sábado, dezembro 22, 2012

Sempre igual - ZUENIR VENTURA

O GLOBO - 22/12


Mais uma vez descumpro a promessa de tirar férias durante o Natal, que costuma cair próximo aos dias em que escrevo ou publico coluna. Calculei mal e aqui estou de novo para me repetir numa época em que também tudo é repetitivo: a rabanada, a canção “Noite Feliz”, os amigos-ocultos, os presentinhos, os engarrafamentos, o movimento das lojas, sem falar no dinheirinho compulsório para os porteiros, o mendigo de estimação, o guardador de carro, os entregadores de jornais, de remédio, de pizza, garis e carteiros. A exemplo dos Natais anteriores, não foi possível cumprir todos os compromissos de fim de ano, já não digo de compras, que minha mulher é quem as faz, mas de atendimento de convites. Parece que todas as noites de autógrafos, todas as exposições, todos os almoços e jantares de confraternização foram deixados para acontecer nesse período. Ter que escolher uns em detrimento de outros é uma das aflições dessa época. Mas o pior do Natal é sua submissão ao consumo, que faz dele “um orçamento”, como já dizia Nelson Rodrigues.

<SW,0>Apesar do desvirtuamento de sentido, porém, a data continua impregnada de simbologia e significados, carregando sonhos, desejos e esperança, tudo do que se precisa. Eu, por exemplo, não consigo deixar de fazer uma viagem nostálgica a um longínquo passado quando ouço o “Noite Feliz”. É como se, ainda coroinha, estivesse ajudando uma missa de meia-noite rezada em latim. A única novidade este ano para mim foi a descoberta que Alice acaba de fazer da diferença entre fantasia e realidade, ou seja, entre um Papai Noel “de mentira” e outro “de verdade”. O curioso é que o de mentira é o que ela vê, pode tocar e que fica parado na esquina fazendo “rou, rou, rou” para as crianças, vestido como se estivesse na Lapônia, com aquele gorro ridículo. O de verdade é justamente o que ela não vê, mas que vai botar seus presentes na árvore de Natal, que é o que afinal lhe interessa. Ela pegou também a mania de encerrar suas explicações com um “entendeu?”. “Esse é de mentira, entendeu?” Precoce, como vocês já perceberam, ela deve achar que o avô, por não saber lidar com o Ipad, tem dificuldade de aprendizado, é um “bobinho”. Ela sabe das coisas.

Comecei repetindo e vou terminar da mesma maneira, desejando para vocês um nada original, mas sincero feliz Natal.

* Algumas críticas ideológicas a Oscar Niemeyer depois de morto revelam, de tão iradas, que no Brasil foi fácil acabar com o comunismo. O difícil é acabar com o anticomunismo.

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