão uma situação financeira nada favorável para empreender o que prometeram nas campanhas. Resultado: antes do carnaval, muitos vão desembarcar em Brasília pedindo um auxílio financeiro ao governo federal. Como o Orçamento até agora não saiu, o governo tem a desculpa perfeita para não atender os pedidos dos novos prefeitos no início do ano. Esse será o primeiro caldo de insatisfação.
Passada a largada de janeiro, virá a disputa pela presidência da Câmara e do Senado. E não será surpresa se deputados e senadores desembarcarem por aqui de cabeça quente, por causa da chiadeira dos prefeitos. Entre os senadores, como já mencionamos aqui, parece tudo mais tranquilo, mas entre os deputados o bicho vai pegar com o maior aliado do governo, o PMDB, vivendo uma disputa interna que não se vê desde 2005, quando as duas alas do partido se uniram em apoio ao governo.
Ao que tudo indica, os espaços congressuais de poder estão pequenos para atender a todos. A guerra está tão grande que até o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, já foi acionado para dar uma ajuda nas conversas do partido, no sentido de não deixar que a disputa afete as prioridades do governo na Casa.
Para engrossar esse caldo tem o PSB, um aliado que Dilma precisa cortejar durante todo o ano de 2013 para não dar margens a um afastamento em 2014. Para um recém-chegado à fotografia dos pré-candidatos a presidente da República, os 4% que o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, obteve na última pesquisa do Datafolha foram comemorados com ares de vitória. Afinal, ele não é muito conhecido fora de seu estado. Pode até não ser candidato e apoiar Dilma, como disse em sua mais recente entrevista, publicada pela revista Época. Mas ele deixa bem claro que Dilma precisa ganhar 2013 para ganhar 2014. Para bons entendedores, a porta de saída ficou entreaberta e palavras ditas no cenário de hoje não podem ser levadas ao pé da letra porque o cenário pode mudar. Para que não se altere, Dilma terá de ganhar não só na economia, mas também politicamente em 2013, de forma a não dar motivos para um afastamento de aliados.
E, para deixar o caldo grosso mesmo, não dá para esquecer do PT. Não é preciso ser vidente ou ter uma bola de cristal para afirmar que o partido entra em 2013 com seu maior grupamento, o Construindo um novo Brasil (CNB), bastante estressado. E não sem motivos. Não é todos os dias que uma legenda passa pelo desgosto de ver um de seus maiores líderes, no caso o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, prestes a enfrentar a cadeia. Isso sem contar as tentativas de envolver o ex-presidente Lula nesse enredo.
Se continuar nessa batida do ministro da Secretaria-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, pedindo aos petistas para irem às ruas defenderem Lula, os riscos de ligar ainda mais o PT a escândalos de corrupção aumentam. Daí, caberá a presidente se desdobrar em conversas políticas para compensar uma economia apenas razoável com um boa condução na política, coisa que ela não tem muita paciência para fazer. E, é bom que se diga, nessa seara os adversários externos, em especial o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e os internos, leia-se Eduardo Campos, são pra lá de talentosos.
Por falar em economia…
A notícia do salário mínimo de R$ 678 foi uma forma de Dilma passar o Natal dando ares de felicidade à população, mas não dá para esquecer o efeitos inflacionários que essa medida pode trazer. Para 2013, estão certos aqueles que vislumbram um ano apenas razoável em termos econômicos e preconizam que todo o cuidado é pouco. Vamos acompanhar.
'NÃO EXISTE PRÍNCIPE' - MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 26/12
A atriz Giovanna Ewbank, 26, comenta na revista "Glamour" de janeiro o período que ficou separada do namorado, Bruno Gagliasso, 30, que era apontado como pai do filho da modelo Carol Francischini.
"Ficamos dois meses separados e foi um sofrimento horrível, mas pude colocar várias coisas em perspectiva. Descobri que perfeição não existe, nem príncipe, nem princesa, nem castelo", diz Giovanna à publicação, que chega às bancas nessa sexta-feira.
"Aprendi a ver a vida como ela é e não como um conto de fadas. Tudo ficou mais fácil, mais pé no chão", diz Ewbank, cujo último trabalho na TV foi a sério "Acampamento de Férias", na rede Globo.
CADASTRO NACIONAL
O Ministério da Saúde cadastrará todos os brasileiros diagnosticados com HIV. Médicos e laboratórios que fizerem exames de detecção do vírus serão obrigados a repassar os dados do paciente, em caso de resultado positivo. Atualmente, as informações só são notificadas no caso de o paciente soropositivo desenvolver Aids.
NOSSO SEGREDO
"A informação será sigilosa", diz a epidemiologista Maria Amélia Veras, da Santa Casa de SP. Ela fez parte do grupo que formulou com o ministério a nova diretriz, do qual fizeram parte instituições como a UFBA, a UFMG e a FioCruz.
MUDA TUDO
O intuito do registro é conhecer o perfil dos portadores do HIV para formular políticas públicas que tentem diminuir o contágio pelo vírus. O ministério diz não ter prazo para a inclusão do HIV no sistema de vigilância epidemiológica.
SATYROS SEM LAR
Os teatros da trupe Os Satyros, que deixarão a praça Roosevelt a partir de março, ainda não têm novo bairro definido. "Tínhamos pensado na cracolândia, mas a região já tem um projeto de revitalização estabelecido. Queremos procurar áreas que não o tenham", diz Ivam Cabral, diretor do grupo. Ele agora busca imóveis no Glicério, na Liberdade e na Sé.
TONY TUPINIQUIM
A SP Escola de Teatro terá uma espécie de Tony próprio, a partir de 2013. O prêmio será concedido anualmente a um profissional que tenha se destacado nas artes cênicas. A primeira agraciada é a atriz e educadora Maria Alice Vergueiro, 77.
CORDAS NO QUARTO
O crítico inglês Norman Lebrecht elencou em seu blog aquelas que considera as melhores orquestras do mundo em 2012.
A Osesp ficou em quarto lugar e foi classificada como "a primeira orquestra latino-americana a se globalizar".
TREM DA ALEGRIA
Foi retirado da pauta da Comissão de Relações Exteriores do Senado projeto de Roberto Requião (PMDB-PR) que propõe a validação automática dos diplomas obtidos no exterior. Instituições como Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Capes e CNPq, se mobilizaram para impedir a votação. A proposta voltará a ser debatida no ano que vem em audiência pública.
TREM DA ALEGRIA 2
Estão no centro da polêmica os cursos de pós-graduação oferecidos nos países latino-americanos. "Muitos fazem propaganda na internet, ofertam diplomas e não são reconhecidos nem nos próprios países", critica o diretor de avaliação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Lívio Amaral.
EU VOU PRA NOVA YORK
Quatro filmes do cineasta Eryk Rocha, filho de Glauber Rocha, farão parte do acervo permanente do MoMA, em Nova York. São eles: os longas "Rocha que Voa" e "Transeunte" (2011) e os curtas "Quimera" e "Medula" (2006), feitos em parceria com o artista Tunga.
SORRISO
A atriz Nathalia Dill, 26, que colocou aparelho fixo na semana passada, gargalhou quando perguntada sobre o novo visual. "Não acredito que querem falar disso."
PRÊMIO À PAULISTA
Os artistas Anna Maria Maiolino e Paulo Nazareth estão em exposição do Prêmio Masp de Artes Visuais. A produtora gráfica Tatiana Josefovich e Marcela Caruso estiveram na abertura da mostra, na quinta.
DISQUE M PARA FESTA
O empresário Pedro Braun comemorou seu aniversário na festa Vale By Night, no sábado. Guga Guizelini foi um dos organizadores da balada, no espaço M.
CURTO-CIRCUITO
Expedito Araújo celebra aniversário hoje, no restaurante do hotel Fasano.
O Cine Cult, da Rede Cinemark, será exibido em seis complexos de São Paulo, entre hoje e amanhã.
Zeca Baleiro e Angela Ro Ro abrem temporada de shows de 2013 no Sesc Belenzinho, no dia 4 de janeiro. 18 anos.
A exposição "Denise Milan: Mist of the Earth", da artista brasileira, encerra temporada em Chicago no começo do ano.
A banda americana de indie rock Surfer Blood se apresenta pela primeira vez no Brasil, no dia 17 de janeiro, no HSBC Brasil.
O escritor e antropólogo Luiz Eduardo Soares faz palestra gratuita em 17 de janeiro, às 20h, no CCBB de São Paulo.
Interino - SONIA RACY
O ESTADÃO - 26/12
O fundo dono dos papéis tem apenas um cotista. E este, sabe-se lá por qual razão, não tem interesse em participar das decisões da empresa.
Ar livre
Para que todas as pessoas do mundo pudessem dispor da qualidade devida de uma cidade como Curitiba, seriam necessários 8 planetas Terra. Iguala Nova York,12. E com o padrão de Paris, 15.
O estudo é da americana Rand Corporation. Sai em abril do ano que vem.
Passo a passo
A experiência em Viracopos deu certo. E o Ibama decidiu ter uma base avançada também em Guarulhos para aumentar a fiscalização. O próximo passo do instituto é a criação de bases nos chamados portos secos.
O retorno
Índio da Costa, que foi vice na chapa de Serra em 2010, bateu o martelo: vai disputar a eleição em 2014pelo PSD.
Samba
Quem frequenta a quadra da Mangueira já notou: o presidente Ivo Meirelles tem andado com oito seguranças para cima e para baixo.
Ele não dispensou o reforço nem mesmo no enterro de Delegado, presidente de honra e baluarte da verde e rosa, que morreu mês passado.
Tecno hair
E não falta inventar mais nada. Acaba de ser lançada no Brasil linha de cosméticos capilares com... células-tronco retiradas da maçã verde.
A promessa é combater sinas da idade nas madeixas.
Misteriosa
Cristina Kirchner está como cabelo cada vez mais avermelhado, em tom acaju. A presidente, morena antes da morte do marido Néstor, também exibe plásticas evidentes.
Quantas? Segredo de estado. Nem o nome do médico o governo argentino revela.
Saúde!
Já está funcionando a nova ala do Hospital Oswaldo Cruz, onde foram investidos R$ 240 milhões. Uma torre de 25 andares.
Além da vã filosofia
O mundo não acabou em 2012 e, de olho em 2013, a coluna consultou o xamã Alexandre Meirelles. O xamanismo é uma filosofia que visa ao reencontro do homem com a natureza e seu mundo interior.
•Mudanças em 2013? Estamos assistindo lenta e paulatinamente uma mudança de paradigma. A velha ordem começa a se desmantelar, se debatendo para poder permanecer. O ano de 2013 será certamente o da construção de uma nova ordem, com a mudança dos centros de poder, tanto no que se refere ao ser humano quanto à sociedade. Estamos em tempos de mudança de era.
•O que seria essa nova era? O chacra cardíaco será expandido – o coração responderá muito mais rápido que a mente. Essa inversão privilegiará o despertar da intuição, o sexto sentido.
•Já estaríamos sentindo isso? Olha, nunca se registrou um número tão grande de casos de crise de pânico ou depressão como nos últimos meses. Este é um sinal desta mudança, um período de adequação e reestruturação do corpo. Esta sensibilidade extremada começa a ser apaziguada já no início do ano. As sensações de vazio e falta de perspectiva dão lugar à criatividade e ao direcionamento. A Medicina avança com o reconhecimento e a importância da espiritualidade, entendendo que a doença física provém da desordem psíquica, emocional e espiritual. Descobertas de vacinas ou medicamentos para doenças epidêmicas e endêmicas. Este é um ano de energia de cura.
•E na organização social? A mudança de núcleos de poder “destrona” o que está estabelecido. Caem as máscaras e poderemos assistir outros tantos novos escândalos no Brasil, trazendo à tona a necessidade de transformações e reformas. A tendência é de que haja movimentos sociais importantes e significativos.
•Para melhor?
O retorno ao natural e ao “mais simples”, torna-se imperioso como forma de reestabelecer a saúde individual e social. E conseguir coexistir com o avanço tecnológico conquistado, sem ser engolido por ele. Somos cocriadores de nossas realidades e não meros expectadores. A postura e a ação de cada um como indivíduo ou ser social determinarão o futuro que queremos ter.
Paul McCartney - ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 26/12
Menos propaganda e mais ação
O combate à corrupção, por causa da repercussão do julgamento do mensalão pelo STF, virou uma coqueluche entre os partidos políticos. Eles agora têm a oportunidade de transformar a retórica em realidade. Está tramitando na Câmara proposta do deputado Luiz Couto (PT-PB) de criação de varas específicas nos estados para julgar os crimes de corrupção e de improbidade. O petista diz que o atual sistema, no qual se forma uma lista interminável de processos à espera de um veredito, favorece a prescrição e a impunidade. O tema pode sensibilizar, além dos partidos do governo e da oposição, os novos presidentes da Câmara e do Senado, que assumem em fevereiro.
"O Congresso está conseguindo se comprometer mais ainda. O que torna o Congresso medíocre é uma CPI como a do (contraventor) Cachoeira".
Sérgio Guerra
Presidente do PSDB e deputado federal (PE)
De olho na experiência do Rio
Profissionais de marketing que atuam próximos ao governador Geraldo Alckmin (SP) avaliam que seu grande desafio eleitoral é a segurança. Eles dizem que o tucano pode adotar uma UPP, ao estilo do governo do Rio, com um verniz paulista.
Protagonismo
Pela primeira vez, desde que foi criado, em 1937, o Conselho Nacional de Saúde vai ser presidido por um representante dos usuários do sistema de saúde. Socorro Souza, dirigente da Contag, foi eleita para a função. Sua prioridade será pressionar o governo Dilma para fortalecer o SUS e ampliar os gastos e investimentos em saúde pública.
Todo poder aos Estados
Ele diz que não é candidato ao Planalto, mas o governador Eduardo Campos (PSB-PE) adotou a mesma tese do candidato do PSDB, o senador Aécio Neves (MG): a "desconcentração do poder e das receitas da União" em favor dos Estados.
Fim da lua de mel?
Depois de 10 anos no governo, o movimento sindical dá sinais de impaciência com a gestão petista. As centrais estão organizando uma grande manifestação pública, em Brasília, para março. Querem o fim do Fator Previdenciário e a redução da jornada de trabalho sem redução de salários. Reclamam que a presidente Dilma dá "tratamento VIP aos representantes do capital"
Na sintonia
Por causa do projeto de extinção do 14º e 15º salários, pagos aos parlamentares a título de ajuda de custo, pendente de aprovação pela " Câmara, a senadora Ana Amélia (PP-RS) pediu ao Senado para não depositá-los em sua conta.
No rastro do mensalão
Políticos experientes se divertem cada vez que um petista, como o ministro Gilberto Carvalho, diz-se enganado pelo ministro Luiz Fux. Dizem que esses petistas assumem ser "ingênuos" e apresentam Fux como "independente"
A ALA DO PSD que não quer aliança futura com o PSDB trabalha para que o vice Afif Domingos (SP) seja nomeado ministro do governo Dilma.
Plano B - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 26/12
Diante do impasse na votação do Orçamento 2013, a equipe de Dilma Rousseff estuda desde a semana passada editar uma Medida Provisória liberando R$ 50 bilhões destinados a investimentos no próximo ano. Interlocutores do Planalto afirmam que a verba seria uma autorização de antecipação de orçamento, sob a justificativa de que é preciso manter a economia aquecida nos primeiros meses do terceiro ano do mandato da presidente. A decisão deve sair até sexta-feira.
Déjà vu Técnicos do governo lembram que, sem Orçamento no final de 2005, o ex-presidente Lula editou uma Medida Provisória liberando crédito em 2006 para investimentos retidos, inclusive o das empresas estatais.
Aí, não Peemedebistas têm incentivado Geddel Vieira Lima a disputar a presidência do partido. Eles alegam que o vice-presidente da República, Michel Temer, deverá concorrer novamente e se licenciar. Desta forma, o cargo seria ocupado pelo vice da legenda, Valdir Raupp.
Veja bem Procurado, o vice-presidente da Caixa Econômica Federal afirmou que todo debate é saudável e não descarta a possibilidade. "Começo a pensar sobre a hipótese." A eleição deverá ocorrer em março de 2013.
Apagão Tucanos desistiram de comprar horário na TV para responder à ofensiva publicitária do governo Dilma sobre a redução das tarifas de energia. Para dirigentes do partido, o anunciado reajuste do preço da gasolina em 2013 servirá de antídoto à campanha do Planalto.
A jato A Infraero concluiu a reforma da pista e taxiway em Cuiabá, uma das cidades-sede da Copa 2014, com quase dois meses de antecedência. Agora parte para a terceira e última etapa na capital matogrossense, com a ampliação do terminal de passageiros. O valor total das obras dessa fase é R$ 77,2 milhões.
Nova... Na esteira do que o Diretório Nacional fará em abril, a seção paulista do PSDB fará um Congresso Estadual em maio para rever seu programa, o estatuto e aprovar um Código de Ética.
...roupagem O coordenador-geral da organização do congresso tucano será o deputado Mendes Thame e o secretário-geral será o presidente da Juventude Tucana estadual, Paulo Mathias.
Revisão 1 O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, divulga hoje balanço dos oito anos de gestão. Ele vai dizer que cumpriu 85% das metas que fixou para o governo.
Revisão 2 Kassab apresentará como parcialmente cumpridas obras que foram iniciadas, mas não entregues. "É um critério para auferir as realizações de um governo sem sectarismo", diz.
Base... Em seu projeto de ser candidato a governador em 2014, Kassab projeta ter apoio de algumas categorias estratégicas, como as associações comerciais do Estado, ligadas ao vice-governador Guilherme Afif e ao PSD.
...aliada Kassab também tem influência nos sindicatos da UGT (União Geral dos Trabalhadores), comandada por Ricardo Patah, e nas associações de policiais militares, que conquistou ao colocar coronéis no comando das subprefeituras e lançar o ex-comandante da PM Coronel Camilo candidato a vereador.
Oriente-se Tão logo transmita o cargo a Fernando Haddad, Kassab sai em férias prolongadas. Irá a Istambul, na Turquia, e depois a Abu Dhabi e Dubai, nos Emirados Árabes. Na volta, vai alugar apartamento em Brasília para se revezar entre São Paulo e a capital federal.
Varejo O presidente da Câmara paulistana, José Police Neto (PSD), que articulou uma candidatura a novo mandato, assumirá a presidência da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). Roberto Trípoli (PV) deve ficar com a Comissão de Finanças.
com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI
tiroteio
"É tamanha a afinidade entre Haddad e Kassab que é capaz de virar o ano e o prefeito eleito pedir para o atual continuar."
DO SECRETÁRIO ESTADUAL DE ENERGIA, JOSÉ ANIBAL, sobre a transição na Prefeitura paulistana e o fato de o petista ter mantido auxiliares do prefeito.
contraponto
Guerra de Secessão
Em sessão tumultuada do Congresso que apreciou o veto à distribuição dos royalties, na semana passada, o ex-ministro e deputado Hugo Napoleão (PSC-RJ) dizia que só se lembrava de situação parecida em 1981:
-Foi quando se decidiu dar seis anos de mandato aos prefeitos e vereadores eleitos em 1982.
Em outra rodinha no fundo do plenário, parlamentares indagavam onde estaria o senador José Sarney (PMDB-AP), presidente do Congresso Nacional.
Marcus Pestana (PSDB-MG) arriscou:
-Enquanto Dilma toma vinho em Paris e Sarney habilmente um chá na ABL, a federação sangra no plenário.
Os riscos que Dilma corre para se reeleger - ROSÂNGELA BITTAR
VALOR ECONÔMICO - 26/12
A dois anos de uma eleição o que importa, em matéria de declaração de intenção de voto revelada em pesquisas e índices de popularidade é a situação do "incumbente". É o que dizem os especialistas. Ou seja, vale a situação daquele que está no cargo, com a responsabilidade da tarefa e é candidato à reeleição. Esse é quem precisa estar bem. Se a situação se apresenta instável, a derrocada se avizinha e dá oportunidade para ultrapassagens extemporâneas na disputa.
Portanto, a levar em conta essa perspectiva, as duas últimas pesquisas, do Ibope e do Datafolha, divulgadas na semana passada, registraram que a presidente Dilma Rousseff é mesmo quem está em melhor situação para 2014. Enquanto todos os outros se embolam em um segundo lugar variado, mesmo que um tenha 19%, outro 14%, outro 7%. A esta altura, a diferença entre esses níveis do patamar inferior não tem grande importância.
Quem está mais confortável no cenário é, também, quem enfrenta riscos. Resta avaliar a solidez da popularidade de Dilma e os riscos de sangria na sua hoje excelente situação.
A economia continua sendo, aqui e no mundo, o principal flanco. Se a economia não deslanchar, se não aparecerem os resultados concretos da política que tem o objetivo de estimular investimentos, se o setor privado não superar a crise de desconfiança, surgem os fantasmas de qualquer campanha eleitoral: o desemprego e a queda de renda. Vê-se, sobretudo nesse fim de ano, um esforço brutal de comunicação da presidente com o empresariado, com os investidores, com a sociedade, para transmitir segurança, confiança, regulação e medidas que delineiem um quadro mais favorável aos negócios.
Mas há outros. O cipoal de escândalos de corrupção não atingiu o ex-presidente Lula como não tem atingido a presidente Dilma, cuja popularidade só cresce, mas depois do julgamento do mensalão e seus desdobramentos a impermeabilidade aos focos de irregularidades no governo pode mudar.
No primeiro ano de governo, quando demitiu vários ministros com poucos meses no cargo por causa de denúncias de corrupção, a presidente viu elevar-se seu índice de aceitação, passou a receber elogios públicos de artistas e analistas que lhe atribuíram sucesso com a autoria da faxina governamental.
Porém, segundo avaliações feitas a posteriori, sobretudo depois que se multiplicaram os escândalos de corrupção também no segundo ano de governo, a interpretação de que seus índices de popularidade tinham crescido por causa do combate à corrupção pareceu precipitada. Naquele momento, cortejada até pela oposição por haver se diferenciado do ex-presidente, ela poderia simplesmente estar, ainda, sucedendo a popularidade do seu padrinho político e inventor.
A equação corrupção-governo Lula, com as novas investigações que têm sido pedidas após o julgamento do mensalão, e as novas operações de combate deflagradas pela polícia federal, deixando o ex-presidente tão a descoberto quanto aflito para demonstrar força e liderança que suplantem o desfavor, formam um segmento de forte risco para os planos de Dilma. Que pode perder, nesse caso, onde ganhou no início, permitindo que se desfaça a ideia, cristalizada no início do governo, de que não é igual ao seu antecessor no que toca à mistura do interesse público com o privado. Aqui a presidente terá que caminhar em corda bamba, com atenção onde pisa para chegar ao fim da linha com a imagem preservada.
O eleitorado cansou de mostrar, ao longo de todo o ano de 2012, inclusive depois de iniciado o julgamento do mensalão com o reconhecimento de que houve corrupção, houve dinheiro público envolvido no crime e o governo participou, que não se deixa mobilizar por esse assunto. Gosta de saber que a impunidade não é mais um mal inexorável mas não fica remoendo a desgraça eleitoralmente. Não liga muito para corrupção, mostram as pesquisas, fato sempre enfatizado por analistas que produzem trabalhos para o governo e para o PT. A incongruência desse eleitorado - corrupção pode, punição também - pode também resultar em risco eleitoral. Não se sabe para que lado evoluirá.
Um terceiro risco a destacar é o da gestão do governo nas áreas consideradas essenciais pela população de classe média e mais pobre que precisa dos serviços públicos. A presidente tem falado muito em educação, mas nada em saúde. Mesmo se conseguir deslanchar obras, conquistar os investimentos privados, passar incólume pelas denúncias contra seu padrinho político, de cujo governo foi braço direito, ainda terá sobressaltos se viver mais uma campanha de cenas terríveis em hospitais públicos e privados. A saúde não aconteceu e não há sinais de medidas que a levem a bons resultados em dois anos. O flanco da saúde é também de um risco imenso, e esse, ao contrário da sempre reclamada providência de governo na área de segurança, não dá para empurrar para os governos estaduais e municipais.
Por enquanto, Dilma tem resistido a tudo, é uma governante que tem a simpatia da população e sabe que é preciso manter o clima o tempo todo. Isso é mais importante, no momento, que as intenções de votos nos adversários. Que também não deixaram de ser surpreendentes.
O fato de o ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal e relator do mensalão, julgamento que puniu políticos, banqueiros e funcionários do governo, ter recebido 9% ou 10% das intenções de voto, sem ser político e jamais haver se candidatado a cargos eletivos, tem um significado. Como também tem indicação de rumo o que as pesquisas mostram sobre o governador Eduardo Campos (PSB) e o senador Aécio Neves (PSDB), possíveis candidatos. Na mesma faixa de popularidade do jamais político Joaquim, eles são pouco conhecidos para o tanto que já se expuseram e precisam procurar crescer. A mesma falta de nitidez acomete a candidatura Marina Silva (sem partido). Ela tem mais intenção de votos que seus prováveis adversários mas claramente uma lembrança da campanha anterior. De lá para cá a ex-senadora perdeu o partido, ficou sem mandato e passou os últimos dois anos em esporádicas conferências pelo circuito universitário.
A dois anos de uma eleição o que importa, em matéria de declaração de intenção de voto revelada em pesquisas e índices de popularidade é a situação do "incumbente". É o que dizem os especialistas. Ou seja, vale a situação daquele que está no cargo, com a responsabilidade da tarefa e é candidato à reeleição. Esse é quem precisa estar bem. Se a situação se apresenta instável, a derrocada se avizinha e dá oportunidade para ultrapassagens extemporâneas na disputa.
Portanto, a levar em conta essa perspectiva, as duas últimas pesquisas, do Ibope e do Datafolha, divulgadas na semana passada, registraram que a presidente Dilma Rousseff é mesmo quem está em melhor situação para 2014. Enquanto todos os outros se embolam em um segundo lugar variado, mesmo que um tenha 19%, outro 14%, outro 7%. A esta altura, a diferença entre esses níveis do patamar inferior não tem grande importância.
Quem está mais confortável no cenário é, também, quem enfrenta riscos. Resta avaliar a solidez da popularidade de Dilma e os riscos de sangria na sua hoje excelente situação.
A economia continua sendo, aqui e no mundo, o principal flanco. Se a economia não deslanchar, se não aparecerem os resultados concretos da política que tem o objetivo de estimular investimentos, se o setor privado não superar a crise de desconfiança, surgem os fantasmas de qualquer campanha eleitoral: o desemprego e a queda de renda. Vê-se, sobretudo nesse fim de ano, um esforço brutal de comunicação da presidente com o empresariado, com os investidores, com a sociedade, para transmitir segurança, confiança, regulação e medidas que delineiem um quadro mais favorável aos negócios.
Mas há outros. O cipoal de escândalos de corrupção não atingiu o ex-presidente Lula como não tem atingido a presidente Dilma, cuja popularidade só cresce, mas depois do julgamento do mensalão e seus desdobramentos a impermeabilidade aos focos de irregularidades no governo pode mudar.
No primeiro ano de governo, quando demitiu vários ministros com poucos meses no cargo por causa de denúncias de corrupção, a presidente viu elevar-se seu índice de aceitação, passou a receber elogios públicos de artistas e analistas que lhe atribuíram sucesso com a autoria da faxina governamental.
Porém, segundo avaliações feitas a posteriori, sobretudo depois que se multiplicaram os escândalos de corrupção também no segundo ano de governo, a interpretação de que seus índices de popularidade tinham crescido por causa do combate à corrupção pareceu precipitada. Naquele momento, cortejada até pela oposição por haver se diferenciado do ex-presidente, ela poderia simplesmente estar, ainda, sucedendo a popularidade do seu padrinho político e inventor.
A equação corrupção-governo Lula, com as novas investigações que têm sido pedidas após o julgamento do mensalão, e as novas operações de combate deflagradas pela polícia federal, deixando o ex-presidente tão a descoberto quanto aflito para demonstrar força e liderança que suplantem o desfavor, formam um segmento de forte risco para os planos de Dilma. Que pode perder, nesse caso, onde ganhou no início, permitindo que se desfaça a ideia, cristalizada no início do governo, de que não é igual ao seu antecessor no que toca à mistura do interesse público com o privado. Aqui a presidente terá que caminhar em corda bamba, com atenção onde pisa para chegar ao fim da linha com a imagem preservada.
O eleitorado cansou de mostrar, ao longo de todo o ano de 2012, inclusive depois de iniciado o julgamento do mensalão com o reconhecimento de que houve corrupção, houve dinheiro público envolvido no crime e o governo participou, que não se deixa mobilizar por esse assunto. Gosta de saber que a impunidade não é mais um mal inexorável mas não fica remoendo a desgraça eleitoralmente. Não liga muito para corrupção, mostram as pesquisas, fato sempre enfatizado por analistas que produzem trabalhos para o governo e para o PT. A incongruência desse eleitorado - corrupção pode, punição também - pode também resultar em risco eleitoral. Não se sabe para que lado evoluirá.
Um terceiro risco a destacar é o da gestão do governo nas áreas consideradas essenciais pela população de classe média e mais pobre que precisa dos serviços públicos. A presidente tem falado muito em educação, mas nada em saúde. Mesmo se conseguir deslanchar obras, conquistar os investimentos privados, passar incólume pelas denúncias contra seu padrinho político, de cujo governo foi braço direito, ainda terá sobressaltos se viver mais uma campanha de cenas terríveis em hospitais públicos e privados. A saúde não aconteceu e não há sinais de medidas que a levem a bons resultados em dois anos. O flanco da saúde é também de um risco imenso, e esse, ao contrário da sempre reclamada providência de governo na área de segurança, não dá para empurrar para os governos estaduais e municipais.
Por enquanto, Dilma tem resistido a tudo, é uma governante que tem a simpatia da população e sabe que é preciso manter o clima o tempo todo. Isso é mais importante, no momento, que as intenções de votos nos adversários. Que também não deixaram de ser surpreendentes.
O fato de o ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal e relator do mensalão, julgamento que puniu políticos, banqueiros e funcionários do governo, ter recebido 9% ou 10% das intenções de voto, sem ser político e jamais haver se candidatado a cargos eletivos, tem um significado. Como também tem indicação de rumo o que as pesquisas mostram sobre o governador Eduardo Campos (PSB) e o senador Aécio Neves (PSDB), possíveis candidatos. Na mesma faixa de popularidade do jamais político Joaquim, eles são pouco conhecidos para o tanto que já se expuseram e precisam procurar crescer. A mesma falta de nitidez acomete a candidatura Marina Silva (sem partido). Ela tem mais intenção de votos que seus prováveis adversários mas claramente uma lembrança da campanha anterior. De lá para cá a ex-senadora perdeu o partido, ficou sem mandato e passou os últimos dois anos em esporádicas conferências pelo circuito universitário.
Dilma na segunda metade do mandato - ELIO GASPARI
O GLOBO - 26/12
Na próxima semana a doutora Dilma entrará na segunda metade de seu mandato, e são poucas as pessoas dispostas a dar a volta no quarteirão para aporrinhá-la. Ela deve esse êxito a algumas qualidades pessoais e a dois patronos: Lula e Fernando Henrique Cardoso, com seus dezesseis anos de estabilidade democrática e econômica. Um restabeleceu o valor da moeda, o outro batalhou para reduzir as desigualdades sociais. Sem FHC não haveria Lula e, graças aos dois, o país pode se dar ao luxo de ter uma governante que chega cedo ao trabalho, toca o barco e não se vê obrigada a dar a impressão de que precisa salvar o país. Parece pouco, mas em quase meio século todos os presidentes foram obrigados a dar essa impressão. Uns pretendiam salvá-lo dos perigos da democracia, outros da ruína econômica.
As circunstâncias (percebidas por Lula) deram-lhe a oportunidade. Seu desempenho comprovou a eficácia da ideia, e Dilma vestiu o papel com a naturalidade com que veste seu medonho casaquinho de renda branca. Afastou-se da rotina do Congresso, deixando-o deslizar para um papel perigosamente banal. Mantendo-se longe das tensões provocadas pelo contencioso dos cleptocompanheiros ela foi um fator relevante no engrandecimento do Judiciário. Colocou na surdina a diplomacia de atabaques que herdou. Meteu-se numa estudantada com o Paraguai, mas saiu dela exercitando o silêncio. Resta saber como justificará uma eventual quebra da ordem constitucional na muy amiga y compañera Venezuela.
Há algo de impessoal na doutora. Afora os destemperos que afligem seus ministros, não se deu ao folclore. Resta a imagem da gerentona, que é tudo o que um país precisa. Seus pibinhos, associados à incerteza criada na gerência das concessões de petróleo, energia e transportes mostram que ela terá os próximos dois anos para confirmar a expectativa. Por enquanto, nas áreas de saúde e educação produziu mais do mesmo, um mesmo de baixa qualidade.
Se a doutora Dilma for avaliada pelo que prometeu, os dois primeiros anos de governo foram apenas médios. Para quem ofereceu seis mil creches até 2014 e entregou apenas sete, nem médio foi, mas atire a primeira pedra quem acreditou nessa parolagem da campanha. Dois governos que prometeram realizar dois exames anuais do Enem até hoje não cumpriram a meta. Em vez de discutir o fracasso, saiu-se com uma nova oferenda: o Enem por computador. Para uma ex-ministra de Minas e Energia, é uma humilhação governar um país onde o presidente do Operador Nacional de Sistemas diz que Pindorama tem que aprender a conviver com apagões.
Fica a impressão de que há no Planalto uma gerentona apertando os botões de uma máquina que não funciona. E não adianta dar bronca, porque se acessos de fúria ajudassem os presidentes, o general João Batista Figueiredo teria sido um campeão. Como diria o ministro Aldo Rabelo, quem fazia o certo era o marechal Floriano Peixoto, com seu cigarrinho de palha no canto da boca e o revólver no coldre. Foi a alma de Floriano quem deu à doutora a maior vitória de seus primeiros dois anos: o enquadramento da banca e a queda dos juros.
Seu êxito é simples: pela primeira vez, em décadas, há poucas pessoas no Brasil querendo que a presidente se dane.
As circunstâncias (percebidas por Lula) deram-lhe a oportunidade. Seu desempenho comprovou a eficácia da ideia, e Dilma vestiu o papel com a naturalidade com que veste seu medonho casaquinho de renda branca. Afastou-se da rotina do Congresso, deixando-o deslizar para um papel perigosamente banal. Mantendo-se longe das tensões provocadas pelo contencioso dos cleptocompanheiros ela foi um fator relevante no engrandecimento do Judiciário. Colocou na surdina a diplomacia de atabaques que herdou. Meteu-se numa estudantada com o Paraguai, mas saiu dela exercitando o silêncio. Resta saber como justificará uma eventual quebra da ordem constitucional na muy amiga y compañera Venezuela.
Há algo de impessoal na doutora. Afora os destemperos que afligem seus ministros, não se deu ao folclore. Resta a imagem da gerentona, que é tudo o que um país precisa. Seus pibinhos, associados à incerteza criada na gerência das concessões de petróleo, energia e transportes mostram que ela terá os próximos dois anos para confirmar a expectativa. Por enquanto, nas áreas de saúde e educação produziu mais do mesmo, um mesmo de baixa qualidade.
Se a doutora Dilma for avaliada pelo que prometeu, os dois primeiros anos de governo foram apenas médios. Para quem ofereceu seis mil creches até 2014 e entregou apenas sete, nem médio foi, mas atire a primeira pedra quem acreditou nessa parolagem da campanha. Dois governos que prometeram realizar dois exames anuais do Enem até hoje não cumpriram a meta. Em vez de discutir o fracasso, saiu-se com uma nova oferenda: o Enem por computador. Para uma ex-ministra de Minas e Energia, é uma humilhação governar um país onde o presidente do Operador Nacional de Sistemas diz que Pindorama tem que aprender a conviver com apagões.
Fica a impressão de que há no Planalto uma gerentona apertando os botões de uma máquina que não funciona. E não adianta dar bronca, porque se acessos de fúria ajudassem os presidentes, o general João Batista Figueiredo teria sido um campeão. Como diria o ministro Aldo Rabelo, quem fazia o certo era o marechal Floriano Peixoto, com seu cigarrinho de palha no canto da boca e o revólver no coldre. Foi a alma de Floriano quem deu à doutora a maior vitória de seus primeiros dois anos: o enquadramento da banca e a queda dos juros.
Seu êxito é simples: pela primeira vez, em décadas, há poucas pessoas no Brasil querendo que a presidente se dane.
Concessão e arquitetura de aeroportos - FERNANDO SERAPIÃO
FOLHA DE SP - 26/12
Em Guarulhos, o edital ignorou que já havia um ótimo projeto de ampliação. Ele custou caro, mas será jogado fora e trocado por um que parece rodoviária
Os problemas na concessão dos aeroportos brasileiros foram reconhecidos até mesmo por integrantes do governo. Mas pouco se tem falado na arquitetura dos terminais -e no consequente conforto.
Ainda no governo Lula, a Infraero começou a projetar novos terminais, sempre seguindo as burocráticas e lentas licitações.
Em Guarulhos, a licitação de projeto foi vencida em 2009 por um consórcio de várias empresas projetistas -estrutura, hidráulica, elétrica etc. Eles contavam com os arquitetos da Biselli+Katchborian, um dos poucos escritórios brasileiros habilitados a desenhar aeroportos.
A empresa, liderada por dois sócios na casa dos 50 anos de idade, é uma das mais prestigiadas do país. Já tinha ganho, em 2006, a disputa pelo desenho do terminal de Florianópolis (ainda não construído). Por isso, a vitória na licitação em Guarulhos foi recebida positivamente no meio arquitetônico, que percebeu a oportunidade de construir um terminal interessante.
Após dois anos de labor, o desenho foi apresentado publicamente, sem decepção: em forma de avião, o desenho do terminal 3 não só era original por sua cobertura tecnológica, semelhante aos encontrados em projetos high-tech, como reverberava o modernismo brasileiro.
Ciente da urgência, o grosso da área construída utilizava elementos pré-moldados, deixando a sofisticação para a porção visível. A presidente Dilma se entusiasmou, e o terminal foi detalhado e entregue para a licitação da obra.
Mas eis que a Anac, ao preparar o edital para a concessão, simplesmente desconsiderou o projeto coordenado pela Infraero.
O edital transferiu para o consórcio vencedor, Invepar, a decisão de construir ou não o terminal projetado pela Infraero.
Mais que isso, incentivou o sepultamento do desenho ao diminuir o padrão de conforto da nova construção (do nível máximo, AAA, para C, dentro da nomenclatura de padrão de conforto de aeroportos internacionais). Em outras palavras, a Anac permitiu que a operadora entregasse aos brasileiros um terminal menos confortável.
Sem clareza, a concessionária apresentou algumas imagens do seu projeto, suficientes para atestar a baixa qualidade arquitetônica do desenho importado: quase uma rodoviária que, se construída, perpetuará o desespero e a trapalhada governamental contra o caos aéreo.
É importante lembrar o desperdício: o governo está jogando no lixo um projeto de R$ 22 milhões, pronto para ser construído. A baixa gerencia alegará que o governo arrecadou R$ 16,21 bilhões com a licitação e que, nessa escala, o que foi para o lixo não é nada. Mas como justificar aos eleitores?
A arquitetura deveria ser um item estratégico para o país. Veja a Alemanha: eles aproveitaram a Copa do Mundo em seu país para especializar algumas firmas de projeto em estádios. Resultado? Nos mundiais seguintes, emplacaram 30% dos projetos na África e 41% no Brasil. Além dos honorários, o pacote conta com especificações de produtos alemães, das caríssimas coberturas de lona até cadeiras.
No que se refere aos aeroportos internacionais, a arquitetura como estratégia de Estado tem outro sentido: os terminais são as portas de entradas dos países. O filósofo francês Paul Virilio acredita que eles representam hoje os antigos portais das muralhas das cidades-estados. Se a civilização trocou grossos muros de pedras por edifícios cristalinos, continua o simbolismo da entrada.
Entre dezenas de exemplos, em Londres a precisão inglesa é vista em todos os detalhes, até nos parafusos; em Paris, a graça francesa esta presente nos arcos de concreto da cobertura, caprichosamente abauladas para baixo; e a luz filtrada por pequenas aberturas na Cidade do México lembram-nos da delicadeza e da aspereza mexicana.
No fundo, é fácil impressionar com um prédio mágico quem passou horas dentro de um avião. Além de ser mais factível do que resolver as mazelas do país, perpetuar edifícios simbólicos também eleva a estima nacional. Que o digam Juscelino Kubitschek e Oscar Niemeyer.
Em Guarulhos, o edital ignorou que já havia um ótimo projeto de ampliação. Ele custou caro, mas será jogado fora e trocado por um que parece rodoviária
Os problemas na concessão dos aeroportos brasileiros foram reconhecidos até mesmo por integrantes do governo. Mas pouco se tem falado na arquitetura dos terminais -e no consequente conforto.
Ainda no governo Lula, a Infraero começou a projetar novos terminais, sempre seguindo as burocráticas e lentas licitações.
Em Guarulhos, a licitação de projeto foi vencida em 2009 por um consórcio de várias empresas projetistas -estrutura, hidráulica, elétrica etc. Eles contavam com os arquitetos da Biselli+Katchborian, um dos poucos escritórios brasileiros habilitados a desenhar aeroportos.
A empresa, liderada por dois sócios na casa dos 50 anos de idade, é uma das mais prestigiadas do país. Já tinha ganho, em 2006, a disputa pelo desenho do terminal de Florianópolis (ainda não construído). Por isso, a vitória na licitação em Guarulhos foi recebida positivamente no meio arquitetônico, que percebeu a oportunidade de construir um terminal interessante.
Após dois anos de labor, o desenho foi apresentado publicamente, sem decepção: em forma de avião, o desenho do terminal 3 não só era original por sua cobertura tecnológica, semelhante aos encontrados em projetos high-tech, como reverberava o modernismo brasileiro.
Ciente da urgência, o grosso da área construída utilizava elementos pré-moldados, deixando a sofisticação para a porção visível. A presidente Dilma se entusiasmou, e o terminal foi detalhado e entregue para a licitação da obra.
Mas eis que a Anac, ao preparar o edital para a concessão, simplesmente desconsiderou o projeto coordenado pela Infraero.
O edital transferiu para o consórcio vencedor, Invepar, a decisão de construir ou não o terminal projetado pela Infraero.
Mais que isso, incentivou o sepultamento do desenho ao diminuir o padrão de conforto da nova construção (do nível máximo, AAA, para C, dentro da nomenclatura de padrão de conforto de aeroportos internacionais). Em outras palavras, a Anac permitiu que a operadora entregasse aos brasileiros um terminal menos confortável.
Sem clareza, a concessionária apresentou algumas imagens do seu projeto, suficientes para atestar a baixa qualidade arquitetônica do desenho importado: quase uma rodoviária que, se construída, perpetuará o desespero e a trapalhada governamental contra o caos aéreo.
É importante lembrar o desperdício: o governo está jogando no lixo um projeto de R$ 22 milhões, pronto para ser construído. A baixa gerencia alegará que o governo arrecadou R$ 16,21 bilhões com a licitação e que, nessa escala, o que foi para o lixo não é nada. Mas como justificar aos eleitores?
A arquitetura deveria ser um item estratégico para o país. Veja a Alemanha: eles aproveitaram a Copa do Mundo em seu país para especializar algumas firmas de projeto em estádios. Resultado? Nos mundiais seguintes, emplacaram 30% dos projetos na África e 41% no Brasil. Além dos honorários, o pacote conta com especificações de produtos alemães, das caríssimas coberturas de lona até cadeiras.
No que se refere aos aeroportos internacionais, a arquitetura como estratégia de Estado tem outro sentido: os terminais são as portas de entradas dos países. O filósofo francês Paul Virilio acredita que eles representam hoje os antigos portais das muralhas das cidades-estados. Se a civilização trocou grossos muros de pedras por edifícios cristalinos, continua o simbolismo da entrada.
Entre dezenas de exemplos, em Londres a precisão inglesa é vista em todos os detalhes, até nos parafusos; em Paris, a graça francesa esta presente nos arcos de concreto da cobertura, caprichosamente abauladas para baixo; e a luz filtrada por pequenas aberturas na Cidade do México lembram-nos da delicadeza e da aspereza mexicana.
No fundo, é fácil impressionar com um prédio mágico quem passou horas dentro de um avião. Além de ser mais factível do que resolver as mazelas do país, perpetuar edifícios simbólicos também eleva a estima nacional. Que o digam Juscelino Kubitschek e Oscar Niemeyer.
Brasil e China, inevitável complementaridade - SERGIO AMARAL
O ESTADÃO - 26/12
Por ocasião da Conferência Internacional do Conselho Empresarial Brasil-China, realizada em novembro, o diretor de Integração do Banco Interamericano de Desenvolvimento apresentou os resultados de uma pesquisa sobre as relações entre a Ásia e a América Latina (Shapingthe Future of the Asia and Pacífic-Latin America and the Caribbean Relatíonship, ADB-IDB ACB Institute). Alguns dados desse estudo merecem atenção.
A participação da Ásia no comércio latino-americano mais que dobrou na última década. Por trás dos números está uma complementaridade entre as principais economias. De um lado, China, Japão, Coréia, Vietnã têm expressivo déficit de terras cultiváveis e água. De outro, a nossa região, em particular o Mercosul, apresenta superávit.
Tomemos o caso da relação Brasil-China. Nos últimos anos as exportações brasileiras de soja e de minério de ferro para a China cresceram persistentemente. Em contrapartida, as exportações da China para o Brasil de produtos manufaturados aumentaram. Em resumo, o Brasil exporta para a China cada vez mais commodities e, em termos relativos, cada vez menos manufaturas.
O cenário dos últimos anos suscita duas questões: o padrão de comércio commodity x manufatura é uma tendência ou apenas um momento? Há como escapar ao determinismo da geografia? A resposta à primeira pergunta é que a demanda da Ásia por commodities metálicas e alimentares deve durar pelo menos algumas décadas, enquanto a China completa a transferência de cerca de 300 milhões de pessoas do campo para a cidade. Os novos habitantes das cidades precisarão de moradias (portanto, de minério de ferro para a construção) e de soja e proteína animal para se alimentarem.
Nós, que sempre reclamamos da Europa por não comprar mais produtos agrícolas, não podemos agora nos queixar da China por comprar. Mesmo porque as exportações de commodities incorporam cada vez mais tecnologia na extração do minério, na produção de alimentos e nos transportes.
A questão está em saber se teremos condições de competir com os produtos industriais chineses no seu mercado ou no nosso. A resposta não é simples. Como concorrer com uma economia que, além de mão de obra barata, conta com uma taxa de juros negativa, uma carga fiscal abaixo de 20% do PIB, taxa de poupança superior a 40%, infraestrutura inteiramente modernizada e um sistema educacional mais inclusivo e, em média, de melhor qualidade?
A importação de produtos manufaturados chineses cresce a olhos vistos. Alguns anos atrás, o surto de importações chinesas suscitava reclamações e muito ruído. Hoje as importações continuam a crescer, mas de modo mais silencioso. Para sobreviverem muitas indústrias brasileiras passaram a trazer da China os produtos que antes fabricavam. Emprestam- lhes a marca, a distribuição e a assistência técnica. As empresas foram salvas, mas vários segmentos industriais fecharam a porta da produção para se dedicarem à comercialização. E a nova etapa da desindustrialização. Esse fenômeno não é capturado pelas estatísticas, nem o industrial, por constrangimento, a ele se refere. E não poderá ser contido por normas de defesa comercial, que não consideram a importação defensiva um dano, ainda que leve a indústria a ser desalojada do mercado. A importação é, assim, o analgésico do processo sempre doloroso da reestruturação industrial. Mas claramente não é uma solução, porque no limite acelerará a desindustrialização.
Em alguns casos, as medidas tópicas de proteção podem se justificar, se forem temporárias e com o objetivo de promover o ajustamento. Mas não constituem uma alternativa à necessidade de melhorar as condições de competitividade da economia. Nem a uma política industrial voltada para a reconversão da indústria em direção da valorização de nossos recursos naturais. Ou seja, no caso do intercâmbio com a China, o desafio está em tirar proveito da complementaridade existente para promover uma política de transformação industrial, a começar pelos setores em que somos competitivos, como é o caso, entre outros, do agronegócio.
Em princípio, não haveria obstáculo intransponível para que o Brasil, em vez de café, soja ou carne, pudesse vender mais à China café solúvel, óleo de soja e outros alimentos processados. Algumas empresas pioneiras já indicam o caminho, como a Marfrig e a BR Foods, ao estabelecerem parcerias com empresas chinesas para entrarem na distribuição de seus produtos na China.
Mas seria certamente necessário revisar e focalizar algumas políticas industriais, com o objetivo de dar dimensão a esse processo ainda incipiente:
Investir na tecnologia e inovação voltadas para o processamento de alimentos. Em resumo, desenvolver, numa parceria entre governo e empresas, uma Embrapa da transformação alimentar;
Adotar uma política tributária para a agregação de valor, em vez da situação atual, em que os produtos in natura pagam menos impostos que os industrializados;
Promover a integração das cadeias produtivas do agronegócio em escala regional sul- americana, de modo a aumentar a sua competitividade;
Por fim, levar adiante um processo negociador com a China, em que a disposição do Brasil de manter suas fronteiras abertas para produtos e investimentos chineses tenha como contrapartida a progressiva eliminação de escaladas tarifárias, restrições e licenças para a entrada de produtos e investimentos brasileiros na China.
A complementaridade não pode ser vista necessariamente como um mal ou apenas como um risco para a economia a ser, em vão, contido. Mas, sobretudo, como a oportunidade de uma reconversão produtiva voltada para valorizar e tirar proveito das nossas vantagens comparativas.