Se você estiver lendo esta página, é um sinal de que o mundo não acabou no dia 21 de dezembro. Mas a profecia (Marco) Maia do Juízo Final foi levada a sério pelo Congresso. Nossos representantes da Câmara e do Senado decidiram antecipar o fim dos tempos... de trabalho. Entraram em greve branca e bateram o pezinho, recusando-se a votar qualquer coisa, até mesmo o Orçamento de 2013. Reconheceram que existe um juízo final – do Supremo e da Constituição. Já é um bom presságio.
Não resistiu a uma noite e um dia aquela pantomima toda – de arcas gigantes para a resistência ao STF e calhamaços de 463 páginas com questões essenciais, proteladas e esquecidas ao longo de 12 anos. Alguém deve ter avisado aos congressistas que ainda não é fevereiro, mês de Carnaval e desfiles alegóricos. Tiraram as máscaras. É dezembro, é Natal.
Hora de parar tudo porque faz muito calor, e a preguiça remunerada dos deputados e senadores é mais sagrada que os royalties do petróleo ou os coleguinhas condenados no mensalão. Hora de aproveitar o 14º e 15º salários pagos por nós e usufruir todas as ajudas extras que tornam o Congresso brasileiro um dos mais caros do mundo.
Eu queria decretar recesso de colunas políticas. Sério. Queria aliviar a pressão e apostar na tolerância. Queria escrever uma carta ao Papai Noel, com pedido de educação para todos, pois isso sim é urgente. É inaceitável que quase metade dos adultos brasileiros, de 25 anos ou mais, não tenha concluído o ensino fundamental, como acaba de revelar o IBGE. Educação é o primeiro passo para a cidadania plena e o voto consciente.
Queria também desejar a você, leitor, e a sua família 3.060 votos de paz e felicidade – mas os 3.060 vetos atravessaram minhas boas intenções. O ridículo da situação me obriga a pedir ao Papai Noel no ano que vem um Congresso mais ativo e menos guloso. Um Legislativo que não se desmoralize publicamente.
Os números traduzem a irresponsabilidade infantil do Senado. A gráfica imprimiu 416.700 páginas para compor cédulas que acabaram todas no lixo. Gráfica e marcenaria trabalharam em regime de plantão para construir cenário e o enredo da escola de samba que parou no meio da avenida. As dez urnas estavam enfileiradas, como testemunhas toscas da loucura parlamentar. E nós, como sempre, pagamos toda a encenação.
Pedimos então ao Papai Noel que o Congresso não rasgue contratos estabelecidos – porque fica feio. Que não se apresse a votar apenas para inchar os gastos públicos, abrir vagas sem concurso, aumentar seus próprios salários e reduzir para três dias semanais o expediente em Brasília. Que entenda que quem cassa os direitos políticos de congressistas não é o Supremo Tribunal Federal, mas a conduta equivocada e criminosa de cada deputado ou senador. Uma sociedade que se bateu pela Ficha Limpa rejeita condenados como seus representantes.
Torço para que esteja certa a autora do livro 2012, las profecias del fin del mundo, a jornalista mexicana Laura Castellanos. Ela entrevistou antropólogos e historiadores. O apocalipse em 21 de dezembro não foi, segundo ela, previsto pelos maias. A visão do fim do mundo com a chancela de uma civilização antiga acabou se tornando muito popular. Uma peça de marketing com um benefício concreto: rever valores. Segundo o livro de Castellanos, as profecias maias não se concentram em catástrofes. Elas preveem “o despertar da consciência e o renascimento de uma nova humanidade, mais equitativa”.
Queria acreditar. Talvez, no íntimo, acredite. Nada como olhar a perspectiva do fim como um recomeço. Tenho lido artigos de colegas que, com a chegada da velhice, se tornaram arautos do apocalipse. O pessimismo e a desesperança incomodam. Tenho medo de que os jovens se contaminem. Alguns desistem de ter filhos, porque sonhavam com um mundo melhor. Mas a violência, os massacres, a ignorância, a fome, as guerras, os genocídios – tudo isso sempre existiu. Não é invenção de agora.
Também me irrita a mania de alguns velhos – jornalistas ou não – de achar que o mundo acabará quando eles morrerem. É muito egocentrismo. É fácil achar que o baile é ruim só porque somos barrados nele, por extinção de prazo de validade. Se hoje chegamos aos 90 anos, temos não só o direito, mas a obrigação de sonhar. Pelos filhos, netos e bisnetos.
Como os parlamentares também têm família, sugiro um retiro espiritual ou moral para expurgar os pecados e pensar nas lições do ano que termina. Em 2013, já temos uma notícia boa e uma notícia ruim. José Sarney sai de cena. Renan Calheiros entra em cena. O Senado troca seis por meia dúzia.
Reclame, mas não seja chato. Melhor ser um indignado otimista do que um resignado deprimido. Já escrevi isso aqui antes. Vale repetir antes que o mundo acabe.