sexta-feira, dezembro 07, 2012

Escândalos não viajam: quando voltar ao Brasil, Lula vai encontrar o caso Rose à espera das explicações que não há - AUGUSTO NUNES

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“O presidente Lula se sentiu esfaqueado pelas costas”, repetiu nesta quinta-feira Paulo Okamoto, tesoureiro particular e amigo íntimo do palanque ambulante que desligou o serviço de som desde a aparição de Rosemary Noronha no noticiário político-policial. Se fosse uma facada de verdade, o ataque teria interrompido rudemente o sono sem culpas que só é permitido aos bebês de colo, coisa que Lula deixou de ser há mais de 60 anos, aos homens justos, estirpe a que jamais pertenceu, ou a pecadores desprovidos do sentimento da vergonha. Mas foi uma facada retórica: Okamoto está querendo dizer que, como sempre, o velho amigo não sabia de nada.

Se não necessita de cuidados médicos, Lula precisa encontrar com urgência explicações que não há ─ o que torna o caso mais aflitivo, talvez até mais perigoso do que o escândalo do mensalão. “Quando não se sabe o que fazer, melhor não fazer nada”, ensinou dom João VI. Quando não sabe o que dizer, o animador de comício mais falante do Brasil encomenda um surto de mudez malandra e sai de cena. Atropelado em 23 de novembro pelas descobertas da Operação Porto Seguro, ordenou a Okamoto que espalhasse a fantasia da faca e caiu fora do palco. Passados 15 dias, ainda não deu um pio sobre a enrascada em que se meteu ao lado de Rose.

Em duas semanas, recuperou a voz duas vezes, mas para falar de coisas sem parentesco com a fábrica de espantos que instalou no escritório paulista da Presidência da República. Em 27 de novembro, apareceu no Rio para uma festa da Pirelli. Depois de receber um prêmio entregue pela atriz Sophia Loren, cumprimentou-se por ter promovido a pobres 28 milhões de miseráveis e avisou que “o Brasil não vai desperdiçar o século XXI como fez com o século XX”. Sobre Rose, nem uma vírgula.

No dia 29, ressurgiu em São Paulo num encontro de catadores de lixo e enfeitou a conversa fiada com cifras ainda mais hiperbólicas. “Muita gente não quer entender por que se levou 40 milhões de pessoas para a classe média, por que se gerou quase 20 milhões de empregos”, queixou-se. “Neste país, as notícias ruins são manchetes, as notícias boas saem pequenininhas”. Sobre os quadrilheiros que nomeou a pedido de Rose, nem um suspiro.

Sumido há sete dias, vai passar os próximos 15 longe do cenário dos crimes. Nesta sexta-feira, embarcou rumo à Alemanha e promete voltar ao Brasil perto do Natal, depois de escalas na França e na Espanha. Antes de decolar ao lado do maridão, Marisa Letícia informou que precisaria “dar uma olhada na agenda”. Pelo visto, conseguiu remarcar as consultas com o dermatologista e as visitas aos netos. Como as duas já não cabem juntas em lugar nenhum, Rose seguirá acampada na casa da filha, em São Paulo.

Lula não precisou esconder-se tão longe no inverno de 2005, quando descobriu que o slêncio e o sumiço poderiam livrá-lo do afogamento no pântano do mensalão. Nesta primavera, a reprise da mágica de picadeiro só serviu para confirmar que é bem menos penoso suportar tempestades entrincheirado no gabinete presidencial. Um ex-presidente não circula por ruas interditadas aos brasileiros comuns, precedido por batedores e escoltado pela multidão de agentes de segurança.

Um ex-presidente também não voa no AeroLula nem dispõe de uma frota de helicópteros. Não emudece impunemente quando lhe dá na telha. Não se enfurna em palácios em situações de alto risco, nem pode escalar algum ministro para lembrar aos jornalistas que o Primeiro Servidor da Pátria tem coisas mais importantes a fazer. Não adia a hora da verdade com a inauguração de quadras prontas, creches inacabadas ou pedras fundamentais.

Pela primeira vez, Lula viu-se em apuros fora do poder. Pela primeira vez, viu-se acossado por acusações e suspeitas amparadas em fatos e documentos. Foi ele quem promoveu Rosemary Noronha a autoridade da República, foi ele quem exigiu que Dilma mantivesse no cargo a vigarista de estimação, foi ele quem presenteou a companheira com 23 passeios internacionais, foi ele quem transformou delinquentes amigos da amiga em diretores de agências reguladoras, foi ele quem confundiu interesses públicos com prazeres privados. Cedo ou tarde, e em direito a ditar as regras da entrevista, terá de tentar provar que não tem culpa no cartório.

Não será fácil, advertem numerosos e-mails enviados por Rosemary Noronha aos parceiros de quadrilha. Num recado sem data a Rubens Vieira, por exemplo, a mulher que se apresentava com “namorada do Lula” orienta o comparsa em campanha por uma diretoria da Agência Nacional de Aviação Civil. “Vou tentar falar com o PR na próxima 3a.feira na sua vinda a São Paulo. Se vc estiver aqui em São Paulo, posso te colocar no Evento de 3a.feira a tarde pelo menos vc cumprimenta só para ele lembrar de vc, aí eu ataco! Bjokas”.

Às 13 horas de 17 de março de 2009, Rubens ficou sabendo que as coisas andavam muito bem: “O PR falou comigo hoje e disse que na terça-feira, quando voltar dos USA, resolve tudo do seu caso e disse que a Mirelle precisa começar a trabalhar logo. Fiquei Feliz!” Filha de Rose, Mirelle não demorou a ganhar um empregão na Anac. Nunca começou a trabalhar. São apenas duas amostras. Há mais, muito mais.

Durante a viagem de 15 dias, o ex-presidente só ouvirá cobranças constrangedoras se Marisa Letícia ainda não concluiu o interrogatório. Mas duas semanas passam rapidamente. E escândalos não viajam, nem ficam menores se os protagonistas resolvem fingir que não conseguem enxergá-los. Quando voltar ao Brasil, Lula encontrará à sua espera o caso Rose. A assombração estará do mesmo tamanho. Ou maior.

Pompadour - Rainha de um Rei - CARLOS HEITOR CONY

FOLHA DE SP - 07/12


Subproduto emocionante da Operação Porto Seguro, surgiu no noticiário nacional uma questão delicada, que envolve vidas particulares de personagens públicos, mas que de certa forma violentam a privacidade a que todos temos direito. Ao longo da história universal tivemos casos idênticos ou análogos, sendo talvez o mais famoso o que ligava cortesãs a um rei pouco antes da revolução francesa. Madame Pompadour (Rainha de um Rei) por um lado, e madame Du Barry por outro, de certa forma influíram perifericamente na revolta do povo contra a monarquia absolutista de Luís 15.

Num polo oposto, a influência do monge Rasputin junto a czarina Romanov também pesou nos antecedentes imediatos da revolução russa. A rainha de Sabá também complicou a história do povo de Israel. E no mundo estritamente oriental, foram várias e formosas as mulheres que exerceram junto a reis, imperadores e sultões um poder que transcendia os limites dos tálamos, que geralmente eram adamascados.

O Brasil não podia ficar fora desta tradição de alcova. Nossos dois imperadores pagaram o tributo da carne, Dom Pedro 1º com diversas damas de sua corte, onde reinava a marquesa de Santos, mas sem direito à exclusividade. O segundo imperador, apesar de sua austeridade, também encontrou uma condessa. Não consta que tenham exercido influência nos negócios de Estado mas não deixa de ser curioso: Dom Pedro 2º com seu manto imperial enfeitado de papos de tucano, reinando absoluto em Petrópolis, cidade de Pedro, e uma vez por mês indo a uma pequena vila próxima, onde morava um cidadão de chapelão e barbas brancas ao lado da condessa de Barral. O povo chamava o dono da vila de "Pedro do Rio". Até hoje se chama assim.

Na república, a tradição continuou. Só para citar alguns casos. Dona Santinha, mulher legítima e carola do presidente Dutra, forçou o fechamento dos cassinos e o rompimento com a União Soviética. Dona Yolanda, mulher do marechal Costa e Silva, é tida como responsável pelo uso obrigatório dos cintos de segurança (medida mais que necessária mas correu a notícia que ela teria comissão dos fabricantes dos tais cintos).

Ademar de Barros tinha uma esposa de grande dignidade, Dona Leonor, mas guardava seus dólares e joias no cofre de um tal "Dr. Raul", que aliás foi roubado por ativistas contra a ditadura de 64. Quanto aos filhos bastardos, a lista é grande e divertida. Os presidentes João Goulart, Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso tiveram a dignidade de reconhecer os filhos fora do tálamo oficial. Paulo Maluf também foi acusado, mas inocentado.

Muitos outros poderiam ser citados, mas a verdade obriga que se considere inofensivos esses casos, que não tiveram influência na administração pública e nos cofres da nação.

O caso atual é diferente. Como candidato presidencial, e graças a uma jogada iníqua do partido contrário, Lula saiu chamuscado quando subornaram com dinheiro a mãe de uma filha bastarda. Evidente que o fato teve consequência na eleição daquele ano. Esperou um novo período para então exercer a presidência por dois mandatos e saiu glorificado, nacional e internacionalmente. E aqui entre nós, o episódio de sua filha Lurian em nada prejudicou o muito de bom que ele fez e deixou para a sua sucessora.

Contudo, o barco de seu incontestável prestígio parece que errou de porto, embora tenha encalhado num Porto dito Seguro. Suas relações íntimas e antigas com uma funcionária do gabinete presidencial em São Paulo, escapam da simples natureza humana e estão sendo julgadas como interferências exorbitantes na máquina do estado.

Nem o ex-presidente nem a funcionária em questão podem apelar para a privacidade a que todos temos direito. Os oito anos de sucesso da gestão Lula tiveram um ramal auxiliar cujas atividades estão sendo investigadas pelos órgãos responsáveis. Por essas e outras, é lícito supor que a corrupção política e administrativa não é mais artesanal, mas organizou-se nas cavernas do centro do poder.

O outro Pelé! - TUTTY VASQUES


O Estado de S.Paulo - 07/12

Na minha juventude de esquerda - ninguém é perfeito! -, aprendi a gostar de Oscar Niemeyer justamente pelo que a ditadura militar mais abominava no arquiteto: suas ideias comunistas.

Ele já vivia no exílio quando comecei a prestar atenção na poesia, na sensualidade e, sobretudo, na modernidade de seus traços eternizados na ousadia futurista de Brasília.

Mas só um bom tempo depois - melhor deixar as datas pra lá -, em uma viagem de férias a Paris, tive a exata dimensão do artista ao visitar uma retrospectiva de sua obra no museu Jeu de Paumme, no Jardin des Tuilleries. Ao final de um documentário exibido em auditório abarrotado de gente, os aplausos calorosos dos franceses me encheram de um orgulho patriótico que o Brasil autoritário praticamente sonegou de minha adolescência.

Até então, creio, só havia sentido algo parecido com os deuses do futebol, ainda que meu encantamento por Pelé torcesse contra certas ideias que, volta e meia, escapava-lhe ao microfone na contramão da minha juventude.

Bobagem! O tempo se encarregou de colocá-los - Pelé e Niemeyer - no ponto mais alto da admiração de todos os brasileiros. Pra sempre!


Mal comparando

Tô enganado, tá cedo ou o brasileiro resolveu economizar neste ano luzinha de Natal na sacada de casa? Capaz de causar desemprego na China!

Sempre cabe mais um

Se a Cúpula do Mercosul realizada nesta sexta-feira em Brasília admitir o ingresso da Bolívia e do Equador entre os membros do bloco econômico, a Grécia vai só esperar a abertura da janela da zona do euro para também pedir transferência.

Dúvida cruel

A denúncia é de José Dirceu: "José Serra foi passear com os netos na Disney!" Será que isso tem alguma coisa a ver com a falência da Tia Augusta, caramba?

Negócio da China

Campanha para estimular o carnaval de rua em São Paulo conta com o lobby de fabricantes de banheiro químico!

Dom Juan

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, não perde o cacoete de conquistador: deu agora para negar malfeitos no "seio da Presidência". Pode?

Fogo no rabo

Estádio onde o Corinthians vai estrear no Mundial de Clubes tem aquecimento no assento. Como se a Fiel precisasse disso!

Veta, Dilma!

O que faz o paulistano que não sai às ruas para pedir o veto da presidente Dilma ao projeto de lei que dá o nome do deputado Freitas Nobre ao Aeroporto de Congonhas? Parece que no Rio a pressão deu certo!


Tudo pra dar certo!

Como se não bastasse a experiência de assistente de palco do Ratinho, Marco Antonio Ricciardelli, o Marquito, levará para a Câmara Municipal de São Paulo o DNA de sobrinho do apresentador Raul Gil. Nem o Tiririca tinha currículo igual quando abraçou a carreira 
política!

Razão e relinchos - MICHEL LAUB

FOLHA DE SP - 07/12


Pensar com liberdade passa por ouvir e aprender com vozes dissonantes


Existe um livro de Schopenhauer chamado "Como Vencer um Debate sem Precisar Ter Razão" (ed. Topbooks). Um dos riscos de escrever uma coluna de jornal hoje, ou de opinar em qualquer instância pública, é o oposto: ser ignorado, quando não perseguido e açoitado num pelourinho de grunhidos, relinchos e cacarejos, a despeito da mais cuidadosa argumentação.

Convencer alguém a mudar de ideia não é algo comum em nosso tempo. Basta uma semana nas redes sociais para perceber: militantes pró e contra aborto, descriminação da maconha, eutanásia, cotas, cabras e sobrenomes Guarani-Kaiowá, a maioria está ali para confirmar certezas prévias ou se irritar com quem diz o contrário.

Uma radicalização que também nasce do meio: para que os palpites sejam ouvidos entre tantas vozes, a tendência é que o adjetivo prevaleça sobre o termo exato, a ênfase sobre a ponderação, as regras generalizantes sobre as nuances que tiram a graça e o colorido das frases e slogans.

Num cenário assim, não é difícil adotar um tom nostálgico ou apocalíptico. Talvez se possa lamentar o fim de uma suposta era de ouro dos debates elevados. Prefiro seguir achando que a humanidade não mudou tanto: apenas passamos a ouvir, graças a uma tecnologia muito mais benéfica que perniciosa, que criou possibilidades infinitas de compartilhamento de informação, as conversas antes restritas a botecos. É um choque descobrir que amigos são tão ignorantes, levianos ou idiotas, claro, mas até isso tem seu lado positivo.

De certa forma, estamos diante de um problema das democracias maduras, que já superaram -ou deviam ter superado- questões graves referentes à liberdade de discurso. Ou seja, não estou falando da lei, que proíbe censura, calúnia, injúria e difamação. Nem da ética, que repele a desonestidade intelectual sem que seu autor precise ir para a cadeia. Estou falando é de etiqueta, a "pequena ética" que em sua face menos elitista propõe tolerar os modos alheios -um caminho para, quem sabe, prestar atenção ao que eles representam.

Isso porque linguagem e tom -que são maneiras de segurar os talheres num debate- nem sempre arruínam as ideias por terem aparência tosca. Dá um pouco de cansaço, por exemplo, quando bikers defendem suas propostas para o trânsito com tamanha agressividade. Ou quando a pecha de "fascista", misturada à teoria política da salmonela, aparece na discussão sobre bisnagas de plástico proibidas em feiras e lanchonetes. Ainda assim, tudo a favor de ciclovias e meios alternativos de transporte, e abaixo aqueles saquinhos tristes de ketchup e mostarda.

Num ensaio de 2005, um nome insuspeito quando o tema é a consequência das palavras -Salman Rushdie, que passou anos escondido por causa de um livro considerado blasfemo pelo Irã- escreveu: "Na Universidade de Cambridge, me ensinaram (...) que não se deve ser grosseiro com a pessoa com quem se discute, mas se pode ser extremamente grosseiro em relação a tudo que ela pensa". Parece uma citação descabida num texto sobre etiqueta. Na verdade, é a lembrança de uma regra ideal em debates: deveria importar o que é dito, e não quem diz. É o que impede um interlocutor de ser desqualificado por gênero, crença, classe ou etnia.

Forçando um pouco a boa-fé, por que não abstrair também o partido em que o interlocutor vota, a empresa jornalística onde trabalha, os amigos que tem? Ou suas deficiências retóricas, sua ingenuidade, sua queda pelo vitimismo, pelo sentimentalismo, pelo insulto? A distinção total entre texto e autor é utópica, e o conteúdo de uma ideia pode ser indistinguível de sua forma, e às vezes tudo se resume mesmo a interesse ou tolice, mas o esforço para enxergar um pouco além disso é sempre virtuoso. Pensar com liberdade, o melhor atalho para identificar o lado certo numa disputa, passa por ouvir e aprender com vozes dissonantes. Mesmo que o timbre delas seja mais frequente em zoológicos, penitenciárias e hospícios.

Meus ícones - PAULO SANT’ANA

ZERO HORA - 07/12


O idealizador do fumódromo do prédio aqui da RBS deve ter sido o Albert Speer, o arquiteto de Hitler.

A temperatura ambiente do fumódromo é de 60°C. Se se colocar um frango cru ali dentro do fumódromo, em 20 minutos ele estará assado.

Eu compreendo o ódio que se devota atualmente aos fumantes, mas é demais obrigar-nos a frigir dentro de uma sala durante o consumo de um cigarro, não havendo a mínima chance de estabelecimento de qualquer diálogo em tais senegalescas condições.

Há uma câmera dirigida para a porta do fumódromo, onde está escrita uma imperial observação: “Conserve a porta fechada”.

Se a porta permanecer fechada, torram todos os fumantes lá dentro.

Quem foi o arquiteto, quem é o engenheiro, quem é responsável pela barbárie?

Estou reclamando porque deram meu nome ao fumódromo. Sinto-me representante dos grelhados.

Quando quero ler sobre alacridades frívolas, leio o Fabrício Carpinejar. Quando quero ler sobre a privacidade dos faraós, leio David Coimbra.

Quando quero ler sobre a severidade dos governantes antigos, tipo Borges de Medeiros e Flores da Cunha, leio J. A. Pinheiro Machado.

Quando quero ler qualquer ataque às esquerdas, leio Percival Puggina. E, se quero ler prescrições éticas à imprensa, dou de olhos no que escreve o excelente Marcos Rolim.

Se quero ler sobre dosimetria das penas, prefiro o Cláudio Brito. E, se quero me deliciar com a análise das idiossincrasias dos detentores do poder, leio Paulo Brossard.

Se quero saber como andam as coisas na política estadual e municipal, recorro a Rosane de Oliveira, não me esquecendo nunca do Nílson Souza, da Bela Hammes, do Kadão Chaves, do Flávio Tavares e do Roger Lerina.

Esse é o caleidoscópio semanal em que mergulho no meu jornal, além, é claro, das lúcidas intervenções do Moisés Mendes e do Luiz Antônio Araujo, sempre nos atraindo para aspectos inéditos do cotidiano.

Não deixo de parar por minutos para ler as notas atraentes do nosso Tulio Milman.

No esporte, vou de Diogo Olivier, Zini Pires e Ruy Carlos Ostermann. Sendo assim, é grande o meu espectro jornalístico. Leio todos com sofreguidão e análise crítica, crendo que eles também me leem, não são bruxos para escapar.

O Verissimo e o Wianey, nos últimos dias, me deixaram na mão, recolheram-se a hospitais, onde eu deveria estar e teimo em resistir aos veementes chamados nosocomiais.

Não sei se os leitores estão notando, a minha represália continua em curso: como ninguém me cita, cito todos.

O jornal é uma cachaça e as colunas são pontos de atrativo. Eu, por exemplo, antes de ser colunista, era grande leitor de colunas. Ainda jovem me apaixonei pelos colunistas Nélson Rodrigues e Stanislaw Ponte Preta, parece-me que da Última Hora.

Eu era operário, mas não sei de onde eu conseguia tirar dinheiro para comprar todos os dias a minha Última Hora na banca de revistas da Praça da Alfândega. Era um dever socioíntimo que eu tinha.

Recém deixado de ser menino, filava de meus parentes a revista O Cruzeiro, na qual lia avidamente o texto mais brilhante que já conheci em toda a minha vida: David Nasser.

Eram duas páginas que erigiam ou derrubavam um governo.

Antes, pois, de ser jornalista, fui insistente leitor e antes de ser radialista eu era frequentador de programas de auditório, como o célebre Rádio Sequência de todos os meios-dias, na Rádio Farroupilha da Rua Siqueira Campos.

Eu até acho estranho que me tenha tornado produtor, porque na verdade eu sou intrinsecamente um grande consumidor de imprensa.

Fantasmas de Trotski em Coyoacán - MILTON HATOUM


O Estado de S.Paulo - 07/12


Coyoacán é um dos bairros mais vibrantes da Cidade do México. Há meio século, ele era apenas um pueblo, como tantos outros nos arredores da capital: Mixcoac, Tacubaya, San Ángel e Tlalpan, quase todos com seus conventos, igrejas, praças, ruínas pré-hispânicas. Octavio Paz assinalou que "incontáveis edifícios históricos em todo o México foram demolidos ou desonrados pela barbárie, incúria e avidez do lucro". Apesar disso, ainda há fortes vestígios do passado em Coyoacán: igrejas coloniais esplêndidas, casas "solariegas", ruas e becos arborizados e pequenas praças que são lugares de calmaria e prazer visual numa das maiores cidades do mundo, e talvez a mais fascinante desta América.

Andava por Coyoacán quando vi uma placa singela: Museo Trotski. Ao contrário do museu Frida Kahlo - a mais festejada artista mexicana do século 20 -, não havia fila para comprar ingressos. Por curiosidade histórica, entrei no museu quase vazio e comecei a observar fotografias da época em que Trotski viveu em Coyoacán.

Perseguido por Stalin, Leon Trotski chegou ao México em janeiro de 1937. Diego Rivera e Frida Kahlo lhe deram abrigo na "Casa Azul" da Rua Londres, no coração de Coyoacán. Morou nessa casa até maio de 1939, quando se mudou para o número 19 da Rua Viena. Dizem que ele e Frida tiveram um caso amoroso, embora a artista tenha pintado o rosto de Stalin num de seus quadros. Nem sempre a ideologia destrói amizades e namoros. O certo é que em 20 de agosto de 1940 Trotski foi golpeado mortalmente pelo catalão Ramón Mercader, cujos codinomes eram Jacques Mornard e Frank Jacson.

Há filmes e romances sobre essa história de traições, intrigas, calúnias e perseguições que envolveram o covarde assassinato de Trotski. Às vezes, grandes assassinatos políticos passam pela sedução. Durante uma reunião política em Paris, Ramón seduziu a norte-americana Sylvia Agelott, que viria a ser a secretária de Trotski na cidade do México. Depois, Ramón se aproximou da família do exilado e dos guardas que protegiam a casa da Rua Viena.

Enquanto visitava essa casa, cujo interior é modestíssimo, pensava nas razões que levaram Trotski a confiar em seu assassino. O ex-comandante do Exército Vermelho podia ser tudo, menos ingênuo. Certamente foi um dos mais hábeis e corajosos líderes comunistas, e não seria inexato dizer que foi um cruel e implacável no comando militar. No exílio imposto por Stalin, Trotski refugiou-se na Turquia, França e Noruega antes de se exilar na capital mexicana. Na noite de 24 de maio de 1940, um grupo de stalinistas chefiado pelo artista David Siqueiros invadiu a casa da Rua Viena e metralhou o quarto onde Leon e Natasha dormiam. Ambos escaparam desse atentado, planejado por Ramón.

Por precaução, a metade da janela do quarto do casal foi tapada com alvenaria; a porta, agora blindada, estreitou-se. De uma torre erguida no quintal, vigias controlavam o movimento nos arredores da casa e a entrada de visitantes. A água escura do Rio Churubusco ainda corria a poucos metros da Rua Viena. No pacato pueblo de Coyoacán, a vida do exilado tornou-se uma prisão domiciliar.

O guia da visita era um jovem mexicano simpático e falastrão. Alternava o nome de Stalin com "o criminoso"; falava com a segurança de quem havia lido os três volumes da excelente biografia de Trotski, escrita por Isaac Deutscher. Visitamos a cozinha, a sala, a biblioteca e o jardim, onde o casal Trotski cuidava de uma horta e criava coelhos. Também no jardim o revolucionário banido foi enterrado. Vi a torre dos vigias coberta de musgo e imaginei que na tarde do dia 20 de agosto de 1940 Jacques Mornard , parado na Rua Viena, acenara para os guardas. Desta vez, Mornard ou Mercader não visitaria sua namorada, e sim Trotski. Queria mostrar ao exilado um artigo político. Fluente em várias línguas, e pretenso estudioso de política internacional numa época em que a Espanha e quase toda a Europa estavam em chamas, o assassino persuadira sua vítima a ler ou revisar um ensaio.

No final da tarde nublada entramos no escritório, onde Trotski começara a ler o texto de Mornard. Nesse momento o guia, indignado, apontou o exato lugar onde o assassino erguera a pequena picareta de alpinista e golpeara por trás a cabeça da vítima. Seis horas em ponto. Esse momento da visita coincidia com o do assassinato. Da janela do escritório avistava-se a lápide de cimento, cercada de cactos e arbustos. Escurecia.

Eu disse ao guia que Trotski, ferido mortalmente, apontara para o algoz e balbuciara em espanhol: "Não o matem... Ele deve falar...".

O guia, ansioso, imediatamente me corrigiu. Trotski disse: "Não o matem... Esse homem tem uma história para contar".

Essa última versão me parece mais plausível. A história - trama política - e a voz estão implicadas na mesma frase agônica: uma história para contar.

Formam-se opiniões - DAVID COIMBRA

ZERO HORA - 07/12


Outro dia um sujeito me perguntou:

– Que tal isso de ser formador de opinião?

Fiquei pensando. Formador de opinião. Uma função, um cargo. Poderia abrir uma empresa para essa atividade específica. Algo moderno, com nome em inglês: Formed Opinion S.A. Ou: Cia da Opinião. “Formam-se opiniões”, diria o meu anúncio. “Você está sem assunto? Não sabe o que pensar sobre economia, política, futebol? Nós temos uma opinião pronta para você.

Por um preço módico, você levará para casa uma opinião ponderada ou polêmica, engraçada ou dura, a opinião que mais combine com você, junto com toda a argumentação para defendê-la. Procure-nos! E faça sucesso social”.

Claro que poucos procurariam a empresa para adquirir opiniões sobre futebol. Todo mundo acha que entende de futebol. Mesmo assim, para os que quisessem ter opiniões exclusivas, nossos especialistas forneceriam algumas sobre novos jogadores africanos que estão atuando na Europa. Qualquer um que fale de novos jogadores africanos que estão atuando na Europa parece entender muito.

Na economia é mais fácil formar uma opinião. A economia passa a impressão de ser uma ciência, de que tudo nessa área é técnico, matemático, resultado de estudos profundos e inacessíveis. Nós, da Formed Opinion, sabemos que não. Sabemos que, ao contrário, tudo é vago em economia, tudo é especulação e que tudo muda, às vezes inesperadamente.

Sabemos mais: sabemos que Lulu Santos estava certo: a vida vem em ondas, como o mar. Assim, as crises se sucedem. Está tudo bem com uma economia? Não por muito tempo. Logo sobrevirá uma crise que a abalará. Portanto, em economia você deve fazer alertas: diga que o país está bem, mas que é preciso ter cuidado, que não se pode gastar tanto, que a bolha vai furar. Funciona.

Agora, complicado mesmo é a política. Claro, você sempre pode resmungar que todos os políticos são corruptos. Ninguém vai reclamar dessa opinião, embora nós, da Formed Opinion, saibamos que não é verdade, que os políticos são corruptos na medida da corrupção da sociedade. O problema, na política, são certos personagens. Lula, por exemplo. Lula é um carismático e, como todo carismático, ou é amado ou odiado. Quer dizer: não é possível tecer considerações racionais acerca de Lula.

Ou ele é todo ruim ou todo bom. Só que nós, no recôndito do relacionamento com nossos clientes, podemos dizer a verdade: que Lula tem predicados e defeitos, como qualquer um, e que seu governo os teve ambos, predicados e defeitos. Mas nosso conselho é que você não opine diretamente sobre Lula. Apenas faça observações espirituosas em cima da opinião de alguém. Como fazer observações espirituosas? Desculpe, vamos ter que refazer o orçamento. Ter opinião é fácil, fazer observação espirituosa custa muito mais.

De volta ao futuro - ANCELMO GOIS


O GLOBO - 07/12

Absolvido no processo do mensalão, o publicitário Duda Mendonça não perdeu tempo. A sua nova agência é uma das 20 que, ontem, apresentaram proposta à Petrobras Distribuidora.
Em jogo, uma conta de R$ 80 milhões.

Reunião de trabalho
Um encontro reservado reuniu ontem Zé Dirceu e Nelson Jobim, em Brasília.

Namoro na igreja
O desembargador André Emílio Ribeiro Von Melentovych, da 7ª Câmara Cível do Rio, negou pedido de indenização feito por um cidadão em ação contra a Associação Brasileira d’A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias.
O autor alega que era da igreja e se recusou a casar com uma fiel. A partir daí, diz, começou a ser discriminado e humilhado pelos bispos.

Os Niemeyer
A família Niemeyer prepara há algum tempo um grande encontro em Indaiatuba, SP.
Depois, a ideia é fazer outro em Hanover, na Alemanha, berço dos Niemeyer.

Joaquim no Planalto...
Os funcionários do Palácio do Planalto aproveitaram a presença do ministro Joaquim Barbosa no palácio, no velório de Oscar Niemeyer, para fotos e paparicos com o presidente do STF.

No mais...
A ideia de Noca da Portela de lançar um samba em homenagem a Joaquim Barbosa no réveillon do Feitiço Mineiro esbarra no fato de o templo da esquerda festiva de Brasília ser uma sucursal do PT.
Ali, Dirceu é Deus, e Joaquim, diabo. 

Vacina 100% nacional
Acaba de ser testada com sucesso em 360 crianças entre 1 e 9 anos uma vacina contra meningite. Foi desenvolvida pela Bio-Manguinhos, da Fiocruz.
O estudo comprovou a capacidade protetora e a segurança da vacina. É que indivíduos de qualquer idade podem ter meningite C, mas crianças e adolescentes são os mais vulneráveis, com risco de sequelas e, como se sabe, até morte.

Sobrou para o Nordeste
A crise fez cair o número de turistas europeus no Nordeste, na comparação entre os dez primeiros meses de 2011 e os de 2012.O aeroporto de Salvador teve queda de 22,3%. O de Fortaleza, 17,4%.
Isso é grave. Até porque, graças em grande parte aos voos da TAP, a região lucra muito com a vinda de turistas de lá.

Mas...
Por causa do Galeão-Tom Jobim, no Rio (crescimento de 17,7%), o Brasil, no cômputo geral, teve aumento de 7% no número de turistas europeus.
Os dados são da Embratur, que analisou informações da Polícia Federal.

Henfil, 25 anos
O Bloco do Barbas, que sai em Botafogo, no Rio, vai homenagear Henfil (1944-1988) em 2013. É que fará 25 anos que o irmão de Betinho morreu.
As camisas terão o mesmo desenho que Henfil fez para o Barbas no carnaval de 1985: uma imagem estilizada do “Manequinho”, o menino mijão da famosa estátua do bairro.

Reage, Flamengo
A fase não parece mesmo boa para o querido Flamengo.
Acredite. Ontem, pela terceira vez em menos de um mês, bandidos roubaram a loja oficial do clube na quadra 308 Sul, no Plano Piloto, em Brasília. O preju chega a R$ 15 mil.

Tragédia do crack
O casseta Hélio de La Peña estará na comissão de frente de um ato que a ONG Respeito é Bom e Eu Gosto vai promover segunda agora contra a internação compulsória de menores usuários de drogas como o crack, no IFCS, no Largo de São Francisco, Centro do Rio.

Funk do rato
Uma turma da pesada tem ocupado a área externa do bar de samba e choro Beco do Rato, na Rua Joaquim Silva, na Lapa, no Rio, e feito ali, sem consentimento, bailes funks nos fins de semana, quando a casa não abre.
Nas convocações para os bailes, o pessoal chega a usar o nome do bar, que não tem nada com isso.

Cena carioca
Segunda, por volta de 18h, parceira da coluna caminhava pelo Centro, em frente à Livraria da Travessa, quando, de repente, alguém veio por trás, tapou os olhos dela e fez aquela brincadeira: “Adivinha quem é?!”
Ela arriscou vários nomes e não acertou, até que o próprio respondeu: “É o mendigo!” E era mesmo. Um pedinte maluquinho que sempre zanza por ali. Ela saiu correndo.

DE FAZER CAIR O QUEIXO
Taís Araújo, a linda mulher de Lázaro Ramos, deixa marmanjos boquiabertos, repare, ao desfilar no evento Beauty Shaker Awards, iniciativa da L’Oréal que reconhece projetos inovadores de seus colaboradores. Benza Deus (com todo o respeito)

A ETERNA RAINHA DO RÁDIO
Marlene, a querida cantora, recebe, com o filho Sérgio, um diploma do MIS por seus 90 anos, levado pela vice do museu, Rachel Valença. Merece 

Ponto Final
São muitos os legados que o arquiteto do Brasil deixou para a humanidade. Destes, a coluna, enlutada, escolheu uma frase que vale como reflexão para muita gente: “O homem, sendo tão pequenino perante o Universo, deveria ser mais modesto.”

Ideologia de Niemeyer foi mero detalhe - BARBARA GANCIA

FOLHA DE SP - 07/12


Glorificar a pobreza é coisa nossa, vide Sebastião Salgado e Portinari. Deixemos Niemeyer com sua utopia


Na época em que a Zélia confis­cou o troco que eu tinha no banco, mão na frente e outra atrás, fui morar em Milão com um tio que marcou para mim uma en­trevista de emprego na Mondadori.

Andei um bocado para chegar ao local combinado e, quando me dei conta, estava diante de um minipa­lácio Alvorada. Ao final da entre­vista, o editor veio com um pedido inesperado. "Já que é brasileira, mande um recado ao Niemeyer, o arquiteto que projetou este edifí­cio."

Muito solicita, eu logo me prontifiquei. "Niemeyer? Chapi­nha meu, xá comigo, ligo assim que chegar, me dá logo esse emprego aí, dottore!" O sujeito me encarou e mandou ver. "Diga a ele que é uma tortura viver neste ambiente. Que a luz que vem lá do forro bate dire­tamente na nuca, que a corrente de ar é insuportável e que termica­mente isto é um inferno."

Duvido que tenha sido Oscar Nie­meyer o responsável direto pela minha, digamos, não obtenção da vaga de redatora da revista "Pano­rama". Mas parece ser recorrente a reclamação de que ambientes cria­dos pelo mestre tapuia transmitem a mesma sensação térmica de quem veste jeans e/ou camisas La­coste: no inverno dão frio e, no ve­rão, calor.

Ao contrário do editor que fez a entrevista comigo, sempre fui re­tumbantemente feliz dentro, fora e ao redor das obras de Niemeyer. Verti lágrimas ao me encontrar, pela primeira vez, fincada em solo desta nossa Mãe Gentil, na entrada da praça dos Três Poderes, em Bra­sília, diante da simbologia proposta e da beleza extraterreste daquele concreto todo.

Minha querida Oca, que eu escala­va na infância pela escada de servi­ço externa, a marquise, que tantas vezes me viu ralar joelhos em tom­bos de bicicleta, e o prédio da Bie­nal, que eu invariavelmente me en­contro fotografando em vez de olhar para as obras que contém, são edifícios que eu encaro como uma extensão da minha própria casa.

Nasci nas imediações do Ibira­puera e hoje vivo a poucas quadras do portão oito. Ainda me deslum­bro com esse privilégio.

Minha amiga Ciça casou seu filho na catedral de Brasília. Sei que o ateu Niemeyer não concordaria, mas me agrada a ideia de que Jesus já deva ter rezado muito pai-nos­so incógnito por ali, só para usu­fruir do brilho do sol entrando pe­los vitrais azul e turquesa no fim da tarde.

Na idade dele -e sendo monumen­tal-, Niemeyer tinha todo o direito de achar o que fosse sem ser ques­tionado. Ninguém terá dúvida de que o fazia por lealdade a ideais os mais puros, oriundos de tempos em que ainda não se havia consta­tado que a alma humana, por ques­tões meramente evolutivas, é mo­vida a competitividade e a busca do individualismo. Ademais, glorifi­car a pobreza como forma é uma nossa tradição, vide Sebastião Sal­gado e Portinari. Por que Niemeyer haveria de se despir de sua utopia?

A lamentar, somente o fato de que isso o tenha impedido de perceber que o discurso que opõe Capital a Mão de Obra foi suplantado há muito pelo consenso de que a luta certa e justa não é mais aquela entre o patronato e operários, mas a que se trava entre a informação versus a mão invisível do Mercado. Pena ele não ter se dado conta de que o que conta agora são a vigilância constante pela regulamentação do sistema econômico e a viabilização legal da sustentabili­dade.

FLÁVIA OLIVEIRA - NEGÓCIOS & CIA

O GLOBO - 07/12


De férias
É na Disney (EUA) que Neymar vai passar as férias com a família. O craque vai ajudar a engordar os gastos dos brasileiros em viagens internacionais. Até outubro, foram US$ 18,4 bi, diz o BC.

Deflação
O dólar já subiu 12% desde o início do ano. Ainda assim, aparelhos eletrônicos, com componentes importados, apresentam deflação em 12 meses no IPC-Br: celular (-1,78%), televisor (-9,92%) e DVD player (-6,98%). É obra da forte concorrência e da evolução tecnológica. André Braz, da FGV, diz que, com o dólar baixo, valeriam menos.

Inflação
O custo da cesta de material elétrico subiu 4,87% em outubro, após três quedas seguidas. Passou a R$ 1.736,34, diz pesquisa Simerj /Fecomércio-RJ.

Copa 2014
Foi de R$ 100 milhões o investimento da OAS Arenas em tecnologia no novo estádio do Grêmio (RS). Há 400 refletores de iluminação e irrigação eletrônica do gramado. Inaugura amanhã.

Jogos 2016
Sustentech, GMP, SBP e Lumens venceram licitação para construir os centros de tênis e esportes aquáticos dos Jogos 2016. As empresas vão desenvolver projetos de arquitetura e engenharia. O complexo de tênis receberá R$ 10,2 milhões do governo. O outro, R$ 8,3 milhões.

A ORDEM É FAZER O PATRIMÔNIO MUNICIPAL RENDER
Governo Paes cria Subsecretaria de Projetos Estratégicos e PPPs para cuidar de imóveis e pequenas concessões

Será do lado das receitas o acerto fiscal do início do segundo mandato de Eduardo Paes na Prefeitura do Rio. O pacote de renegociação de dívidas dos contribuintes com a Fazenda municipal, já na Câmara de Vereadores, foi o ponto de partida. Esta semana, saiu outra medida. Jorge Arraes, presidente da Cdurp, a empresa responsável projeto do Porto Maravilha, assumiu a Subsecretaria de Projetos Estratégicos e PPPs, subordinada à Casa Civil. No cargo, continuará cuidando da Cdurp e assumirá a Superintendência de Patrimônio do Município. Concessões de pequeno e médio portes, caso da Marina da Glória, do Engenhão e dos 13 cemitérios municipais administrados pela Santa Casa, estarão também sob o guarda-chuva de Arraes, conta o secretário Pedro Paulo Carvalho, da Casa Civil de Paes: “A missão de Arraes será analisar o patrimônio fundiário da prefeitura e fazer bons negócios. Não é só vender. Ele vai pensar em operações estruturadas para, por exemplo, agregar valor aos terrenos”. Arraes já sabe que a prefeitura é dona de cem mil matrículas de imóveis. A primeira tarefa será saber o quanto disso está disponível para venda, locação ou parcerias com o setor privado.
R$ 127,7 MILHÕES
Serão as receitas da Prefeitura do Rio com patrimônio imobiliário em 2012. A renda é basicamente de aluguéis. Em 2010, bateu recorde de R$174,9 milhões, com a venda de terrenos na Barra e na Tijuca.

PELO TELEFONE
Rodrigo Lombardi estreia hoje como garoto-propaganda da TIM. O ator estrela a campanha de Natal do plano pós-pago Liberty, criação da Neogama/BBH. No filme, o Theo de “Salve Jorge”, novela das 21h da TV Globo, embarca no “Trem Azul” da operadora e convida os espectadores a aderirem ao plano de telefonia celular.

Livre Mercado
A engenheira Ruth Soares Alves assume dia 13 a presidência da Aben. É a 2ª mulher no cargo.

A AgeRio, agência de fomento, estreia site hoje.

O Empório Farinha Pura é revendedor exclusivo no Rio dos panetones Havanna. Quer vender 500 até o natal. A marca argentina é famosa pelo Alfajor.

A Mercatto lança e-commerce hoje. Investiu R$1 milhão. Deverá ser a principal loja em dois anos.

É do Sebrae a análise sobre empregos gerados por micro e pequenas empresas em outubro.

Varejo
A Leader abre loja de 1.100 metros quadrados, em Angra dos Reis, hoje. É a estreia na Costa Verde fluminense. Amanhã, a rede inaugura unidade em Duque de Caxias. Será 74ª do país. O aporte total é de R$ 12 milhões. A meta é chegar ao fim de 2013 com mais de cem filiais.

Qualificação
São microempresas nove em dez estabelecimentos dos 18 polos comerciais do Rio. É grande a demanda por capacitação em atendimento ao cliente (66,5%), vendas (57,5%) e marketing (55%). Os dados saíram de censo feito por Fecomércio-RJ, Sebrae/RJ, SindRio, ACRJ, BB e prefeitura.

CHICO
É da Loja Comunicação a campanha da revista “piaui , que chega hoje às bancas. A reportagem de capa é sobre a transposição do Rio São Francisco. Será veiculada em cinema, rádio e impressos. o Natal. A marca argentina é famosa pelo alfajor.

ANO NOVO SOLIDÁRIO
O MetrôRio começa a vender cartões especiais para o réveillon nesta segunda. Vêm estampados com paisagens do Rio. A concessionária colocará 143 mil cartões à venda, 1.500 mais que em 2011. Este ano, o Rio Como Vamos vai receber parte da receita arrecadada.

SEM VIOLÊNCIA
O Instituto Avon e o Observatório das Favelas iniciam projeto contra a violência doméstica, na semana que vem. O Rio em Rede promoverá atividades culturais, oficinas, shows e sessões do cinema itinerante Cine Tela Brasil em cinco favelas do Rio. Começa na quarta, pelo Complexo da Penha. Depois, passa por Cidade de Deus, Rocinha, Maré e Jardim Gramacho. A ação deve atingir 300 mil pessoas em seis meses.

Cerveja
Devassa by Playboy é o especial de verão da cervejaria. A cerveja será lançada ainda este mês, no Rio e em São Paulo, em lata de 269 ml e garrafa long neck de 275 ml. O licenciamento foi negociado diretamente noescritório da “Playboy”, nos
EUA. O rótulo exibe umapin-up, ícone da marca.

É chocolate
Chega hoje a 160 lojas da rede Pão de Açúcar chocolates Casino em embalagem especial. Vêm da França, como o controlador da varejista. A encomenda foi de oito mil unidades. A previsão é que o lote esteja esgotado até o fim do mês.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO


FOLHA DE SP - 07/12

Agências fazem um acordo na área de gás natural
A ANP (Agência Nacional do Petróleo) e a estadual Arsesp (de distribuição de gás canalizado, saneamento e energia elétrica em São Paulo) assinaram um convênio de cooperação.

O objetivo é desenvolver estudos e atividades para regulamentar o transporte, a distribuição e a comercialização do gás natural.

O acordo não envolve recursos, "mas haverá intenso intercâmbio técnico para melhorar a regulação do gás, onde há muito para ser feito", segundo Silvia Calou, presidente da Arsesp.

Para Calou, os pontos mais importantes a serem tratados pelas duas agências referem-se ao biogás, ao transporte do gás e à realização de um leilão de compra pelas distribuidoras para o Estado em 2014, com entrega em 2019.

"Estamos estruturando o leilão, inspirados no que existe para energia." O contrato da Comgás, por exemplo, está fechado até 2019 com a empresa de gás boliviana.

"Há um agente dominante em toda a cadeia do gás que é a Petrobras. Para que esse mercado tenha mais dinamismo, precisamos tratar da transparência e da clara separação dos elos da cadeia."

Apenas a Petrobras fornece gás hoje. "Mas temos perspectivas de outros ofertantes com o pré-sal, onde temos outros investidores produzindo, como a BP, a Shell e a OGX."

"No continente, também a Petra e a Orteng já estão prestes a produzir." Uma maior oferta, porém, viria apenas no fim da década. "Por isso, queremos o leilão."

Trás-os-montes
O grupo Synergy, dos empresários José e German Efromovich, apresenta hoje ao governo português uma proposta para adquirir a TAP.

O grupo, que controla a Avianca Brasil, foi o único candidato com acesso ao "data room" para participar da privatização da companhia aérea portuguesa.

"Se nada mudar até amanhã [ hoje], nossa proposta final será entregue", disse ontem José Efromovich.

Cerca de 50 pessoas da Avianca Brasil estiveram em Portugal para analisar dados financeiros e legais da TAP.

Do grupo que fez a "due dilligence", participaram altos executivos da companhia, dentre eles o diretor-geral (que voltou ontem ao país) e o CFO, além de auditores da PricewaterhouseCoopers, advogados do Linklaters e especialistas da consultoria Oliver Wyman.

"A próxima fase será de dar esclarecimentos sobre a proposta até que o governo decida", afirmou Efromovich, que não revela valores nem o banco que participará da operação.

Insegurança Tropical
A falta de segurança no Brasil foi apontada como uma das maiores preocupações de multinacionais que pretendem enviar funcionários ao país, conforme estudo realizado pela Ernst & Young.

Das 520 companhias pesquisadas, 24% disseram temer a violência no Brasil. O pior resultado foi o do continente africano, apontado por 40% delas. Rússia, com 17%, Índia, com 8%, e China, com 7%, foram os outros países citados no levantamento.

Impostos (19%), imigração (18%), benefícios (16%), moradia e escolas (13%) também foram citados.

O estudo, no entanto, revelou que, em 2013, os funcionários enviados aos mercados emergentes aumentarão 27%. Neste ano, o crescimento foi de 16% ante 2011.

DOAÇÃO TRANSPARENTE
Projetos de educação e meio ambiente são os que mais recebem atenção de filantropos no Brasil, de acordo com Heiko Specking, chefe global da área de filantropia do Credit Suisse.

"O que falta [no país para aumentar as doações] é mais transparência da possibilidade de ajudar", afirma.

Specking está no Brasil para participar hoje do Philantropy Summit, encontro no qual o banco mostrará aos clientes de gestão de fortunas como apoiar projetos.

Janine Händel, CEO da Fundação Federer, do tenista Roger Federer, também estará no evento. Ela diz que, por enquanto, não há planos para a entidade atuar no Brasil. Hoje a fundação apoia projetos de educação e esportes na África. "Não faremos expansão geográfica nos próximos dois anos."

Vida e previdência... 
A Icatu Seguros abrirá sua primeira filial em Belém. Com a unidade, a empresa terá inaugurado sete novas filiais em 2012. Ao todo, serão 22 no país.

...no Pará 
A meta é elevar a penetração no ramo de seguros de vida, previdência e capitalização. Nas regiões Norte e Nordeste, a expectativa é crescer 30% em 2013 ante o ano anterior.

Incentivo 
A Pertra, especializada em viagens de incentivos e congressos, formou o grupo P2Com, após fusão com a Privia, empresa do setor. As marcas serão mantidas.

Macarronada... 
O consumo de massa seca está presente em 88% dos lares brasileiros, de acordo com a Abima (associação de indústrias de massas alimentícias). A maior concentração é nas regiões Norte e Nordeste.

...regional 
A participação do macarrão instantâneo é de 33% do total, com consumo concentrado nas regiões Centro-Oeste e Sul (39% e 32%, respectivamente).

Fresca 
Apenas 10% das casas pesquisadas consomem a massa fresca. O destaque fica para o Sul e o Sudeste, cada uma com cerca de 15%.

'Do Mel às Cinzas' - FERNANDO GABEIRA


O ESTADÃO - 07/12


Esse é o título de uma obra do antropólogo francês Claude Lévi-Strauss, um ensaio de grande alcance intelectual. Não deveria estrear abrindo um texto como este. Mas ele me parece muito mais forte do que o título de um romance. Além do mais, contar de forma romanesca o que se passa na cena política brasileira nos levaria à banalidade do "a madame saiu às 5 horas".

O mel - com seu duplo sentido para os ameríndios, alimento e sexo, daí a expressão lua de mel - é um ponto de partida mais rico para chegarmos às cinzas de um projeto que se intitulava de transformação, no princípio do século. O mel como sexo não é o tema aqui. Com o tempo, aprendi que a química humana é irredutível a um esquema lógico. Pessoas se aproximam e se afastam de forma surpreendente e, em vez de pensar em algum controle mental desse processo, é melhor deixar que se desenrole com suas inevitáveis surpresas.

Também não interessa aqui a questão quem está dando para quem. Interessa saber o que está sendo dado. O ex-senador Gilberto Miranda quer duas ilhas, uma onde construiu uma casa e outra onde pretende construir um porto particular.

De ilha em ilha, os senadores acabam ocupando um arquipélago. Lembro-me da discussão pública que tive com o então senador Ney Suassuna, que queria ocupar uma ilha na Estação Ecológica de Tamoios, em Angra dos Reis (RJ). De modo geral, eles compram um barraco ou qualquer instalação modesta de um eventual morador da ilha e, em seguida, reivindicam seu pleno uso, como se fossem, realmente, os donos.

Concordo com o poeta quando diz que nenhum homem é uma ilha. Mas acrescento: nenhum homem deveria ter uma ilha. Entregar uma ilha é mais concreto do que a corrupção que desvia recursos. Não se trata de dinheiro, mas de um pedaço do território nacional.

O homem-chave desse processo, Paulo Vieira, disse numa ligação interceptada que as coisas seriam facilitadas por um funcionário desde que se colocasse "mel na chupeta". O mel ressurge aí não exatamente como alimento, mas com seu poder de sedução. Ele é a forma enganadora de tornar suportável o conteúdo da mamadeira. Nas cinzas de uma promessa de renovação, instala-se uma difusa certeza de que a vida só é tragável com a chupeta empapada de mel. E que só tem sentido participar do governo para enriquecer.

Como na canção de Chico Buarque, aparece uma mulher que diz sim por uma coisa à toa, uma noitada boa, um cinema, um botequim. Uma cirurgia, um emprego, um cruzeiro com Bruno e Marrone.

Não se pode reduzir a análise à trajetória da secretária Rosemary Nóvoa de Noronha. O nome de Paulo Vieira foi rejeitado pelo Senado, mas o governo decidiu forçar a barra, tanto do ponto vista político como regimental. Ao tomar uma decisão dessa ordem, o governo não sabia por quem estava atropelando o Congresso Nacional? Será que, no convívio com Rosemary, Lula nunca questionou: mas quem é esse cara que foi rejeitado pelo Congresso, por que vale a pena insistir nele?

A manobra para garantir o cargo a Paulo Vieira a qualquer custo contou com o apoio de senadores. Romero Jucá articulou e agora diz que nem se lembra do caso. Magno Malta fez um recurso para tornar viável a nova escolha de Vieira. Se lhe perguntarem, dificilmente dirá alguma coisa. José Sarney, então, é uma esfinge.

Acreditar que todo esse processo tenha tido como dínamo apenas o poder de sedução feminino bloqueia outros caminhos para conhecer o que se passou. Um governo não atropela o Congresso para impor uma indicação se não a considerar de grande importância estratégica. Vendo por outro ângulo, um governo não deixa de reexaminar uma indicação quando ela é rejeitada pelo Senado.

Os franceses aconselham a procurar a mulher ("cherchez la femme") nesses casos intrincados. Mas aqui talvez valha a pena distanciar-se dela e olhar para a montanha de cinzas que o projeto de renovação nos legou.

O governo e alguns senadores foram cúmplices objetivos de uma quadrilha em formação. Eles estavam negociando ilhas, patrimônio físico do Brasil. A entrega, por meio da chupeta melada, de uma parte do território nacional é algo muito grave para se reduzir a um folhetim, apesar da beleza dos versos de Chico Buarque.

O Congresso parece que não tem condições de investigar. Talvez nem queira. Mas um dia isso cai nas mãos de um setor independente da Justiça. E de novo todos ficarão angustiados com a palavra dosimetria, pensando no remédio amargo depois de anos de "mel na chupeta".

Da minha parte, afirmo apenas que objetivamente a quadrilha imposta pelo governo ao Congresso estava negociando uma parte do Brasil. Dose dupla.

Não adianta insinuar que o coração tem razões que a própria razão desconhece. Quando começam a levar nossas ilhas, é preciso dizer basta.

A quadrilha que negociava ilhas é apenas uma irrupção na montanha de cinzas. É preciso dinheiro para manter a máquina partidária, garantir eleições, pagar marqueteiros. É preciso dinheiro para se manter no poder. Só assim se faz dinheiro. Para continuar no poder.

Do mel às cinzas, vão-se desfazendo os mitos políticos. A apuração e a publicidade do episódio vão ajudar a compreender melhor a atmosfera de um governo de coalizão de partidos e algumas facções, como a que opera no Porto de Santos.

Não sei o que sairá disso. Mas é preciso, pelo menos, salvar as ilhas dos piratas. O governo foi na direção certa quando mandou examinar todos os outros processos que passaram pelo grupo. Mas não respondeu a uma pergunta que deveria ter sido dirigida ao próprio governo: como foi possível fazer essa indicação, atropelar o Congresso por ela e não monitorar uma escolha tão polêmica?

No mínimo, foi um delírio autoritário. É difícil pensar que sejam tão inocentes as pessoas que dirigem o Brasil hoje. Muitas têm uma longa trajetória. Quando vão encarar a realidade de uma vez por todas, sem tergiversar?

Uma reforma política desnecessária EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 07/12


Câmara deve tentar aprovar mudanças profundas na regulamentação de eleições e vida partidária, mas poucos ajustes já seriam reconfortantes



Influenciados, como teria de ser, pelo momento político de liberalização, mas condicionados por uma visão ideológica de mundo em seu ocaso histórico, os constituintes de 1987 redigiram uma Carta, promulgada no ano seguinte, já ultrapassada em vários aspectos. Foi sensata a decisão, tomada à época, de prever uma revisão constitucional para cinco anos depois. Não houve, porém, muitas alterações.

Apenas no início da gestão de FH, o governo, com capital político acumulado, conseguiu extirpar da Constituição parte do ranço estatista herdado de um mundo em que havia o Muro de Berlim, demolido no ano seguinte ao da promulgação da Carta. A quebra de monopólios, a abertura de espaço para privatizações e o controle das finanças públicas permitido pela Lei de Responsabilidade Fiscal deram base jurídica para a estabilização conseguida pelo Plano Real. Aquele longo ciclo de avanços dá hoje sinais de esgotamento, o que requer nova etapa de reformas, queiram os poderosos de turno ou não.

No campo político-partidário, destaca-se, em termos de aperfeiçoamentos de arcabouços legais, a reeleição depois de dois mandatos consecutivos de quatro anos, e a definição de uma cláusula de barreira ou desempenho, para acabar com a excessiva pulverização partidária. Mais por erro técnico na aprovação da regra — teria de ser por emenda constitucional e não via projeto de lei ordinária — do que por outras alegações, a cláusula terminou derrubada no Supremo. Já a norma de dois mandatos consecutivos é a dose certa para haver rotatividade no poder, sem o desgaste de mandatos longos ou curtos demais.

Nunca saiu de pauta uma reforma política ambiciosa, com mudanças no sistema eleitoral, no mecanismo de financiamento de campanhas etc. As propostas, porém, não têm conseguido o consenso mínimo para permitir alterações de dispositivos protegidos, acertadamente, por salvaguardas constitucionais. No momento, o presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), tenta votar projetos relatados por Henrique Fontana (PT-RS). Repete-se o equívoco de se buscar grandes alterações, quando as normas que regem a vida de políticos e partidos não requerem ajustes revolucionários. Acabar com a excrescência das coligações em eleições proporcionais, com a figura biônica do senador suplente sem voto já será um aperfeiçoamento reconfortante. E se pelo menos uma emenda para o fechamento do leque da quantidade de legendas for novamente colocada em discussão, melhor ainda mais. A vida política nacional não necessita de ajustes heroicos.

Ácido acetilsalicílico - SONIA RACY


O ESTADÃO  - 07/12

Emocionado, Paulo Niemeyer Filho revelou ontem, à coluna, faceta pouco conhecida do tio Oscar: o destemido arquiteto, revolucionário e comunista, era... hipocondríaco.

Tanto que, por anos, seu médico e irmão, Paulo Niemeyer, o tratou com meia aspirina. E após a morte de Paulo pai, Paulo filho assumiu a função, dando continuidade ao “tratamento”. “Dava certo, por que mudar?”, diverte-se.

Ácido acetil 2
Niemeyer lembra também do dia em que o arquiteto ligou para seu pai do carro (sim, já havia celular) e reclamou que estava vendo coisas estanhas. O médico mandou estacionar imediatamente. In loco, Dr. Paulo diagnosticou: uma questão de óculos sujos.

Ácido 3
E o coração? “Mesmo sabendo que ele viveu bem e muito, estou triste, sim. Principalmente porque, com ele, vai-se uma época de valores e educação. Foi um privilégio ter convivido com Oscar”, finalizou.

Luto
Chico Buarque ficou tão chateado com a morte de seu ídolo Niemeyer, anteontem, que desistiu de sair para jantar com a namorada, Thais Gulin. Preferiu ficar em casa.

Confusão
Se Dilma souber, ficará uma arara: os presidentes de estatais federais só foram convocados para o lançamento do programa dos portos na... quarta à tarde. Os privados receberam o convite na segunda.

Confusão 2
Inúmeras coroas de flores, em homenagem a Niemeyer, começaram a chegar ao Palácio do Planalto ontem, tão logo terminou a solenidade dos portos, no salão nobre.

Precisaram ser guardadas no salão oeste até que o local fosse preparado para o velório.

In loco
Graça Foster, da Petrobrás, visitou, quarta-feira, o estaleiro Atlântico Sul. À la Dilma, explicou que não vai admitir atrasos na entrega de encomendas da estatal...

Pingos nos is
Fabio Lepique, do Comitê Paulista da Copa, esclarece ao São Paulo: o apoio da Ambev para a construção das arquibancadas temporárias do Itaquerão é para o Mundial–não para o Corinthians.

E mais: após o evento, a estrutura será desmontada.

Bola ‘fuera’
Não haverá amistoso entre Espanha e Brasil antes da Copa das Confederações. Palavra de Ángel Maria Villar, da federação espanhola de futebol, ao Estado. “Não há espaço no calendário”.

Por vias tortas
Segredo de polichinelo: quem quer mesmo que Julio Delgado assuma a presidência da Câmara, ano que vem, é o... PT.
O PSD e o PSB, não.

Na boca do gol?
Quem vê a briga, no TSE, do suplente do PSB Marcelinho Carioca pela vaga de Chalita na Câmara,lembra que o ex-jogador já viveu história inversa.

Abriu mão da vaga em 2011, alegando compromissos profissionais.

Na boca 2
E mesmo que o tribunal negue o pedido, Marcelinho pode, sim, se tornar deputado federal. Basta Chalita virar ministro – o que vai acontecer no começo de 2013.

Duelo sonoro
Avenida Paulista, ontem. De um lado, sindicato dos bancários e carro de som contra demissões. De outro, performer vestido de Elvis Presley aumentava o alto-falante.

Música? It’s Now or Never.

Ueba! Niemeyer foi abduzido! - JOSÉ SIMÃO

FOLHA DE SP - 07/12


O Niemeyer era visionário! Desenhou o Congresso com dois penicões. Um pra cima e outro pra baixo!


Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!

E adorei esta declaração: "Ministro diz que Rosemary é usada". Usada? Não se diz mais usada. Se diz seminova. A Rosemary é seminova. Rarará!

Os tiozinhos do Supremo querem fazer redução peniana nos condenados? Rarará!

E o Niemeyer?! O Niemeyer era um visionário! Desenhou o Congresso com dois penicões. Um pra cima e outro pra baixo. Botou dois penicões no Congresso!

O Niemeyer foi abduzido! Eu sempre achei que o Niemeyer foi abduzido por um disco voador e voltou direto pra prancheta!

E desenhou Brasília. Ficção científica. Um escândalo de beleza! Brasília é a cidade que mais aparece na televisão! "Você conhece Brasília?" "Conheço, pela televisão." "E onde fica Brasília?" "No 'Jornal Nacional'." Brasília é a capital do "Jornal Nacional". Rarará!

O Niemeyer numa explosão de humildade: "Minha vida não tem nada de especial". Então a minha é um pó de traque. Minha vida é um pó de traque. E o chargista Zedassilva: "E morreu o penúltimo comunista do mundo!" Sobrou o Fidel.

Eu sempre conto que o Niemeyer escreveu uma carta pro Fidel indicando-o para o Prêmio Nobel da Paz! E o Fidel respondeu: "Mas pra quem eu entrego a carta? Só tem dois comunistas no mundo, eu e vocâ". Rarará!

E o São Paulo X Tigre? Festival de trocadilhos: ganso, bambi, tigre! E já falaram que era Tigre X Panteras! E o tigre era sem dentes. Aquele time tava mais pra Gato de Botas! E a única novidade: tigre argentino dá coice.

O Luis Fabiano foi expulso e pegou um helicóptero direto pro show da Madonna no Morumbi! Ele se expulsou-se! Rarará!

Aliás, um amigo tava no show da Madonna e disse que ela atrasou mais que a morte do Niemeyer! É mole? É mole, mas sobe!

O Brasil é Lúdico! Cartaz num restaurante em Sorocaba (SP): "Em virtude da trabalheira para fazer a panqueca, hoje não temos ovo frito". Então não vou. Não dá pra almoçar sem ovo frito!

E esta pichação em Pouso Alegre, em Minas: "Temos frango: de granja, caipira, sertanejo e sertanejo universitário". Rarará!

Nóis sofre, mas nóis goza!

Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

A idade do benefício - FABIO GIAMBIAGI

O GLOBO - 07/12


O benefício da assistência social original era concedido em média por dez anos, e hoje é por 18 anos



Completo hoje a série de artigos com propostas de reforma da previdência e da assistência social. Minha experiência é que em ano de eleições presidenciais ou a caminho dele, o espaço para tratar dessas questões racionalmente se estreita muito. Daí ter optado por expor essa agenda dois anos antes da próxima eleição nacional, procurando evitar que corações e mentes sejam dominados pela emoção extrema que marca esses processos.

Nos encontros anteriores, tratei da necessidade de adotar regras mais duras de aposentadoria para as futuras gerações, da importância de uma regra de transição para quem está na ativa, da idade de aposentadoria, das normas para a aposentadoria feminina, do número de anos de contribuição, das pensões, da aposentadoria rural, do caso dos professores e do valor do benefício assistencial. Hoje vou abordar, por último, o tema da idade de concessão do benefício assistencial.

O economista John K. Galbraith tinha uma boa sentença para explicar a dificuldade para fazer escolhas no terreno das decisões de política. Ele dizia que “a política consiste em escolher entre o desagradável e o desastroso”. Neste caso a frase envolveria certo exagero, mas retrata o tipo de “escolha de Sofia” enfrentada pelo governante. Basicamente, o dilema está em optar entre medidas vistas como impopulares — melhorando a gestão das contas públicas — ou continuar agindo com paternalismo, ao custo de prejudicar as perspectivas fiscais futuras.

Considerem-se os seguintes fatos:

I: A despesa com benefícios da Lei Orgânica da Assistência Social (Loas) foi de R$ 1 bilhão em 1997. Quinze anos depois, está em R$ 30 bilhões.

II: Quando a Loas surgiu (Lei 8.742/1993), o artigo 20 definia a necessidade de instituir o benefício assistencial a partir dos 70 anos. O artigo 1 da Lei 9.720/98 reduziu o parâmetro para 67 anos e o artigo 34 da Lei 10.741/2003 (“Estatuto do Idoso”) para 65 anos.

III: A expectativa de vida do brasileiro aos 70 anos era em média de mais 10 anos de vida em 1993 com as informações de que se dispunha na época, e é de mais 14 anos atualmente (e de mais 18 anos para quem tem 65 anos).

Em outras palavras, a expectativa de vida do brasileiro de 70 anos, ao longo desses quase 20 anos desde a aprovação da Lei, aumentou em 4 anos. Enquanto isso, a idade de concessão de benefício diminuiu 5 anos no mesmo período. Resultado: o benefício original era concedido em média por 10 anos e hoje é concedido por 18.

Ao mesmo tempo, fez-se uma mistura indevida entre as idades de aposentadoria e de concessão do benefício assistencial. Por que um indivíduo vai contribuir para o INSS sobre o benefício básico se, mesmo sem contribuição, aos 65 anos vai receber exatamente o mesmo valor e à mesma idade que receberia se contribuísse?

A sugestão que aqui faço é propor uma lei — para aprovar ano que vem — pela qual a idade de concessão do benefício assistencial seria elevada para adaptar o país às futuras mudanças demográficas, na escala de 6 meses por ano, ao longo de um período de 10 anos. Assim, começando dos atuais 65 anos em 2013, a exigência de idade passaria para 65 anos e 6 meses em 2014, 66 anos em 2015 e assim sucessivamente, até os 70 anos. Consequentemente, em 2023 a Loas seria concedida à mesma idade prevista... em 1993! Ou seja, estamos falando em conservar o mesmo requisito de idade existente 30 anos antes, em um período em que as transformações da composição etária do país estão sendo significativas.

A demagogia que impregna o debate sobre tais questões tende a rotular como manifestações de insensibilidade tecnocrática o que não passa da expressão do mais elementar bom-senso. O princípio do benefício assistencial é meritório, indica a existência de uma sociedade solidária e deve ser preservado. O que deve ser discutido é o parâmetro de idade a partir do qual ele é concedido. Note-se que os constituintes de 1988 escreveram na Constituição que a assistência social tem como objetivo a garantia de um salário mínimo ao idoso que comprove não possuir meios de prover à própria manutenção (Artigo 203), mas tiveram a sabedoria de não engessar nela a idade à qual isso ocorreria. Nada mais natural, portanto, que adaptar a Lei às mudanças demográficas em curso.

Abre o olho presidente - ADRIANO PIRES

BRASIL ECONÔMICO - 07/12


Os investimentos em infraestrutura continuam patinando. E a razão principal é a falta de politicas públicas que definam um modelo capaz de atrair investidores privados. Para isso, é essencial que o modelo seja claro, transparente e baseado no tripé: segurança jurídica, estabilidade regulatória e respeito as regras de mercado.

Infelizmente o que temos visto é uma total improvisação e uma série de trapalhadas como aconteceu recentemente com a edição da MP 579 do setor elétrico.

O que se observa, é que, do ponto de vista pragmático, o governo mostra um total conhecimento sobre a necessidade de atrair capitais privados para o setor de infraestrutura.

O problema é que o governo possui um DNA nacionalista e intervencionista muito forte, que acaba por se transformar em dogma e impede a construção de um modelo, que vem impedindo que atraia para o país os investidores mais capacitados no segmento da infraestrutura.

O exemplo da concessão dos aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Brasília demonstra bem essa tese. Nos consórcios vencedores, nenhum dos três operadores operava grandes aeroportos em outros países.

O afastamento dos grandes operadores ocorreu pelo fato do modelo escolhido pelo governo ter mantido a Infraero com uma grande participação acionária no consórcio, o que representava um grande risco regulatório.

Para surpresa geral, o governo suspendeu os leilões de novos aeroportos, alegando estar de novo procurando um novo modelo. Isso significa insegurança jurídica e mais risco regulatório.

Da mesma forma, que suspendeu os leilões de petróleo, e já fazem quatro anos, o governo fez o mesmo com os aeroportos e não se sabe quando serão retomados. E olha que estamos as vésperas de Copa do Mundo e Olimpíada.

No setor de estradas e ferrovias a história se repete. Depois de ter feito concessão de estradas, ainda no governo Lula, pelo critério de menor tarifa, e que se transformou num tremendo fiasco, com as empresas vencedoras, praticamente nada investindo, o governo recentemente apresentou um plano de concessões para rodovias e ferrovias.

O novo plano começa trazendo como grande novidade a criação de mais uma estatal: a Empresa de Planejamento e Logística(EPL).

Aliás, tem sido uma característica do governo criar novas estatais, como se isso fosse essencial para o planejamento de setores da infraestrutura. Criou a Empresa de Planejamento Energético (EPE), a PPSA (Petrosal) e agora a EPL.

Não é criando novas estatais que se atrai os melhores investidores nem tão pouco se consegue os melhores financiamentos.

O governo precisa entender que ao propor modelos com a presença excessiva do Estado, seja diretamente através de suas estatais ou indiretamente com politicas públicas intervencionistas que desrespeitam o acionista minoritário, não resolveremos o déficit da infraestrutura, não traremos para o setor os melhores investidores, não vamos conseguir criar modelos de financiamento que não dependam somente do BNDES e teremos de conviver com o Pibinho.

O anúncio do crescimento pífio do PIB no terceiro trimestre de apenas 0,6% é mais um indicador de que o governo Dilma poderá passar para a história como o que mais promete e não cumpre.

É bom lembrar que o ministro Mantega havia prometido um crescimento de 1,2% para o PIB do terceiro trimestre.

Será que agora, diante desse péssimo resultado do PIB o governo vai entender que o modelo baseado no consumo das famílias não consegue dar sustentação ao crescimento do PIB e que precisamos de grandes investimentos na infra estrutura?

O paradoxo egípcio - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 07/12


A Irmandade Muçulmana, a mais antiga organização civil do Egito, teve participação periférica e tardia na revolta que sacudiu o país em 25 de janeiro do ano passado e em meros 18 dias derrubou o ditador Hosni Mubarak, há três décadas no poder. Mas os jovens seculares, liberais e sintonizados com o mundo que lideraram as maciças demonstrações na Praça Tahrir, no centro do Cairo, pelo advento da democracia no Egito - dando curso global ao termo "Primavera Árabe" - perderam para os islâmicos as batalhas políticas decisivas da tumultuada mudança de regime.

Nas primeiras eleições livres do país, na virada de 2011 para 2012, as agremiações alinhadas com a Irmandade, a começar do Partido Liberdade e Justiça (PLJ), conquistaram perto de 75% das cadeiras do novo Parlamento, dez vezes mais assentos do que os obtidos pelos liberais. E em junho último, no segundo turno de um ciclo eleitoral igualmente democrático, o candidato do PLJ e ex-líder da entidade muçulmana, Mohamed Morsi, elegeu-se presidente da República. Os conflitos de rua que voltaram a ensanguentar o Cairo nos últimos dias exprimem o paradoxo da revolta egípcia: as forças progressistas que a desencadearam não rivalizam em matéria de apoio popular com o movimento de matriz religiosa que sucedeu Mubarak.

Mais preocupantes do que aqueles, para Morsi, sempre foram outros atores políticos - as Forças Armadas e o Judiciário. As primeiras assumiram o controle direto do país desde o golpe que derrubou a monarquia, em 1953. Entrelaçados à vasta burocracia estatal e aos serviços de segurança, além de criar um verdadeiro império econômico, os militares encarnam o chamado Egito profundo. Sob as ditaduras fardadas desses últimos 60 anos, a Irmandade Muçulmana, fundada em 1928, não raro comeu o pão que o diabo amassou - um de seus ativistas, o médico Ayman al-Zawahiri, saiu do cárcere para fundar a Al-Qaeda. Mais depressa do que era de esperar, no entanto, Morsi se impôs à caserna, em troca, aparentemente, do compromisso de não bulir com os seus privilégios econômicos. Já em agosto, mandou a cúpula militar para a reserva e revogou a legislação que dava amplos poderes às Forças Armadas.

Com o Judiciário, o embate tem sido mais difícil. A Suprema Corte, nomeada toda ela por Mubarak e leal ao velho regime, invalidou as eleições legislativas e dissolveu o Parlamento. Passados quatro meses, em novembro, o presidente deu o troco: decretou que nada do que fizesse poderia ser contestado nos tribunais até a entrada em vigor da nova Constituição, em preparo por uma comissão dominada pelos islâmicos e a ser referendada nas urnas. Deixando claro o que o inquietava, ele proibiu a Justiça de dissolver a Constituinte, como fizera com o Congresso. De novo, os revoltosos de Tahrir prorromperam em protestos, equiparando Morsi a Mubarak, e o Ocidente expressou o seu descontentamento. O presidente deu meia volta na questão das prerrogativas e fez a comissão constitucional terminar o seu trabalho a toque de caixa, para ser votado no dia 15.

Foi aí que se soube o que o texto contém - e o que omite. Além de concentrar amplos poderes nas mãos do presidente, cerceia a liberdade de expressão ao prever punições para "ofensas públicas" e "insultos a profetas", abre espaço à influência da Sharia, o código muçulmano, na legislação civil e ignora os direitos femininos. Enquanto partidários e adversários do governo se engalfinhavam diante do palácio presidencial, seis assessores de Morsi (entre eles uma mulher e um cristão copta) se demitiram. Numa tentativa de aplacar a oposição, o vice-presidente Mahmoud Mekki propôs que, mediante acordo por escrito, o novo Parlamento, a ser eleito depois do referendo, emende a Constituição nos seus trechos mais contestados. Os liberais se dividem entre os que pregam o boicote à consulta e aqueles que, embora certos da derrota - a massa egípcia é conservadora - justificam a participação como investimento político para o próximo pleito legislativo.

Já o Exército, com o qual a Carta é generosa, está mudo e quedo.

Abismo fiscal: símbolo do declínio? - MOISÉS NAÍM

FOLHA DE SP - 07/12


Incapacidade dos EUA em lidar com crise fiscal é uma fraqueza, mas não uma prova de declínio irreversível


O debate sobre uma possível catástrofe fiscal, que pode estar iminente nos Estados Unidos, torna fácil presumir que o país está em declínio. A incapacidade da superpotência para lidar de maneira rápida e efetiva com a crise fiscal claramente representa uma fraqueza.

Mas usar esse problema como prova final de que os EUA estão em declínio irreversível é um erro.

Na realidade, eles continuam fortes e -o que importa ainda mais- continuam mais fortes do que todos os seus rivais. A economia americana continua a ser a mais rica e a mais produtiva entre as grandes economias mundiais. É três vezes maior que a da China, por exemplo.

Os EUA continuam a ser um dos dez países mais competitivos do mundo, um dos cinco melhores lugares para fazer negócios e um dos destinos mais atrativos para o capital dos investidores internacionais.

De todas as economias avançadas que passaram pelo "crash" de 2008, a americana teve a mais rápida recuperação. E o país está passando por um boom no setor de energia...

Novas tecnologias ampliarão a produção de petróleo e gás natural e reduzirão a dependência do país com relação à energia importada.

Entre 2010 e 2015, as importações de energia cairão de 49% para 36% do consumo interno total, e os EUA se tornarão exportadores de gás natural. Em 2017, o país será o maior produtor mundial de petróleo, superando Arábia Saudita e Rússia.

O Citigroup calcula que, nos próximos sete anos, o boom americano do petróleo e gás natural possa criar entre 2,7 milhões e 3,6 milhões de empregos novos, elevando o PIB real em 2% a 3% e reduzindo o deficit em conta corrente em 60%.

E há também o efeito iPad: a inovação. Embora os EUA respondam por apenas 5% da população mundial, originam 28% das patentes concedidas no mundo e abrigam 40% das universidades de pesquisa mais conceituadas do planeta.

A despeito dos problemas do regime de imigração, os EUA seguem sendo o destino preferencial dos profissionais mais capacitados do mundo.

Por fim, a população americana é mais jovem, tem mais crianças e está crescendo mais rápido, via imigração, do que a dos demais países avançados e da China.

Nos próximos 20 anos, a força de trabalho do país deve crescer em 17%, enquanto a das demais economias avançadas crescerá 1%. Na China, a população em idade de trabalho deve cair pouco mais de 1%.

Isso é uma vantagem, porque expande as dimensões do mercado interno americano e implica que existam mais trabalhadores para sustentar as crianças e os idosos.

Nas próximas décadas, os mercados emergentes devem crescer duas a três vezes mais rápido que os dos países avançados e responder por mais de metade da classe média mundial, adicionando mais de 1 bilhão de potenciais compradores para os produtos dos EUA.

Os Estados Unidos precisam superar diversos obstáculos antes que possam explorar ao máximo o seu potencial. Mas nenhum outro país ocupa posição melhor para se beneficiar das mudanças econômicas, demográficas e sociais que estão dando forma nova ao planeta.


Tradução de PAULO MIGLIACCI