REVISTA ÉPOCA
Quando Rosemary saiu das sombras de seu chefe direto, Lula, e ficou mais famosa do que vilã de novela, ao ser demitida por Dilma, a fofoca correu o Brasil: “Sabia que ela era amante de Lula?”. Um amigo me dizia saber de fonte segura e insuspeita, do Palácio. Outro comentava apenas que era óbvio: “Eles viajavam juntos para todo lado, ela era uma secretária com superpoderes e com passaporte diplomático”.
O assunto começou a me dar asco. Creio que muitas mulheres já se viram em situação parecida. Foi promovida? É porque deu para o chefe. Viajaram juntos, foram para o mesmo hotel? É claro que transaram.
Inicialmente, nenhuma reportagem deixou claro que os dois teriam uma relação amorosa ou sexual.
Mas todos os eufemismos foram usados. Rose é “amiga íntima” de Lula. Dona Marisa Letícia “não gosta de Rose”. Rose chama Lula de “tio”. Lula chama Rose de “Rosa”. Pedidos de Rosa para ajeitar a vida da filha e do ex-marido eram como ordens. Rose “rodou o mundo” com Lula. A Polícia Federal “gravou 122 ligações pessoais entre Rose e Lula”.
Não me interessa saber se o PR – sigla usada por Rosemary para tratar do então presidente em e-mails – e sua ex-chefe de gabinete em São Paulo trocavam carinhos. Se havia um caso consensual entre dois adultos, isso interessa apenas à ex-primeira-dama. A julgar pela ausência de Dona Marisa em evento do Calendário Pirelli, no Rio de Janeiro, onde Lula se aboletou sobre o decote de Sophia Loren, ele não escapará da CPI doméstica.
O importante para todos nós é que Rosemary, falastrona, não só pedia favores pessoais em nome de Lula. Para obter o que queria, ela se identificava como sua “namorada”. Se for verdade, e ela usou o sexo ou o amor como trampolim para defender interesses privados, isso é imoral, ilegal, irregular.
Mulheres assim prestam um desserviço à categoria. E Lula, até que ponto ele permitiu que sua intimidade contaminasse suas decisões como líder político? Não é imoral apaixonar-se. Mas um presidente não pode misturar vida privada e pública, sob pena de, nas suas próprias palavras, “ser apunhalado pelas costas”. Dilma não gostou.
Até que ponto Lula deixou sua intimidade contaminar o Poder e, agora, acuar o governo Dilma?
A imprensa sempre protegeu a vida particular de Fernando Henrique Cardoso e nunca fuçou suas aventuras ou romances extraconjugais. Era tabu falar de filhos de FHC fora do casamento, por ser um assunto estritamente privado. O adultério do senador Renan Calheiros só veio à tona porque havia uma empreiteira no meio do amorzinho com Mônica Veloso, a mineira que escancarou na Playboy os bens materiais de Renan.
Esquecendo o lado picante – já que Rose não é nenhuma Mônica Veloso e nem com plástica seria convidada a posar nua –, os maiores estragos morais vêm do abominável “pequeno poder” de nossa República. Instalado por um governo queprometia ética, ética, ética. As revelações diárias da Operação Porto Seguro, da Polícia Federal, sobre as tramoias dos personagens envolvidos com o escritório da Presidência da República em São Paulo chocam, de certa maneira, até mais que o mensalão, um escândalo da alta política.
A Porto Seguro mostra a teia da baixa política. Um dos fios podres é a desmoralização de agências reguladoras. Com a indicação de Rose e a cumplicidade do senador “incomum” José Sarney, o Congresso aprovou raposas para regular os galinheiros. Foi o caso de Paulo Vieira, cuja incompetência técnica para dirigir a Agência Nacional de Águas (ANA) tinha sido atestada por especialistas.
Paulo chamou alguém do mesmo sangue, Rubens, para dirigir a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Os irmãos Vieira são acusados de coordenar um esquema de pareceres irregulares que favorecem amigos, senadores e parentes. Diplomas falsos, avaliações de faculdades no MEC, cargos apadrinhados em autarquias do governo, construções de portos e mansões particulares em ilhas de cabras e bagres.
Violando regras e procedimentos. Rose e Paulo, amigos há dez anos, planejavam abrir um curso de inglês em São José dos Campos, Red Balloon (ou Balão Vermelho). É uma história muito brega, se não fosse perigosa.
Lula agora precisa explicar direitinho quem o apunhalou. Nunca antes na história um presidente foi tão traído. Duvido que fale antes da viagem de duas semanas que fará, a partir desta sexta-feira, para Paris, Berlim, Doha e Barcelona.
Há outra pergunta que não sai da minha cabeça. Qual foi o motivo da demissão fulminante de Rose?
1) um ato de coragem e retidão de Dilma por não compactuar com a corrupção?
2) um ato de irritação com uma personagem de cujo caráter Dilma suspeitava havia anos, tendo alertado Lula em vão?
3) uma manobra para evitar que Rose deponha no Congresso (governistas se opõem a sua convocação alegando que ela já foi demitida)?
Se a afobada Rose diz que não fez nada “imoral, ilegal ou irregular”, vamos dar a ela a chance de se defender. Não?
sábado, dezembro 01, 2012
Occupy me - MARCELO RUBENS PAIVA
O Estado de S.Paulo - 01/12
"A vida é uma só."
Para os agnósticos que não acreditam em reencarnação, espiritismo, vida após a morte, sim, ela é uma só. O que é um alento e um tormento, traz paz na mesma intensidade que aflige. Muitos seguem a vida com a escolha de que ela é uma só e não deixam nada pra depois. É agora ou nunca, é pra já. É?
Tal opinião pode vir precedida de outra frase que gruda na cabeça, como música de festa de casamento: "Quero, mas não posso".
Poderá ter consequências danosas realizar o querer. A razão, a intuição, ou o que psicanálise chama de superego combatem numa guerra sangrenta as emoções, os instintos, ou o que os amigos de bar chamam de desejo. Fazer o que não se deve pode nos levar a uma roubada, apesar de tentador. Numa blitzkrieg, a artilharia moral entra em ação e enumera, de acordo com a crença de cada um, o que pode trazer a mais pura anarquia.
Quer, mas não deve, não pode, não vai!
"Mas a vida é uma só", retorna para atormentar e anunciar outra fatalidade a ser evitada, uma bomba de gás mostarda nas trincheiras dos pensamentos duradouros: o arrependimento! O que leva a uma terceira questão metafísica: "Erro ou remorso?"
Se ela é uma só, pode apenas ser provado no fim dela. A dúvida razoável nos torna inocentes se desejarmos levar uma vida desregrada, doida demais, em que a repressão atinge uma blindagem eficiente, e o prazer forma a cabeça de praia por onde a tropa hedonista, que só quer diversão e arte, uma vida dionisíaca, em paz com Eros e com os mais abusados dos mitos, se infiltra pelo território do sentido da vida cantando "a gente quer inteiro, e não pela metade..."
***
No domingo, abri os olhos, e silêncio pela casa. Mulher viajou. Estava sozinho, ficaria sozinho. Nada de hóspedes, nenhum amigo recém-separado abrigado no quarto dos fundos, nem compromissos ou visitas agendadas. Eu, dois gatos, uma ressaca deprimente, minha vida e 24 horas para ocupá-la com relevâncias. Afinal, ela é uma só.
Pela janela, deus ex machina: chuva. A vida é uma só, São Paulo tem mais de 200 teatros, 200 cinemas, milhares de estabelecimentos gastronômicos, exposições, mas uma chuva rala e um frio fora de época indicavam que talvez eu devesse ficar em casa. Mas a vida não é uma só?
Daqui a pouco, largada da Fórmula 1 em Interlagos, final de campeonato. Nem o acompanho mais. Porém, é programa obrigatório ver a famigerada reta dos boxes, a largada, aquela primeira curva em que muitos se estrepam, curva em que se chega a mais de 320 km/h, num circuito redesenhado pelo Senna, que dizem ser seletivo, mas tem cara de autódromo vintage, com aquelas arquibancadas aparentemente improvisadas, o Cingapura do Maluf ao fundo, que era azul, mas pintaram de branco, a Curva do Pinheirinho sem pinheirinho, que a maioria não sabe onde é, a Curva do Laranjinha, Galvão Bueno menos ufanista, porque os pilotos brasileiros atuais não chegam aos pés dos seus rivais ou companheiros de equipe, estão longe do posto dos heróis do passado e nem de perto dignos de nomearem uma rodovia pedagiada.
Vi a prova até o fim. O favorito venceu.
Logo mudei para NFL (National Futebol League). Três clássicos na sequência, na fase final de grupos. Mas um jogo de futebol americano dura em média três horas. Conseguiria ficar nove horas diante da TV, sendo que o time mais simpático, Falcons, jogaria, assim como meu time, o 49ers, jogaria depois - com Colin Kaepernick, o quarterback reserva que aos poucos vira titular, repetindo a substituição da lenda Joe Montana pela lenda Steve Young, justamente na temporada em que morei em São Francisco -, e depois teria Giants contra Green Bay, os dois últimos campeões de 2010 e 2011, ou melhor, do Super Bowl XLV e XLVI, assim mesmo, em algarismo romano?
E Homeland, rapá, a série que você assiste de olhos esbugalhados, passa à noite no FX. Passar um domingo inteiro diante da TV faz sentido? A vida é uma só. Jogará um dia desta preciosidade na lata de lixo do entretenimento HDTV?
Estude uma língua, reconfigure seu computador, baixe os novos e mais populares aplicativos, consulte fundos de investimento que pagam mais, vá a uma loja de construção e compre, enfim, aquela luminária, planeje uma viagem para a primavera europeia, aproveite agora os supostos preços baixos da antecedência, privilégio de pessoas organizadas que conseguem prever o futuro e estabelecer planos e metas que são cumpridos e se dão bem, os ídolos da classe média e da sacolagem.
Nada disso. Pedi comida da lanchonete. O entregador foi a única pessoa que vi no domingo. Até dei para ele um livro autografado. Vi Falcons vencer, 49ers arrasar, e Giants trucidar, numa noite memorável a zero grau em Nova York. Ainda gravei Homeland que vi dentro da madrugada e da coberta.
Não li uma linha do meu terceiro Jonathan Franzen de 600 páginas. Estou no final. Mas ele foi trucidado numa roda de amigos na quarta-feira anterior. "Muito novelão", disseram. Sim, muito novelão, mas que novelão, que escritor, que personagens, que narrativa, que estilo, quantos conflitos... Todos já bêbados afirmaram que Jeffrey Eugenides e Foster Wallace, que se matou, são muito melhores que o melhor amigo deles, Franzen.
Fiquei revoltado, aflito, frustrado. Não li Eugenides e Wallace! Li tudo de Franzen. Estou perdendo meu tempo com um escritor que até a Veja diz que "não está com essa bola toda"?
Minha sorte foi que passou Daniel Galera, tradutor de Wallace (Ficando Longe do Fato de Já Estar Meio que Longe de Tudo). Me piscou tipo "não ligue para esses bêbados" e declarou em bom tom: "Franzen é ótimo!"
Passei mais de 14 horas em frente da TV. Não aprendi nenhum truque de mágica. Não fiz absolutamente nada. Me pergunto se ocupei bem o dia ou o desperdicei sem levar em conta a raridade que é a vida.
Sei lá. Como saber vivê-la se não há jurisprudência ou manuais? Talvez seja melhor imaginar que ela não é uma só. Assim, a culpa de não fazer nada num domingo chuvoso não estraga o resto da semana. Reabri meu Franzen só na terça e já coloquei Eugenides e Wallace na fila.
Hora do elogio - PAULO SANT’ANA
ZERO HORA - 01/12
Como ninguém me elogia, em represália vou passar a elogiar os outros.
Cumpro elogiar a colega Rosane de Oliveira, nossa cronista política de Zero Hora. Fiquei encantado com o texto que ela produziu anteontem sobre o julgamento do mensalão.
Sobre a pena atenuada que sofreu Roberto Jefferson, ex-deputado federal que denunciou o esquema criminoso, Rosane escreveu: “Dito assim, parece que Jefferson denunciou o esquema porque é um bom cidadão, um sujeito reto que não compactua com a falcatrua na política. Não é bem assim.
O chefão do PTB só botou a boca no trombone quando caiu o esquema de corrupção que o partido dele comandou nos Correios. Inconformado porque o PT não pagou os R$ 20 milhões que prometera ao PTB (os repasses ficaram em mais ou menos um quarto do valor combinado), Jefferson abriu as portas do inferno e deu a trilha para que a CPI dos Correios chegasse aos 40 indiciados.
É indiscutível que o ex-deputado, cassado na mesma leva de José Dirceu, prestou um serviço ao país ao denunciar o mensalão, mas isso não faz dele um herói. Seu partido recebeu do mesmo dinheiro sujo que outros aliados do governo Lula receberam. Cada um usou o dinheiro como quis, financiando campanhas ou melhorando a vida de seus dirigentes, mas são todos farinha do mesmo saco”.
Esplêndido resumo da colega Rosane de Oliveira sobre a origem do mais aparatoso escândalo da história da República.
Sinto orgulho de ser colega da Rosane de Oliveira, pela sua inteligência e pela qualidade de seu texto.
Vale elogiá-la.
Meu outro elogio é para o radialista Antônio Carlos Macedo, que está completando amanhã 10 anos na apresentação do programa Gaúcha Hoje, na Rádio Gaúcha.
Chega a ser espantoso o preparo dele na apresentação do programa. Vai recebendo os e-mails de ouvintes e as intervenções de seus colegas sobre as notícias ou opiniões dos fatos do dia e os aborda com extraordinário domínio sobre os fatos, o que demonstra que consome várias horas do dia para ilustrar-se sobre a atualidade.
Com boa voz radiofônica e conhecimento extraordinário sobre as nuanças da política, da administração pública e do futebol, tornou-se o mais completo analista de torrente radiofônica discursiva, mostrando-se preparado para improvisar a todo instante sobre os acontecimentos interessantes, às vezes repentinos, do noticiário do dia.
O Antônio Carlos Macedo leva o meu elogio mais profundo e sincero. Trata-se de um raro profissional da notícia e do comentário.
Porque não usufrui das luzes da televisão, a constância de sua boa atuação é muitas vezes injustamente não destacada, mas todos os dias as manhãs da Rádio Gaúcha são engalanadas pela proficiência da sua apresentação.
E quanto à carga pesada da sua opinião, na maioria das vezes ele está correto em suas observações, sendo raro que se equivo que nelas.
Ainda bem que há uma unanimidade entre seus superiores de que Macedo é um dos profissionais de jornalismo mais competentes que se conhecem em nosso meio.
Há que se reconhecer insistentemente o seu brilho.
Como ninguém me elogia, em represália vou passar a elogiar os outros.
Cumpro elogiar a colega Rosane de Oliveira, nossa cronista política de Zero Hora. Fiquei encantado com o texto que ela produziu anteontem sobre o julgamento do mensalão.
Sobre a pena atenuada que sofreu Roberto Jefferson, ex-deputado federal que denunciou o esquema criminoso, Rosane escreveu: “Dito assim, parece que Jefferson denunciou o esquema porque é um bom cidadão, um sujeito reto que não compactua com a falcatrua na política. Não é bem assim.
O chefão do PTB só botou a boca no trombone quando caiu o esquema de corrupção que o partido dele comandou nos Correios. Inconformado porque o PT não pagou os R$ 20 milhões que prometera ao PTB (os repasses ficaram em mais ou menos um quarto do valor combinado), Jefferson abriu as portas do inferno e deu a trilha para que a CPI dos Correios chegasse aos 40 indiciados.
É indiscutível que o ex-deputado, cassado na mesma leva de José Dirceu, prestou um serviço ao país ao denunciar o mensalão, mas isso não faz dele um herói. Seu partido recebeu do mesmo dinheiro sujo que outros aliados do governo Lula receberam. Cada um usou o dinheiro como quis, financiando campanhas ou melhorando a vida de seus dirigentes, mas são todos farinha do mesmo saco”.
Esplêndido resumo da colega Rosane de Oliveira sobre a origem do mais aparatoso escândalo da história da República.
Sinto orgulho de ser colega da Rosane de Oliveira, pela sua inteligência e pela qualidade de seu texto.
Vale elogiá-la.
Meu outro elogio é para o radialista Antônio Carlos Macedo, que está completando amanhã 10 anos na apresentação do programa Gaúcha Hoje, na Rádio Gaúcha.
Chega a ser espantoso o preparo dele na apresentação do programa. Vai recebendo os e-mails de ouvintes e as intervenções de seus colegas sobre as notícias ou opiniões dos fatos do dia e os aborda com extraordinário domínio sobre os fatos, o que demonstra que consome várias horas do dia para ilustrar-se sobre a atualidade.
Com boa voz radiofônica e conhecimento extraordinário sobre as nuanças da política, da administração pública e do futebol, tornou-se o mais completo analista de torrente radiofônica discursiva, mostrando-se preparado para improvisar a todo instante sobre os acontecimentos interessantes, às vezes repentinos, do noticiário do dia.
O Antônio Carlos Macedo leva o meu elogio mais profundo e sincero. Trata-se de um raro profissional da notícia e do comentário.
Porque não usufrui das luzes da televisão, a constância de sua boa atuação é muitas vezes injustamente não destacada, mas todos os dias as manhãs da Rádio Gaúcha são engalanadas pela proficiência da sua apresentação.
E quanto à carga pesada da sua opinião, na maioria das vezes ele está correto em suas observações, sendo raro que se equivo que nelas.
Ainda bem que há uma unanimidade entre seus superiores de que Macedo é um dos profissionais de jornalismo mais competentes que se conhecem em nosso meio.
Há que se reconhecer insistentemente o seu brilho.
A mesma velha história - SÉRGIO AUGUSTO
O ESTADÃO - 01/12
Está fazendo 70 anos que Ilsa Lund partiu de Casablanca com Viktor Laszlo rumo a Lisboa, deixando Rick Blaine envolto pelas brumas do aeroporto e as plateias do mundo inteiro com o coração em pedaços. Como Casablanca estreou aqui em 7 de dezembro de 1942, 11 dias depois da première em Nova York e seis semanas antes de sua entrada em circuito no mercado americano, nossa plateia foi a primeira a sofrer com a prevalência da lógica do esforço de guerra (Laszlo, afinal de contas, era um herói da Resistência) sobre a lógica hollywoodramática da época, pela qual o mocinho não podia perder a mocinha para ninguém.
Se terminasse de forma convencional, com Ilsa conseguindo convencer Rick a deixá-la ficar com ele, para o que desse e viesse, Casablanca não teria se transformado na mais romântica e cultuada história de amor do cinema, nem despertado tanto interesse especulativo pelo destino de seus personagens principais.
A produção do filme trabalhou com mais duas hipóteses de desfecho: em ambas Rick ficaria sozinho, e numa delas atrás das grades pela morte do major Strasser. Ao lado de Ilsa, só no wishful thinking dos espectadores, nas conjeturas de alguns escritores e na catártica (e já mundialmente célebre) versão que o jornalista carioca João Luiz de Albuquerque ousou cometer em vídeo quase 30 anos atrás.
Remontando toda a sequência final numa ilha de edição, extraindo e acrescentando falas, Albuquerque materializou à perfeição o sonho de milhões de pessoas: Laszlo alçando voo, desacompanhado, Rick e Ilsa abraçados no meio da pista, enfim, sós para sempre. Valeu o esforço, mas em Casablanca, sob o risco de afetar ou mesmo pulverizar sua mística, não se mexe. Refilmá-lo seria uma heresia; quem tentou, na TV, estrepou-se. Sondado, em 1974, François Truffaut nem quis ouvir o resto da cantada. "Os clássicos são clássicos porque são únicos", fulminou o cineasta. Devem ter repetido a frase para Madonna quando ela ameaçou refilmar Casablanca no Iraque.
Dar prosseguimento àquela velha história de luta por amor e glória ("still the same old story/a fight for love and glory", diz a letra de As Time Goes By) não afeta a mística do drama original, que dela se nutre, aliás, mas é empreitada caça-níqueis. A própria Warner programou, em 1943, uma continuação (ou sequel, como lá chamam), que levaria o título de Brazzaville e daria conta das andanças de Rick e do (ex-capitão) Renault pelo Congo, lutando do lado da Resistência. Nunca saiu do papel. Soube-se recentemente que um dos roteiristas de Casablanca, Howard Koch, escreveu, há 24 anos, Return to Casablanca, que a neta de um dos fundadores da Warner pretende levar à tela o mais rápido que puder. Sua intriga se passa em 1961, com o filho de Rick (e Ilsa) à procura do pai, no Marrocos, além de embeiçado por uma jovem inspirada na cantora Joan Baez.
A partir do final de Casablanca, o jornalista e escritor Michael Walsh montou uma trama que começa com a fuga de Rick e Renault no Buick do mocinho, levado até o aeroporto por Sam, o pianista negro, e Sacha, o fiel barman russo do cassino. O romance, As Time Goes By, editado pela Warner Books em 1998, é divertido e tanto nos leva ao período pós-Ilsa de Rick como recua ao seu passado de gângster em Nova York, nos tempos de Al Capone. Em 1992, num romance do argentino Edgar Brau, intitulado Casablanca, um bilionário portenho ergueria nos Pampas uma réplica do Rick’s Café Américain, assombrado pelos frequentadores do cassino original.
A mais imaginosa e deliciosa especulação sobre o que teria acontecido a Rick, Ilsa, Laszlo, Renault & cia. traz a assinatura do crítico de cinema britânico David Thomson. É um dos capítulos (ou verbetes) de Suspeitos, ciranda especulativa com dezenas de personagens famosos do cinema americano interligados de maneira assaz engenhosa. Traduzido pela Marco Zero em 1992 e há muito só à venda em sebos, seu título deriva de um dos bordões mais conhecidos do filme, "Prenda os suspeitos de sempre", que o capitão Renault bradava sempre que precisava fingir que mantinha a lei e a ordem na cidade.
Segundo Thomson, Laszlo e Ilsa viajaram de Lisboa para a América, no outono de 1941. Beneficiado por seu status de herói de guerra, Laszlo ganhou a vida fazendo conferências sobre o futuro do socialismo, até se encrencar com a caça às bruxas macarthista, como, de resto, sucedeu com seu intérprete, Paul Henreid. Fumante compulsivo, a ponto de acender dois cigarros ao mesmo tempo (referência cifrada ao personagem que Henreid interpretara em A Estranha Passageira), morreu de enfisema em 1952. Por ser poliglota, Ilsa sobreviveu por uns tempos ensinando línguas e traduzindo as legendas dos primeiros filmes de Ingmar Bergman para o inglês. Também posou para Edward Hopper (é aquela mulher na porta da casa em High Noon, pintado em 1949) e manteve um romance com o poeta, contista e bebum Delmore Schwartz, que a teria homenageado numa estrofe de Vaudeville for a Princess. Seu último emprego foi como secretária do secretário-geral da ONU Dag Hammarskjold, ao lado de quem morreu num desastre aéreo sobre a África, em 1961.
Fantasiado por Thomson, Rick ganhou um passado de líder sindical (em Nova York), introduziu Ilsa às ideias de Marx, Trotski, Victor Serge e John Reed (em Paris), e participou da Guerra Civil Espanhola. Depois de matar o major nazista, despachar Ilsa e Laszlo para Portugal e dar início à sua "bela amizade" com Renault, mandou-se para Marrakesh, onde abriu um antiquário com o amigo. Sim, os dois eram gays. E foram felizes até que a morte de Rick os separou, em 1949.
Está fazendo 70 anos que Ilsa Lund partiu de Casablanca com Viktor Laszlo rumo a Lisboa, deixando Rick Blaine envolto pelas brumas do aeroporto e as plateias do mundo inteiro com o coração em pedaços. Como Casablanca estreou aqui em 7 de dezembro de 1942, 11 dias depois da première em Nova York e seis semanas antes de sua entrada em circuito no mercado americano, nossa plateia foi a primeira a sofrer com a prevalência da lógica do esforço de guerra (Laszlo, afinal de contas, era um herói da Resistência) sobre a lógica hollywoodramática da época, pela qual o mocinho não podia perder a mocinha para ninguém.
Se terminasse de forma convencional, com Ilsa conseguindo convencer Rick a deixá-la ficar com ele, para o que desse e viesse, Casablanca não teria se transformado na mais romântica e cultuada história de amor do cinema, nem despertado tanto interesse especulativo pelo destino de seus personagens principais.
A produção do filme trabalhou com mais duas hipóteses de desfecho: em ambas Rick ficaria sozinho, e numa delas atrás das grades pela morte do major Strasser. Ao lado de Ilsa, só no wishful thinking dos espectadores, nas conjeturas de alguns escritores e na catártica (e já mundialmente célebre) versão que o jornalista carioca João Luiz de Albuquerque ousou cometer em vídeo quase 30 anos atrás.
Remontando toda a sequência final numa ilha de edição, extraindo e acrescentando falas, Albuquerque materializou à perfeição o sonho de milhões de pessoas: Laszlo alçando voo, desacompanhado, Rick e Ilsa abraçados no meio da pista, enfim, sós para sempre. Valeu o esforço, mas em Casablanca, sob o risco de afetar ou mesmo pulverizar sua mística, não se mexe. Refilmá-lo seria uma heresia; quem tentou, na TV, estrepou-se. Sondado, em 1974, François Truffaut nem quis ouvir o resto da cantada. "Os clássicos são clássicos porque são únicos", fulminou o cineasta. Devem ter repetido a frase para Madonna quando ela ameaçou refilmar Casablanca no Iraque.
Dar prosseguimento àquela velha história de luta por amor e glória ("still the same old story/a fight for love and glory", diz a letra de As Time Goes By) não afeta a mística do drama original, que dela se nutre, aliás, mas é empreitada caça-níqueis. A própria Warner programou, em 1943, uma continuação (ou sequel, como lá chamam), que levaria o título de Brazzaville e daria conta das andanças de Rick e do (ex-capitão) Renault pelo Congo, lutando do lado da Resistência. Nunca saiu do papel. Soube-se recentemente que um dos roteiristas de Casablanca, Howard Koch, escreveu, há 24 anos, Return to Casablanca, que a neta de um dos fundadores da Warner pretende levar à tela o mais rápido que puder. Sua intriga se passa em 1961, com o filho de Rick (e Ilsa) à procura do pai, no Marrocos, além de embeiçado por uma jovem inspirada na cantora Joan Baez.
A partir do final de Casablanca, o jornalista e escritor Michael Walsh montou uma trama que começa com a fuga de Rick e Renault no Buick do mocinho, levado até o aeroporto por Sam, o pianista negro, e Sacha, o fiel barman russo do cassino. O romance, As Time Goes By, editado pela Warner Books em 1998, é divertido e tanto nos leva ao período pós-Ilsa de Rick como recua ao seu passado de gângster em Nova York, nos tempos de Al Capone. Em 1992, num romance do argentino Edgar Brau, intitulado Casablanca, um bilionário portenho ergueria nos Pampas uma réplica do Rick’s Café Américain, assombrado pelos frequentadores do cassino original.
A mais imaginosa e deliciosa especulação sobre o que teria acontecido a Rick, Ilsa, Laszlo, Renault & cia. traz a assinatura do crítico de cinema britânico David Thomson. É um dos capítulos (ou verbetes) de Suspeitos, ciranda especulativa com dezenas de personagens famosos do cinema americano interligados de maneira assaz engenhosa. Traduzido pela Marco Zero em 1992 e há muito só à venda em sebos, seu título deriva de um dos bordões mais conhecidos do filme, "Prenda os suspeitos de sempre", que o capitão Renault bradava sempre que precisava fingir que mantinha a lei e a ordem na cidade.
Segundo Thomson, Laszlo e Ilsa viajaram de Lisboa para a América, no outono de 1941. Beneficiado por seu status de herói de guerra, Laszlo ganhou a vida fazendo conferências sobre o futuro do socialismo, até se encrencar com a caça às bruxas macarthista, como, de resto, sucedeu com seu intérprete, Paul Henreid. Fumante compulsivo, a ponto de acender dois cigarros ao mesmo tempo (referência cifrada ao personagem que Henreid interpretara em A Estranha Passageira), morreu de enfisema em 1952. Por ser poliglota, Ilsa sobreviveu por uns tempos ensinando línguas e traduzindo as legendas dos primeiros filmes de Ingmar Bergman para o inglês. Também posou para Edward Hopper (é aquela mulher na porta da casa em High Noon, pintado em 1949) e manteve um romance com o poeta, contista e bebum Delmore Schwartz, que a teria homenageado numa estrofe de Vaudeville for a Princess. Seu último emprego foi como secretária do secretário-geral da ONU Dag Hammarskjold, ao lado de quem morreu num desastre aéreo sobre a África, em 1961.
Fantasiado por Thomson, Rick ganhou um passado de líder sindical (em Nova York), introduziu Ilsa às ideias de Marx, Trotski, Victor Serge e John Reed (em Paris), e participou da Guerra Civil Espanhola. Depois de matar o major nazista, despachar Ilsa e Laszlo para Portugal e dar início à sua "bela amizade" com Renault, mandou-se para Marrakesh, onde abriu um antiquário com o amigo. Sim, os dois eram gays. E foram felizes até que a morte de Rick os separou, em 1949.
O marinheiro e o camponês - CLÁUDIA LAITANO
ZERO HORA - 01/12
Durante mais de 30 anos, meu pai trabalhou em uma grande loja de departamentos chamada Hermes Macedo. Se aquele prédio na esquina da Alberto Bins com a Coronel Vicente fosse um reino – e para mim era –, meu pai seria o soberano, e eu sua única princesa.
Loja de departamentos era aquele negócio com a ambição cosmogônica de contemplar todas as necessidades de consumo que um crediário é capaz de abarcar. Na HM, compravam-se calcinhas e geladeiras, bicicletas e relógios, pneus e anáguas, lanchas e todos os seus acessórios, sofás e passadores de cabelo. Como a família real morava em apartamento, a Hermes Macedo era meu parque, minha Disney, meu reino das águas claras.
Ali, eu podia pular em todos os sofás, testar todos os brinquedos e, mais radical de todas as aventuras, subir correndo a escada rolante no sentido contrário. Na Hermes Macedo, iniciei e encerrei minha carreira de modelo infantil cometendo um ousado strip-tease na passarela, sentei no colo do Papai Noel pela primeira e última vez – e chorei, acalentei todas as bonecas, pedalei todas as bicicletas sem nunca sair do lugar.
Tudo porque meu pai trabalhou quase a vida inteira em um único emprego – e para mim, na infância, era como se ele tivesse nascido ali e fosse morrer ali também. (Anos mais tarde, ele acabou morrendo no trabalho, mas não na HM, que já havia falido, mas no escritório onde se empregou para completar a modesta aposentadoria que se pagava aos soberanos das lojas de departamentos naquela época.)
Em um texto clássico sobre a arte de contar histórias, Walter Benjamin divide a habilidade de narrar em dois grandes arquétipos: o do marinheiro e o do camponês. O marinheiro viaja, enfrenta perigos, estende horizontes com o relato de suas aventuras. O camponês é o depositário da tradição, das narrativas que tornam um lugar único em relação a todos os outros. O marinheiro é espaço, o camponês é tempo.
Meu pai foi o camponês urbano que nunca saiu do mesmo lugar. Se tivesse sido um piloto da Varig, um capitão da Guarda Costeira, um mascate de tecidos, é provável que tivesse me ocorrido perguntar mais sobre as coisas que tinha visto, os personagens exóticos, as paisagens distantes.
Hoje me arrependo de não ter usado o tempo que tivemos juntos para perguntar mais sobre a cidade de onde ele nunca saiu, sobre as esquinas que conhecia desde sempre, sobre as pequenas e grandes intrigas daquele reino aparentemente indestrutível que se desfez antes mesmo de eu chegar à vida adulta.
Dizem que os garotos de hoje têm pavor da ideia de trabalhar a vida inteira no mesmo lugar e que a carreira estável não tem o apelo que tinha nos tempos do meu pai. E é verdade. Mas o fato é que a jornada aventurosa do marinheiro sempre foi mais sedutora do que a estabilidade, mesmo quando ser camponês parecia mais sensato.
Eu mesma, se tivessem me perguntado, talvez respondesse que preferiria visitar todas as capitais da Ásia a morar sempre na mesma cidade, fazendo a mesma coisa todos os dias e vendo as semanas virarem meses, e os meses se agruparem em anos.
Não foi bem o que aconteceu. Esta semana, comemorei inacreditáveis 25 anos lavrando metaforicamente o mesmo pedaço de terra, na mesma esquina da Erico com a Ipiranga onde comecei a trabalhar antes mesmo de decidir ser jornalista. Sou, como meu pai, uma camponesa.
O que marinheiros e camponeses acabam percebendo depois de algum tempo é que há sempre algo novo a se descobrir na paisagem de todos os dias, assim como algo que se repete naqueles lugares onde nunca estivemos antes.
A única aventura realmente inesgotável talvez seja aquela de poder fazer o que se gosta. Assim na terra como no mar.
Durante mais de 30 anos, meu pai trabalhou em uma grande loja de departamentos chamada Hermes Macedo. Se aquele prédio na esquina da Alberto Bins com a Coronel Vicente fosse um reino – e para mim era –, meu pai seria o soberano, e eu sua única princesa.
Loja de departamentos era aquele negócio com a ambição cosmogônica de contemplar todas as necessidades de consumo que um crediário é capaz de abarcar. Na HM, compravam-se calcinhas e geladeiras, bicicletas e relógios, pneus e anáguas, lanchas e todos os seus acessórios, sofás e passadores de cabelo. Como a família real morava em apartamento, a Hermes Macedo era meu parque, minha Disney, meu reino das águas claras.
Ali, eu podia pular em todos os sofás, testar todos os brinquedos e, mais radical de todas as aventuras, subir correndo a escada rolante no sentido contrário. Na Hermes Macedo, iniciei e encerrei minha carreira de modelo infantil cometendo um ousado strip-tease na passarela, sentei no colo do Papai Noel pela primeira e última vez – e chorei, acalentei todas as bonecas, pedalei todas as bicicletas sem nunca sair do lugar.
Tudo porque meu pai trabalhou quase a vida inteira em um único emprego – e para mim, na infância, era como se ele tivesse nascido ali e fosse morrer ali também. (Anos mais tarde, ele acabou morrendo no trabalho, mas não na HM, que já havia falido, mas no escritório onde se empregou para completar a modesta aposentadoria que se pagava aos soberanos das lojas de departamentos naquela época.)
Em um texto clássico sobre a arte de contar histórias, Walter Benjamin divide a habilidade de narrar em dois grandes arquétipos: o do marinheiro e o do camponês. O marinheiro viaja, enfrenta perigos, estende horizontes com o relato de suas aventuras. O camponês é o depositário da tradição, das narrativas que tornam um lugar único em relação a todos os outros. O marinheiro é espaço, o camponês é tempo.
Meu pai foi o camponês urbano que nunca saiu do mesmo lugar. Se tivesse sido um piloto da Varig, um capitão da Guarda Costeira, um mascate de tecidos, é provável que tivesse me ocorrido perguntar mais sobre as coisas que tinha visto, os personagens exóticos, as paisagens distantes.
Hoje me arrependo de não ter usado o tempo que tivemos juntos para perguntar mais sobre a cidade de onde ele nunca saiu, sobre as esquinas que conhecia desde sempre, sobre as pequenas e grandes intrigas daquele reino aparentemente indestrutível que se desfez antes mesmo de eu chegar à vida adulta.
Dizem que os garotos de hoje têm pavor da ideia de trabalhar a vida inteira no mesmo lugar e que a carreira estável não tem o apelo que tinha nos tempos do meu pai. E é verdade. Mas o fato é que a jornada aventurosa do marinheiro sempre foi mais sedutora do que a estabilidade, mesmo quando ser camponês parecia mais sensato.
Eu mesma, se tivessem me perguntado, talvez respondesse que preferiria visitar todas as capitais da Ásia a morar sempre na mesma cidade, fazendo a mesma coisa todos os dias e vendo as semanas virarem meses, e os meses se agruparem em anos.
Não foi bem o que aconteceu. Esta semana, comemorei inacreditáveis 25 anos lavrando metaforicamente o mesmo pedaço de terra, na mesma esquina da Erico com a Ipiranga onde comecei a trabalhar antes mesmo de decidir ser jornalista. Sou, como meu pai, uma camponesa.
O que marinheiros e camponeses acabam percebendo depois de algum tempo é que há sempre algo novo a se descobrir na paisagem de todos os dias, assim como algo que se repete naqueles lugares onde nunca estivemos antes.
A única aventura realmente inesgotável talvez seja aquela de poder fazer o que se gosta. Assim na terra como no mar.
"Foca" escondido - RUY CASTRO
FOLHA DE SP - 01/12
RIO DE JANEIRO - Há dias, um prédio foi implodido na rua Frei Caneca, no Estácio, região central do Rio. Era a antiga sede da Bloch Editores, onde, desde 1952, funcionaram a oficina e a Redação das revistas do grupo, entre as quais "Manchete". Em 1970, as revistas se mudaram para a Glória, e Frei Caneca reduziu-se à administração. Em 2000, com a falência e o fim do império Bloch, o prédio foi abandonado e ocupado por famílias sem-teto. Há pouco, estas foram abrigadas pela prefeitura e, no lugar, subirá um shopping.
Trabalhei ali como repórter, pena que por apenas seis meses. De fins de 1967 a meados de 1968, tive o orgulho de ser dirigido por Justino Martins, ir à rua com fotógrafos como Gervasio Batista, Helio Santos e Armando Rozario, e submeter minhas reportagens a redatores como R. Magalhães Jr., Joel Silveira e Narceu de Almeida. Entre os colaboradores da revista estavam Clarice Lispector (como entrevistadora!) e João Saldanha. Os cronistas eram Rubem Braga, Paulo Mendes Campos.
Alguns de meus colegas na reportagem eram os poetas Lêdo Ivo e Homero Homem, o futuro pesquisador de comunicação Muniz Sodré, o fabuloso -já então, sua vida se prestava a fábulas- Carlos Marques (com quem fui morar no Solar da Fossa) e Roberto Muggiati, que seria o sucessor de Justino. Trabalhar com esses nomes compensava a dura convivência com a família Bloch, só possível se você conseguisse se esconder na Redação -o que, para um quase "foca", não era difícil.
Os Bloch não se diziam jornalistas, e com razão. "Manchete" era uma bela revista semanal ilustrada e, apesar deles, informativa e bem escrita. A concorrência das feíssimas semanais de "leitura", sisudas, maçudas e em PB, contribuiu para destruí-la nos anos 80.
Hoje, as ex-revistas de "leitura" se tornaram um picadinho colorido. E continuam feias.
RIO DE JANEIRO - Há dias, um prédio foi implodido na rua Frei Caneca, no Estácio, região central do Rio. Era a antiga sede da Bloch Editores, onde, desde 1952, funcionaram a oficina e a Redação das revistas do grupo, entre as quais "Manchete". Em 1970, as revistas se mudaram para a Glória, e Frei Caneca reduziu-se à administração. Em 2000, com a falência e o fim do império Bloch, o prédio foi abandonado e ocupado por famílias sem-teto. Há pouco, estas foram abrigadas pela prefeitura e, no lugar, subirá um shopping.
Trabalhei ali como repórter, pena que por apenas seis meses. De fins de 1967 a meados de 1968, tive o orgulho de ser dirigido por Justino Martins, ir à rua com fotógrafos como Gervasio Batista, Helio Santos e Armando Rozario, e submeter minhas reportagens a redatores como R. Magalhães Jr., Joel Silveira e Narceu de Almeida. Entre os colaboradores da revista estavam Clarice Lispector (como entrevistadora!) e João Saldanha. Os cronistas eram Rubem Braga, Paulo Mendes Campos.
Alguns de meus colegas na reportagem eram os poetas Lêdo Ivo e Homero Homem, o futuro pesquisador de comunicação Muniz Sodré, o fabuloso -já então, sua vida se prestava a fábulas- Carlos Marques (com quem fui morar no Solar da Fossa) e Roberto Muggiati, que seria o sucessor de Justino. Trabalhar com esses nomes compensava a dura convivência com a família Bloch, só possível se você conseguisse se esconder na Redação -o que, para um quase "foca", não era difícil.
Os Bloch não se diziam jornalistas, e com razão. "Manchete" era uma bela revista semanal ilustrada e, apesar deles, informativa e bem escrita. A concorrência das feíssimas semanais de "leitura", sisudas, maçudas e em PB, contribuiu para destruí-la nos anos 80.
Hoje, as ex-revistas de "leitura" se tornaram um picadinho colorido. E continuam feias.
Um olhar aceso no âmago da escuridão - SILVIANO SANTIAGO
O Estado de S.Paulo - 01/12
Leia trecho de O Chamado do Cego, que se baseia num personagem de Amor, obra-prima da narrativa clariciana
Se casa às três da tarde. Todos os dias. Faça sol faça chuva. Não há motivo para eu sair de casa a essa hora ou em dia que não me convida ao prazer da caminhada pelas ruas de Botafogo, a não ser o fato de mamãe me perguntar, depois de o cuco cantar três vezes na sala de estar, por que você não vai dar a sua voltinha pelo Largo dos Leões.
Está na hora - insiste ela, se não me mexo.
Quando estou para abrir a porta do apartamento, escuto sua voz de novo. Não vá esquecer a bengala na chapeleira. Às vezes a esqueço. Não é por esquecimento que a esqueço. Quem é que gosta de sair para passear com uma bengala branca? Está na cara que eu sou quem eu sou. A bengala branca é o pior dos chamarizes. Os passantes me encaram como se fosse bicho do mato em exposição numa jaula do Largo dos Leões. Pressinto o susto e pior! a piedade. Mais que os pressinto, tenho certeza. Interjeição é interjeição, nada é mais espontâneo no mundo. Foge do coração sem que a pessoa se dê conta.
Mamãe nunca diz para eu não esquecer o guarda-chuva quando está chuviscando. Ela sabe que não o esquecerei.
Ao sentar-me no banco para relaxar as pernas, deixo a bengala dependurada para o lado da relva e não do passeio. Se não a esqueço em casa, escondo-a quando posso. Às vezes peço ao dono da banca de jornal para guardá-la. Pego-a na volta, digo, quando for pegar A Tribuna da Imprensa para a mamãe.
Mamãe pensa diferente. Sempre diz que um dia, sem a bengala, você ainda será atropelado por um doido ao volante. Quando ela diz doido ao volante, não tem jeito, penso logo em ás do volante. E é o nome de Chico Landi que me vem à mente, junto com o de Fangio. Mamãe não pode adivinhar que ser atropelado no Humaitá pelo grande vencedor do circuito de Bari, na Itália, seria a glória para o temerário homem da bengala branca.
Penso que canso mamãe. O dia inteiro em casa, ao seu lado, sem fazer nada de útil. Tem o direito de ter o apartamento só para ela, ainda que por algumas horas da tarde. Ela deve ter o direito de fazer o que bem entende sem ter de pensar que alguém da sua intimidade escuta os passos e os ruídos e adivinha tudo o que faz nas horas de folga. A vida íntima não é diferente da vida cotidiana? Será que ela não luta por conseguir manter como só suas algumas horas que serão vividas em total segredo de todas as pessoas, até do filho?
Mamãe é tolerante, embora nunca mais me tenha dado banho. Contratou a empregada da vizinha para vir dar-me banho pela manhã. Mamãe tem medo de que eu perca o equilíbrio e escorregue no piso ou na própria banheira. Eu também passei a ter medo e a exigir que a empregada me desse banho todos os dias. Só tiro a roupa depois que ela tranca a porta por dentro.
Sei que a empregada é preta retinta. Sei por que ela me disse. Disse-me também que, mesmo se eu pudesse enxergá-la, eu não a veria. Sua mãe me proíbe - disse-me ela - de acender a luz do banheiro e de abrir a janela que fica atrás da privada e dá para os fundos do prédio. Meu banho de chuveiro é na penumbra e, nas manhãs geladas do meio do ano, quando o chuveiro elétrico está no máximo, o banheiro parece um salão de banho turco, é o que a preta retinta me diz. Saio toda suada daqui, precisando dum banho. Posso ensaboar-me e me enxugar sem problema, mas mamãe insiste em dizer que quer me ver limpo e asseado, como o filho de Deus que sou.
Aliás, de há muito Terezinha deixou de ensaboar o que ela chama de minhas partes feias. Ordens de sua mãe - ela se justificou no primeiro dia e nunca mais voltou a tocar naquelas partes. Segura as mãos, mas não consegue segurar a língua. Vira e mexe toca no assunto. Mamãe tem razão. Quando ela me ensaboava as partes feias, era eu que tinha de me controlar. Fazia de conta que estava na rua e começava a chover, a ventar e a fazer frio. Imaginava que tinha de correr de volta ao apartamento antes que apanhasse um resfriado. Ensaboado, debaixo do chuveiro, controlo-me. Fico como se estivesse perdendo o fôlego por causa da correria. Fico resfolegando, que nem cavalo no Jóquei Clube depois da corrida.
Terezinha me perguntava se cego já nasce cansado. Aí eu já não pensava em mais nada, a não ser em reganhar a respiração normal.
Não conseguiria bater uma punheta na frente dela, embora não me faltasse a vontade, que deixo guardada lá dentro de tudo o que tem de ficar bem escondidinho na vida de todos os dias.
Terezinha insiste em me perguntar se eu sinto que estou pelado. Ela acha que, como sou cego, não sei quando estou vestido e quando estou sem roupa. Gosta de certificar-se se sei que estou assim ou assado. Depois de ela me tirar a roupa e de eu lhe assegurar que sei que estou assim ou assado, pergunta-me se eu, mesmo sendo cego, consigo ver os olhos de Deus e se passo pela vergonha que Adão e Eva passaram no paraíso, antes de serem expulsos por ordenação divina.
Ela não conversa comigo de maneira franca e direta sobre as partes feias. Enquanto me ensaboa ou me enxuga, fica resmungando que cego não deve saber o que é o pecado. Se soubesse, ia sentir vergonha, e eu não tinha vergonha alguma de me exibir para uma desconhecida. A inocência é a forma de misericórdia que Deus encontrou para compensar o ser humano da cegueira. Mais ela resmunga, mais me sinto feliz, embora eu saiba que ela, no fundo, está me pregando uma baita duma mentira.
Diz também que aprendeu com o padre no confessionário as palavras que fala. Ela lhe disse numa tarde e desde então passou a repetir que todos os dias dá banho num vizinho cego. Num marmanjão. O padre lhe garante que mulher dar banho em homem necessitado não é pecado. Deus sabe bem o que Ele nos manda e o que Ele não nos manda fazer, mas mesmo assim ele lhe passa a penitência de dez ave-marias, cinco padre-nossos e uma salve-rainha.
Ela discorda do julgamento do padre. Contrapõe à penitência a garantia de que nunca toca com maldade nas partes do corpo de homem que não são as partes do seu homem. Continua resmungando. E aí me garante que não é filha de Eva. Jura por tudo o que é mais sagrado.
Ela acha que o padre acha que ela tem a mente suja e que o homem cego, mesmo sendo um marmanjo, tem a mente limpa. Um dia perguntou ao padre se o cego tem a mente limpa só porque não enxerga. Ela se lembra da frase que ele lhe disse antes de fazer o pelo sinal da santa cruz que dava por terminada a confissão: É uma benesse de Deus poder remover dos olhos, para todo o sempre, a imagem profana. A misericórdia de Jesus é infinita.
Penso também que mamãe pensa que tenho de arriscar-me a sair sozinho em terreno estranho às quatro paredes do apartamento. Se eu não exijo nada dela por que será que ela exige tanto de mim? Por que será que ela não gosta de me dar a mão na rua? Saio sozinho, ela sai sozinha. Caminho sozinho pelas ruas do Humaitá, ela caminha sozinha pelas ruas de toda a cidade. Tenho de sair de bengala branca e ela sai sem bengala, só com a rede para as compras.
Antes, aos sábados pela manhã, eu saía com o papai. Pegávamos o 21 aqui em frente de casa e íamos sacolejando pelos trilhos até o Jardim Botânico.
Papai sentia prazer em segurar minha mão e me mandar atentar para o cheiro das árvores, para o zumbir das abelhas e o chilrear das aves. Dizia-me que ficava siderado com a beleza e a diversidade da natureza. Deus é pai, e o homem é uma peste... - me diz - penso assim porque tenho vontade de deitar com você na relva e lá está a tabuleta a nos avisar que é proibido pisar na grama. Dá multa pisar na grama.
Em companhia dele, cada detalhe do Jardim Botânico me parecia estranho. Suave demais, grande demais.
Caminhávamos os dois por uma das aleias do jardim e aí apareceu um gato. Vinha de detrás de uma árvore e devia estar com fome. Eu era então menininho. Papai me disse olha o gato! sem saber que eu não poderia ver o gato. Olho o gato e lhe digo não vejo o gato. Ele me diz pode ver sim, pode sim, garanto. Pela voz dele, posso ver o gato e, pelas palavras dele, posso sentir como o pelo do animal é macio e fofo. Ele anuncia que o gato angorá vem caminhando na nossa direção. Ele gosta da gente. Apanha-o no chão. Como é dócil o bichano, diz, e o acarinha e me pede para que eu o toque também. Veja como ele é belo e amigo.
Seu pelo é macio e fofo. Passei-lhe a mão direita.
Não é um gato, é uma gata - ele descobre e me diz.
Aí ele solta a gata no chão, que volta a caminhar pelo Jardim Botânico e voltamos os dois felizes para casa.
Penso ainda que, desde que papai morreu e mamãe se aposentou, ela sente falta da Tribuna da Imprensa que ele trazia debaixo do braço e lia todo santo dia. Para o seu pai, Lacerda está no céu e Deus na terra - me diziam os vizinhos no elevador. Nunca a tinha visto ler jornal. Papai é que chegava com o jornal na hora do jantar. Agora, mamãe se acostumou a lê-lo antes do jantar e a escutar, depois do jantar, o Repórter Esso na Rádio Nacional.
Antes, se os dois não fossem ao cinema na sessão das oito, ficavam conversando até que a noite caísse de vez. Quando iam ao cinema, não me deixavam sozinho em casa. Tínhamos empregada e ela ficava tomando conta de mim até eles voltarem. Pela conversa deles ficava sabendo do que acontecia no mundo, no Brasil e no Rio de Janeiro. Quando papai falava demais em política, mamãe dizia que não tolerava política. Quando papai falava demais em futebol, mamãe dizia que não tolerava futebol. Papai torcia pelo Fluminense e lembro que execrava três dos jogadores do Flamengo, Bria, Biguá e Pirilo, salvava Zizinho, um craque aquele. Ele voltava ao futebol e lhe dizia escuta mulher, vencemos de goleada o Flamengo, por 4 a 0, há que comemorar. Depois de muita prosa, passavam os dois da sala de estar ao quarto de dormir como o próprio dia passa para a noite e depois volta a ser dia. (...)
Leia trecho de O Chamado do Cego, que se baseia num personagem de Amor, obra-prima da narrativa clariciana
Se casa às três da tarde. Todos os dias. Faça sol faça chuva. Não há motivo para eu sair de casa a essa hora ou em dia que não me convida ao prazer da caminhada pelas ruas de Botafogo, a não ser o fato de mamãe me perguntar, depois de o cuco cantar três vezes na sala de estar, por que você não vai dar a sua voltinha pelo Largo dos Leões.
Está na hora - insiste ela, se não me mexo.
Quando estou para abrir a porta do apartamento, escuto sua voz de novo. Não vá esquecer a bengala na chapeleira. Às vezes a esqueço. Não é por esquecimento que a esqueço. Quem é que gosta de sair para passear com uma bengala branca? Está na cara que eu sou quem eu sou. A bengala branca é o pior dos chamarizes. Os passantes me encaram como se fosse bicho do mato em exposição numa jaula do Largo dos Leões. Pressinto o susto e pior! a piedade. Mais que os pressinto, tenho certeza. Interjeição é interjeição, nada é mais espontâneo no mundo. Foge do coração sem que a pessoa se dê conta.
Mamãe nunca diz para eu não esquecer o guarda-chuva quando está chuviscando. Ela sabe que não o esquecerei.
Ao sentar-me no banco para relaxar as pernas, deixo a bengala dependurada para o lado da relva e não do passeio. Se não a esqueço em casa, escondo-a quando posso. Às vezes peço ao dono da banca de jornal para guardá-la. Pego-a na volta, digo, quando for pegar A Tribuna da Imprensa para a mamãe.
Mamãe pensa diferente. Sempre diz que um dia, sem a bengala, você ainda será atropelado por um doido ao volante. Quando ela diz doido ao volante, não tem jeito, penso logo em ás do volante. E é o nome de Chico Landi que me vem à mente, junto com o de Fangio. Mamãe não pode adivinhar que ser atropelado no Humaitá pelo grande vencedor do circuito de Bari, na Itália, seria a glória para o temerário homem da bengala branca.
Penso que canso mamãe. O dia inteiro em casa, ao seu lado, sem fazer nada de útil. Tem o direito de ter o apartamento só para ela, ainda que por algumas horas da tarde. Ela deve ter o direito de fazer o que bem entende sem ter de pensar que alguém da sua intimidade escuta os passos e os ruídos e adivinha tudo o que faz nas horas de folga. A vida íntima não é diferente da vida cotidiana? Será que ela não luta por conseguir manter como só suas algumas horas que serão vividas em total segredo de todas as pessoas, até do filho?
Mamãe é tolerante, embora nunca mais me tenha dado banho. Contratou a empregada da vizinha para vir dar-me banho pela manhã. Mamãe tem medo de que eu perca o equilíbrio e escorregue no piso ou na própria banheira. Eu também passei a ter medo e a exigir que a empregada me desse banho todos os dias. Só tiro a roupa depois que ela tranca a porta por dentro.
Sei que a empregada é preta retinta. Sei por que ela me disse. Disse-me também que, mesmo se eu pudesse enxergá-la, eu não a veria. Sua mãe me proíbe - disse-me ela - de acender a luz do banheiro e de abrir a janela que fica atrás da privada e dá para os fundos do prédio. Meu banho de chuveiro é na penumbra e, nas manhãs geladas do meio do ano, quando o chuveiro elétrico está no máximo, o banheiro parece um salão de banho turco, é o que a preta retinta me diz. Saio toda suada daqui, precisando dum banho. Posso ensaboar-me e me enxugar sem problema, mas mamãe insiste em dizer que quer me ver limpo e asseado, como o filho de Deus que sou.
Aliás, de há muito Terezinha deixou de ensaboar o que ela chama de minhas partes feias. Ordens de sua mãe - ela se justificou no primeiro dia e nunca mais voltou a tocar naquelas partes. Segura as mãos, mas não consegue segurar a língua. Vira e mexe toca no assunto. Mamãe tem razão. Quando ela me ensaboava as partes feias, era eu que tinha de me controlar. Fazia de conta que estava na rua e começava a chover, a ventar e a fazer frio. Imaginava que tinha de correr de volta ao apartamento antes que apanhasse um resfriado. Ensaboado, debaixo do chuveiro, controlo-me. Fico como se estivesse perdendo o fôlego por causa da correria. Fico resfolegando, que nem cavalo no Jóquei Clube depois da corrida.
Terezinha me perguntava se cego já nasce cansado. Aí eu já não pensava em mais nada, a não ser em reganhar a respiração normal.
Não conseguiria bater uma punheta na frente dela, embora não me faltasse a vontade, que deixo guardada lá dentro de tudo o que tem de ficar bem escondidinho na vida de todos os dias.
Terezinha insiste em me perguntar se eu sinto que estou pelado. Ela acha que, como sou cego, não sei quando estou vestido e quando estou sem roupa. Gosta de certificar-se se sei que estou assim ou assado. Depois de ela me tirar a roupa e de eu lhe assegurar que sei que estou assim ou assado, pergunta-me se eu, mesmo sendo cego, consigo ver os olhos de Deus e se passo pela vergonha que Adão e Eva passaram no paraíso, antes de serem expulsos por ordenação divina.
Ela não conversa comigo de maneira franca e direta sobre as partes feias. Enquanto me ensaboa ou me enxuga, fica resmungando que cego não deve saber o que é o pecado. Se soubesse, ia sentir vergonha, e eu não tinha vergonha alguma de me exibir para uma desconhecida. A inocência é a forma de misericórdia que Deus encontrou para compensar o ser humano da cegueira. Mais ela resmunga, mais me sinto feliz, embora eu saiba que ela, no fundo, está me pregando uma baita duma mentira.
Diz também que aprendeu com o padre no confessionário as palavras que fala. Ela lhe disse numa tarde e desde então passou a repetir que todos os dias dá banho num vizinho cego. Num marmanjão. O padre lhe garante que mulher dar banho em homem necessitado não é pecado. Deus sabe bem o que Ele nos manda e o que Ele não nos manda fazer, mas mesmo assim ele lhe passa a penitência de dez ave-marias, cinco padre-nossos e uma salve-rainha.
Ela discorda do julgamento do padre. Contrapõe à penitência a garantia de que nunca toca com maldade nas partes do corpo de homem que não são as partes do seu homem. Continua resmungando. E aí me garante que não é filha de Eva. Jura por tudo o que é mais sagrado.
Ela acha que o padre acha que ela tem a mente suja e que o homem cego, mesmo sendo um marmanjo, tem a mente limpa. Um dia perguntou ao padre se o cego tem a mente limpa só porque não enxerga. Ela se lembra da frase que ele lhe disse antes de fazer o pelo sinal da santa cruz que dava por terminada a confissão: É uma benesse de Deus poder remover dos olhos, para todo o sempre, a imagem profana. A misericórdia de Jesus é infinita.
Penso também que mamãe pensa que tenho de arriscar-me a sair sozinho em terreno estranho às quatro paredes do apartamento. Se eu não exijo nada dela por que será que ela exige tanto de mim? Por que será que ela não gosta de me dar a mão na rua? Saio sozinho, ela sai sozinha. Caminho sozinho pelas ruas do Humaitá, ela caminha sozinha pelas ruas de toda a cidade. Tenho de sair de bengala branca e ela sai sem bengala, só com a rede para as compras.
Antes, aos sábados pela manhã, eu saía com o papai. Pegávamos o 21 aqui em frente de casa e íamos sacolejando pelos trilhos até o Jardim Botânico.
Papai sentia prazer em segurar minha mão e me mandar atentar para o cheiro das árvores, para o zumbir das abelhas e o chilrear das aves. Dizia-me que ficava siderado com a beleza e a diversidade da natureza. Deus é pai, e o homem é uma peste... - me diz - penso assim porque tenho vontade de deitar com você na relva e lá está a tabuleta a nos avisar que é proibido pisar na grama. Dá multa pisar na grama.
Em companhia dele, cada detalhe do Jardim Botânico me parecia estranho. Suave demais, grande demais.
Caminhávamos os dois por uma das aleias do jardim e aí apareceu um gato. Vinha de detrás de uma árvore e devia estar com fome. Eu era então menininho. Papai me disse olha o gato! sem saber que eu não poderia ver o gato. Olho o gato e lhe digo não vejo o gato. Ele me diz pode ver sim, pode sim, garanto. Pela voz dele, posso ver o gato e, pelas palavras dele, posso sentir como o pelo do animal é macio e fofo. Ele anuncia que o gato angorá vem caminhando na nossa direção. Ele gosta da gente. Apanha-o no chão. Como é dócil o bichano, diz, e o acarinha e me pede para que eu o toque também. Veja como ele é belo e amigo.
Seu pelo é macio e fofo. Passei-lhe a mão direita.
Não é um gato, é uma gata - ele descobre e me diz.
Aí ele solta a gata no chão, que volta a caminhar pelo Jardim Botânico e voltamos os dois felizes para casa.
Penso ainda que, desde que papai morreu e mamãe se aposentou, ela sente falta da Tribuna da Imprensa que ele trazia debaixo do braço e lia todo santo dia. Para o seu pai, Lacerda está no céu e Deus na terra - me diziam os vizinhos no elevador. Nunca a tinha visto ler jornal. Papai é que chegava com o jornal na hora do jantar. Agora, mamãe se acostumou a lê-lo antes do jantar e a escutar, depois do jantar, o Repórter Esso na Rádio Nacional.
Antes, se os dois não fossem ao cinema na sessão das oito, ficavam conversando até que a noite caísse de vez. Quando iam ao cinema, não me deixavam sozinho em casa. Tínhamos empregada e ela ficava tomando conta de mim até eles voltarem. Pela conversa deles ficava sabendo do que acontecia no mundo, no Brasil e no Rio de Janeiro. Quando papai falava demais em política, mamãe dizia que não tolerava política. Quando papai falava demais em futebol, mamãe dizia que não tolerava futebol. Papai torcia pelo Fluminense e lembro que execrava três dos jogadores do Flamengo, Bria, Biguá e Pirilo, salvava Zizinho, um craque aquele. Ele voltava ao futebol e lhe dizia escuta mulher, vencemos de goleada o Flamengo, por 4 a 0, há que comemorar. Depois de muita prosa, passavam os dois da sala de estar ao quarto de dormir como o próprio dia passa para a noite e depois volta a ser dia. (...)
Confirma-se o esgotamento dos incentivos ao consumo - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 01/12
Estímulos aos investimentos serão bem-vindos, porém o governo precisa, tanto quanto isso, reconquistar a confiança do empreendedor privado
O frustrante desempenho da economia no terceiro trimestre do ano, confirmado pelo crescimento de apenas 0,6% do PIB no período, em relação aos três meses imediatamente anteriores, reforça o diagnóstico de que se esgota o ciclo de incentivo ao consumo, como mola propulsora do país. E se torna cada vez mais grave a anemia dos investimentos, e não apenas públicos.
Ao comentar os dados do PIB divulgados pelo IBGE, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, reafirmou, é claro, a crença na retomada do crescimento, culpou o mau desempenho do setor de serviços pelo resultado — em função da área financeira, devido em parte à inadimplência — e apressou-se a anunciar para breve medidas de estímulo aos investimentos.
A intenção é acertada, resta saber se dará certo desta vez. Todo o atual quadro da conjuntura econômica confirma a carência crescente de investimentos para a economia voltar a crescer. Nesta semana, o Copom manteve os juros básicos em 7,2%, o nível mais baixo desde a criação da Selic. Para isso, foram necessários dez cortes consecutivos na taxa. O governo também cortou impostos (IPI) sobre bens de consumo, criou estímulos ao crédito (por exemplo, na redução de depósitos compulsórios dos bancos) e ampliou a desoneração de folhas de pagamento. Mesmo que a política monetária, quando acionada, leve um tempo para surtir efeito, está claro que a ação dos juros sobre o nível de atividade, nestas circunstâncias, também tem limites. E eles estão próximos.
A taxa de investimento, também calculada pelo IBGE, completou o quinto trimestre consecutivo em queda (desta vez, menos 2%), não bastasse já estar em nível insatisfatório (19% do PIB, quando o ideal é algo na faixa dos 25%). Foi a maior redução desde o primeiro trimestre de 2009 (menos 11,7%), quando a economia estava atordoada pelo impacto da crise mundial deflagrada em fins de 2008, em Wall Street.
Para complicar, conspira contra a retomada dos investimentos não apenas a propensão do governo a gastar bem mais em custeio do que na infraestrutura do país, mas também intervenções desastradas do Planalto no mundo dos negócios. Tem sido ruidosa a pressão oficial para que concessionários de energia elétrica reduzam a rentabilidade para garantir um corte de 20% na conta de luz. Em vez de agir com mais vigor no elevado peso dos impostos sobre o consumidor de energia, o governo atua contra as empresas.
Um erro, pois deteriora o ambiente de negócios em todos os setores. E não adiantam resmungos porque o valor em bolsa de companhais elétricas caiu mais da metade, ou que a Petrobras (com combustíveis congelados) passou a valer menos que o fabricante de cervejas Ambev. Deveria é ser entendido o recado de que essas empresas não poderão financiar os investimentos no mercado com facilidade.
Serão bem-vindas quaisquer medidas de incentivo aos investimentos. Mas, tanto quanto isso, o governo precisa voltar a ter a confiança dos empreendedores privados.
Estímulos aos investimentos serão bem-vindos, porém o governo precisa, tanto quanto isso, reconquistar a confiança do empreendedor privado
O frustrante desempenho da economia no terceiro trimestre do ano, confirmado pelo crescimento de apenas 0,6% do PIB no período, em relação aos três meses imediatamente anteriores, reforça o diagnóstico de que se esgota o ciclo de incentivo ao consumo, como mola propulsora do país. E se torna cada vez mais grave a anemia dos investimentos, e não apenas públicos.
Ao comentar os dados do PIB divulgados pelo IBGE, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, reafirmou, é claro, a crença na retomada do crescimento, culpou o mau desempenho do setor de serviços pelo resultado — em função da área financeira, devido em parte à inadimplência — e apressou-se a anunciar para breve medidas de estímulo aos investimentos.
A intenção é acertada, resta saber se dará certo desta vez. Todo o atual quadro da conjuntura econômica confirma a carência crescente de investimentos para a economia voltar a crescer. Nesta semana, o Copom manteve os juros básicos em 7,2%, o nível mais baixo desde a criação da Selic. Para isso, foram necessários dez cortes consecutivos na taxa. O governo também cortou impostos (IPI) sobre bens de consumo, criou estímulos ao crédito (por exemplo, na redução de depósitos compulsórios dos bancos) e ampliou a desoneração de folhas de pagamento. Mesmo que a política monetária, quando acionada, leve um tempo para surtir efeito, está claro que a ação dos juros sobre o nível de atividade, nestas circunstâncias, também tem limites. E eles estão próximos.
A taxa de investimento, também calculada pelo IBGE, completou o quinto trimestre consecutivo em queda (desta vez, menos 2%), não bastasse já estar em nível insatisfatório (19% do PIB, quando o ideal é algo na faixa dos 25%). Foi a maior redução desde o primeiro trimestre de 2009 (menos 11,7%), quando a economia estava atordoada pelo impacto da crise mundial deflagrada em fins de 2008, em Wall Street.
Para complicar, conspira contra a retomada dos investimentos não apenas a propensão do governo a gastar bem mais em custeio do que na infraestrutura do país, mas também intervenções desastradas do Planalto no mundo dos negócios. Tem sido ruidosa a pressão oficial para que concessionários de energia elétrica reduzam a rentabilidade para garantir um corte de 20% na conta de luz. Em vez de agir com mais vigor no elevado peso dos impostos sobre o consumidor de energia, o governo atua contra as empresas.
Um erro, pois deteriora o ambiente de negócios em todos os setores. E não adiantam resmungos porque o valor em bolsa de companhais elétricas caiu mais da metade, ou que a Petrobras (com combustíveis congelados) passou a valer menos que o fabricante de cervejas Ambev. Deveria é ser entendido o recado de que essas empresas não poderão financiar os investimentos no mercado com facilidade.
Serão bem-vindas quaisquer medidas de incentivo aos investimentos. Mas, tanto quanto isso, o governo precisa voltar a ter a confiança dos empreendedores privados.
A sabedoria de Felipão - FERNANDO RODRIGUES
FOLHA DE SP - 01/12
BRASÍLIA - O técnico da seleção brasileira de futebol, Luiz Felipe Scolari, cometeu um "sincerocídio" nesta semana. Depois de dizer ser uma obrigação ganhar a Copa de 2014, emendou: "Se não quiser pressão, vai trabalhar no Banco do Brasil, senta no escritório e não faz nada".
Neste mundo politicamente correto, houve uma enxurrada de protestos. Felipão cometeu o pecado da generalização. Carimbou todos os funcionários do Banco do Brasil como preguiçosos.
O próprio Felipão telefonou para a direção do BB e pediu desculpas. O banco soltou uma nota se dizendo satisfeito.
Alguma coisa está errada quando alguém não pode vocalizar um sentimento generalizado na sociedade. Basta ir à praça da República, em São Paulo, ou à Cinelândia, no Rio, e perguntar aos pedestres se concordam com o axioma de Felipão (não vale incluir na enquete funcionários do BB). A imensa maioria concordará.
É evidente que há excelentes funcionários no BB. Mas também é inegável a condição privilegiada que eles têm na sociedade. Por exemplo, acesso a aposentadoria quase integral e a um plano de saúde dos sonhos, entre outros benefícios inalcançáveis para milhões de brasileiros.
Um funcionário que ingressa solteiro no BB pagará a vida inteira 3% de seu salário para ter acesso ao plano de saúde do banco, não importando se casar e agregar meia dúzia de filhos ou enteados desfrutando dessa facilidade. É um capitalismo sem risco elevado à máxima potência. Quem paga a conta é o restante da sociedade.
Em vez de apenas se indignar, o Banco do Brasil e seus funcionários deveriam se perguntar: por que tantos brasileiros têm uma visão parecida com a de Felipão? Não é só senso comum e preconceito. Trata-se de uma situação que emula a desigualdade social no país. Muitos se incomodam. E têm razão.
BRASÍLIA - O técnico da seleção brasileira de futebol, Luiz Felipe Scolari, cometeu um "sincerocídio" nesta semana. Depois de dizer ser uma obrigação ganhar a Copa de 2014, emendou: "Se não quiser pressão, vai trabalhar no Banco do Brasil, senta no escritório e não faz nada".
Neste mundo politicamente correto, houve uma enxurrada de protestos. Felipão cometeu o pecado da generalização. Carimbou todos os funcionários do Banco do Brasil como preguiçosos.
O próprio Felipão telefonou para a direção do BB e pediu desculpas. O banco soltou uma nota se dizendo satisfeito.
Alguma coisa está errada quando alguém não pode vocalizar um sentimento generalizado na sociedade. Basta ir à praça da República, em São Paulo, ou à Cinelândia, no Rio, e perguntar aos pedestres se concordam com o axioma de Felipão (não vale incluir na enquete funcionários do BB). A imensa maioria concordará.
É evidente que há excelentes funcionários no BB. Mas também é inegável a condição privilegiada que eles têm na sociedade. Por exemplo, acesso a aposentadoria quase integral e a um plano de saúde dos sonhos, entre outros benefícios inalcançáveis para milhões de brasileiros.
Um funcionário que ingressa solteiro no BB pagará a vida inteira 3% de seu salário para ter acesso ao plano de saúde do banco, não importando se casar e agregar meia dúzia de filhos ou enteados desfrutando dessa facilidade. É um capitalismo sem risco elevado à máxima potência. Quem paga a conta é o restante da sociedade.
Em vez de apenas se indignar, o Banco do Brasil e seus funcionários deveriam se perguntar: por que tantos brasileiros têm uma visão parecida com a de Felipão? Não é só senso comum e preconceito. Trata-se de uma situação que emula a desigualdade social no país. Muitos se incomodam. E têm razão.
Clima radical preocupa - WALTER CENEVIVA
FOLHA DE SP - 01/12
Se não nos cuidarmos, repercutirá no direito a insuficiência de meios dos defensores da natureza
VOCÊ SABIA que São Paulo, até o começo da segunda metade do século 20, era a Terra da Garoa? Não é mais. A garoa, chuva fina e fria, durava horas. Às vezes, dias. As interferências urbanas progressivamente alteraram esse e outros fenômenos da natureza. O mesmo acontece em outros pontos do planeta, e, por isso, constituem as preocupações fortes do IPCC.
IPCC é a sigla, em inglês, do Intergovernamental Panel on Climate Change, da ONU, ou seja, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas na Terra. Seu propósito consiste em determinar os riscos de eventos radicais alterando as condições atmosféricas nos próximos anos.
Interessa ao IPCC a avaliação das mudanças e a determinação do impacto sobre áreas do planeta, em espaços territoriais específicos. As informações ajudarão a antecipar e minimizar os efeitos dos fenômenos surgidos na superfície terrestre.
Certos desastres climáticos resultam da imprevidência dos governos, ou de sua aceitação de pressões contrárias ao interesse coletivo, fugindo ao enfrentamento deles, dando ensejo a danos graves. Em nosso país, são de lembrar nos últimos dez anos os danos sofridos no Estado do Rio, em áreas de montanha ou junto ao mar, na planície amazônica. No Estado de São Paulo, os graves prejuízos em São Luiz do Paraitinga chocaram o país. Em face de catarinenses e gaúchos, também houve uma dose de omissões e desvios danosos do interesse geral. A lenta alteração da temperatura, com o crescimento do número de dias e noites mais quentes, pode ser percebida na pele.
O direito assegura ao cidadão meios jurídicos para atacar ações e omissões do poder público. Vale lembrar, pelo menos, um exemplo constitucional. O inciso LXXIII do art. 5º assegura a qualquer cidadão legitimidade para propor ação popular, entre outros fins, para anular ato lesivo ao meio ambiente, ao patrimônio histórico e cultural, nos três níveis de governo -do municipal, o estadual ou o federal (art. 18).
A cidadania deve, portanto, manter-se atenta.
Há referências e interferências de interesses econômicos dos que modificam condições físicas e do tempo de regiões, mas são comumente ignoradas. O nível dos oceanos, a força de furacões e a intensidade dos terremotos podem assumir velocidades e extensões crescentes.
Servem de exemplo de ofensa aos bens naturais em vias fluviais o lançamento de lixo de toda sorte de detritos, transformando-os em águas paradas. No Brasil, talvez as chuvas muito intensas e continuadas, por um lado, ou os longos períodos de seca, por outro, transformarão radicalmente o meio ambiente, com ampliação das temperaturas para mais ou para menos, sacrificando a saúde do povo.
Se não nos cuidarmos, repercutirá no direito a conhecida insuficiência de meios dos defensores da natureza, em face dos que querem tirar proveito dela a qualquer custo.
Sabemos que defender a natureza é difícil, até pela falta de uniformidade na compreensão universal dos efeitos daninhos no dia a dia.
Chegam a sugerir que o direito não terá condição de impedir a caminhada na reiteração de desastres radicais. O poder de reação contra os que ofendem a natureza é de curta duração, em tendência a ser corrigida pelos condenados ao desastre. Quando? Já.
Se não nos cuidarmos, repercutirá no direito a insuficiência de meios dos defensores da natureza
VOCÊ SABIA que São Paulo, até o começo da segunda metade do século 20, era a Terra da Garoa? Não é mais. A garoa, chuva fina e fria, durava horas. Às vezes, dias. As interferências urbanas progressivamente alteraram esse e outros fenômenos da natureza. O mesmo acontece em outros pontos do planeta, e, por isso, constituem as preocupações fortes do IPCC.
IPCC é a sigla, em inglês, do Intergovernamental Panel on Climate Change, da ONU, ou seja, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas na Terra. Seu propósito consiste em determinar os riscos de eventos radicais alterando as condições atmosféricas nos próximos anos.
Interessa ao IPCC a avaliação das mudanças e a determinação do impacto sobre áreas do planeta, em espaços territoriais específicos. As informações ajudarão a antecipar e minimizar os efeitos dos fenômenos surgidos na superfície terrestre.
Certos desastres climáticos resultam da imprevidência dos governos, ou de sua aceitação de pressões contrárias ao interesse coletivo, fugindo ao enfrentamento deles, dando ensejo a danos graves. Em nosso país, são de lembrar nos últimos dez anos os danos sofridos no Estado do Rio, em áreas de montanha ou junto ao mar, na planície amazônica. No Estado de São Paulo, os graves prejuízos em São Luiz do Paraitinga chocaram o país. Em face de catarinenses e gaúchos, também houve uma dose de omissões e desvios danosos do interesse geral. A lenta alteração da temperatura, com o crescimento do número de dias e noites mais quentes, pode ser percebida na pele.
O direito assegura ao cidadão meios jurídicos para atacar ações e omissões do poder público. Vale lembrar, pelo menos, um exemplo constitucional. O inciso LXXIII do art. 5º assegura a qualquer cidadão legitimidade para propor ação popular, entre outros fins, para anular ato lesivo ao meio ambiente, ao patrimônio histórico e cultural, nos três níveis de governo -do municipal, o estadual ou o federal (art. 18).
A cidadania deve, portanto, manter-se atenta.
Há referências e interferências de interesses econômicos dos que modificam condições físicas e do tempo de regiões, mas são comumente ignoradas. O nível dos oceanos, a força de furacões e a intensidade dos terremotos podem assumir velocidades e extensões crescentes.
Servem de exemplo de ofensa aos bens naturais em vias fluviais o lançamento de lixo de toda sorte de detritos, transformando-os em águas paradas. No Brasil, talvez as chuvas muito intensas e continuadas, por um lado, ou os longos períodos de seca, por outro, transformarão radicalmente o meio ambiente, com ampliação das temperaturas para mais ou para menos, sacrificando a saúde do povo.
Se não nos cuidarmos, repercutirá no direito a conhecida insuficiência de meios dos defensores da natureza, em face dos que querem tirar proveito dela a qualquer custo.
Sabemos que defender a natureza é difícil, até pela falta de uniformidade na compreensão universal dos efeitos daninhos no dia a dia.
Chegam a sugerir que o direito não terá condição de impedir a caminhada na reiteração de desastres radicais. O poder de reação contra os que ofendem a natureza é de curta duração, em tendência a ser corrigida pelos condenados ao desastre. Quando? Já.
Competitividade em xeque - PAULO PEDROSA
O Estado de S.Paulo - 01/12
Em meio aos ataques que investidores, concessionários de energia e até governos fazem a uma medida histórica que reduz o preço da energia para promover competitividade, nada mais natural que a indústria brasileira saia em sua defesa. É natural porque a indústria, junto com todos os outros consumidores, pagou nas últimas décadas pela rentabilidade e os investimentos realizados por essas empresas. É natural, também, porque a indústria está combalida diante de competidores internacionais, que usam a energia como forma de promover política industrial e que intensificaram este movimento desde que a crise econômico-financeira assolou o mundo em 2008. Para dar apenas dois exemplos, a França, em 2011, aprovou uma lei que destina 25% da energia produzida pelas usinas nucleares históricas da EDF - ou seja, com investimento já amortizado - a preços diferenciados para grandes indústrias. A Alemanha, em apenas um ano, reduziu em 20% os preços exclusivamente para a produção industrial.
A Medida Provisória (MP) 579 sem dúvida está pautada pela competitividade. Mas o governo federal precisa estar ciente de que todo esse esforço e desgaste poderá ter sido em vão se um detalhe não for observado: a queda dos preços não chegará, nos próximos dois anos, a boa parte da indústria brasileira, em especial às grandes consumidoras de energia, se a MP não for alterada. Não chegará por uma questão técnica simples. As quotas de energia barata das concessões vincendas de geração foram destinadas exclusivamente ao mercado cativo, que atende consumidores ligados às distribuidoras. Mas quase 60% da energia usada pela indústria tem origem no mercado livre e, por isso, tais consumidores não receberão o que lhes cabe.
O efeito dessa falta de isonomia poderá ser perverso. Alguns executivos do governo defendem a ideia de que não é preciso destinar as quotas dessa energia igualmente a todos os consumidores, pois a oferta nos dois mercados tenderia a se equilibrar, já que a quantidade de energia no sistema continuará a mesma. Isso é verdade, mas o que não está sendo levado em consideração nessa análise é que os preços são suscetíveis à oferta do momento e que, em 2013, ela será escassa no mercado livre em razão da antecipação da entrega da energia das concessões de geração exclusivamente ao mercado cativo. Essa antecipação é condição para que os concessionários tenham direito à prorrogação e foi uma opção do governo para incentivar a economia já a partir de janeiro de 2013. Em meio a um cenário mundial preocupante e números do PIB que apontam para um crescimento marginal, é de fato urgente que os incentivos à competitividade sejam imediatos.
A presidente Dilma tem dito reiteradas vezes que é preciso estimular a produção brasileira, e ela certamente está pautada por dados que acenderiam a luz amarela na mesa de qualquer comandante. A indústria química, por exemplo, que tem na energia 40% de seu custo de produção, amargará este ano mais um recorde de déficit na balança comercial. Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), as importações acumuladas até novembro superaram as exportações em US$ 27 bilhões, volume maior que os US$ 25,9 bilhões registrados em todo o ano passado, que já havia sido considerado um "rombo". A indústria do alumínio, pouco beneficiada pela MP, ainda está ameaçada de ver fábricas fecharem pelo alto custo da energia. A indústria do aço registrará a primeira queda de produção desde 2008. Unidades industriais do setor de vidro estão paralisadas.
Fica o alerta: se a MP 579 não for aperfeiçoada num pequeno detalhe, que dará isonomia entre consumidores cativos e livres, ela não só não trará a competitividade necessária à base das cadeias produtivas, como poderá comprometer a sustentabilidade do mercado livre, também um fator importante para o desenvolvimento da indústria nacional e do setor elétrico do Brasil. Além disso, o esforço fiscal e regulatório de antecipar a renovação das concessões em favor da competitividade poderá ter sido inútil.
FLÁVIA OLIVEIRA - Negócios e CIA
O GLOBO - 01/12
Hora de Gastar bem o dinheiro dos Royalties
Estados e municípios têm (mais) obrigação de aplicar com responsabilidade e transparência a riqueza do petróleo
Foi justo o veto de Dilma Rousseff ao artigo 39 da lei de redistribuição dos royalties. Amparada em parecer da AGU, a presidente decidiu preservar os acordos vigentes entre empresas, União e estados produtores. O embate prometido por Rio e Espírito Santo no STF ameaçava as novas rodadas de licitação da ANP, suspensas desde 2008. Sem leilões, não haveria retomada de investimentos no setor de óleo e gás, fundamentais para o país num período de PIB morno.
Estados e municípios produtores, até aqui, conseguiram preservar os recursos orçamentários com que contavam. Mas o acalorado debate deixou um saldo. É essencial que governadores e prefeitos valorizem a receita dos campos já licitados, gastando-a com responsabilidade e transparência. O país todo soube de exemplos e mau uso dos recursos dos royalties. É oportuno, agora, usar o dinheiro em prol da população que foi às ruas para reivindicar o direito de mantê-lo. O resto do Brasil está de olho. Deve (e vai) cobrar o bom uso adequado dessa riqueza.
Também é mais que louvável vincular à educação 100% da receita com os royalties dos campos a serem licitados. O baixo nível de escolaridade, a má qualidade do ensino público, o acesso ainda modesto de crianças à pré-escola e de adolescentes ao ensino médio são mazelas que envergonham o país e limitam o desenvolvimento socioeconômico. É boa ideia transformar os recursos finitos da exploração de óleo e gás em investimento permanente em capital humano. Se o plano se confirmar, será um salto ainda maior que as reservas do pré-sal.
Porto Maravilha
Metade do potencial de construção da área do
Porto Maravilha já está em negociação, diz Jorge Arraes, da Cdurp. São três milhões de metros quadrados em 20 megaprojetos. Outras 40 intervenções em imóveis menores estão em análise.
1mobiliário
O Veirano Advogados já cuida de 60 projetos imobiliários ligados aos Jogos 2016. Somam R$ 6 bi. Atua na estruturação de seis hotéis, Vila dos Atletas e Parque Olímpico. Quer faturar 50% mais no setor.
Ajuste à vista
ACM Neto, prefeito eleito de Salvador, se reuniu no Rio com o secretário Pedro
Paulo, da Casa Civil do Rio. Ouviu sobre o ajuste fiscal do 19 ano do governo Paes. Já trabalha com a McKinsey, que ajudou os cariocas.
Brasil na Europa
Protecionismo e taxas de juros são os assuntos mais mencionados na Europa, quando o assunto é Brasil. Tomam 60% das notícias. Também há menções às indústrias automotiva (14%), financeira (14%) e de óleo e gás (9%), diz pesquisa da Aberj e/Barabino&Parners.
Meio ambiente
Aproveitamento de resíduos e consumo eficiente de água são temas dominantes no Prêmio Vale-Capes. Das 89 dissertações de mestrado e teses de doutorado inscritas, 44 tratam de lixo; 20 de água.
É Natal 1
Um milhão de pessoas devem passar pela Saara para as compras de fim de ano. A SuperVia, por isso, vai liberar o embarque de grandes volumes nos trens, a partir de segunda. Nos dias úteis, a empresa transporta, em média, 550 mil passageiros.
É Natal 2
Dezembro terá duas edições da Feira Rio Antigo. Hoje, 25 mil pessoas devem passar pelo evento, na Lapa, com 400 expositores; dia 15, 15 mil. Na média habitual, são 17 mil.
Que beleza
A Feira Rio Belleza deve gerar R$ 1,5 milhão em negócios. É crescimento de 50% sobre a edição anterior. Deve receber 20 mil pessoas. Ano passado, foram 13 mil. A Embelleze vai lançar produtos com óleo de Ojon no evento, amanhã e 29.
Sem pastel
Famosa pelos pastéis, a rede Bar do Adão abre hoje, no Centro, a Forneria do Adão. Terá pizza, calzone e afins. Investimento de R$ 1 milhão.
Hora de Gastar bem o dinheiro dos Royalties
Estados e municípios têm (mais) obrigação de aplicar com responsabilidade e transparência a riqueza do petróleo
Foi justo o veto de Dilma Rousseff ao artigo 39 da lei de redistribuição dos royalties. Amparada em parecer da AGU, a presidente decidiu preservar os acordos vigentes entre empresas, União e estados produtores. O embate prometido por Rio e Espírito Santo no STF ameaçava as novas rodadas de licitação da ANP, suspensas desde 2008. Sem leilões, não haveria retomada de investimentos no setor de óleo e gás, fundamentais para o país num período de PIB morno.
Estados e municípios produtores, até aqui, conseguiram preservar os recursos orçamentários com que contavam. Mas o acalorado debate deixou um saldo. É essencial que governadores e prefeitos valorizem a receita dos campos já licitados, gastando-a com responsabilidade e transparência. O país todo soube de exemplos e mau uso dos recursos dos royalties. É oportuno, agora, usar o dinheiro em prol da população que foi às ruas para reivindicar o direito de mantê-lo. O resto do Brasil está de olho. Deve (e vai) cobrar o bom uso adequado dessa riqueza.
Também é mais que louvável vincular à educação 100% da receita com os royalties dos campos a serem licitados. O baixo nível de escolaridade, a má qualidade do ensino público, o acesso ainda modesto de crianças à pré-escola e de adolescentes ao ensino médio são mazelas que envergonham o país e limitam o desenvolvimento socioeconômico. É boa ideia transformar os recursos finitos da exploração de óleo e gás em investimento permanente em capital humano. Se o plano se confirmar, será um salto ainda maior que as reservas do pré-sal.
Porto Maravilha
Metade do potencial de construção da área do
Porto Maravilha já está em negociação, diz Jorge Arraes, da Cdurp. São três milhões de metros quadrados em 20 megaprojetos. Outras 40 intervenções em imóveis menores estão em análise.
1mobiliário
O Veirano Advogados já cuida de 60 projetos imobiliários ligados aos Jogos 2016. Somam R$ 6 bi. Atua na estruturação de seis hotéis, Vila dos Atletas e Parque Olímpico. Quer faturar 50% mais no setor.
Ajuste à vista
ACM Neto, prefeito eleito de Salvador, se reuniu no Rio com o secretário Pedro
Paulo, da Casa Civil do Rio. Ouviu sobre o ajuste fiscal do 19 ano do governo Paes. Já trabalha com a McKinsey, que ajudou os cariocas.
Brasil na Europa
Protecionismo e taxas de juros são os assuntos mais mencionados na Europa, quando o assunto é Brasil. Tomam 60% das notícias. Também há menções às indústrias automotiva (14%), financeira (14%) e de óleo e gás (9%), diz pesquisa da Aberj e/Barabino&Parners.
Meio ambiente
Aproveitamento de resíduos e consumo eficiente de água são temas dominantes no Prêmio Vale-Capes. Das 89 dissertações de mestrado e teses de doutorado inscritas, 44 tratam de lixo; 20 de água.
É Natal 1
Um milhão de pessoas devem passar pela Saara para as compras de fim de ano. A SuperVia, por isso, vai liberar o embarque de grandes volumes nos trens, a partir de segunda. Nos dias úteis, a empresa transporta, em média, 550 mil passageiros.
É Natal 2
Dezembro terá duas edições da Feira Rio Antigo. Hoje, 25 mil pessoas devem passar pelo evento, na Lapa, com 400 expositores; dia 15, 15 mil. Na média habitual, são 17 mil.
Que beleza
A Feira Rio Belleza deve gerar R$ 1,5 milhão em negócios. É crescimento de 50% sobre a edição anterior. Deve receber 20 mil pessoas. Ano passado, foram 13 mil. A Embelleze vai lançar produtos com óleo de Ojon no evento, amanhã e 29.
Sem pastel
Famosa pelos pastéis, a rede Bar do Adão abre hoje, no Centro, a Forneria do Adão. Terá pizza, calzone e afins. Investimento de R$ 1 milhão.
PSDB: colocar o bloco na rua - ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 01/12
À procura de um rumo
Os tucanos concluíram que Aécio Neves precisa com urgência se tornar conhecido dos eleitores brasileiros. Por isso, a direção do PSDB está à procura de um marqueteiro que conduza o partido a uma estratégia vitoriosa. A relação PT/João Santana é citada como exemplo. O partido também quer adotar técnicas novas e ousadas de marketing político e eleitoral. Os tucanos consideram que a dinâmica social do Brasil é igual à americana e querem estabelecer um intercâmbio com o Partido Democrata do presidente Barack Obama. O ex-presidente FH vai tratar disso com o ex-presidente Bill Clinton, nos Estados Unidos, nos próximos dias.
“Errará quem achar que nesta questão dos royalties há vencedores evencidos”
Dilma Rousseff Presidente da República
CPI: PMDB atendido
Os representantes do PMDB na CPI do Cachoeira não fizeram gestão junto ao relator Odair Cunha (PT-MG) em defesa da Delta ou de Fernando Cavendish. Eles pediram, e levaram, pelo PGR Roberto Gurgel e por Policarpo Júnior (Veja).
O ‘custo Serra’ Apontado como um dos candidatos viáveis do PMDB para suceder o governador Sérgio Cabral nas eleições de 2014, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, está relutante. Ele teme o que está sendo chamado de “risco Serra”.
Reeleito no primeiro turno
com 65% dos votos, não sabe qual será a reação do eleitor se ele abandonar a prefeitura do Rio.
Quanta diferença
As autoridades brasileiras envolvidas na organização da Copa do Mundo de 2014 e nas Olimpíadas de 2016 no Rio chegaram a um veredicto: dirigentes do COI são mais profissionais,
e menos encrenqueiros, que os da FIFA.
Luz, câmera, ação
O PSB está criando um banco de imagens para a campanha presidencial em 2014. Dezenas de câmeras, uma grua e uma mesa de edição digital foram mobilizados ontem para o encontro de prefeitos do PSB, em Brasília. A estrela da festa, o governador Eduardo Campos (PE), anda convidando políticos de todos os partidos para passarem um “dia de princesa” com ele no Recife.
Atrás da cortina
Petistas que ocupam posições de destaque no governo Dilma participaram da mobilização que levou quase 200 deputados à festa de aniversário do deputado Júlio Delgado (PSB-MG),
quarta-feira, candidato a presidente da Câmara.
Peru quer empresas brasileiras
Num encontro bilateral, em Lima, durante reunião da Unasul, o presidente peruano Ollanta Humala pediu ao vice Michel Temer apoio do Brasil para atrair investimentos de empresas brasileiras e internacionais a seu país.
O GOVERNADOR SÉRGIO CABRAL convidou o presidente da OAB, Wadih Damous, para discutir, na próxima semana, a instalação da Comissão da Verdade.
Fala, Lula - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 01/12
Além do ex-assessor de imprensa Ricardo Kotscho, conselheiros de Lula no meio jurídico cobram pronunciamento público do ex-presidente sobre o julgamento do mensalão e o escândalo que envolve sua ex-assessora Rosemary Noronha. Esse grupo considera vital a defesa do "legado institucional" lulista, enfatizando a contribuição de seu mandato para a autonomia do Judiciário e o vigor investigativo da PF, que acaba de desvendar tráfico de influência em agências reguladoras.
Timing Quem conversou com Lula nos últimos dias conta que ele tem acolhido bem a sugestão, mas ainda não tem ideia de como se daria essa manifestação pública -se por meio de nota oficial, vídeo gravado ou entrevista.
Porto seguro Durante evento com cooperativas de catadores, anteontem, o ex-presidente evitou jornalistas, mas falou à TVT, ligada à CUT, sobre e lixo e inclusão social. A emissora não abordou o "Rosegate", tampouco o julgamento do mensalão.
Aqui não A Casa Civil nega que José Weber Holanda, ex-adjunto da AGU investigado na Operação Porto Seguro, tenha atuado na formatação da Medida Provisória que vai detalhar o pacote de concessão dos portos, que o governo lança semana que vem.
Despacho... Ao contrário das outras duas adjuntas de Luís Inácio Adams, a agenda oficial de Weber Holanda não era divulgada pelo órgão. Era a única autoridade da AGU não submetida às regras da transparência.
...interno Nas agendas oficiais da Casa Civil consta uma única audiência, em agosto, com o secretário-executivo adjunto, Gilson Bittencourt, para tratar de ações relativas a crédito rural.
Verão passado Na Codesp, empresa que administra o porto de Santos na qual atuou como conselheiro, o ex-diretor da ANA Paulo Vieira era conhecido pela alcunha de "Paulo Maluco".
De volta Um dos principais acusados de envolvimento na máfia dos sanguessugas, que envolvia fraudes no Orçamento, o deputado Nilton Capixaba (PTB) foi designado coordenador da bancada de Rondônia na definição de emendas para 2013.
Importado O prefeito eleito de Salvador, ACM Neto (DEM), escolheu o atual secretário de Finanças de Gilberto Kassab (PSD), Mauro Ricardo, para a Secretaria da Fazenda da capital baiana.
Portfólio Ex-assessor de José Serra no Bandeirantes, Ricardo é conhecido pelo rigor na arrecadação. Idealizou as notas fiscais paulista e paulistana, vitrines das gestões tucano-kassabistas.
Magic Kingdom Enquanto o PSDB nacional iniciará, segunda-feira, o debate acerca de sua "refundação" com prefeitos eleitos, Serra tem outros planos. Vai passear com os netos pelos parques temáticos da Disney.
De saída Chefe da Casa Civil de Geraldo Alckmin, Sidney Beraldo tem data para deixar o governo paulista: tomará posse como conselheiro do TCE-SP no dia 18. Um dia antes terá que se desincompatibilizar da secretaria.
A regra... O governador fez chegar a seus assessores que exigirá que o novo titular da articulação política não seja candidato em 2014. A cláusula fortaleceria João Carlos Meirelles, que coordenou a campanha presidencial do tucano em 2006.
... é clara Ante o movimento, os secretários Edson Aparecido (Desenvolvimento Metropolitano), Julio Semeghini (Planejamento) e Silvio Torres (Habitação), todos deputados, sinalizaram que aceitariam abrir mão da reeleição caso ocupem o posto.
com FÁBIO ZAMBELI e BRENO COSTA
tiroteio
"Será que Felipão está tão desatualizado sobre futebol como está sobre o BB? Pressão por resultado é o que mais se vê nas agências."
DO PRESIDENTE DA CUT, VAGNER FREITAS, sobre o técnico da seleção ter insinuado que o trabalho de funcionário do Banco do Brasil é livre de pressões.
contraponto
Salvos pelo gongo
Os ministros Gleisi Hoffmann, Aloizio Mercadante, Edison Lobão e Ideli Salvatti explicavam, no Palácio do Planalto, o veto parcial da presidente Dilma Rousseff ao projeto que redistribui os royalties do petróleo. Um repórter perguntou a opinião do governo sobre o crescimento de 0,6% do PIB no terceiro trimestre, abaixo da expectativa do mercado. Titular da Educação, Mercadante saiu em socorro do grupo e despistou:
-Você está perguntando para os ministros errados. Neste governo é cada macaco no seu galho!
Os demais riram, aliviados, e encerraram a entrevista.
A LENDA DO VASO QUEBRADO - JORGE BASTOS MORENO - NHENHENHÉM
O GLOBO - 01/11
confiança em algum amigo.
Um valiosíssimo vaso imperial quebrou-se sozinho, no gabinete da Dilma esta semana.
A presidente nem notou. Estava feliz da vida. O chamado inferno astral que se abate sobre as pessoas às vésperas do aniversário, desta vez não a tinha atingido, ainda — Dilma completa 64 anos no próximo dia 14, dois dias depois do fim do mundo, previsto pelo calendário maia.
Mas, para a presidente, o fim do mundo veio antes, com a Operação Porto Seguro. Inconcebível o envolvimento da chefe do escritório de São Paulo e, mais ainda, a do advogado geral adjunto da AGU.
A presidente não é paranoica, mas sabe que, quando a oposição mira no Lula, o alvo nem é ela, é a sucessão presidencial.
A novela será longa, pois há farto material a ser explorado. Nada que possa derrubar a República, mas constrangê-la, ao expor relações íntimas.
Gênios palacianos
Antes de anunciar o veto parcial aos royalties, a presidente Dilma disse aos sábios do Palácio:
—Estamos discutindo duas propostas: uma que agrada a dois governadores e outra que agrada a 25 deles. E vocês agora me apresentam como solução uma outra proposta, que desagrada aos 27. Vocês são uns gênios.
“Dela, não minha”
Até antes de explodir o escândalo, Lula apresentava Rosemary Noronha às pessoas como sendo “a secretária particular da Dilma”.
Surpresa
A delegada encarregada da busca e apreensão na sala do funcionário afastado do MEC Esmeraldo Malheiros dos Santos, ao abrir uma das gavetas da sua mesa, não conteve um grito de espanto.
Barata? Não! Era um kit de saliências, Ancelmo Gois!
Verde-oliva
Na ditadura, o Exército implicava. Hoje, assessora a autora Glória Perez na novela “Salve Jorge”.
Por isso, muitas cenas da novela são reais. Tamanho é o zelo dos militares pela novela que retrata o dia a dia da caserna, que um coronel da reserva foi designado para a missão de ajudar a equipe de produção.
Atropelador
O prefeito Eduardo Paes não ficou nada satisfeito com a forma com que Mercadante assediou a secretária Cláudia Costin para que ela fosse assessorá-lo no MEC.
— O Haddad, quando tentou a mesma coisa, ligou para mim antes, pedindo autorização para fazer o convite. Já Mercadante não teve a mesma gentileza. Por isso, um se elegeu prefeito de São Paulo, e outro, não.
Falar em Haddad, ele convidou o jornalista Núnzio Briguglio para a Secretaria de Imprensa da prefeitura.
Fofoqueiro
Apesar da sua imensa sagacidade, a Dilma ainda conserva a pureza de alma.
Sabem a quem a presidente designou a missão de contar tudo, sem esconder nada, ao Lula sobre a Operação Porto Seguro?
A Gilberto Carvalho.
Como se precisasse...
Crítica
O verdadeiro guerreiro não se abate.
Ali mesmo, na frente da própria, Lula cochichou com Cabral sobre as fantasias inconfessáveis que já teve pela Sophia Loren.
La Loren encantou-se com o nosso metalúrgico. Cabral, ela já conhecia da casa de Sarkozy.
A atriz estava interessada em política e quis saber o que Lula e Cabral achavam do Berlusconi.
Os dois responderam que o maior equívoco do ex-premier foi confundir o público com o privado.
Cachos
Aviso aos coleguinhas!
Nem tentem buscar com a ministra Helena Chagas informações sobre o funcionamento do escritório da Presidência em São Paulo.
A ministra nunca botou os pés naquela representação. Em São Paulo, Helena só despacha no escritório do meu querido amigo Marco Antônio De Biase, o maior cabeleireiro do país.
Quando não está fazendo compras no shopping Iguatemi.
Silhueta russa
O maior problema da Dilma no momento não tem nada a ver com política.
Não que precisasse, mas, por hobby, a presidente fez dieta e perdeu uns quilinhos, bagunçando seu guarda-roupa para enfrentar o frio de Moscou.
JOAQUIM BARBOSA LÁ - MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 01/12
QUEM É ELE?
Na pesquisa, feita por telefone com mil eleitores em todo o país, 15% dizem que não votariam em Barbosa "de jeito nenhum". E 31% afirmam que não o conhecem "o suficiente para opinar". A sondagem será divulgada hoje num encontro de juízes em Florianópolis (SC).
DILMA VERSUS JOAQUIM
Os técnicos do instituto alertam para o fato de o nome de Barbosa não ter sido apresentado em tabela com outros candidatos. A pergunta ao eleitorado lembra apenas que "as pessoas poderão reeleger Dilma Rousseff ou votar em outros candidatos". E pergunta o que elas fariam se Barbosa se candidatasse.
BALANÇA
O ministro do STF consegue maior percentual no Nordeste (28%). No Sul, tem 17%.
ALEGRIA DE ADRIANI
O CD "Família", de Jerry Adriani, vendeu mais de 50 mil cópias em dez dias. Tem canções como "Pai Nosso" e "Jesus Alegria dos Homens".
VIDA LONGA
Carolina Dieckmann permanece em "Salve Jorge" até pelo menos fevereiro. A atriz entrou na novela para encarnar a traficada Jéssica por 20 capítulos, mas foi ficando. O longa que deveria filmar em novembro acabou adiado. "Ela ganhou sobrevida", diz a autora Gloria Perez.
VIDA LONGA 2
E Sônia Braga não fará mera participação especial na novela de Gloria Perez. A atriz entra no núcleo central do tráfico de mulheres. Não será mais uma personagem, mas alguém que vai viver uma situação chave da história, segundo a autora.
QUE AMOR
O Coral Palavra Cantada, formado por 50 crianças entre 8 e 13 anos, fará pela primeira vez uma apresentação solo no dia 14 de dezembro, no Sesc Pinheiros.
O coro, criado pela dupla Palavra Cantada, de Paulo Tatit e Sandra Peres, costuma acompanhar os músicos em alguns shows.
MARCO UM
O marco zero do Brasil, monumento esculpido em pedra que é símbolo do Descobrimento, ganhará companhia: o busto do frei Miguel Gagliani. Ele cuidou da igreja, localizada no centro histórico de Porto Seguro (BA), por décadas antes de morrer, em 2011.
A paróquia local decidiu nesta semana que encomendará a estátua na Itália, onde Gagliani nasceu.
PINHEIRO AVATAR
A árvore de Natal que é inaugurada hoje na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio, terá enfeites em 3D. O pinheiro artificial é a maior árvore flutuante do mundo, diz o livro "Guinness", e é patrocinada pela Bradesco Seguros.
TENDINHA
A apresentadora Astrid Fontenelle levou o filho Gabriel para ver o circo Tihany, na quarta. Elaine Mickely, atriz, estava com a sobrinha Lorena. O piloto Pedro Queirolo foi ao parque Villa-Lobos com a mulher, Daniela Freitas, e o filho, Pedro. A empresária Maythe Birman curtiu o espetáculo "AbraKdabra" com o filho André.
SAÚDE!
O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, foi a prêmio no Memorial da América Latina, anteontem. O cirurgião plástico Ivo Pitanguy foi um dos vencedores do evento, organizado pelo grupo Abril.
Curto-circuito
Alexandre Herchcovitch realiza bazar hoje e amanhã em sua loja da rua Melo Alves, nos Jardins. A entrada é 1 kg de alimento não perecível ou um brinquedo, que serão doados.
O calendário 2013 da Associação Brasileira de Alzheimer tem lançamento na Livraria Cultura do Conjunto Nacional, com renda revertida para a entidade.
Fábio Tucci Farah lança hoje, às 16h, o livro "As Aventuras de Pépin, o Pequeno Peregrino", na Livraria da Vila do JK.
Tipo exportação - SONIA RACY
O ESTADÃO - 01/12
Indagado se a “deserção” será factível sem afetar profundamente a CE, o economista ponderou: “Pode sair do euro, sem grandes marolas, quem é credor e economicamente pequeno”.
Para justificar seu raciocínio, o fundador da MB Associados fez um paralelo como jogo de pôquer. “Quem está ganhando muito ou perdendo muito precisa ficar na mesa. Já o que está ali, ganhando só um pouco, consegue ir embora sem que alguém reclame”.
Back to the future
José Seripieri Jr., fundador da Qualicorp, não apenas voltou à presidência executiva e do Conselho de Administração da empresa. Também acaba de comprar número suficiente de ações na BM&F(em bloco, que pertenciam ao fundo Carlyle) para
poder chamar a Qualicorp de... sua novamente. Em operação, esta semana, avaliada em R$ 100 milhões.
Aprovado
O PP, de Maluf, diz estar de pleno acordo com a decisão de Haddad de tirar o Aprov da Secretaria da Habitação – pasta que o partido pleiteia no governo petista.
A surpresa: o PP garante que apresentou três nomes técnicos para o posto.
Além dos páreos
A Associação Comercial de São Paulo tem interesse em comprar a sede do Jockey Club, na Rua Boa Vista, centro da cidade.
Mantendo o clube em funcionamento no 8º, 9º e 10º andares do prédio. Com valor estimado em R$ 90 milhões, o imóvel é cobiçado
também pela BM&F e pelo... governo do Estado.
Enxugando
Depois de anunciar o fim do patrocínio ao Palmeiras, a Fiat decidiu cortar também o do América- MG.Hoje, a montadora deposita cerca de R$ 2 milhões por ano na conta do clube.
Será mesmo?
Soninha Francine foi abordada na padaria do bairro. “Você se parece muito com aquela candidata à Prefeitura...” “Sou eu mesma.” O moço não acreditou. Ela então sacou o RG. “E tem até o mesmo nome!!!” Aí a ex-vereadora desistiu...
Generosa
Ainda com sua mostra em cartaz no MAM de São Paulo, Adriana Varejão doou ao museu três das 57 telas do mural Carnívoras.
Questão de ótica
O filme Marighella, de Isa Grinspum Ferraz, traz um curioso depoimento de Lula. No longa, o ex presidente declara que, com exceção de Tiradentes, o País não tem heróis. “Marighella é um herói!...
E nós estamos colhendo o que ele plantou”, afirma. O DVD será lançado terça, na Cinemateca Brasileira.
Pé de valsa
E Suplicy não pôde levarChambinho do Acordeon para tributo a Luiz Gonzaga no Senado. Mas caiu no forró, junto com Milú Villela, em show do músico no fim de semana. Foi elogiado pela performance.
Os EUA e o projeto chinês - MARCOS CARAMURU DE PAIVA
FOLHA DE SP - 01/12
Nada mais expressivo do que a primeira viagem de Obama após as eleições ter sido ao Sudeste Asiático
OS DEZ países do Sudeste Asiático mostram regularmente o peso que têm no mundo ao atrair para as reuniões anuais da sua associação, a Asean, os líderes dos EUA, da China, do Japão e, frequentemente, de outras nações.
A localização estratégica justifica o interesse pela região. Acresce-se a isso que o modelo de diálogo montado pela Asean com os países de fora -Asean + EUA, Asean + China, Asean + Japão, Asean + Coreia, Asean + 3 (China, Japão e Coreia)- funciona direito.
Ao longo da última década, a China aumentou sua importância no Sudeste Asiático, enquanto Japão e, sobretudo, EUA perderam espaço. É natural. A China ampliou sua presença econômica em toda parte.
Mas o sucesso da integração das cadeias produtivas entre o Sudeste Asiático e a China superou expectativas. Os fluxos comerciais também.
Ademais, a China tem investido na infraestrutura que a liga aos vizinhos do sul. Isso terá um impacto crescente, pois os custos de produção chineses estão aumentando e as empresas tenderão a transferir suas unidades dependentes de mão de obra barata para Laos, Camboja, Vietnã, Mianmar.
O problema é que a China tem disputas territoriais pela posse de pequenas ilhas com cinco países da região. E aí há ressentimentos.
O governo americano tem buscado reconquistar o terreno perdido. Tenciona reativar as operações militares conjuntas com os países do Sudeste Asiático e parece querer energizar as instâncias de cooperação econômica com a Asean.
Nada mais expressivo que o fato de a primeira viagem do presidente Obama após as eleições ter sido à região. O presidente começou o tour pela Tailândia, país que os americanos sempre trataram como uma espécie de "hub" para as suas operações militares e diplomáticas.
E, em Bangkok, na entonação suave que lhe é peculiar, mas ao mesmo tempo num tom firme, Obama definiu o propósito americano: "sempre fomos uma potência na Ásia do Pacífico" afirmou. Tal afirmação foi a ponte para justificar o fortalecimento da cooperação para a segurança e a revitalização dos vínculos econômicos com a região.
Não é de surpreender que, em seguida ao presidente Obama, o primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao, tenha também se deslocado para a Tailândia. Foi a primeira visita de uma autoridade chinesa desse nível na última década.
Nos anos que se seguem, a China tem tudo para ampliar o seu peso e o seu grau de integração econômica com os membros da Asean. Se, ao lado disso, puder reforçar os laços com os vizinhos na fronteira marítima oriental (Japão e Coreia), vai-se criar no leste asiático uma região de extraordinário peso, que tem potencial para mudar o equilíbrio das relações mundiais.
Os riscos, no entanto, estão no ar. Se a China confiar demais no poder econômico e em sua força militar para administrar disputas, faltará ambiente para uma integração que tenha, além do econômico, um veio político relevante. E, se os EUA se voltarem mesmo para a Ásia do Pacífico com mais interesse e motivação militar, como anunciou Obama, vão inevitavelmente criar problemas para o projeto chinês.
Nada mais expressivo do que a primeira viagem de Obama após as eleições ter sido ao Sudeste Asiático
OS DEZ países do Sudeste Asiático mostram regularmente o peso que têm no mundo ao atrair para as reuniões anuais da sua associação, a Asean, os líderes dos EUA, da China, do Japão e, frequentemente, de outras nações.
A localização estratégica justifica o interesse pela região. Acresce-se a isso que o modelo de diálogo montado pela Asean com os países de fora -Asean + EUA, Asean + China, Asean + Japão, Asean + Coreia, Asean + 3 (China, Japão e Coreia)- funciona direito.
Ao longo da última década, a China aumentou sua importância no Sudeste Asiático, enquanto Japão e, sobretudo, EUA perderam espaço. É natural. A China ampliou sua presença econômica em toda parte.
Mas o sucesso da integração das cadeias produtivas entre o Sudeste Asiático e a China superou expectativas. Os fluxos comerciais também.
Ademais, a China tem investido na infraestrutura que a liga aos vizinhos do sul. Isso terá um impacto crescente, pois os custos de produção chineses estão aumentando e as empresas tenderão a transferir suas unidades dependentes de mão de obra barata para Laos, Camboja, Vietnã, Mianmar.
O problema é que a China tem disputas territoriais pela posse de pequenas ilhas com cinco países da região. E aí há ressentimentos.
O governo americano tem buscado reconquistar o terreno perdido. Tenciona reativar as operações militares conjuntas com os países do Sudeste Asiático e parece querer energizar as instâncias de cooperação econômica com a Asean.
Nada mais expressivo que o fato de a primeira viagem do presidente Obama após as eleições ter sido à região. O presidente começou o tour pela Tailândia, país que os americanos sempre trataram como uma espécie de "hub" para as suas operações militares e diplomáticas.
E, em Bangkok, na entonação suave que lhe é peculiar, mas ao mesmo tempo num tom firme, Obama definiu o propósito americano: "sempre fomos uma potência na Ásia do Pacífico" afirmou. Tal afirmação foi a ponte para justificar o fortalecimento da cooperação para a segurança e a revitalização dos vínculos econômicos com a região.
Não é de surpreender que, em seguida ao presidente Obama, o primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao, tenha também se deslocado para a Tailândia. Foi a primeira visita de uma autoridade chinesa desse nível na última década.
Nos anos que se seguem, a China tem tudo para ampliar o seu peso e o seu grau de integração econômica com os membros da Asean. Se, ao lado disso, puder reforçar os laços com os vizinhos na fronteira marítima oriental (Japão e Coreia), vai-se criar no leste asiático uma região de extraordinário peso, que tem potencial para mudar o equilíbrio das relações mundiais.
Os riscos, no entanto, estão no ar. Se a China confiar demais no poder econômico e em sua força militar para administrar disputas, faltará ambiente para uma integração que tenha, além do econômico, um veio político relevante. E, se os EUA se voltarem mesmo para a Ásia do Pacífico com mais interesse e motivação militar, como anunciou Obama, vão inevitavelmente criar problemas para o projeto chinês.