segunda-feira, setembro 24, 2012

O mesmo grau de certeza - CARTA AO LEITOR - REVISTA VEJA

REVISTA VEJA


Em 1992, Pedro Collor escancarou em VEJA os porões estarrecedores do governo do irmão, Fernando. Na semana passada, VEJA revelou os segredos que Marcos Valério guardava sobre o papel de Lula no escândalo do mensalão

Foi extraordinária, em todos os sentidos, a repercussão da reportagem de capa de VEJA da semana passada, com o publicitário mineiro Marcos Valério, o pivô financeiro do mensalão. VEJA trouxe revelações bombásticas de Valério sobre o papel central do ex-presidente Lula nas operações que resultaram em um escândalo que, por pouco, não lhe custou o mandato presidencial.

O ex-presidente Lula manteve-se calado. Marcos Valério também não se pronunciou. São dois casos de silêncio ensurdecedor.

Em contraste, os partidos da base de sustentação do governo protestaram e os de oposição emitiram notas exortando VEJA a tomar públicas as evidências materiais que embasaram a publicação das contundentes declarações do publicitário mineiro.

Os partidos que enxergam nas revelações de Marcos Valério vantagens políticas podem proceder como quem vislumbrou essas mesmas propriedades no depoimento de Pedro Collor trazido a público vinte anos atrás e que culminaram com o impeachment do irmão, Fernando Collor.

Da mesma forma, quem se sentiu prejudicado pela divulgação das informações do homem do dinheiro do mensalão tem a possibilidade de interpelá-lo publicamente ou procurar reparação na Justiça. Marcos Valério está vivo e tem endereço conhecido. A mensagem é de Marcos Valério. VEJA foi a mensageira.

O grau de certeza de VEJA em relação ao conteúdo da reportagem com Marcos Valério é o mesmo que a revista tinha quando publicou, em 1992, a capa "Pedro Collor conta tudo". Tanto em um caso quanto no outro, VEJA cumpriu sua missão de informar com fidelidade, coragem e espírito público fatos testemunhados por pessoas com grande intimidade com o poder.

Existe outro paralelo entre a reportagem de VEJA com Pedro Collor e a de agora com Marcos Valério. Ambas são estrondosas por reunirem declarações que deram materialidade a situações sobre as quais já tinham sido levantados diversos detalhes significativos, porém esparsos. Ficava faltando um demiurgo com informações privilegiadas capaz de amarrar todos os eventos, dando-lhes coerência. Foi o que Pedro Collor fez em 1992 e, na semana passada, Marcos Valério.

Mulher em debate - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 24/09

Em plena festa de 80 anos do voto feminino no Brasil, o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos chama atenção para o tema em livro de seu colega Jairo Nicolau, "Eleições no Brasil’,’ recém-lançado. "Lá diz que a obrigatoriedade universal do voto feminino só ocorreu em 1965! Antes era facultativo para 'donas de casa,’ isto é, mulheres que não fossem funcionárias ou com renda própria não eram obrigadas a votar. Eu perguntaria ao Jairo como é que foi isso, 80 anos depois do código eleitoral de 1932?”

Segue..

Jairo diz que é isto mesmo:
— O Código de 1965 passou a adotar o critério de obrigatoriedade do voto sem distinção de sexo.
Antes não era assim. Em 1932, o direito de voto foi instituído, mas facultativo para mulheres. A Constituição de 1934 tornou obrigatório o voto das mulheres com profissões públicas, e o Código Eleitoral de 1950 definiu que o alistamento era facultativo para as que não exercessem profissões remuneradas.

Exemplo em casa

Para o autor de "Eleições” não há estudos sobre o volume de donas de casa que, entre 1945 e 1965, não se alistaram como eleitoras:
— Sei apenas de um caso: minha mãe. Era dona de casa e votou em todas as eleições do período!

No mais

Essa Pnad, pesquisa do IBGE divulgada na sexta-feira, confirma uma boa notícia. Mais uma vez, a proporção de negros no ensino superior aumentou. Cresceu de 35% para 38% de 2009 a 2011.

Veja só
Em 2001, a proporção era de 22%.

SOS ARVORES DE IPANEMA Desmatamento. A árvore das fotos, vejam que pena, é uma das muitas que estão no corredor da morte na Rua Barão de Jaguaripe, endereço de bacanas em Ipanema. Moradores dizem que vizinhos incomodados com a posição das árvores (esta, no número 155, está espremida entre duas entradas de garagem) fazem de tudo para matá-las para facilitar o acesso sobre rodas ao prédio. Como a poda sem autorização é proibida, põem pedras e cimento sobre a terra, para dificultar a rega, e dão injeções de veneno. Que maldade! Alô, Comlurb!

A revanche
A turma que azucrinou a vida de Ana de Hollanda no PT e em outros grupos de esquerda volta com todo o gás. Entregaram à nova ministra Marta Suplicy uma carta assinada por diferentes movimentos sociais da cultura. Nela, diz que a posse de Marta significa "a possibilidade de recuperar a grandeza e a relevância na ação do Ministério da Cultura.’

Sobrou para a Ana
A missiva diz que a gestão de Ana de Hollanda "foi marcada por ausência de diálogo, interrupção de políticas públicas, omissão frente aos grandes temas e conservadorismo político.”
E ainda: "O Ministério da Cultura que queremos precisa ter as portas abertas, ser republicano, posicionando a cultura acima de interesses partidários, armadilhas tecnocráticas ou lobbies (muitos oriundos do próprio mundo da cultura) que tentam minar a ação pública.”

Sobrou para o Rio
A carta fala em "desprovincianizar a Funarte, mudando a sede do Rio para Brasília, dando a ela caráter nacional, plural, e capaz de desenvolver políticas fundamentais nas áreas de música, artes visuais, cênicas”.
É. Pode ser.

Aedes ‘do bem’

A Fiocruz anuncia hoje que começará a trabalhar com um Aedes aegypti "do bem’!
O mosquito, um produto da colaboração internacional do Brasil com a Austrália, promete impedir a transmissão da doença de forma natural.
É que o Aedes "do bem” carrega uma bactéria que consegue bloquear o vírus da dengue dentro do mosquito.

Paes no samba
Ontem sambistas de várias escolas reuniram-se no barracão da Portela, para gravação de apoio a Paes.
Estiveram lá, entre outros, Selminha Sorriso, porta-bandeira da Beija-Flor, e Camila Soares, filha do bicheiro Jayder Soares e chefe do ateliê da Grande Rio.
A prefeitura reformou as quadras de Portela, União da Ilha, Império Serrano e Imperatriz, e construiu a quadra da Mocidade Independente.

O outro lado

De Kléber Leite sobre eventual ação regressiva do Flamengo contra ele por causa da decisão que condenou o clube a pagar R$ 60 milhões ao consórcio que iria construir um shopping na Gávea na época em que era presidente:
— O Flamengo nada deve ao consórcio. O consórcio, sim, deve uma fortuna ao Flamengo. Mas o clube, misteriosamente, nunca procurou a Justiça para reparar o prejuízo moral, institucional e financeiro, embora a decisão de promover a ação contra o consórcio tivesse sido tomada pelo conselho.

Profissionais do sexo

Veja como é dura a vida de Marcelo Freixo ao incluir em seu programa temas polêmicos como a luta para garantir acesso aos direitos trabalhistas aos profissionais do sexo.
Sábado, duas jovens num salão no Leblon, ex-eleitoras do candidato do PSOL, estavam horrorizadas com a proposta.

Modelo ainda indefinido - GEORGE VIDOR


O GLOBO - 24/09


O governo quer portos mais eficientes, mas não encontrou o modelo ideal para o país. O da Ásia está descartado.

O governo está com certa dificuldade para definir um modelo que atenda ao objetivo de ampliar e baratear os serviços prestados pelos portos do país, e que seja também factível aos investidores privados. Para não criar mais uma jabuticaba, as autoridades preferiram adiar a decisão, esperando bater o martelo em outubro, após ouvir empresários experientes, tanto do ramo de transportes quanto na contratação de serviços portuários. O modelo asiático está descartado porque não se adapta ao Brasil. Cingapura, por exemplo, cujo porto movimenta mais carga geral que os terminais marítimos brasileiros somados, tem um único operador. Funciona com uma eficiência de dar inveja. O controle de qualidade e as tarifas são estabelecidos pelo Estado, que, de democrático só tem mesmo a fachada (quando a oposição passa a ter mais de 10% do Parlamento o sistema político entra em crise e retrocede!). Na China, os portos gigantes são operados por poucos operadores, sob a mão pesada do Estado. A sociedade brasileira não aceitaria um modelo como esse, e com razão, pois pressupõe um intervencionismo estatal além da conta.

O modelo europeu se aproximaria mais do que o Brasil deseja, embora lá sejam poucos os operadores. Na Holanda, o governo define os investimentos futuros e estabelece as condições para que esses poucos operadores privados possam realizá-los.

O Brasil adotou, após a lei de modernização do setor, um modelo de competição entre os os operadores de terminais em portos públicos, aceitando alguma competição por parte de terminais privados de uso misto. A maioria dos portos públicos brasileiros só tem um terminal para carga geral, com um operador na movimentação de contêineres. Apenas em Santos (que tem duas margens, uma delas nos municípios vizinhos de Cubatão e Guarujá) é que existem vários operadores de terminais de contêineres: quatro em pleno funcionamento - Santos Brasil, Libra, Tecondi e Rodrimar -, um quinto (BTP), público, prestes a ser inaugurado, e um sexto (Embraport), de uso misto, em fase de construção.

No Rio, há dois operadores (Multiterminais e Libra), ambos dando partida a consideráveis projetos de expansão. Quando concluídos esses investimentos, o porto do Rio passará a ter quase dois quilômetros de cais contínuo (o maior em um porto de grande profundidade, que poderá chegar a 16 metros). Além do cais ampliado, estão surgindo novas áreas de armazenagem de carga no porto, o que quadruplicará a capacidade de movimentação de contêineres e duplicará o de veículos. Agora vizinho ao cais do Caju, surgiu um terminal de apoio às plataformas de petróleo, numa extensão de 1.800 metros, abrangendo o cais de São Cristóvão e parte do cais da Gamboa.

Transporta-se cada vez mais carga por contêineres (até mesmo grãos, fertilizantes e açúcar), mas os minérios e os combustíveis, em granel, ainda respondem, em volume, por quase 90% das mercadorias que circulam pelos terminais portuários brasileiros. São geralmente terminais privativos, obrigados a oferecer uma parcela mínima de sua capacidade a terceiros. Quem não tem terminal fica meio ao deus-dará, com poucas opções de terminais públicos. Daí os gargalos em Santos, Paranaguá, Rio Grande, com longas filas de espera de caminhões e navios, especialmente no auge das safras.

Nesse quadro, não está fácil encontrar um modelo que estimule investimentos na ampliação ou em novos portos, com tarifas que não tirem a competitividade das exportações brasileiras ou onerem as importações de insumos e componentes essenciais à cadeia produtiva do país. Aparentemente, empreiteiras que estão entrando no setor e os operadores já instalados têm posições bem divergentes em relação aos caminhos a seguir

Esforço na infraestrutura

Raul Velloso, especialista em contas públicas, não acredita que a economia brasileira consiga ampliar consideravelmente, como um todo, os investimentos necessários para o país crescer de forma sustentável nos próximos anos. Por isso, ele sugere uma concentração de investimentos na infraestrutura. Isso daria um ganho de produtividade para todos, pelo aumento de eficiência, capaz de compensar essa dificuldade de destravar o investimento nos demais segmentos.

Ao que parece, o governo federal tem hoje um diagnóstico semelhante.

Mensalão

No mercado o pessoal anda vibrando com o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). Dizem que o país ganhou pontos institucionalmente a partir do momento em que ficou claro que o rei não pode mandar cortar cabeça de juízes. E que os juízes têm autoridade para mandar cortar a cabeça do rei.

Esperança - AÉCIO NEVES

FOLHA DE SP - 24/09


Já se vão mais de quatro décadas desde que o peito do lavrador João Boiadeiro recebeu o primeiro coração transplantado no Brasil, pelas mãos do cirurgião Euryclides de Jesus Zerbini, no Hospital das Clínicas, na cidade de São Paulo.
O paciente viveu 28 dias com o novo órgão e inaugurou um caminho de esperança na vida de famílias em todo o país. É uma história marcante para ser lembrada na data de hoje, em que iniciamos a semana em que se comemora o Dia Mundial da Doação de Órgãos.
Há muito tempo que o Brasil é destaque internacional e possui um dos maiores programas públicos de transplantes de órgãos e tecidos do mundo. Foi decisiva para esse avanço a participação do Sistema Único de Saúde (SUS), que hoje financia a maior parte das cirurgias realizadas no país.
O grande salto estrutural, como tantos outros, em campos diversos, se deu durante o governo do PSDB, com a edição da Lei dos Transplantes e sua regulamentação, em 1997.
Na ocasião, firmaram-se os princípios e as diretrizes, como o consentimento e a gratuidade da doação, estabelecendo-se direitos e garantias para receptores, doadores e suas famílias.
Em seguida, o Ministério da Saúde, em particular na gestão de José Serra, dedicou-se com afinco à organização do Sistema Nacional de Transplantes, à implantação de listas únicas de receptores e à criação de centrais estaduais de transplantes.
Em 1997, os transplantes não superavam 4 mil por ano. Em 2011, foram mais de 23 mil cirurgias. Apesar dessa manifestação de solidariedade, o número ainda é insuficiente.
O desafio continua sendo o baixo número de doadores. Em 2011, pela primeira vez, o Brasil chegou ao índice de 11,4 doadores por milhão de habitantes. A meta é alcançar 15 por milhão em 2015.
Dados da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos mostram que quase a metade de 1.915 famílias consultadas por equipes médicas em 2011 não autorizou doação.
A maior parte das negativas se baseia no fato de a família não saber se a pessoa concordava com a doação. Na dúvida, prevalece a recusa.
Diante desse cenário, precisam ser multiplicadas ações para que mais brasileiros aceitem e declarem sua opção como doadores. Esse tipo de iniciativa cabe tanto à administração pública -federal, estadual, municipal- quanto à sociedade civil.
Uma solução criativa recente foi a parceria entre o Ministério da Saúde e o Facebook, permitindo ao usuário da rede social fazer sua opção publicamente. Embora de alcance jurídico limitado, há um efeito simbólico evidente.
O transplante é a única alternativa para cerca de 20 mil pacientes por ano, no país, portadores de doenças graves. Eu sou doador. E você?

Só com censura - J.R. GUZZO

REVISTA VEJA 


Para o seu próprio sossego pessoal, o ex-pre-sidente Lula, seus fãs mais extremados e os chefes do PT deveriam pôr na cabeça, o mais rápido possível, um fato que está acima de qualquer discussão: só existe um meio que realmente funciona, não mais que um, para governos mandarem na imprensa, e esse meio se chama censura. Infelizmente para todos eles, essa é uma arma de uso privativo das ditaduras — e nem Lula, nem o PT, nem os “movimentos sociais” que imaginam comandar têm qualquer possibilidade concreta de criar uma ditadura no Brasil de hoje. Podem, no fundo da alma, namorar a ideia. Mas não podem, na vida real, casar com ela. Só perdem seu tempo, portanto, e se estressam à toa, quando ficam falando que a mídia brasileira é um lixo a serviço das “elites”; há dez anos não mudam de ideia e não mudam de assunto. Bobagem. O que querem mesmo é impedir que esta revista, por exemplo, publique reportagens como a matéria de capa de sua última edição, com as declarações de Marcos Valério sobre o envolvimento direto de Lula no mensalão. Ficam quietos, porque têm medo de que sejam publicadas as fitas gravadas com tudo aquilo que ele disse, e as coisas piorem ainda mais. Mas o seu único objetivo real é este: eliminar as informações que desejam esconder.

Até agora, o plano mais ambicioso que lhes ocorreu para chegar aonde querem foi propor algo que chamam de “controle social” da mídia; não conseguem explicar bem o que seria isso na prática, mas nem é preciso que expliquem. O problema do PT, nessa história toda, é simples: “controle social” é algo que não existe no mundo dos fatos. Na vida como ela é, só têm controle verdadeiro sobre um órgão de imprensa os seus proprietários ou, então, o departamento de censura. Todo o resto é pura tapeação. Mas é isso, exatamente, que o PT propõe. Já foi feita, de 2003 para cá, uma boa meia dúzia de tentativas para armar o tal controle, primeiro com projetos de lei que morreram antes de nascer, depois com “audiências públicas” e outras esquisitices. Não saiu, até agora, um único coelho desse mato. Falou-se também da “mobilização de setores populares” para pressionar a mídia, mas não se conseguiu mobilizar ninguém. Manifestações de massa, para o PT de hoje, exigem ônibus fretados, lanches grátis, patrocínio de alguma estatal — e, francamente, não é assim que se faz uma revolução. Muito dinheiro do Erário tem sido gasto na compra do apoio de uma parte da imprensa, através de verbas publicitárias e outros tipos de ajuda; o problema, aí, é que o governo não consegue comprar os veículos que têm mais público. Foram criadas, também, brigadas de “blogueiros” que recebem uma espécie de “mensalinho” para falar a favor do governo e contra quem faz críticas a ele; ninguém parece prestar atenção no que dizem. Inventou-se, ainda, uma “TV Brasil”, emissora que serve para apoiar as autoridades e é sustentada com dinheiro público em estado puro. Em cinco anos de funcionamento, sua audiência continua vizinha do zero; a esta altura, talvez tenha mais funcionários do que telespectadores. A questão, em todos esses casos, é que imprensa a favor não adianta nada — o que interessa a quem manda é não ter imprensa contra. Elogios não salvaram uma única cabeça, entre os doze ministros que a presidente Dilma Rousseff botou na rua até agora, nos casos em que foram denunciados por corrupção no noticiário. Não têm resolvido nada no julgamento do mensalão, também revelado integralmente pelo trabalho da imprensa; o STF vem sendo o flagelo de Deus para os réus, triturados um após o outro com sentenças de condenação.

Ditaduras entendem muito bem como se controla a imprensa. Não desejam aplausos: a única coisa que lhes importa é cortar tudo aquilo que não querem que seja publicado. Não podendo fazer isso, o PT fica na gritaria. Ainda há pouco, o presidente nacional do partido, deputado Rui Falcão, disse que a “mídia conservadora” é instrumento de uma “elite suja e reacionária”, e fez uma ameaça: “Não mexam com o PT”. E se mexerem — ele vai fazer o quê? As coisas que o deputado diz não chegam a obter a nota mínima necessária para ser levadas a sério: não há exemplo na história de situações em que a imprensa tenha mudado de linha por causa de dis-curseira desse tipo, ameaças vazias ou “pressões da sociedade”. Veículos independentes não têm medo de insultos, “setores populares” ou líderes políticos com popularidade de 80%; o que lhes quebra a espinha é a força armada, e só ela. É melhor, então, o PT segurar a ansiedade.

O fim da rede social - LÚCIA GUIMARÃES


O Estado de S.Paulo - 24/09


A falta de credibilidade da mídia jornalística bateu outro recorde nos Estados Unidos. Uma pesquisa do Instituto Gallup revela que 60% dos americanos têm pouca ou nenhuma confiança na informação transmitida pela mídia. Não é surpresa que republicanos constituem uma parcela expressiva dos desconfiados, uma vez que o bordão populista do partido demoniza jornalistas como esquerdistas bebedores de Romanée Conti.

Mas o número que me assusta não é o da divisão ideológica e sim o geracional. Apenas 39% dos americanos disseram que estão acompanhando regularmente o noticiário sobre a campanha presidencial, uma queda de 5% em relação a 2008, uma campanha mais passional, sim, com o ineditismo do primeiro candidato negro da história. Mas, este ano, o orçamento da propaganda eleitoral é muito mais alto. A questão é, quem está assistindo aos anúncios da campanha?

Outro número sinaliza a mudança demográfica: As pesquisas de opinião que usam celulares e interação ao vivo com o eleitor dão vantagem maior a Barack Obama. Um terço dos domicílios americanos não possuem telefone fixo.

Agora, o número para arrepiar: somente 11.5% dos americanos assistem à TV aberta em tempo real. Sei que o Brasil ainda está distante deste cenário e que a nossa banda larga, tão real quanto Papai Noel, ainda não permite a migração dos hábitos de assistir ao vídeo de maneira tão radical. Além disso, só 1/3 dos brasileiros têm acesso à banda larga em casa.

A publicidade online ainda está longe de financiar os custos de TV de alta qualidade, seja nas minisséries brasileiras ou no drama refinado exibido pelas redes de cabo aqui, como HBO e Showtime. Por isso, a juventude que abandona a TV aberta ou a cabo é má notícia para todos. A TV americana é hoje uma usina de ideias muito mais vibrante do que Hollywood.

Mas, voltemos à noção de que 39%, menos da metade deste país, onde o voto não é obrigatório, acompanham regularmente a eleição presidencial. Com a permissão de todos que prestigiam esta coluna com paciência e comentários (Lucia.Guimaraes@estadao.com.br), eu me dirijo agora a você, o leitor que não passou dos 25 anos. Você poderia ser meu filho ou minha filha. Perdoe o tom maternal, mas, estarei certa se concluir que você não assina um jornal impresso? Que você não organiza a sua noite em torno do horário de um telejornal em rede? Se você ainda não tem capital para assinar a Veja ou a Época, disputa a leitura do exemplar que seus pais recebem?

Sim, você passa muito mais tempo online do que seus pais passam lendo jornal, ouvindo rádio ou assistindo ao noticiário pela TV. Quantas vezes você clicou num vídeo da guerra civil em curso na Síria, na última semana? Uma vez que, na noite em que Bill Clinton fez seu famoso discurso na Convenção Democrata, você estava malhando ou tomando uma cerveja no Baixo Gávea (perdoem a carioca, não sei onde tomar cerveja em São Paulo), você clicou na versão completa, de 50 minutos, quando voltou para casa? A resposta, adivinho sem a menor condescendência, é "não". Veja, tanto quanto você, eu fico uma pilha de nervos a cada nova cena de crianças sírias gritando de dor. Prefiro clicar no vídeo do Grizzly Bear (a ótima banda do Brooklyn, não a espécie ameaçada de extinção que frequenta o National Geographic Channel).

Mas a diferença é que a minha juventude não foi marcada pela escolha. A mídia de massa em rede, o jornal toda manhã na porta de casa, faziam a curadoria para mim e me impediam de ignorar a guerra civil na Síria, uma das grandes calamidades desta segunda década do milênio. A falta de escolha aqui não é sinônimo de opressão. Foi libertadora porque me expôs a uma realidade muito mais complexa do que a acessada pelo adolescente da solidão de seu quarto.

É impossível dissociar o crash de 2008, que resultou em tanto trauma econômico mundial, da maneira customizada de consumir realidade. Basta ver o número de livros que apuraram a extensão da corrupção na elite financeira. Eles são, na prática, reportagens tardias sobre o que se passava na nossa frente.

Então, leitor-que-poderia-ser-meu-filho(a): conto com seu contemporâneo americano para reeleger Barack Obama. Mas, se nós, apesar da diferença de idade, podemos nos esbarrar num concerto do Grizzly Bear, como vamos nos encontrar naquela outra praça? Falo da praça da história, da qual o jornalismo é a primeira versão.

Escândalo olímpico - EDGAR ALVES

FOLHA DE SP - 24/09


Comitê Rio 2016 diz ser pautado pela transparência, mas omite detalhes cruciais sobre caso de desvio de dados



O COMITÊ Organizador dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos Rio 2016, comandado por Carlos Arthur Nuzman e que tem Leonardo Gryner como diretor-geral, afirmou em nota oficial que é pautado pelos princípios da ética, responsabilidade e transparência. Entretanto, omitiu por cerca de 40 dias o envolvimento de dez de seus funcionários no desvio de informações do Comitê Organizador dos Jogos de Londres 2012 (Locog, na sigla em inglês).

Os membros da organização brasileira se esquivam de vir a público para dar esclarecimentos mais precisos de como se deu o ato criminoso. Aliás, é bom lembrar que o caso só foi revelado pela atitude do colunista da Folha Juca Kfouri, que obteve as informações e as colocou em seu blog no UOL.

Os meios de comunicação apontam que dez funcionários do Rio 2016 foram afastados, mas faltam detalhes cruciais, mantidos a sete chaves pela organização olímpica. O principal deles: quem teria dado a ordem para a operação criminosa? Quem teria dirigido a patética ação? Os dez envolvidos, que trabalhavam em áreas distintas, agiram por iniciativa própria numa tremenda coincidência? Ou foi uma operação organizada para colher informações de vários setores? Houve ou não risco de tais informações terem chegado às mãos de terceiros, que poderiam tentar vendê-las ao próprio Comitê Rio 2016? A falta de transparência num caso dessa natureza só faz alimentar dúvidas e suspeitas.

A mídia internacional noticiou a descoberta dos desvios, a primeira mancha na, até então, aparentemente segura e tranquila organização dos Jogos no Rio. O governo federal, que investe bilhões na Olimpíada, não se manifestou sobre o caso. E o Ministério do Esporte, sob direção de Aldo Rebelo, informou que não comentará. Incrível é que o mesmo Rebelo, durante os Jogos de Londres, não vacilou em palpitar, inclusive, em desempenho possível do time nacional no Rio. Mas lá, creio, tudo era festa, fantasia.

A curta nota do Comitê Rio 2016 basicamente confirmou a denúncia do blog e acrescentou que contou com 200 representantes em Londres por ocasião da Olimpíada e da Paraolimpíada, disputadas entre 27 de julho e 13 de setembro. "Os envolvidos foram identificados e as lideranças do Rio 2016 e do Locog agiram de forma conjunta, coordenada e rápida para reparar a situação. Todos os arquivos foram recuperados e devolvidos." E os envolvidos desligados. O crime foi identificado na Olimpíada, mas o grupo ficou em Londres até a conclusão dos trabalhos e só foi demitido no Brasil.

O encontro de novembro, no Rio, no qual haverá apresentações sobre a experiência de organização dos Jogos de Londres, já tem um tema desafiador: os riscos da transferência de conhecimento. Das informações ilegais, é claro! E do golpe brasileiro.

Contas & contos - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 24/09

Nessas duas semanas que antecedem as eleições municipais, o cidadão brasileiro ouvirá um mar de promessas difícil de cumprir. Basta ver as contas do ano que vem. Acabam de sair do forno as primeiras análises técnicas dos consultores do Legislativo a respeito do Orçamento de 2013. A versão preliminar do relatório da receita, por exemplo, indica que deputados e senadores terão dificuldades em encontrar uma forma de inflar recursos para atender mais emendas do Legislativo. Já na primeira linha do estudo divulgado essa semana, os analistas informam que a proposta orçamentária do ano que vem chegou ao Congresso com parâmetros desatualizados. Portanto, a peça orçamentária, vista sempre como uma obra de ficção, está pior do que as versões anteriores. Os técnicos informam que a peça do governo enviada a menos de um mês “subestima a inflação e superestima o crescimento” real da economia, tanto neste ano quanto no próximo.

Em relação a este ano, a proposta cita um crescimento de 3%. O próprio ministro da Fazenda, Guido Mantega, invariavelmente otimista, anunciou dia desses que o crescimento não chegará a 2%. No quesito inflação, o texto cita 4,7%. O índice já acumula 3,18 até agosto e 5,24% em 12 meses. Para 2013, o mercado projeta uma inflação de 5,5%.

As receitas também não estão lá aquela festa, embora o governo tenha a cada ano arrecadações recordes. Este ano, desde o decreto de programação financeira, editado em fevereiro, até julho, a estimativa da receita recuou R$ 23,2 bilhões. Para completar, as economias governamentais em 12 meses ficaram pouco acima de 1,8% do PIB e a situação dos estados e municípios vai mal. “Dos R$ 42,8 bilhões que lhes caberia economizar, acumularam apenas R$ 19,2 bilhões até julho.”

Enquanto os técnicos ainda avaliavam os dados disponíveis na proposta orçamentária, o mês de setembro passou trazendo novos fatores para essas contas. As medidas de concessões de energia, por exemplo, editadas depois que o texto do projeto de lei orçamentário desaguou no Congresso, representarão “um impacto negativo de R$ 3,3 bilhões, a serem acomodados no Orçamento”, dizem os técnicos.

E há outros fatores complicados, como algumas receitas colocadas ali sem que os congressistas levem a menor fé na arrecadação, caso da alienação de imóveis da União, com a qual o governo prevê arrecadar quase R$ 4 bilhões. Da parte das despesas, há aquelas que o governo certamente terá que não estão elencadas, como os já conhecidos R$ 3,9 bilhões para compensar estados exportadores, dentro da Lei Kandir. O Fundo de Previdência privada do Servidor público (Funpresp) também não está contemplado. Por essas e outras, leitor, muito cuidado com as promessas que você ouve no horário eleitoral. A depender do caixa da União, a maioria não vai sair do papel.

Enquanto isso, em Brasília…

O Senado tenta votar esta semana a indicação de Teori Zavascki para o Supremo Tribunal Federal. Há quem diga que o novo ministro terá muito o que contribuir na hora de definir as penas a serem aplicadas aos réus do mensalão. Vamos aguardar.

E em Nova York…

O mensalão e as eleições esquentam, enquanto a presidente Dilma Rousseff passa a semana focada na política externa e na economia. Segue sua pauta na Abertura da 67ª Assembleia Geral da ONU de olho no futuro. Afinal, se for candidata à reeleição, precisará de ter as contas em dia e a imagem altiva, de quem está acima do mensalão ou do clima exacerbado deste pleito municipal. Mas há quem diga que ela ainda pisará nos palanques neste primeiro turno, especialmente em São Paulo e Belo Horizonte, onde o PT está em franca desvantagem nas pesquisas.

Essas aparições, a depender da agenda, conforme já dissemos aqui, será do tipo “passa lá em casa, mas não dá o endereço”, ou seja, apenas para constar, sem muita repercussão ou peso na visão do eleitor. Basta ver que, no passado, Lula presidente não conseguiu transferir votos para eleger prefeitos na maioria das capitais. Sinal de que, quando se trata da sua cidade, o eleitor dispensa padrinhos que não estejam diretamente vinculados ao seu dia a dia. Nesse sentido, Dilma, por mais que seja mineira, não é tida como alguém hoje vinculada ao dia a dia dos habitantes de São Paulo ou mesmo de Belo Horizonte.

A esquerda venceu? - RENATO JANINE RIBEIRO


Valor Econômico - 24/09


A esquerda venceu? A esquerda perdeu? Um balanço das últimas décadas permite argumentar numa direção e noutra. Vou propor uma distinção, para sugerir que a esquerda política perdeu, enquanto a esquerda que chamarei de comportamental venceu.

As mudanças na vida pessoal - o que hoje é denominado "comportamento", termo que uso aqui por simples comodidade - foram enormes no último meio século. Na década de 1960, homossexuais eram mal vistos em quase todo o Ocidente, mulheres eram cidadãs de segunda classe, negros muitas vezes não eram sequer respeitados como cidadãos e, para resumir, quem adotasse uma postura não convencional em face da vida enfrentava dificuldades que podiam ser grandes. Os 50 anos transcorridos desde então conheceram uma mudança nas atitudes das pessoas sem precedentes na história do mundo.

Boa parte dessas bandeiras foi desfraldada pela esquerda. Ela foi radical contra o racismo. É verdade que não foi unânime em favor das mulheres nem dos homossexuais, mas seguramente a maior parte da esquerda apoiou as causas delas e deles; e certamente a proporção de direitistas que defenderam a emancipação feminina e o respeito à orientação homossexual foi bem inferior à proporção de esquerdistas assumindo tais valores. Sem dúvida, havia pessoas à esquerda que achavam que homossexualismo era vadiagem, mas eram menos numerosas do que os direitistas que o condenavam como pecado. Sem dúvida havia gente à esquerda que considerava a defesa dos direitos das mulheres como um desvio em relação ao conflito principal, que seria a luta entre capital e trabalho - mas isso porque esperava que a vitória do socialismo traria, automaticamente, a solução dos problemas das mulheres. Isso, claro que em linhas gerais.

Ela mudou mais o comportamento do que a política

Hoje, essas causas venceram, não totalmente mas em larga medida. Continua havendo crimes de ódio contra homossexuais. O machismo está presente em nossa sociedade e em outras. Fora do Ocidente expandido, a situação é sem dúvida pior, mas pelo menos nesta parte do mundo a esquerda que chamei de comportamental conseguiu emplacar várias de suas causas. Mas ela venceu justamente porque essas questões deixaram de ser de esquerda e se tornaram universais.

Talvez seja por isso que no Brasil, enquanto a sociedade politizada se cindiu de maneira talvez irremediável entre PT e PSDB, esses dois agrupamentos coincidem o mais das vezes na defesa dos direitos humanos. Alguns colunistas de jornal que atacam com veemência o governo petista estão mais perto dele na defesa do meio ambiente, dos direitos das mulheres e dos homossexuais. Essas causas nasceram na esquerda, mas se expandiram. É verdade que os agrupamentos políticos de base religiosa não seguem esse caminho, e que - sobretudo nos Estados Unidos - eles obtêm uma votação preocupante. Também é verdade que em nosso país o segundo turno de 2010 foi sequestrado por uma discussão arcaica sobre o aborto, o que o converteu na disputa de ideias mais rasa de nossa história recente. Mas na postura política mais civilizada temos a vitória de ideais que, aliás, foram de esquerda mais no sentido de uma sensibilidade ampla do que no de pertencerem a um partido ou outro. Porque os temas que enumerei nunca foram propriamente partidários. O único partido minimamente importante que já se organizou em torno de uma dessas causas foi o Verde, que só chefiou um governo nacional uma vez - dez meses na Letônia.

Quantos lembram como começou Maio de 1968, na França? O ministro da Juventude do general De Gaulle foi inaugurar uma piscina em Nanterre, em 8 de janeiro daquele ano. Um estudante alemão, Daniel Cohn-Bendit, interpelou-o. Disse que fazer piscinas era uma aposta nazista para reprimir sexualmente os estudantes. Tudo começou aí. Cohn-Bendit não estava errado, mas o próprio fato de que essa frase chocará ou fará rir nove em dez leitores mostra que hoje as aulas de educação física já não são cogitadas para esgotar a energia de natureza sexual dos jovens. Hoje, ter uma vida sexual ativa não é mais uma causa rebelde ou revolucionária.

Para a esquerda política, porém, as coisas são bem diferentes. É verdade que em toda a América Latina é mais fácil ser de esquerda hoje do que nunca no passado. Os governos importantes da América do Sul, salvo Chile e Colômbia, são de esquerda. Políticas de conteúdo social se tornaram irrenunciáveis. Sindicatos e movimentos sociais não são mais reprimidos a bala, pelo menos não como praxe. Todos esses são avanços da esquerda, mas por outro lado ninguém hoje disputa seriamente o poder propondo o fim da propriedade privada dos meios de produção.

O projeto de uma sociedade socialista sumiu ou pelo menos recuou. Em 2008, quando o mundo da utopia neoliberal faliu, acarretando um desastre econômico e social, não havia proposta alternativa pela esquerda. Não tinha havido uma crítica em regra da teoria marxista, que levasse a um novo projeto passível de empolgar as massas. Não tinha havido uma atualização das propostas radicais, que, com frequência, são apenas as mais antigas. Para os pobres traz resultados mais imediatos a política de cooptação de seus movimentos pelo capitalismo, iniciada por Lula, do que os ideais puros e duros de um PSOL. Quando os grandes partidos do centro para a esquerda, como o socialista francês ou o PT, aceitam princípios do neoliberalismo, então a esquerda política vive um momento de eclipse. Para sair dele, precisará propor uma nova sociedade, em escala macro, mas como fazer isso? Ela avançou no microssocial, mas hoje não se sabe como retomar seus sonhos para a sociedade como um todo.

Desliguem as câmeras no STF já - GUILHERME FIÚZA


REVISTA ÉPOCA

O julgamento do mensalão está pondo a democracia em risco, porque está todo mundo vendo. O alerta do se­cretário de comunicação do PT, André Vargas, deputado pelo Paraná, é preocupante. Ele denuncia as transmissões ao vivo do Supremo Tribunal Federal como um perigo para as instituições, as pessoas e os partidos. Esse negócio de ficar mostrando as coisas como elas são, na hora em que aconte­cem, ainda vai dar problema.

Tudo era muito melhor antes de Roberto Jefferson abrir a janela e deixar a luz entrar. Na penumbra, sem ninguém de fora ver nada, a democracia estava mais protegida. Os negócios patrióticos que corriam de lá para cá pelo valerioduto teriam prosperado, e certamente haveriam pula­do da casa dos milhões para a dos bilhões. No que a TV mostrou e a imprensa publicou, aquele promissor proje­to nacional escorreu pelo ralo. Um prejuízo incalculável.

André Vargas diz que o julgamento no STF virou “quase um Big Brother da Justiça”. Com a habilidade de comuni­cador que fatalmente tem um secretário de comunicação, ele sugere que aquilo que se passa na corte suprema do país é uma palhaçada. Sua imagem nos permite imaginar que, a qualquer momento, os juizes tirarão suas capas e mergulharão de sunga na piscina, exibindo seus músculos, seus planos para a festinha de logo mais e suas intrigas para jogar o colega ao lado no paredão.

É uma sólida argumentação. Realmente, fora do circo, as palhaçadas só deveriam ocorrer entre quatro paredes. Sem transmissão ao vivo. A palhaçada da cúpula do PT, com Marcos Valério transferindo dinheiro do Estado para o partido, não tinha nada de vir a público. Era um assunto privado deles, ninguém tinha nada com isso. E o fato de a operação envolver dinheiro do povo não tinha o menor problema. Eles tinham sido eleitos por esse povo para fa­zer o que sabiam fazer. Estavam, portanto, cumprindo seu compromisso democrático. Tanto que, depois disso, foram eleitos novamente duas vezes para dirigir o país. Cada povo tem os palhaços que merece.

Só não fica bem, como disse André Vargas, botar essas coisas na televisão. Se a família está jantando, a comida pode não cair bem. E um risco para a democracia e para o estômago dos brasileiros. Para que viver perigosamente?

Democratas deste Brasil grande, interrompam ime­diatamente a transmissão das sessões do Supremo. De­tenham enquanto é tempo esse atentado às instituições e às pessoas de bem. Não é preciso tanta pressa para saber o que se passa no Tribunal. Vamos deixar as coisas se acalmar, a febre baixar e o povo se distrair com outra coisa. Papai Noel não demora, depois tem o Carnaval, e aí começa a contagem regressiva para a Copa do Mun­do no Brasil. Ninguém vai querer que este país sedie o maior evento do mundo com sua democracia em risco. Desliguem as câmeras no STF já!

Outro brasileiro que subiu o tom em defesa da de­mocracia foi o senador Jorge Vianna, do PT do Acre. Ele era um político moderado, equilibrado, conhecido pela sensatez. Mas tudo tem limite. Depois que o nome de Luiz Inácio da Silva começou a circular no Supremo, e que declarações atribuídas a Marcos Valério colocaram o ex-presidente no topo da palhaçada, o senador mansinho virou bicho. Assim como seu colega André Vargas, pôs o dedo na ferida: isso é um golpe da elite preconceituosa.
Para os não iniciados, é bom esclare­cer: “elite”, no dicionário do PT, é um ter­mo figurativo muito importante para os ladrões do bem, que os mantém na condição de milionários oprimidos. Eles têm o poder - mas “elite” são os outros.

É um conceito que funciona bem há bastante tempo, e em time que está ganhando não se mexe. A outra palavra- chave desse dicionário é “preconceito”. Luiz Inácio da Silva é o filho do Brasil, vítima da “elite”. Se você tiver “preconceito” contra a montagem de um governo qua­drilheiro, esqueça. Você estará sempre discriminando o pobre homem bom. Não importa quantos valeriodutos atravessem a biografia dele.

Como já decretara o nosso Delúbio, o mensalão é um gol­pe da direita contra o governo popular. Jorge Vianna, André Vargas e grande elenco petista estão dizendo: pelo amor de Deus, continuem acreditando nisso, senão estamos fritos.

Buscando a excelência - LYA LUFT


REVISTA VEJA


"A mediocridade reina, assustadora, implacável e persistente. Autoridades desinformadas, alunos que saem do ensino médio semianalfabetos e assim entram nas universidades, que aos poucos vão se tornando reduto de pobreza intelectual"



Quando falo em excelência, não me refiro a ser o melhor de todos, ideia que me parece arrogante e tola. Nada pior do que um arrogante bobo, o tipo que chega a uma reunião, seja festa, seja trabalho, e já começa achando todos os demais idiotas. Nada mais patético do que aquele que se pensa ou se deseja sempre o primeirão da classe, da turma, do trabalho, do bairro, do mundo, quem sabe? Talento e discrição fazem uma combinação ótima.

Então, excelência para mim significa tentar ser bom no que se faz, e no que se é. Um ser humano decente, solidário, afetuoso, respeitoso, digno, esperançoso sem ser tolo, idealista sem ser alienado, produtivo sem ser viciado em trabalho. E, no trabalho, dar o melhor de si sem sacrificar a vida, a família, a alegria, de que andamos tão carentes, embora os trios elétricos desfilem e as baladas varem a madrugada.

Estamos carentes de excelência. A mediocridade reina, assustadora, implacável e persistente. Autoridades, altos cargos, líderes, em boa parte desinformados, desinteressados, incultos lamentáveis. Alunos que saem do ensino médio semianalfabetos e assim entram nas universidades, que aos poucos - refiro-me às públicas - vão se tornando reduto de pobreza intelectual. As infelizes cotas, contra as quais tenho escrito e às quais me oponho desde sempre, servem magnificamente para alcançarmos este objetivo: a mediocrização também do ensino superior. Alunos que não conseguem raciocinar porque não lhes foi ensinado, numa educação de brincadeirinha. E, porque não sabem ler nem escrever direito e com naturalidade, não conseguem expor em letra ou fala seu pensamento truncado e pobre. Professores que, mal pagos, mal estimulados, são mal preparados, desanimado e exaustos ou desinteressados. Atenção: há para tudo isso grandes e animadoras exceções, mas são exceções, tanto escolas quanto alunos e mestres. O quadro geral é entristecedor.

E as cotas roubam a dignidade daqueles que deveriam ter acesso ao ensino superior por mérito, porque o governo lhes tivesse dado uma ótima escola pública e bolsas excelentes: não porque, sendo incapazes e despreparados, precisassem desse empurrão. Meu conceito serve para cotas raciais também: não é pela raça ou cor, sobretudo autodeclarada, que um jovem deve conseguir diploma superior, mas por seu esforço e capacidade, porque teve ótimos 1° e 2° graus em escola pública e/ou bolsas que o ampararam. Além do mais, as bolsas por raça ou cor são altamente discriminatórias: ou teriam de ser dadas a filhos de imigrantes japoneses, alemães, italianos, que todos sofreram grandemente chegando aqui, e muitos continuam precisando de esforços inauditos para mandar um filho à universidade.

Em suma, parece que trabalhamos para facilitar as coisas aos jovens, em lugar de educá-los com e para o trabalho, zelo, esforço, busca de mérito, uso de sua própria capacidade e talento, já entre as crianças. O ensino nas últimas décadas aprimorou-se em fazer os pequenos aprender brincando. Isso pode ser bom para os bem pequenos, mas já na escola elementar, em seus primeiros anos, é bom alertar, com afeto e alegria, para o fato de que a vida não é só brincadeira, que lazer e divertimento são necessários até à saúde, mas que escola é também preparação para uma vida profissional futura, na qual haverá disciplina e limites - que aliás deveriam existir em casa, ainda que amorosos.

Muitos dirão que não estou sendo simpática. Não escrevo para ser agradável, mas para partilhar com meus leitores preocupações sobre este país com suas maravilhas e suas mazelas, num momento fundamental em que, em meio a greves, justas ou desatinadas, projetos grandiosos e seguidamente vãos - do improviso e da incompetência ou ingenuidade, ou desinformação -,se delineia com grande inteligência e precisão a possibilidade de serem punidos aqueles que não apenas prejudicaram monetariamente o país, mas corroeram sua moral, e a dignidade de milhões de brasileiros. Está sendo um momento de excelência que nos devolve ânimo e esperança.

Contra os comissários da ignorância - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 24/09


O que é conservadorismo? Tratar o pensamento político conservador ("liberal-conservative") como boçalidade da classe média é filosofia de gente que tem medo de debater ideias e gosta de séquitos babões, e não de alunos.

Proponho a leitura de "Conservative Reader" (uma antologia excelente de textos clássicos), organizada pelo filósofo Russel Kirk. Segundo Kirk, o termo começou a ser usado na França pós-revolucionária.

Edmund Burke, autor de "Reflexões sobre a Revolução na França" (ed. UnB, esgotado), no século 18, pai da tradição conservadora, nunca usou o termo. Tampouco outros três pensadores, também ancestrais da tradição, os escoceses David Hume e Adam Smith, ambos do século 18, e o francês Alexis de Tocqueville, do século 19.

Sobre este, vale elogiar o lançamento pela Record de sua biografia, "Alexis de Tocqueville: O Profeta da Democracia", de Hugh Brogan.

Ainda que correta a relação com a Revolução Francesa, a tradição "liberal-conservative" não é apenas reativa. Adam Smith, autor do colossal "Riqueza das Nações", fundou a ideia de "free market society", central na posição "liberal-conservative". Não existe liberdade individual e política sem liberdade de mercado na experiência histórica material.

A historiadora conservadora Gertrude Himmelfarb, no seu essencial "Os Caminhos para a Modernidade" (ed. É Realizações), dá outra descrição para a gênese da oposição "conservador x progressista" na modernidade.

Enquanto os britânicos se preocupavam em pensar uma "sociologia das virtudes" e os americanos, uma "política da liberdade", inaugurando a moderna ciência política de fato, os franceses deliravam com uma razão descolada da realidade e que pretendia "refazer" o mundo como ela achava que devia ser e, com isso, fundaram a falsa ciência política, a da esquerda. Segundo Himmelfarb, uma "ideologia da razão".

O pensamento conservador se caracteriza pela dúvida cética com relação às engenharias político-sociais herdeiras de Jean-Jacques Rousseau (a "ideologia da razão").

Marx nada mais é do que o rebento mais famoso desta herança que costuma "amar a humanidade, mas detestar seu semelhante" (Burke).

O resultado prático desse "amor abstrato" é a maior engenharia de morte que o mundo conheceu: as revoluções marxistas que ainda são levadas a sério por nossos comissários da ignorância que discutem conservadorismo na cozinha de suas casas para sua própria torcida.

Outro traço desta tradição é criar "teorias de gabinete" (Burke), que se caracterizam pelo seguinte: nos termos de David Hume ("Investigações sobre o Entendimento Humano e sobre os Princípios da Moral", ed. Unesp), o racionalismo político é idêntico ao fanatismo calvinista, e nesta posição a razão política delira se fingindo de redentora do mundo. Mundo este que na realidade abomina na sua forma concreta.

A dúvida conservadora é filha da mais pura tradição empirista britânica, ao passo que os comissários da ignorância são filhos dos delírios de Rousseau e de seus fanáticos.

No século 20, proponho a leitura de I. Berlin e M. Oakeshott. No primeiro, "Estudos sobre a Humanidade" (Companhia das Letras), a liberdade negativa, gerada a partir do movimento autônomo das pessoas, é a única verdadeira. A outra, a liberdade positiva (abstrata), decretada por tecnocratas do governo, só destrói a liberdade concreta.

Em Oakeshott, "Rationalism in Politics" (racionalismo na política), os conceitos de Hume de hábito e afeto voltam à tona como matrizes de política e moral, contra delírios violentos dos fanáticos da razão.

No 21, Thomas Sowell (contra os que dizem que conservadores americanos são sempre brancos babões), "Os Intelectuais e a Sociedade" (É Realizações), uma brilhante descrição do que são os comissários da ignorância operando na vida intelectual pública.

Conservador não é gente que quer que pobre se ferre, é gente que acha que pobre só para de se ferrar quando vive numa sociedade de mercado que gera emprego. Não existe partido "liberal-conservative" no Brasil, só esquerda fanática e corruptos de esquerda e de direita.

Fim em si - RUY CASTRO


FOLHA DE SP - 24/09


RIO DE JANEIRO - Outro dia, mandaram-me um vídeo de um cantor japonês. Comecei a assistir. Cantor, canção e vídeo eram anódinos. O japonês estava de perfil. De repente, com um corte, a câmera mostrou uma cantora japonesa, também de perfil e também anódina. Finalmente, a imagem revelou: os dois eram um só, metade homem, metade mulher, divididos pela vertical, e com as vozes correspondentes. Não faz muito, esses exotismos eram coisa do "Acredite se Quiser", de Ripley, que saía nos jornais.

Todo dia recebo vídeos com imagens de desertos mexicanos, estepes russas, trigais espanhóis, geleiras polares e praias brasileiras. São de tirar o fôlego. Sem falar dos edifícios, viadutos e ilhas artificiais de Dubai. No passado, essas imagens saltavam das páginas da "Manchete" para a vida real e nos faziam babar.

E os vídeos sobre animais? Não param de entrar. São galinhas chocando cachorros, gatas lambendo esquilos desamparados e cadelas amamentando porquinhos órfãos. Em outros, veem-se golfinhos, pinguins e babuínos mais expressivos que certos atores de novela. Tudo isso, além de filmes sobre a vida sexual dos pernilongos, é material que, até há pouco, só se via em revistas como "National Geographic Magazine" ou no canal Discovery.

E, naturalmente, não falta quem mande fotos de estrelas do cinema que cometeram o erro de envelhecer e embagulhar. Ou de gente famosa em poses indiscretas, como a alemã Angela Merkel tirando meleca, Obama, com os sapatos furados, ou Kate Middleton, de topless. Enfim, o tipo de assunto que costumava ser privilégio das revistas de escândalos.

Em 1885, o poeta Mallarmé dizia que tudo no mundo existia "para acabar em um livro". Hoje, pode-se dizer que o mundo existe para acabar na internet. Com a qual ficamos dispensados até de sair à rua para fazer parte dele.

"Dilmanomics" - VINICIUS MOTA

FOLHA DE SP - 24/09


Os salários têm de crescer mais devagar, e os lucros, mais depressa. Um candidato a presidente que anunciasse essa plataforma estaria cavando a própria cova. Pois eis o fundamento recôndito da “nova” política econômica do governo Dilma Rousseff, o “Dilmanomics”.

Não há outra saída para o Brasil elevar sua capacidade de crescimento, diga-se a favor da correção de rota ambicionada pela presidente. Juros mais baixos, dólar um pouco mais alto e despesa pública um tiquinho mais controlada fazem parte do pacote, o que é bom de todo jeito.

Já da tolerância com a inflação não se diga o mesmo. Ela “ajuda” a corroer o poder de compra dos salários, uma vitória de Pirro -com escassez de mão de obra, a competição no mercado de trabalho compensa, quando não reverte, aquela corrosão.

Mas é difícil combater a deterioração da capacidade de competir das empresas brasileiras causada pela inflação, ano após ano superior à de nações que fazem comércio conosco.

No plano da grande política, estamos diante de mais uma tentativa de aliança profunda entre o governo e o empresariado não financista. E de um distanciamento relativo entre governo e sindicatos.

Dilma, com seu DNA brizolista e seu desengajamento da guerra entre as correntes do PT, talvez seja mais talhada para a missão que Lula. Algo muda, entretanto, no movimento sindical, com segmentos escapando das mãos da CUT e da Força Sindical -e, assim, da cooptação estatal, antiga arma do varguismo reabilitada pelo PT no poder.

Num segundo momento, o alinhamento entre empresários e governo terá de ser qualificado e problematizado. Pois os lucros dos setores beneficiados pelo boom chinês há mais de uma década -o campo, a mina e o poço- terão de crescer mais devagar que o de outros segmentos produtivos. Isso se “Dilmanomics” for algo para levar a sério

Populismo, mensalão e voto - JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO


O Estado de S.Paulo - 24/09


Em 1947, Victor Nunes Leal defendeu a tese que viraria "Coronelismo, enxada e voto", o clássico sobre as relações de poder no Brasil rural. Nesses 65 anos, o país mudou e se tornou 85% urbano. Mas o livro de Nunes Leal continua útil para compreender as eleições municipais de hoje.

No prefácio à edição de 2012, o historiador José Murilo de Carvalho sintetiza a obra. Observa que o autor descreveu o coronelismo como um sistema que transcende o mandonismo local: "Tem a ver com a conexão entre município, Estado e União, entre coronéis, governadores e presidente, num jogo de coerção e cooptação exercido nacionalmente". Familiar?

Troquem-se coronéis por prefeitos e temos a descrição do papel do PMDB, com sua extensa rede municipal e volumosa base no Congresso. Do outro lado, o partido que exerça o poder central naquele momento, seja o PT ou o PSDB. Essas três siglas, por seu protagonismo, simbolizam as demais, que jogam o mesmo jogo, mas como coadjuvantes ou meros figurantes.

Nesta eleição, porém, há atores emergentes tentando roubar a cena, enquanto o trio principal troca de personagem. Cada vez mais parecido com o PMDB, o PT busca ampliar o número de prefeitos no interior do Brasil para, daqui a dois anos, formar a maior bancada da Câmara dos Deputados, suplantando o aliado. Mas os petistas sofrem um contragolpe do PSB nas capitais.

O partido de Eduardo Campos segue passos que o PT trilhou para ser protagonista. O PSB investe para ganhar capitais como Fortaleza e Recife, e manter Curitiba e Belo Horizonte. A aliança segue no Brasil profundo, mas nas grandes cidades o PSB se emancipou do PT.

Um resultado possível a sair das urnas é o PT, desgastado pelas condenações do mensalão, perder espaço nas capitais mas crescer no interior. Será mais um passo para virar o novo PMDB.

Isso tem tudo a ver com o sistema descrito por "Coronelismo, enxada e voto". Prefeituras do interior são mais dependentes de repasses federais e da liberação de verbas para emendas assistencialistas dos parlamentares. É o tal "jogo de coerção e cooptação" que explica o porquê de Lula e Dilma Rousseff terem mantido uma taxa de apoio na Câmara sempre acima de 80% dos votos dos deputados mesmo depois de o mensalão ter sido exposto.

O escândalo é insuficiente para explicar um governismo tão avassalador. Puni-lo é indispensável, mas reduzir o diagnóstico dos males da política brasileira a mesadas parlamentares é uma boa maneira de manter tudo como está e sempre foi. Mudanças de fachada são eficientes para conservar as estruturas intactas.

Desde 2001, a pirâmide da distribuição da renda no Brasil mudou, pela primeira vez ampliando a base e emagrecendo o topo. Isso se deveu primeiro ao fim da inflação e, depois, a aumentos reais sucessivos do salário mínimo. É o que se vê no gráfico que ilustra este texto. Essa mudança está na origem do novo consumismo e da popularidade de Lula e Dilma.

Isso ocorreu a despeito de um movimento inverso na distribuição de terras desde os tempos de "Coronelismo, enxada e voto". Enquanto as micropropriedades rurais são proporcionalmente menos numerosas e ocupam uma área menor do que em 1940, as grandes, impulsionadas por novas tecnologias e ganhos de escala, cresceram e dominaram praticamente a metade da área destinada à produção agropecuária do país. Ou seja, do título do livro, a única coisa que ficou obsoleta foi a enxada.

NOVA VOZ - MÔNICA BERGAMO


FOLHA DE SP - 24/09


Eliane Brum, 46, fez carreira como jornalista, mas foi só escrever seu primeiro romance, "Uma Duas", que já virou finalista do Prêmio SP de Literatura, que acontece hoje no Museu da Língua Portuguesa. "Agora, essa voz nova, que é a da ficção, faz parte do que eu sou. Os monstros acordaram em mim, e é com a ficção que impeço que eles me comam por dentro."

CASA PRÓPRIA
Trabalhar como empregada doméstica não é mais a principal opção das mulheres brasileiras. Os números da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) revelam que esse contingente caiu de 6,7 milhões há três anos para 6,2 milhões no ano passado.

CASA PRÓPRIA 2
Em percentuais, as empregadas domésticas, em 2009, eram 17% do total de 39,4 milhões de trabalhadoras, base que se manteve estável. Em 2011, passaram a ser 15,7%.

VENDE-SE
Pela primeira vez, o percentual de domésticas não ficou no topo do ranking -mas em terceiro lugar. As campeãs agora são as comerciárias, que saltaram de 6,5 milhões em 2009 (16,5% do total) para 7 milhões (17,6%). Em segundo, o grupo ocupado em educação, saúde e serviço social. "Isso indica qualificação e também pode ser atribuído a políticas públicas", diz a ministra Eleonora Menicucci, das Mulheres.

TIO DA AMÉRICA
A Estre, maior empresa de gestão ambiental do país, está comprando participação em uma das maiores companhias americanas do ramo. Por US$ 100 milhões, ela está adquirindo 11% da Star Atlantic.

VASSOURA
Com 6.000 funcionários, a empresa americana é a quarta dos Estados Unidos com atuação na coleta de resíduos em lugares como Flórida, Geórgia e Chicago. A ambição da companhia brasileira é aumentar a parceria no longo prazo.

CLIMA
Questionado sobre a possibilidade de eventual condenação de José Dirceu (PT-SP) resultar em prisão, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) que tem sido um dos mais rigorosos no julgamento do mensalão responde: "Não [ocorrerá] necessariamente".

PÉ NO FREIO
Emerson Fittipaldi adiado: a exposição que celebraria os 40 anos de carreira do piloto, em novembro, no Sesi-SP, não conseguiu patrocínio e terá que ser adiada para 2013. O curador Marcello Dantas diz que os produtores da mostra só captaram até agora a metade dos R$ 2 milhões necessários.

DEIXA QUE EU PARO
A Prefeitura de São Paulo, que há três meses começou a exigir o uso de talões de estacionamento para motoristas de "valet", vistoriou metade dos 4.500 restaurantes filiados à Associação Nacional dos Restaurantes. Multou 11% deles.

É PÂNICO OU NADA
Eduardo Sterblitch, do "Pânico", diz que, se sair do programa, "é provável que deixe de fazer TV". "Nunca mais vou ter liberdade criativa desse jeito, então acho que ia preferir atuar só no teatro", diz ele. Nas últimas semanas circulou a informação de que ele poderia trocar a atração pela TV Globo.

CONTÉM GLÚTEN
E Sabrina Sato manteve só por três dias uma dieta sem glúten. "Trabalho demais, não dá pra ficar achando pão especial em qualquer lugar."

GAL LONGE DA COSTA
Gal Costa, que se mudou para SP neste ano, diz estar "adorando". "A cidade tem tanta coisa pra fazer que te puxa pra rua. E também para o trabalho, é claro."

FAIXAS NA FAIXA
Os shows no Studio SP e no Studio RJ às quintas serão gratuitos. O público poderá doar dinheiro numa caixinha. A quantia será dividida entre os artistas que tocarem no projeto, chamado Quanto Vale o Show.

SUPLICY 'CONVOCA' RUSSOMANO
O senador Eduardo Suplicy (PT) bem que tentou convencer Celso Russomanno (PRB) a ir ao debate com candidatos a prefeito promovido pela Arquidiocese de São Paulo, na quinta. Chegou a telefonar para o ausente minutos antes de o evento começar, da primeira fila do teatro Fernando Torres, no Tatuapé. "Ouvi a voz dele, mas a ligação caiu", contou à coluna. Decidiu, então, enviar mensagem pedindo que ele viesse "mesmo que atrasado", em "respeito à democracia" (veja acima). Falhou de novo: não havia rede no local. Sem contornar polêmicas envolvendo a Igreja Católica e dirigente de sua campanha ligado à Igreja Universal, Russomanno não apareceu por lá.

O PAPA É NA OCA
O cardeal dom Odilo Scherer e o padre Juarez foram à abertura da mostra "Esplendores do Vaticano", que leva arte sacra à Oca. O ex-governador Alberto Goldman também esteve no evento.

CURTO-CIRCUITO

A escola de samba Mocidade Alegre celebra 45 anos com uma missa afro. Amanhã às 20h, na quadra da Morada do Samba.

Andrea Matarazzo lança o livro "São Paulo", com fotos de seu iPhone. Hoje, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional, às 19h.

A africana Leymah Gbowee, vencedora do Nobel da Paz em 2011, contará no seminário Mulheres Reais que Transformam sobre a greve de sexo que ajudou a pôr fim à Segunda Guerra Civil da Libéria, em 2003. O evento acontece no dia 30 de outubro, no Rio.

Miau! Miau! Miau! - RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 24/09


“Sou inocente e não cometi nenhum crime. Fui só presidente do PT”

JOSÉ GENOINO, um dos réus do mensalão



Tem rabo de gato. Focinho de gato. Olhos de gato. Pelo de gato. Mia como um gato. Mas está longe de ser um gato, segundo a malta dos que nada veem demais na escolha em tempo recorde do ministro Teori Zavascki para a vaga do ministro Cesar Peluzo no Supremo Tribunal Federal (STF). E também na pressa com que estão sendo tomadas as providências para que ele assuma o cargo o mais rapidamente possível.

PORTA-VOZES de Dilma juram que ela quer distância do julgamento do processo do mensalão. Trata-se de herança pesada deixada pelo governo anterior. Logo... Logo, por que ela se envolveria com a manobra esperta de indicar um ministro para influir no resultado das votações do processo? Ou pior: para tentar adiar o julgamento, como sempre foi desejo expresso de Lula?

MAS A ESCOLHA foi relâmpago (Miau!). Dois dias após anunciada, Teori começou a bater perna no Senado atrás de votos (Miau! Miau!). Renan Calhei-ros (PMDB-AL) pediu para relatar a indicação de Teori (Miau! Miau! Miau!). Esvaziado pela eleição, o Senado foi convocado para aprovar o novo Código Florestal. De quebra, aprovará o nome da predileção de Dilma para o StF (Miau! Miau! Miau! Miau!).

TEORI TEM FAMA de homem sério. Por sério não se prestaria a ser peão de jogada política. Sua seriedade, porém, o impediria de retardar o exame do seu nome pelo Senado. Uma vez no STF, deixaria de ser considerado sério só por estar disposto a exercer de imediato a função de juiz? Que juiz sério e responsável votaria sem antes estudar detidamente o que tivesse de votar? Para estudar, só pedindo vistas (Miau! Miau! Miau! Miau! Miau!).

SENTADO NUMA DAQUELAS cadeiras do plenário do STF, um ministro só deve satisfações à sua consciência. Cada um à sua maneira, é assim que procedem, por exemplo, os ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski. Graças a Lula ambos ganharam assento no STF. Lula está furioso com a independência de Joaquim e satisfeito com o bom comportamento de Lewandowski.

NÃO COBREM de Lula apego férreo ao princípio da separação dos poderes. Lula concorda com todos os princípios que balizam o sistema democrático desde que possa ignorá-los sempre que lhe convier. O mensalão atingiu em cheio a soberania do Legislativo. Lula foi contra o suborno de deputados? Marcos Valério deu a entender que Lula só não caiu porque ele, José Dirceu e Delúbio jamais contaram o que sabem.

ACUSAÇÃO TÃO GRAVE ficou sem resposta de Lula. O que ele teme? Que Valério faça novas revelações? E que elas acabem forçando a Justiça a processá-lo? O PT e partidos aliados acusaram "setores conservadores’ da sociedade de pressionarem o STF para que faça do julgamento do mensalão um meio de "golpear a democracia’! Santo Deus! Como se o STF fosse formado por um bando de tontos.

SANDICES! Sandices à farta que aos ignorantes impressiona, e somente a eles. Digam lá: em que parte do mundo civilizado já se ouviu falar de ameaça de golpe contra um ex-presidente? Golpeia-se presidentes; ex, não. O PT denuncia a iminência de um golpe contra Lula! Ahahahahah! O PT está no poder há dez anos. Oito dos atuais dez ministros do STF devem o emprego a Lula e a Dilma. E, contudo...

HÁ UM GOLPE em marcha contra Lula! Ouve-se ao longe o barulho produzido pelo atrito com o asfalto das esteiras dos tanques a caminho de São Bernardo. No país da jabuticaba, golpe contra ex-presidente é coisa nossa! Quanto a golpe a favor... Miau! Miau!

Hoje só amanhã - MELCHIADES FILHO

FOLHA DE SÃO PAULO - 24/09


BRASÍLIA - Ninguém contribuiu mais para politizar o julgamento do mensalão do que Lula e o PT.

A oposição não tinha abraçado essa causa, seja por ter apanhado nas urnas, seja por saber que o holofote logo se voltará para o PSDB mineiro, primeiro cliente do valerioduto.

Foi Lula quem definiu como prioridade "desmontar a farsa" do mensalão ao se despedir do Planalto, quando recordes de popularidade lhe permitiriam fazer o que bem desejasse -lançar carreira internacional, sugerir novos projetos de inclusão, torcer pelo Timão etc.

Lula pressionou pessoalmente ministros do STF e, quando ficou evidente que Ricardo Lewandowski teria de entregar sua revisão e nada mais retardaria o julgamento, mandou o PT atiçar a militância e usar a CPI do Cachoeira para desviar a atenção e fustigar os adversários.

Tão logo saíram as primeiras condenações pelo esquema de desvio de recursos públicos, a direção do partido não hesitou em qualificar o STF de "instrumento golpista".

Não hesitou, também, em insultar o ministro relator, acusando-o de produzir uma "falácia" justo quando ele se preparava para tratar da participação ativa de petistas na compra de apoio parlamentar.

Cabe especular por que Lula e PT agem com o fígado. Uns dizem que eles perderam a mão. Outros, que tentam estancar prejuízos eleitorais. Mas é difícil acreditar que Lula, Zé Dirceu, Rui Falcão & Co vivam todos a mesma má fase. E nenhuma pesquisa vinculou o mau desempenho do PT nas capitais ao mensalão. Em São Paulo, por exemplo, o problema é o candidato: tem a metade do apoio do eleitor ao PT.

Resta uma hipótese. Esculacha-se o STF, o procurador-geral e a imprensa porque o mensalão é, como já disseram o delegado responsável da PF e Marcos Valério, uma teia criminosa bem maior do que a que está sob julgamento. Grita-se hoje para abafar o som do amanhã.

Democracias - DENIS LERRER ROSENFIELD

O GLOBO - 24/09


O julgamento do mensalão e suas reações partidárias estão expondo diferentes acepções da democracia. Uns e outros defendem ou reclamam de determinados procedimentos jurídicos e, mesmo, de coberturas midiá-ticas e jornalísticas em nome da democracia. Contudo, não fica muito claro de qual democracia se está falando.

De um lado, o Supremo está dando uma rara demonstração de uma instituição que não se curva nem ao Poder Executivo, nem ao Legislativo, nem, sobretudo, a injunções partidárias. De outro lado, há dirigentes partidários que, não apenas tinham tudo apostado na impunidade, mas, principalmente, porque atribuíam às urnas uma espécie de poder divino, o de absolvê-los.

Duas concepções da democracia estão envolvidas. Uma concepção, encarnada pelo STF, é a reafirmação do estado democrático de direito, que se situa acima de qualquer contenda partidária. É a democracia representativa. A outra é a que se faz presente em declarações do presidente do PT, Rui Falcão, do deputado João Paulo Cunha e do ex-presidente Lula. É comum a todos eles o desprezo pelas instituições, a invenção de "golpes” e o recurso a uma suposta absolvição do povo mediante eleições. É a democracia totalitária.

Vejamos alguns traços da democracia representativa: a) o estado de direito é central, baseado na impessoalidade, na imparcialidade e na universalidade das leis; b) a supremacia das instituições sobre quaisquer processos eleitorais, pois eleições pressupõem instituições que as tornem possíveis; c) as condições de uma sociedade livre não podem, por constituírem princípios, ser submetidas a eleições, algo que foge ao escopo dessas; d) os meios de comunicação e a imprensa em geral são livres; e) processos eleitorais são realizados regularmente, fazendo parte do funcionamento do Estado. No entanto, eleições são uma das características de um Estado livre, não esgotando a sua significação. Eleições sem liberdade de imprensa e sem um Judiciário independente não podem ser consideradas, stricto senso, democráticas.

Vejamos alguns traços da democracia totalitária: a) a consideração de que a dita soberania do povo é ilimitada, podendo, inclusive, alterar ou mesmo banir as condições de funcionamento de um Estado e de uma sociedade livres; b) normalmente, tal tipo de discurso é instrumentalizado por um grupo político que se utiliza desse tipo de demagogia para se instalar no Poder; c) essa liderança que se autointitula "popular” considera os meios de comunicação e a imprensa em geral como "inimigos”; d) a concepção de "democratização dos meios de comunicação” é uma forma de domínio da dita "elite popular” que procura o controle total da sociedade; e) o Judiciário é considerado um Poder subalterno que deve ser domesticado e controlado, de modo que se torne um instrumento dos totalitários que poderão, então, dizer que agem de acordo com a "lei”; f) uma característica de seu discurso reside na criação de inimigos fictícios, que os estariam sempre perseguindo. A sua forma ideológica reside na formulação de um "golpe de Estado” que estaria sendo urdido; g) na verdade, ao construírem essa ficção, procuram criar condições para eles mesmos abaterem os seus adversários políticos.

Exemplos claros de democracia totalitária encontramos nos países boli-varianos vizinhos, cujo estágio mais avançado é o da Venezuela, sendo seguida pela Bolívia e pelo Equador. Os traços totalitários acima destacados encontram-se todos presentes, o que unicamente varia, segundo as circunstâncias, é a intensidade. Comum a todos eles é o projeto de "subverter a democracia por meios democráticos” em particular por intermédio de eleições.

Alguns desses traços totalitários encontram-se em declarações de certos dirigentes petistas. O mais relevante deles é o de que "o povo julga” através das eleições. O povo se manifestando através de eleições teria um poder ilimitado, que não poderia, então, ser limitado por instituições, dentre as quais o Supremo. Meliantes políticos teriam, dessa maneira, uma espécie de salvo-conduto para a criminalidade, comportando-se como se punições não os pudessem alcançar.

Outros traços totalitários se fazem presentes: a) a mentira, o negar os fatos, é um desses traços, particularmente presente no discurso de que o "mensalão não existiu”; b) a declaração do presidente do PT de que o julgamento do mensalão seria uma espécie de golpe urdido pela mídia conservadora e por um Supremo igualmente conservador ; c) o menosprezo do Judiciário como um Poder a serviço de conservadores bem mostra o quanto a independência do Judiciário e o estado de direito são alvos que deveriam ser enfraquecidos; d) a "crítica” à "mídia conservadora” se inscreve em uma linhagem de setores do petismo que procuram controlar os meios de comunicação graças a artifícios ideológicos como o da dita "democratização dos meios de comunicação”.

Torna-se aqui necessário fazer a distinção entre setores radicais do petis-mo e outros setores do partido, que não podem ser apresentados como se fossem um bloco monolítico, ideologicamente coeso. O governo petista atual tem se recusado a qualquer cerceamento da liberdade de imprensa e dos meios de comunicação em geral. Outro exemplo: os ministros indicados pela presidente Dilma, no julgamento do mensalão, têm, até agora, se recusado a qualquer inflexão ideológica, obedecendo a critérios técnicos e jurídicos. O atual governo, ademais, pelo seu silêncio, procura se manter distante de qualquer contaminação política. Ou seja, o governo petista está seguindo as condições de uma democracia representativa, ao arrepio de setores de seu próprio partido.

O julgamento do mensalão coloca-nos diante de uma encruzilhada de distintas significações da democracia. O caminho que está sendo trilhado indica, contudo, um fortalecimento do estado democrático de direito.

A obediência de Lewandowski - MARCELO COELHO


FOLHA DE SP - 24/09


Ministro optou por condenar Pedro Corrêa por corrupção passiva, quando gostaria de absolvê-lo


Foi estranha a atitude de Ricardo Lewandowski, revisor do processo do mensalão, na sexta-feira passada.

Decidiu condenar Pedro Corrêa, do PP, pelo crime de corrupção passiva. Mas não porque estivesse particularmente convicto disso. Afirmou que se curvaria ao entendimento da maioria do plenário.

Seguiria assim, disse ele, o exemplo de Joaquim Barbosa, que em outra etapa do julgamento acabou também obedecendo à maioria.

É verdade. Com um pouco de ranger de dentes, Barbosa absolveu Ayanna Tenório, diretora do Banco Rural, do crime de lavagem de dinheiro. Fez isso, entretanto, mais por uma questão de lógica do que de convicção.

É que a questão da lavagem de dinheiro só foi decidida depois de Ayanna ter sido absolvida do crime de gestão fraudulenta. Barbosa ficou em minoria naquele momento: queria condenar Ayanna pelas duas coisas. Mas, como ela havia sido absolvida do primeiro crime, não faria sentido em condená-la pelo segundo, já que a acusação ligava uma coisa a outra.

Se assim foi decidido, raciocinou Barbosa, seria absurda a condenação que gostaria de fazer.

Lewandowski aplicou o mesmo raciocínio. Só que num caso bem diferente. Estava convicto de que não se poderia condenar um deputado por corrupção sem que ficasse bem claro, na acusação, qual o ato esperado dele.

Você pode receber propina para facilitar uma concorrência, ou para votar de tal jeito em determinada decisão parlamentar. Mas receber dinheiro apenas em troca de um vago "apoio político no Congresso" não seria suficiente para caracterizar o crime de corrupção.

Bem, ele poderia continuar achando isso e votar pela absolvição de Pedro Corrêa, mesmo prevendo que a maioria não concordaria com seu entendimento. Seu voto ficaria minoritário, mas não seria absurdo logicamente.

O fato é que Lewandowski não quis ficar em minoria. Disse que ia "obedecer" a uma nova tendência no plenário, que estaria mudando a jurisprudência anterior.

Antes, a definição do ato de ofício era obrigatória, disse Lewandowski. Agora, não é mais. Então, se vocês querem assim...

Está longe de ser clara a interpretação de Lewandowski sobre a suposta "mudança" na jurisprudência do tribunal, dos tempos de Collor para cá. Celso de Mello, o único que participou da absolvição de Collor, já explicou, por exemplo, que o julgamento atual é coerente com os princípios anteriores. Rosa Weber sugeriu que talvez tenha havido mudança, sim.

Seja como for, Lewandowski optou por condenar, quando gostaria de absolver. Por quê?

É possível que esteja pensando em outra etapa do processo. Quando for o momento de definir a "dosimetria das penas" -quanto tempo de cadeia cabe a cada condenado-, Lewandowski pretende, certamente, dar sua opinião. E é provável que só os ministros que tenham dado votos condenatórios possam, nesse momento, estipular a pena a ser aplicada.

O 'mensalão' e o prático inerte sartriano - LUIZ WERNECK VIANNA


O ESTADÃO - 24/09


Não andaria com a cabeça nas nuvens quem, meses atrás, imaginasse que o tempo do julgamento dessa Ação Penal 470 jamais chegaria. E se chegasse, supunham outros, caso coincidisse com o período das eleições municipais, traria consigo um clima de exasperação da política e de ruas efervescentes pela participação popular, contra ou em defesa de algumas lideranças de um partido à testa do governo há quase dez anos, ora levadas às barras de um tribunal. Mas, faltando ainda o principal - qual seja, o julgamento do núcleo político que teria sido o ideador da operação dos malfeitos contra a administração pública e instituições republicanas -, o clamor que tem vindo das ruas, até o momento, é de origem distinta, pois procede de movimentos prosaicos dos servidores públicos, inclusive de carreiras estratégicas de Estado, em torno de questões salariais.

Nada de trivial nessa constatação, uma vez que ela pode significar um processo de amadurecimento das instituições da nossa democracia política no exercício do controle do poder político e no culto republicano de obediência e respeito às leis, que a todos, governantes e governados, igualmente deve obrigar. Contudo, se avaliado de uma perspectiva com foco mais reduzido, esse sinal lisonjeiro não pode eclipsar um diagnóstico perturbador, uma vez que o silêncio das ruas estampa a distância existente entre a política e a população, ora reduzida à posição de mera observadora do andamento de um processo que expõe à vista de todos práticas de malfeitos de alguns dos dirigentes do partido hegemônico na coalizão governamental, ele próprio inerme diante da situação.

As razões dessa distância também não são triviais. Se ela, agora, se tornou evidente, suas origens são remotas e não podem ser buscadas exclusivamente numa repentina conversão da multidão às regras do jogo democrático e a uma atitude de reverência diante da autonomia do Poder Judiciário, embora, em algum grau, algo disso possa estar-se fazendo presente. Datam essas razões, longe disso, das cruciais opções assumidas pelo Partido dos Trabalhadores (PT) imediatamente após sua vitória eleitoral em 2002, conquistada em nome de agendas igualitárias nascidas no campo da esquerda.

Nessa hora, e contrariamente à opinião de importantes próceres do PT, esse partido se recusou a enveredar por uma via de aliança com o PMDB, agremiação partidária congressualmente majoritária, preterida em favor de uma coalizão com partidos de menor representação, quase todos legendas de baixa densidade programática, fundamentalmente preocupados com a reprodução política dos seus quadros dirigentes, para os quais a conquista de posições fortes na administração pública era a chave para o atendimento de suas clientelas locais. Assim, seu programa de mudanças, além de contingenciado pelas reservas da época quanto à sua capacidade de garantir a estabilidade financeira - pedra de toque da conjuntura do primeiro governo Lula -, tornava-se dependente de uma coalizão estranha ou indiferente à agenda política que o tinha conduzido à vitória eleitoral.

A matéria bruta da Ação Penal 470, o mensalão, foi gestada no interior e a partir dessa decisão política de perseguir objetivos de mudança social desancorada de uma ativa esfera pública democrática, que importava a mobilização dos movimentos sociais, que logo, aliás, seriam postos sob a influência de agências estatais, quando não estatalizados tout court, convertendo-se a política num quase monopólio da chefia do Executivo. Aos partidos dessa bizarra coalizão presidencial, tangidos a ela com a expectativa de extrair recursos públicos para sua reprodução eleitoral, caberia conceder apoio parlamentar às iniciativas governamentais, enquanto ao Executivo, pelas vias decisionistas do direito administrativo, caberia realizar a agenda de mudanças avaliada como compatível com as circunstâncias.

Tal cálculo político, certamente exótico ao campo da esquerda, encontrou seu coroamento na política de massificação da política social com os programas assistenciais, revestindo a sociedade do estatuto do prático inerte de que falava Jean-Paul Sartre, massa passiva a ser conduzida por uma inteligência posta acima dela. Como um prático inerte, politicamente imobilizada, salvo nos períodos eleitorais, quando suas ações eram pautadas pelas legendas partidárias, a sociedade viveu mais um ciclo de modernização econômica, fortemente aparentado com os ciclos que se sucederam a partir dos anos 1930, tendo, de fato, experimentado, pela ação afirmativa de políticas públicas conduzidas pelo Estado, uma significativa incorporação ao mundo dos direitos de parcelas da população até então à sua margem. Mas a sociedade que emerge desse experimento de mudança por cima, se conhece a modernização, não irrompe para o moderno.

Filha de um tipo particular de revolução passiva, na forma tão bem caracterizada pelo sociólogo Francisco de Oliveira em seu ensaio Hegemonia às Avessas (São Paulo, Boitempo, 2010), a sociedade que dela resulta traz em si duas marcas negativas, ambas sáfaras à floração de uma cultura política democrática: a da restauração do poder político das oligarquias tradicionais, às quais se propiciaram os meios para a preservação do seu domínio local; e a valorização sans phrase da dimensão do interesse, numa versão chapada e imune à política. Os sobrenomes e a genealogia de tantos envolvidos na presente sucessão municipal testemunham isso, assim como aí estão os ecos na política dos cultos religiosos centrados na ideologia da prosperidade.

Com esse quadro, não é de espantar que a política pareça ter migrado para o mundo fechado dos tribunais.

Crime e castigo - VERA MAGALHÃES - PAINEL


FOLHA DE SP - 24/09


Ao discutir a redução de pena para Roberto Jefferson, ministros do Supremo Tribunal Federal analisam, reservadamente, que outros réus do mensalão poderão ser beneficiados com a ideia. Na dosimetria, definida ao final do julgamento, magistrados dizem que a fixação de pena mínima será ''suavizada'' para o petebista e outros núcleos poderão ter penas menores. Um caso, segundo um ministro, é a diferente participação de sócios de Marcos Valério em crimes com o publicitário.

Também quero Como Jefferson não fez delação premiada, uma das justificativas para a redução de pena poderá ser a ausência de maus antecedentes. Se isso ocorrer, advogados de outros réus devem reivindicar a medida.

Vetado A OAB, por meio de uma portaria do conselheiro Guilherme Batochio, vai apurar se o presidente do STF, Carlos Ayres Britto, violou prerrogativa de Alberto Toron durante julgamento do mensalão. Toron, que defende João Paulo Cunha, foi impedido de levantar uma questão de ordem no plenário.

Enigma O advogado, no entanto, diz ter ficado surpreso com a iniciativa de Batochio, que pertence a grupo adversário na entidade. "Já faz quase dois meses que isso aconteceu e ninguém lembrou de levantar esta questão na época?", questionou.

Boca... Chamaram atenção de técnicos do Congresso despesas da liderança do PT na Câmara com eventos. Em agosto, foram gastos quase R$ 6 mil com serviço de buffet para um jantar da bancada na casa do líder da legenda, deputado Jilmar Tatto (SP), com a presidente da Petrobras, Graça Foster.

...livre Em julho, foram quase R$ 4 mil com outro restaurante para discutir o Brasil Maior. Desde 2011, as lideranças ganharam direito à cota mensal, além da verba indenizatória individual dos parlamentares, destinada ao atendimento das despesas de interesse das bancadas.

Outro lado A assessoria da liderança afirma que todos os deputados são convidados e nos eventos são discutidos interesses inerentes às ações políticas e legislativas da bancada. O valor é repassado pelos vice-líderes, somando R$ 27,3 mil mensais.

Médio prazo Partidários de Gabriel Chalita reproduziram ontem nas redes sociais corrente para transformar o peemedebista em ministro da Educação. A mobilização só parou depois que uma candidata da legenda advertiu aos militantes que é preciso acreditar na chance de Chalita chegar ao segundo turno.

Mão... O candidato José Serra (PSDB) promete, no capítulo cultural de seu plano de governo, transformar a região do Vale do Anhangabaú, centro paulistano, numa "Praça das Artes".

...na massa Entre as intervenções previstas estão a construção de escola de circo no Largo do Paissandu e a restauração do edifício Sampaio Moreira, na rua Líbero Badaró, que passaria a abrigar a Secretaria da Cultura.

Blockbuster O tucano também planeja delegar ao Ecine (Escritório de Cinema), órgão da Secretaria da Cultura, as autorizações do poder público para filmagens na capital. A ideia é eliminar burocracias para captar imagens.

Cerco caipira O PT se empenhará na reta final da campanha para criar novo polo de predominância nos três maiores colégios eleitorais do Vale do Paraíba, reduto de Geraldo Alckmin. Liderando em Jacareí e São José dos Campos, petistas se credenciam para disputar o segundo turno em Taubaté.

tiroteio

Condenar Paulo Rocha é dar relevo ao modelo nazista que perseguia judeus. Se ele fosse importante, deveria estar na quadrilha.
DO ADVOGADO JOÃO GOMES, defensor do ex-líder do PT no processo do mensalão, que será julgado nas próximas semanas por lavagem de dinheiro.

Contraponto

Cabe mais um?


Durante viagem oficial a Roma, o vice-presidente, Michel Temer, caminhava pela cidade até o hotel após um jantar na embaixada do Brasil. Acompanhado por vários seguranças, Temer virou o centro das atenções entre os turistas, muitos brasileiros, que o chamavam pelo nome. No meio do burburinho, ele virou após reconhecer a voz do presidente da Fiesp, Paulo Skaf.

Sentado em uma varanda de um restaurante conhecido, Skaf quis saber como foi o jantar do vice. Temer, observando o ambiente agradável na mesa, brincou:

-É, vocês estão bem melhor aqui...