domingo, junho 24, 2012
A Alemanha vai destruir a Europa - JOSÉ ROBERTO MENDONÇA DE BARROS
O Estado de S.Paulo - 24/06
Escrevo este artigo com a economista Renata Machado. Todos acompanham a deterioração da situação europeia há mais de dois anos. Nada mais ilustra este fato do que a evolução da Grécia. O PIB grego não só vem caindo desde 2008, como a taxa de decréscimo tem acelerado rapidamente. Se a expectativa do FMI de redução de "apenas" 4,7% do PIB em 2012 se confirmar, este terá caído 17,3% no período de 2008 a 2012. A alta na taxa de desemprego do país também é impressionante, passando de 8,8% em 2006 para mais de 22% hoje. Não dá para dizer que os gregos não estão fazendo sacrifícios. O problema é que esses esforços são insuficientes.
A despeito do corte de mais de 50% no montante devido pelos gregos a seus credores privados, a redução do PIB não tem permitido um alívio na relação dívida/PIB do país, que deverá atingir 136,8% em 2017 (último ano das projeções) saindo de 110% em 2008, segundo estimativas do FMI. Com esses resultados, não tem como não concluir que, se permanecer na rota atual, a Grécia vai explodir.
Ao mesmo tempo, observou-se uma piora gradativa dos grandes países da Zona do Euro, especialmente de Espanha, Itália e, em menor magnitude, da própria França. A piora deve-se em grande medida à percepção de que esses países (em especial os dois primeiros) já entraram em uma situação de armadilha fiscal ("debt trap"). Isso ocorre quando a taxa de crescimento do PIB passa a ser inferior à taxa de juros de mercado cobrada para financiar sua dívida, o que faz com que a relação dívida/PIB do país entre em trajetória de aceleração, a menos que o governo seja capaz de gerar um superávit primário enorme, coisa que está longe de acontecer, apesar de todos os esforços. Não é de surpreender, portanto, que as taxas de juros dos papéis de 10 anos desses países não param de subir (no caso da Espanha, chegou a ultrapassar os 7% ao longo da semana passada e o da Itália está ao redor de 6%). Não existe coalização política e social que resista a tal desgaste.
Olhando esse cenário, fica a dúvida se uma ação mais firme dois anos atrás não poderia ter revertido esta tendência. Hoje, no entanto, nos parece que uma solução efetiva à crise teria um custo elevado demais até mesmo para a Alemanha.
Assim, à medida que o tempo passa, o resultado inequívoco da atual estratégia das autoridades europeias (em especial da alemã Angela Merkel) é uma deterioração rápida da situação econômica de seus países, em um círculo vicioso, no qual, a cada rodada, agravam-se ainda mais as consequências e, portanto, os custos, de uma ruptura. A estratégia de ajuste fracassou redondamente: a Alemanha não vai germanizar a Europa, dadas as gigantescas diferenças na história e na formação das diversas regiões.
Sem dúvida, os países devedores devem fazer ajustes fiscais. Entretanto, é evidente para 100% dos analistas que apenas ajuste fiscal é um caminho para o desastre e não uma solução sustentável para os problemas da região. Este ajuste deveria ser obtido em um prazo mais longo (com um peso maior, em um primeiro momento, de reformas) combinado a ações que minimizassem os efeitos negativos dos ajustes fiscais sobre o PIB e o emprego, de forma a manter a capacidade de pagamento do país.
A Alemanha, entretanto, segue dizendo não a qualquer solução que não seja sua visão de ajuste. Esta visão é doutrinária, quase religiosa. Se os países emprestaram, têm de pagar, independentemente dos custos. Só depois de expurgado o pecado é que algum tipo de solução pode ser pensada. Sem querer esgotar o número de vezes que a mesma disse não, lembremos alguns:
A Alemanha votou contra o programa do Banco Central Europeu (BCE) de compra de papel soberano (basta lembrar que dois de seus representantes no BCE, Axel Weber e Jürgen Stark, pediram demissão por discordar do plano). Hoje é evidente que se o BCE não tivesse feito as compras e os dois leilões de financiamento de três anos (LTRO) o sistema teria quebrado já no ano passado.
O mesmo vale para os projetos do bônus europeu e da união bancária (incluindo um regulador único e um sistema de seguro de depósitos).
A Alemanha se recusa até mesmo a considerar sugestões alemãs como a do Council of Economic Experts (A European Redemption Pact), que prevê a criação de um fundo que acolheria o excesso de dívida acima de 60% do PIB de todos os países da zona do euro e os refinanciaria conjuntamente. Este fundo teria a mesma estrutura do bem sucedido refinanciamento das dívidas estaduais que o governo brasileiro realizou em 1996/97.
Com isso, a Europa só se move à beira do abismo, sempre muito tarde e aquém do necessário. Soluções paralelas, porém limitadas, já começam aparecer. Chipre está negociando um empréstimo com a Rússia, visando a reforçar seu sistema bancário. A Inglaterra, numa revisão de seu ajuste à la Merkel adotado há algum tempo, já emprestou recursos para a Irlanda e anunciou que vai fornecer garantias do Tesouro para investimentos privados em projetos de infraestrutura e habitação no país. O Banco Central Inglês (BOE) anunciou há poucos dias a reativação de uma linha especial de empréstimo a custos baixos (ECTR) de forma a estimular empréstimos. Nesta semana foi liberada a primeira parcela da linha.
Não há dúvida de que uma situação limite ocorrerá em pouco tempo: o euro como se conhece hoje provavelmente não existirá até o fim do ano. Além da possível saída da Grécia, há outras sugestões, como a saída voluntária da Alemanha, seguida de uma valorização do marco e posterior re-atrelamento ao euro, ou até mesmo a "expulsão" da Alemanha, induzida pela aprovação no BCE de medidas de expansão monetária que o país é irrevogavelmente contra. A meu ver, todas as soluções são ruins e com efeitos negativos difíceis de estimar.
Se a Grécia sair, os custos no curto prazo para o país serão enormes. Sem falar no risco de contaminação e saída de outros países, cujos efeitos para a própria região e para a economia mundial seriam bastante negativos. Se a Alemanha sair, perdem os bancos e a economia alemã, que verá sua moeda valorizar fortemente ante o euro. Mesmo neste caso, em que os custos no curto prazo parecem ser menores, há incertezas enormes quanto à capacidade de sobrevivência de uma nova união, uma vez rompido o acordo inicial.
Enfim, o remédio alemão para curar a doença fiscal acaba por agravá-la. Já se disse que a Alemanha após duas guerras fracassadas conseguiu com o euro dominar a Europa sem dar um tiro. Entretanto, este domínio pode acabar mais uma vez mal. Joschka Fisher, ex-ministro do Exterior da Alemanha fez, em artigo recente, a mais aguda crítica que conheço à posição de seu país, que reproduzimos abaixo.
"A Alemanha destruiu-se - e à ordem europeia - duas vezes no século 20, e depois convenceu o Ocidente que tinha chegado às conclusões certas. Só desta maneira - refletida vivamente no seu apoio ao projeto europeu - conseguiu a Alemanha consentimento para sua reunificação. Seria simultaneamente trágico e irônico se uma Alemanha restaurada por meios pacíficos e com a melhor das intenções trouxesse a ruína da ordem europeia por uma terceira vez."
E tudo isto em apenas cem anos.
Neocoronelismo urbano - CARLOS GUILHERME MOTA
O ESTADÃO - 24/06
Mal começado, o século 21 trouxe uma surpresa histórica: Lula se aliou a Maluf. O arco se fecha, e queima-se um bom candidato à condução da megacidade de São Paulo, capital financeira e cultural do País. Era só o que faltava para a caracterização completa dessa "república de coalizões" estapafúrdias, com seu futuro redesenhado nessa semana a partir da maior metrópole do País. Hoje, que significa mesmo ser republicano?
Encerra-se um ciclo histórico, deixando para trás as esperanças de efetiva e sólida renovação político-social por conta do líder operário que nos anos 1970 pusera paletó e gravata para encontrar-se, a pedido, com o chanceler alemão Helmut Schmidt no hotel Hilton, centro de São Paulo, e explicar-lhe a nova era e o novo sindicalismo, o que impactou o sistema civil-militar de então. O mesmo bravo líder que enfrentou a ditadura a partir da "república do ABC"; o paciencioso torneiro que disputou - até ganhar! - eleições presidenciais contra forças de herdeiros da ditadura, da mídia e do capital financeiro e, vencedor, encarnou a vanguarda das lutas sociais na América Latina; esse líder não conseguiu fugir ao modelo autocrático-burguês. Pena.
Qual a lógica da política na terra bandeirante? Será possível fazer-se uma análise crítica das forças políticas que comandam a cidade desde, digamos, os tempos da ditadura e dos prefeitos biônicos até hoje? De que maneira os grupos econômico-financeiros, empreiteiras e respectivas forças políticas se revezaram na briga pelo poder? E o que tudo isso tem a ver com o modelo caótico de cidade que temos hoje? Não parece haver dúvidas sobre a importância da disputa municipal deste ano nas futuras eleições presidencial e estadual, sobretudo quando se recorda que o PT, como o antigo PTB e o atual PDT, sempre tiveram dificuldades eleitorais neste Estado e nesta anticidade. Desafio para todos, inclusive para a presidente Dilma, que vai melhorando em sua caminhada, sobretudo quando guarda alguma distância dessa sombra que não quer calar.
A galeria dos ex-prefeitos paulistanos ostenta de tudo, em termos humanos e de interesses do capital. Nossa urbe, marcada pela preocupação com o bem comum (o "ben comun", como se lê nas Atas da Câmara já no século 16) e os interesses da coletividade, teve fortes lideranças, desde o Morgado de Mateus (1765-1775) até o verdadeiro estadista que foi Prestes Maia, já no século 20, estudado pelos eruditos Benedicto Lima de Toledo e Candido Malta Campos, este em sua obra fundamental Rumos da Cidade. Ao revisitarmos a galeria dos ex-prefeitos, sem preocupação de arrolamento, nota-se que alguns são destacáveis (Faria Lima, Olavo Setúbal, Mário Covas, Luiza Erundina, Marta Suplicy, José Serra), outros "esquecíveis" (Jânio Quadros, Adhemar de Barros, Celso Pitta, Paulo Maluf). Mas convidemos o (e)leitor a avaliar o que cada um/uma representou ou ainda representa.
Na atualidade política, dizem os incautos ou muito espertos que direita e esquerda são definições que já não têm sentido. Carentes de leitura de livros, revistas e do mundo contemporâneo, lhes bastaria constatar as diferenças na França entre os projetos de um François Hollande e uma Marine Le Pen, ou no Brasil, entre os de Covas e Pitta, ou entre os de Maluf e (digamos) Lula.
O problema é que, de tempos em tempos, a capital paulista gera quasímodos políticos como Paulo Salim Maluf, um dos pilares da ditadura de 1964. O ex-governador, ex-candidato à Presidência da República e ex-prefeito de São Paulo (as ossadas de Perus não permitem esquecê-lo), nessa aproximação com o ex-presidente Lula com vistas à eleição municipal para escolha do novo prefeito da maior cidade da América Latina, obriga o cidadão minimamente ético e atento à História e a nossa vida política e social a se perguntar se não estamos vivendo mais uma ficção de mau gosto. Nesta agora cidade-pânico, penso no cidadão ativo que se recusa a ser alvo daquela frase ácida de Raymundo Faoro, quando dizia que "o Brasil é um país de otários", uma sentença dura do girondino radical, mas que se atualiza cada manhã ao tomarmos conhecimento do noticiário nacional, ou tentarmos entrar em um metrô (digamos, a Linha Vermelha, de Itaquera à Barra Funda), ou simplesmente atravessar a rua na faixa de pedestres. O problema é que o girondino gaúcho não logrou ensinar a radicalidade responsável ao seu amigo pernambucano, que deveria ser adotada como estratégia e referência em face dos "donos do poder". Ou seja, do patronato político brasileiro, incluídos os últimos lamentáveis ministros das Cidades, no ministério hoje nas mãos do PP de Maluf. Pobres cidades brasileiras.
Neste país de amnésicos, vale recordar o velho Marx, pois do PT, um partido de esquerda, poderíamos esperar tudo, menos a aliança Lula-Maluf. Marx dizia que, ao longo da história há fenômenos que podem se repetir: na primeira vez, ocorrem como tragédia; na segunda, como farsa. Historicamente, na prática, Paulo Maluf contradiz Marx, pois a primeira vez que ocupou posto público foi farsa, a segunda também, a terceira idem, e assim sucessivamente, até essa semana de sucesso. Mas Marx nunca foi bem lido por eles, ou talvez nem sequer lido, e muito menos pensado, sobretudo em suas páginas incômodas sobre os lumpesinatos - de onde provêm a massa dos eleitores de Maluf - que, despidos de ideologia ou filosofia, topam qualquer parada e constituem um freio para o avanço da História.
Como explicar o que aconteceu essa semana em São Paulo, senão pela confluência, para fins eleiçoeiros, de duas lideranças populistas para puxar as massas de seus respectivos eleitores? De uma parte, as gentes de Maluf, liderança que mobiliza moradores da periferia - muito menos do que se imagina, talvez Marta mobilizasse mais -, mas também segmentos da pequena burguesia, o curral decrescente e disperso de desavisados, "despossuídos" e politicamente deseducados. E, de outra parte, os eleitores de Lula e do PT, que, apesar das crescentes defecções, compõem o contingente daqueles que creem que seu carismático líder, historicamente importante, ainda representaria a possibilidade de superação, via reforma, do capitalismo selvagem e da redenção dos trabalhadores. Ou seja, da fração da classe operária que subiu ao paraíso, como espera subir a fração mais abaixo, que aguarda sua vez (e a inadimplência) na antessala das agências de automóveis.
Enfim, uma obra de antiarte política, o encontro Maluf-Lula, que nem a burguesia mais esclarecida e empenhada poderia imaginar, muito menos arquitetar um símile competidor em suas hostes. O resultado, convenhamos, é a massificação bruta de nosso capitalismo periférico, em que tudo vale nada. E que acelera o processo de deseducação cívica e política dos jovens, o desencanto dos maduros e a descrença dos democratas nos valores do socialismo reformista. Nesse processo, desceram pelo ralo o contrato social, as lutas de classes ("apagadas" justamente no período dos governos Lula), da cidadania pura e dura, das visões progressistas de mundo e de política. Enfim, dos valores humanistas. Recorde-se que Chico de Oliveira, um dos ex-fundadores do PT, já concluíra em 2006 que "o papel transformador do PT se esgotou" (Folha de S. Paulo, 24-7-2006, p. A-12). Naquele mesmo ano, o conservador liberal Claudio Lembo sentenciava: "Lula não tem tendência a ditador. É um operário do chão de fábrica. Conhece a vida de verdade. É um pequeno burguês, apenas isso" (Folha de S. Paulo, 31-12-2006). Após o levante do PCC em 15 de maio daquele ano, em que a sociedade civil paulistana se acoelhou, a "paz" voltava a reinar na capital do capital no Brasil.
A recusa da ex-prefeita Luiza Erundina em participar dessa aproximação com Maluf vem reforçar a tese de que, neste país velho e periférico, o "novo" não é novo, e nunca foi. Rapidamente, o supostamente novo ficou velho, correndo de costas em direção ao passado, como se vê na foto histórica, com o candidato Fernando Haddad sem graça entre dois Poderosos Chefões, foto antes inimaginável. A combativa ex-prefeita Erundina, com sua recusa em participar do jogo, demonstra que o pragmatismo rasteiro não pode passar por cima de valores éticos, na política como na vida. Convidado em seguida para o posto, Pedro Dallari optou por trilhar o mesmo caminho da ex-prefeita.
O fato é que a socialista paraibano-paulistana criou um forte lema para a nova sociedade civil brasileira: "Não aceito". E pôs em alerta seu próprio partido, que vem crescendo e conquistando papel importante no cenário nacional. Que ele só terá a ganhar com tal recusa, o tempo dirá. As lideranças burguesas nacionais e as dos trabalhadores, sobretudo aquelas pessoas cidadãs preocupadas com o ethos, a transparência e o mores positivo em política e na formação de um Brasil democrático, republicano e moderno, têm agora uma possibilidade de interlocução com gente de respeito. Quanto ao PT, terá que rever o lugar da ex-prefeita Marta Suplicy no quadro local e nacional; e o PSB de Eduardo Campos, de reavaliar o valor da ex-prefeita Luiza Erundina. Do mesmo modo, os outros partidos, sobretudo o PMDB, que não podem continuar a ter esse papel de vala comum dos descorados camaleões.
Na metrópole paulistana, testemunha-se nos dias atuais o fim da História. Mais precisamente, de uma certa e bela História, que alimentou as expectativas e siderou corações e mentes (lembram-se dessa expressão?) de três ou quatro gerações. Não se trata, está claro, do fim da História de Francis Fukuyama, ideólogo de sucesso e garoto-propaganda de um capitalismo predatório "avançado" e desistoricizante. Ou seja, daquela forma de organização econômico-social que só poderia dar no que deu, mas que gerou a reação social e político-ideológica positiva que resultou na eleição de Barack Obama - uma liderança bem formada política, cultural e ideologicamente. No Brasil, o momento é de desilusão das gerações, mas como a História continua, há que se buscar sinais de novos tempos, de uma nova era.
Como analisar tantas expectativas hoje frustradas? Neste país de tradição colonial, talvez a ascensão de Lula e o crescimento do lulismo possam ser entendidos por conta do velho gosto aristocrático pelo popular, cultivado até por frações da alta burguesia e de classes médias ascendentes, um "apreço" genérico por operários, sobretudo se qualificados e bem pagos. Operários que não tivessem seus macacões sujos de graxa, que fossem conversáveis (e conversíveis) como Lech Walesa, o polonês do Solidariedade. Tal "apreço" lembra os abraços que o grande abolicionista e aristocrático Joaquim Nabuco dava nos militantes negros, eventualmente convidados a subir em seu palanque, mantendo, porém, ligeira distância.
"Tudo que é sólido se desmancha no ar", sabemos hoje. E os carismas e populismos, como o de Jânio Quadros, também se desfizeram com o tempo, por inconsistência. Hoje, ouvem-se os aplausos de plateias que, deseducadas e mal formadas, eventualmente também são atraídas pela musicalidade da "canção nova" e pela singeleza ideológico-teológica de padres-cantores e pregadores espertos. Amanhã, quem sabe isso mude.
Nesta terra de carismas fáceis e "miséria farta" (como diria Anísio Teixeira), em que a modernidade vem sendo adiada com método, "conciliação" e rigor, talvez estejam sendo geradas, em algum canto, novas visões de mundo, lideranças e mensagens menos simplistas e grosseiras sobre o que vem a ser política, sociedade, cultura. Pois a História continua.
Duelos Verbais - MARTHA MEDEIROS
ZERO HORA - 24/06
Corri pra assistir a Deus da Carnificina, temendo que não ficasse muito tempo em cartaz. O filme, adaptação de uma peça de Yasmina Reza, é dirigido por Roman Polanski e traz no elenco Jodie Foster, Christoph Waltz, Kate Winslet e John C. Reily. Uma ficha técnica de respeito, mas mesmo fichas técnicas de respeito podem não resultar no esperado.
Pois Deus da Carnificina foi além do que eu esperava. É econômico em muitos sentidos (80 minutos de duração, cenário único e puro texto), mas em humanidade, é farto à beça. A história: dois garotos de 11 anos brigam por bobagem num parque, e um deles acaba atingindo o outro fisicamente.
O filme mostra, do início ao fim, a visita que os pais do agressor fazem aos pais do menino agredido. Tudo muito cordial e civilizado, até que as máscaras da hipocrisia vão caindo uma a uma, e o barraco se instala. E que barraco, senhoras e senhores. Dois casais que nãose conhecem, fechados num apartamento.
Uma chatonilda politicamente correta, um viciado em trabalho que não desgruda do celular, uma mulher controlada que muda de personalidade após dois goles de uísque e um desencanado que gostaria de estar em qualquer outro lugar, menos ali – com qual deles você se identifica? Um pouco com todos, não há escapatória.
Assim que o filme termina, fica evidente: como somos patéticos, tanto na civilidade quando na baixaria, tanto sóbrios quanto alcoolizados. E contraditórios: julgamos mal uma pessoa por causa de uma única frase, e dali a minutos voltamos a simpatizar com ela por ter concordado com algo que dissemos.
Fazemos uma dramalhão por pequenas coisas, expomos carências infantis, perdemos a co postura, fazemos confissões intimas a estranhos – que meleca. Lá pelas tantas, um deles pergunta: porque as coisas não podem ser mais simples? Ah, é tudo que se quer. Foco, objetividade, ir direto ao ponto. Mas quem consegue? Á medida que o filme avança, a situação torna-se tão sem controle que a plateia começa a rir, e é essa a reação que deveríamos ter dentro de nossa própria sala, não só na sala do cinema.
Rir do nosso delírio de evar a ferro e fogo situações banais, de nossa insistência em querer causar uma boa impressão, de nosso comportarmos como se estivéssemos num tribunal. Qual o propósito de tamanho desgaste, se as coisas solucionam-se quase sempre por si mesmas?
Na saída do filme acompanhei sem quere a conversa de um casal: ela havia amado o filme, o marido havia odiado. E instalou-se a discussão pelos corredores do shopping. Ela tentando convencê-lo da genialidade das cenas, ele se permitindo achar tudo uma aporrrinhação. Ela frustrada com a falta de concordância dele, ele cansado da ladainha dela, sem reparar que estavam. Ambos, dando continuidade ao roteiro.
Patéticos, nós todos. Cada um defendendo suas razões como se disso dependesse a nossa sobrevivência. Ninguém se conforma com sua solidão interna.
Corri pra assistir a Deus da Carnificina, temendo que não ficasse muito tempo em cartaz. O filme, adaptação de uma peça de Yasmina Reza, é dirigido por Roman Polanski e traz no elenco Jodie Foster, Christoph Waltz, Kate Winslet e John C. Reily. Uma ficha técnica de respeito, mas mesmo fichas técnicas de respeito podem não resultar no esperado.
Pois Deus da Carnificina foi além do que eu esperava. É econômico em muitos sentidos (80 minutos de duração, cenário único e puro texto), mas em humanidade, é farto à beça. A história: dois garotos de 11 anos brigam por bobagem num parque, e um deles acaba atingindo o outro fisicamente.
O filme mostra, do início ao fim, a visita que os pais do agressor fazem aos pais do menino agredido. Tudo muito cordial e civilizado, até que as máscaras da hipocrisia vão caindo uma a uma, e o barraco se instala. E que barraco, senhoras e senhores. Dois casais que nãose conhecem, fechados num apartamento.
Uma chatonilda politicamente correta, um viciado em trabalho que não desgruda do celular, uma mulher controlada que muda de personalidade após dois goles de uísque e um desencanado que gostaria de estar em qualquer outro lugar, menos ali – com qual deles você se identifica? Um pouco com todos, não há escapatória.
Assim que o filme termina, fica evidente: como somos patéticos, tanto na civilidade quando na baixaria, tanto sóbrios quanto alcoolizados. E contraditórios: julgamos mal uma pessoa por causa de uma única frase, e dali a minutos voltamos a simpatizar com ela por ter concordado com algo que dissemos.
Fazemos uma dramalhão por pequenas coisas, expomos carências infantis, perdemos a co postura, fazemos confissões intimas a estranhos – que meleca. Lá pelas tantas, um deles pergunta: porque as coisas não podem ser mais simples? Ah, é tudo que se quer. Foco, objetividade, ir direto ao ponto. Mas quem consegue? Á medida que o filme avança, a situação torna-se tão sem controle que a plateia começa a rir, e é essa a reação que deveríamos ter dentro de nossa própria sala, não só na sala do cinema.
Rir do nosso delírio de evar a ferro e fogo situações banais, de nossa insistência em querer causar uma boa impressão, de nosso comportarmos como se estivéssemos num tribunal. Qual o propósito de tamanho desgaste, se as coisas solucionam-se quase sempre por si mesmas?
Na saída do filme acompanhei sem quere a conversa de um casal: ela havia amado o filme, o marido havia odiado. E instalou-se a discussão pelos corredores do shopping. Ela tentando convencê-lo da genialidade das cenas, ele se permitindo achar tudo uma aporrrinhação. Ela frustrada com a falta de concordância dele, ele cansado da ladainha dela, sem reparar que estavam. Ambos, dando continuidade ao roteiro.
Patéticos, nós todos. Cada um defendendo suas razões como se disso dependesse a nossa sobrevivência. Ninguém se conforma com sua solidão interna.
Crônica macabra - CARLOS HEITOR CONY
FOLHA DE SP - 24/06
RIO DE JANEIRO - Crônica publicada na "Ilustrada" da última sexta-feira, "Mata! Mas não esquarteja" provocou protesto de leitor, que considerou o conselho mais selvagem do que aquele que foi dado por Paulo Maluf há tempos, "Estupra, mas não mata!", conselho que, aliás, está citado explicitamente no meu texto.
Não creio que algum desavisado tenha seguido a advertência do Maluf, cometendo o estupro, mas poupando a vida de sua vítima.
Tampouco acredito que algum fanático vá assassinar alguém e poupá-lo de destrinchar o seu corpo, como fazemos com o peru ou com o frango "al primo canto".
Não sou policial nem psiquiatra para avaliar o recente caso da mulher que conseguiu a proeza de colocar o marido, que ela matou, dentro de três malas, despejando-as em locais diferentes na evidente intenção de ocultar o crime que confessou logo ao ser presa, aparentemente sem necessidade de tortura.
Lembro o caso ocorrido no Rio, no qual foi assassinada uma jovem, Cláudia Lessin Rodrigues, irmã da atriz que foi a "garota de Ipanema" no cinema.
Depois da violência praticada, o assassino chamou um amigo para ajudar na ocultação do cadáver: um cabeleireiro que tinha salão em Copacabana. Este não fugiu, foi preso e julgado. Confessou a sua participação no caso, mas esclareceu que o mais difícil foi colocar a moça, que era alta, dentro da mala que levou o corpo até o mar. Durante o julgamento, o promotor atirou diante da bancada dos jurados não a mala do crime, mas outra, que havia comprado para acentuar a monstruosidade dos assassinos.
O promotor queria impressionar o júri, achando que assim obteria uma condenação. Não adiantou. O réu foi absolvido naquela instância. Uma sentença macabra, talvez pior do que um esquartejamento.
Um prefeito civilizado, por favor - VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 24/06
Apesar do baixo nível do início da campanha, ainda há tempo para conversa inteligente sobre São Paulo
SUPONHA que o caso Maluf deixe de poluir as conversas sobre a eleição em São Paulo, seja lá por qual motivo. Do que se vai falar então?
Sim, a gente sabe dos problemas principais. As escolas são uma tristeza indizível. As pessoas perdem metade do seu tempo livre no transporte. O povo não tem hospital decente. O de sempre.
Sim, esperamos que os candidatos tenham algo de bem pensado a dizer sobre o assunto em vez de aparecer com programas com nome marqueteiro populista e cafona ("Mamãe Bacana", "Bebê Paulistano").
O candidato dirá algo sobre como mudar o padrão de gasto da prefeitura? Só 11% da despesa vai para investimento. Sem isso, não vai dar para acreditar que o prefeito novo vai fazer algo lá muito diferente em termos de obras.
Que ideia nova e radical terá para a educação? Ressalte-se: educação é o que e como as crianças aprendem. Uniforme importa, comida, salário, escola limpa e inteira importam. Mas nunca falamos de aprendizado.
A educação no Estado e na cidade mais ricos do país é um desastre. Os tucanos estão faz quase 18 anos no governo, tempo de transformar uma criança em médico formado, e os resultados dos testes são vexaminosos. Na cidade de São Paulo, mais ou menos dominada por tucanos, com pitadas petistas, a coisa não anda melhor. O que dirá o prefeito? Quem será o seu genial secretário da Educação?
O que o prefeito tem de dizer de inovador? O que fará do Minhocão? Do lixo? Em São Paulo, só ouvimos falar de lixo quando se trata de concorrência superfaturada. O que o prefeito tem a dizer sobre reciclagem, usina de energia movida a lixo?
O que tem a dizer sobre tentativas de estimular a economia paulistana? Vez e outra ouvimos que a prefeitura vai demolir tal ou qual região para que se construa um "novo polo econômico" de "novas tecnologias" (em geral, tecnologia de informação, TI).
Mas o que temos aqui de TI? O prefeito sabe? A gente tem é, por exemplo, muito hospital bom (menos para os pobres), turismo de saúde etc. Por que não temos um "polo de tecnologia e indústria" de saúde e medicina?
Por falar em indústria, esse setor ainda produz uns 20% do valor agregado da economia paulistana (dados de 2009, deve ter caído um pouco). Em 2000, eram 26%. Sim, São Paulo se "desindustrializa", mas ainda é uma força industrial. Pregar que a cidade é de "serviços" é ideologia.
E "serviços" pode significar tanta coisa. Pode ser restaurante, limpeza, apoio à produção industrial, finanças.
Enfim, onde estão esses polos tecnológicos? O governo do Estado faria um no Jaguaré, ao lado da USP (TI, fármacos, bio e nanotecnologia). Anda devagar quase parando. Os polos da região da Luz e da cracolândia são um fiasco gigantesco dos tucanos e de Gilberto Kassab.
Por falar em USP, dois dos principais candidatos, Serra e Haddad, são "uspianos". Vai fazer diferença?
São Paulo é uma cidade de "turismo de negócios e de cultura", diz-se. Mas os hotéis são caríssimos e o trânsito vai parar (que tal pedágio urbano?). Não temos nem trens para os aeroportos, uma pobreza.
Não falta, enfim, assunto para uma conversa civilizada sobre a cidade.
Apesar do baixo nível do início da campanha, ainda há tempo para conversa inteligente sobre São Paulo
SUPONHA que o caso Maluf deixe de poluir as conversas sobre a eleição em São Paulo, seja lá por qual motivo. Do que se vai falar então?
Sim, a gente sabe dos problemas principais. As escolas são uma tristeza indizível. As pessoas perdem metade do seu tempo livre no transporte. O povo não tem hospital decente. O de sempre.
Sim, esperamos que os candidatos tenham algo de bem pensado a dizer sobre o assunto em vez de aparecer com programas com nome marqueteiro populista e cafona ("Mamãe Bacana", "Bebê Paulistano").
O candidato dirá algo sobre como mudar o padrão de gasto da prefeitura? Só 11% da despesa vai para investimento. Sem isso, não vai dar para acreditar que o prefeito novo vai fazer algo lá muito diferente em termos de obras.
Que ideia nova e radical terá para a educação? Ressalte-se: educação é o que e como as crianças aprendem. Uniforme importa, comida, salário, escola limpa e inteira importam. Mas nunca falamos de aprendizado.
A educação no Estado e na cidade mais ricos do país é um desastre. Os tucanos estão faz quase 18 anos no governo, tempo de transformar uma criança em médico formado, e os resultados dos testes são vexaminosos. Na cidade de São Paulo, mais ou menos dominada por tucanos, com pitadas petistas, a coisa não anda melhor. O que dirá o prefeito? Quem será o seu genial secretário da Educação?
O que o prefeito tem de dizer de inovador? O que fará do Minhocão? Do lixo? Em São Paulo, só ouvimos falar de lixo quando se trata de concorrência superfaturada. O que o prefeito tem a dizer sobre reciclagem, usina de energia movida a lixo?
O que tem a dizer sobre tentativas de estimular a economia paulistana? Vez e outra ouvimos que a prefeitura vai demolir tal ou qual região para que se construa um "novo polo econômico" de "novas tecnologias" (em geral, tecnologia de informação, TI).
Mas o que temos aqui de TI? O prefeito sabe? A gente tem é, por exemplo, muito hospital bom (menos para os pobres), turismo de saúde etc. Por que não temos um "polo de tecnologia e indústria" de saúde e medicina?
Por falar em indústria, esse setor ainda produz uns 20% do valor agregado da economia paulistana (dados de 2009, deve ter caído um pouco). Em 2000, eram 26%. Sim, São Paulo se "desindustrializa", mas ainda é uma força industrial. Pregar que a cidade é de "serviços" é ideologia.
E "serviços" pode significar tanta coisa. Pode ser restaurante, limpeza, apoio à produção industrial, finanças.
Enfim, onde estão esses polos tecnológicos? O governo do Estado faria um no Jaguaré, ao lado da USP (TI, fármacos, bio e nanotecnologia). Anda devagar quase parando. Os polos da região da Luz e da cracolândia são um fiasco gigantesco dos tucanos e de Gilberto Kassab.
Por falar em USP, dois dos principais candidatos, Serra e Haddad, são "uspianos". Vai fazer diferença?
São Paulo é uma cidade de "turismo de negócios e de cultura", diz-se. Mas os hotéis são caríssimos e o trânsito vai parar (que tal pedágio urbano?). Não temos nem trens para os aeroportos, uma pobreza.
Não falta, enfim, assunto para uma conversa civilizada sobre a cidade.
Idades - CAETANO VELOSO
O GLOBO - 24/06
Suponho que eu não gostava da infância. Lembro-me de muita impaciência e de uma quase permanente irritação contida. Havia alegrias -- como desenhar caminhos de ferro com carvão no cimento imenso do quintal (nesgado de canteiros com arbustos às vezes floridos, num deles um araçazeiro, no do centro, maior, uma mangueira gigantesca) -- por onde fazíamos viajar os trens feitos de ferros retangulares que, com suas ordenadas protuberâncias para encaixe, ficavam no almoxarifado aguardando a vez de irem cravar-se em postes de telégrafo ao longo da ferrovia de verdade. Havia mesmo felicidade nas horas passadas nos galhos altos da mangabeira (que é o que chamávamos de araçazeiro), achando araçás ainda não maduros, as cascas mostrando o entumecimento lento da maturação, movimento supostamente imperceptível mas nitidamente percebido por meus olhos atentos demais, prazerosos demais em sua adivinhação da resistência que a polpa da fruta ofereceria aos dentes antes de exibir seu sabor agridoce, seu travo e sua fresquíssima informação de vegetalidade.
E também na convivência com a grande malta da família, muitas mulheres e nenhuma briga aberta, minha mãe distante mas presta ao menor anúncio de lesão corporal, meu pai além dela mas comandando tudo. Todos os meus irmãos. Felicidade, sim. Em todos uma certa admiração divertida pelo que pareciam ser meus dotes especiais de memória, poder de aprendizado, lucidez. Não tenho nada objetivo de que me queixar. Apenas fui crescendo com impaciência e vi que quem tinha 7 anos desprezava a condição de quem tinha 4, e quem tinha 12, a de quem tinha 7. Isso era Santo Amaro.
As marcas assustadoras, deliciosas da adolescência me assaltaram no Rio. Deixei de ser criança no ano que passei em Guadalupe. Até hoje, por mais que leia sobre as angústias da adolescência e a infinita felicidade da infância, noto antes a alegria que apresentam todas as pessoas que conheci ao deixarem de ser crianças. Crianças choram várias vezes por dia, comem, deitam-se para dormir e tomam banho na hora que os adultos mandam. Não ter autonomia não é sentido como algo que dê contentamento. Não quero negar os conflitos que deve haver -- e há -- no período da passagem. Mas, para mim, adolescentes são mais alegres do que crianças. Acho que sempre achei isso. Desde que era criança. Também quando era adolescente. Percebi que a idade adulta traz ainda maior firmeza a esse gozo da autonomia, mas o florescer dessa ventura ficou para sempre ligado, em meu imaginário, à puberdade. Então posso dizer que sempre fui adolescente. Quinze anos é a minha idade. Talvez 14. O resto são marcos exteriores que não me dizem respeito, como esse número 70 que a gravadora e meu escritório de produção colaram em meu nome no site que rola na internet. Para mim, mesmo esses marcos exteriores se submetem à estrita datação da viragem: tenho 69 anos até o dia 7 de agosto, período, de resto, em que Chico Buarque, que completou 68, fica apenas um ano mais novo do que eu. Mais moderno, diria um santamarense (ou aquele jornal de Cachoeira cuja notícia virou crônica de Machado de Assis estudada por Roberto Schwarz, este último parecendo sacar ainda menos do que Machado que "moderno" no recôncavo baiano significa "jovem").
O desenvolvimento da mente tem uma espécie de ápice aos 50. Não é uma regra, mas senti isso em mim. Julguei que seguiria igual aos 65. Mas logo vi que minha memória não era a mesma. Eu tinha sofrido muito quando, aos quarenta e poucos, tive que pôr óculos para ler. Eu sempre tinha tido excelente visão, não achava suportável ter que usar esse apetrecho nem preocupar-me em não perdê-lo. Tive também de me acostumar a ouvir as pessoas dizerem "o óculos" em vez de "os óculos". A não concordância de número nos verbos e adjetivos relacionados também me faziam mal. Gosto de gramática, de normas para a língua, acho que a tendência à não observância dessas coisas denota insalubridade social. Escrevo de modo um tanto barroco, mas não acho que os brasileiros devessem estar desatentos a regras de clareza, coerência e coesão. Também não me deixa feliz ler, com tanta frequência, coisas como "Fulano não entregou o DVD à Beltrano". Esse acento agudo que indica crase onde não há (coisa que um linguista declarou uma vez que deveria já ser a regra) me entristece. Casmurrice de velho? Não: quando era garoto, eu era mais puro em minhas paixões e vaidades gramaticais.
Digo que tenho 14 anos. Poderia dizer 30, a idade que tinha quando nasceu meu primeiro filho, em meio à alegria indizível de ter voltado para o Brasil. Mas também então me sentia adolescente. A descrição minuciosa das impressões de infância pode fazer crer que a idealizo como todo mundo. É que as experiências correspondentes na adolescência eu não vou descrever aqui.
Um dos sinais mais claros de que estou velho foi ler Francisco Bosco dizendo não entender que graça achávamos em Francis. Foi uma delícia ler um Bosco fragmentário (tão pouco fragmentário, se visto daqui do nosso domingo). Amadureci o bastante para dizer que não creio que conceitos como "luta de classes" expliquem tudo. Que nem sei se esse um diz respeito a algo evidente. Como adolescente, sinto o gosto das descobertas, tenho medo, tenho imensa alegria, começo a ousar dirigir a palavra a estranhos, não apenas a papai e mamãe. Acho lindo o Cristiano Ronaldo e sua difusão mundial da música de Teló.
E também na convivência com a grande malta da família, muitas mulheres e nenhuma briga aberta, minha mãe distante mas presta ao menor anúncio de lesão corporal, meu pai além dela mas comandando tudo. Todos os meus irmãos. Felicidade, sim. Em todos uma certa admiração divertida pelo que pareciam ser meus dotes especiais de memória, poder de aprendizado, lucidez. Não tenho nada objetivo de que me queixar. Apenas fui crescendo com impaciência e vi que quem tinha 7 anos desprezava a condição de quem tinha 4, e quem tinha 12, a de quem tinha 7. Isso era Santo Amaro.
As marcas assustadoras, deliciosas da adolescência me assaltaram no Rio. Deixei de ser criança no ano que passei em Guadalupe. Até hoje, por mais que leia sobre as angústias da adolescência e a infinita felicidade da infância, noto antes a alegria que apresentam todas as pessoas que conheci ao deixarem de ser crianças. Crianças choram várias vezes por dia, comem, deitam-se para dormir e tomam banho na hora que os adultos mandam. Não ter autonomia não é sentido como algo que dê contentamento. Não quero negar os conflitos que deve haver -- e há -- no período da passagem. Mas, para mim, adolescentes são mais alegres do que crianças. Acho que sempre achei isso. Desde que era criança. Também quando era adolescente. Percebi que a idade adulta traz ainda maior firmeza a esse gozo da autonomia, mas o florescer dessa ventura ficou para sempre ligado, em meu imaginário, à puberdade. Então posso dizer que sempre fui adolescente. Quinze anos é a minha idade. Talvez 14. O resto são marcos exteriores que não me dizem respeito, como esse número 70 que a gravadora e meu escritório de produção colaram em meu nome no site que rola na internet. Para mim, mesmo esses marcos exteriores se submetem à estrita datação da viragem: tenho 69 anos até o dia 7 de agosto, período, de resto, em que Chico Buarque, que completou 68, fica apenas um ano mais novo do que eu. Mais moderno, diria um santamarense (ou aquele jornal de Cachoeira cuja notícia virou crônica de Machado de Assis estudada por Roberto Schwarz, este último parecendo sacar ainda menos do que Machado que "moderno" no recôncavo baiano significa "jovem").
O desenvolvimento da mente tem uma espécie de ápice aos 50. Não é uma regra, mas senti isso em mim. Julguei que seguiria igual aos 65. Mas logo vi que minha memória não era a mesma. Eu tinha sofrido muito quando, aos quarenta e poucos, tive que pôr óculos para ler. Eu sempre tinha tido excelente visão, não achava suportável ter que usar esse apetrecho nem preocupar-me em não perdê-lo. Tive também de me acostumar a ouvir as pessoas dizerem "o óculos" em vez de "os óculos". A não concordância de número nos verbos e adjetivos relacionados também me faziam mal. Gosto de gramática, de normas para a língua, acho que a tendência à não observância dessas coisas denota insalubridade social. Escrevo de modo um tanto barroco, mas não acho que os brasileiros devessem estar desatentos a regras de clareza, coerência e coesão. Também não me deixa feliz ler, com tanta frequência, coisas como "Fulano não entregou o DVD à Beltrano". Esse acento agudo que indica crase onde não há (coisa que um linguista declarou uma vez que deveria já ser a regra) me entristece. Casmurrice de velho? Não: quando era garoto, eu era mais puro em minhas paixões e vaidades gramaticais.
Digo que tenho 14 anos. Poderia dizer 30, a idade que tinha quando nasceu meu primeiro filho, em meio à alegria indizível de ter voltado para o Brasil. Mas também então me sentia adolescente. A descrição minuciosa das impressões de infância pode fazer crer que a idealizo como todo mundo. É que as experiências correspondentes na adolescência eu não vou descrever aqui.
Um dos sinais mais claros de que estou velho foi ler Francisco Bosco dizendo não entender que graça achávamos em Francis. Foi uma delícia ler um Bosco fragmentário (tão pouco fragmentário, se visto daqui do nosso domingo). Amadureci o bastante para dizer que não creio que conceitos como "luta de classes" expliquem tudo. Que nem sei se esse um diz respeito a algo evidente. Como adolescente, sinto o gosto das descobertas, tenho medo, tenho imensa alegria, começo a ousar dirigir a palavra a estranhos, não apenas a papai e mamãe. Acho lindo o Cristiano Ronaldo e sua difusão mundial da música de Teló.
No hotel Ritz - DANUZA LEÃO
FOLHA DE SP - 24/06
Ficou a lembrança do fim de semana que passou no quarto mais bonito em que já dormiu na vida
Foi uma paixão como costumam -e devem- ser as paixões: intensa e breve.
A primeira vez que se viram foi no Rio, e houve logo uma faísca. Para isso, ajudou muito o fato de ele ser comprometido, digamos assim, e seu comprometimento estar bem longe. Não demorou muito tempo para se apaixonarem, mas nunca fizeram juras de amor eterno; viveram um louco amor durante duas semanas, quando ela viajaria para Paris. Ele deu um jeito -sempre se dá, quando se quer-, disse que ia encontrá-la.
Ela chegou primeiro, para ter tempo de reconhecer a cidade, fazer o que as mulheres mais gostam, umas comprinhas (o que não é possível, com um homem perto), e ir a um bom cabeleireiro; quando ele chegou -hotéis separados, devido às circunstâncias-, ela estava ainda mais apaixonada, e ele também. Qualquer paixão passando por Paris só faz aumentar, claro.
Como estavam fazendo a linha discreta, tomaram os devidos cuidado e não foram a nenhum dos lugares a que estavam habituados, para não correrem o risco de encontrar amigos.
Decidiram ir ao restaurante da Torre Eiffel, o Jules Verne, onde só vão turistas, eles achavam; lá não encontrariam nenhum conhecido, justamente por ser lugar de turista. Mas ela, quando viu lá de cima as luzes da cidade se acenderem -como era maio, só anoiteceu por volta das nove-, quase se emocionou.
Já estava combinado que passariam oito dias juntos, não mais, e o romance estava tão bom, mas tão bom, que no terceiro dia ele fez uma proposta: que ela escolhesse qualquer lugar do mundo para passarem o que seria o último fim de semana juntos. Mais romântico, impossível.
Ela pensou, pensou, pensou. Marrakech? Uma ilha grega? Como mulher vivida e prática, imaginou o tempo que levaria um táxi do centro de Paris até o aeroporto, o trânsito, o check-in, a chegada em outro país, desarrumar a mala, mandar passar o vestido para jantar, todas essas coisas. Sugeriu então ficarem em Paris e passarem o fim de semana no Hotel Ritz, o mais emblemático e luxuoso da cidade, onde ela não havia, jamais, se hospedado.
Era primavera; ele passou de táxi para buscá-la, o quarto onde dormiriam juntos pela primeira vez era lindo, com o teto todo pintado, com a janela dando para a Place Vendôme; se esqueceram de sair para jantar, pediram champanhe e cerejas e brindaram à vida e ao amor.
Sabiam que esses seriam os últimos dias que passariam juntos e, sabiamente, não disseram uma só palavra sobre isso, nem falaram sobre se reverem.
Já sabiam que seria inútil e impossível ir adiante, que a graça daquela paixão era ser perfeita até o último segundo sem um só desgaste, um só momento ruim, e nem uma vez foi pronunciada a palavra futuro, já que ele não ia acontecer mesmo. Ela pegaria um avião na segunda às 10h, ele pegaria o dele -para outro destino- às 2h da tarde.
Nessa manhã, ela fez tudo para que ele não percebesse, em nenhum momento, que estava um pouco triste, mas ele percebeu. Ela se deu conta disso quando entrou no táxi, olhou para a janela do quarto e viu que ele estava na sacada, olhando ela sair de sua vida para sempre. Se acenaram e nunca mais se viram.
Os anos passaram, mas ficou a lembrança; a lembrança do fim de semana que passou no quarto mais bonito em que já dormiu na vida.
E hoje pensa -acha- que todas as paixões deveriam ser assim.
Ficou a lembrança do fim de semana que passou no quarto mais bonito em que já dormiu na vida
Foi uma paixão como costumam -e devem- ser as paixões: intensa e breve.
A primeira vez que se viram foi no Rio, e houve logo uma faísca. Para isso, ajudou muito o fato de ele ser comprometido, digamos assim, e seu comprometimento estar bem longe. Não demorou muito tempo para se apaixonarem, mas nunca fizeram juras de amor eterno; viveram um louco amor durante duas semanas, quando ela viajaria para Paris. Ele deu um jeito -sempre se dá, quando se quer-, disse que ia encontrá-la.
Ela chegou primeiro, para ter tempo de reconhecer a cidade, fazer o que as mulheres mais gostam, umas comprinhas (o que não é possível, com um homem perto), e ir a um bom cabeleireiro; quando ele chegou -hotéis separados, devido às circunstâncias-, ela estava ainda mais apaixonada, e ele também. Qualquer paixão passando por Paris só faz aumentar, claro.
Como estavam fazendo a linha discreta, tomaram os devidos cuidado e não foram a nenhum dos lugares a que estavam habituados, para não correrem o risco de encontrar amigos.
Decidiram ir ao restaurante da Torre Eiffel, o Jules Verne, onde só vão turistas, eles achavam; lá não encontrariam nenhum conhecido, justamente por ser lugar de turista. Mas ela, quando viu lá de cima as luzes da cidade se acenderem -como era maio, só anoiteceu por volta das nove-, quase se emocionou.
Já estava combinado que passariam oito dias juntos, não mais, e o romance estava tão bom, mas tão bom, que no terceiro dia ele fez uma proposta: que ela escolhesse qualquer lugar do mundo para passarem o que seria o último fim de semana juntos. Mais romântico, impossível.
Ela pensou, pensou, pensou. Marrakech? Uma ilha grega? Como mulher vivida e prática, imaginou o tempo que levaria um táxi do centro de Paris até o aeroporto, o trânsito, o check-in, a chegada em outro país, desarrumar a mala, mandar passar o vestido para jantar, todas essas coisas. Sugeriu então ficarem em Paris e passarem o fim de semana no Hotel Ritz, o mais emblemático e luxuoso da cidade, onde ela não havia, jamais, se hospedado.
Era primavera; ele passou de táxi para buscá-la, o quarto onde dormiriam juntos pela primeira vez era lindo, com o teto todo pintado, com a janela dando para a Place Vendôme; se esqueceram de sair para jantar, pediram champanhe e cerejas e brindaram à vida e ao amor.
Sabiam que esses seriam os últimos dias que passariam juntos e, sabiamente, não disseram uma só palavra sobre isso, nem falaram sobre se reverem.
Já sabiam que seria inútil e impossível ir adiante, que a graça daquela paixão era ser perfeita até o último segundo sem um só desgaste, um só momento ruim, e nem uma vez foi pronunciada a palavra futuro, já que ele não ia acontecer mesmo. Ela pegaria um avião na segunda às 10h, ele pegaria o dele -para outro destino- às 2h da tarde.
Nessa manhã, ela fez tudo para que ele não percebesse, em nenhum momento, que estava um pouco triste, mas ele percebeu. Ela se deu conta disso quando entrou no táxi, olhou para a janela do quarto e viu que ele estava na sacada, olhando ela sair de sua vida para sempre. Se acenaram e nunca mais se viram.
Os anos passaram, mas ficou a lembrança; a lembrança do fim de semana que passou no quarto mais bonito em que já dormiu na vida.
E hoje pensa -acha- que todas as paixões deveriam ser assim.
Cadê você, Fátima? - CRISTINA PADIGLIONE
O Estado de S.Paulo - 24/06
Jornalista volta ao ar amanhã no comando de show matinal
William Bonner já não precisa mais perguntar à mulher, em rede nacional: "Onde está você, Fátima Bernardes?" Agora ela fica no Projac, o complexo de estúdios da Globo em Jacarepaguá, todo santo dia, de segunda a sexta, sem motivo para aparecer na TV em outro endereço que não seja o seu estúdio high tech. Depois de 13 anos dizendo "boa-noite", é hora de enfatizar que seu negócio agora é "bom-dia".
Perto de completar 50 anos, a virginiana Fátima promoveu uma virada rigorosa na rotina, para estrear amanhã, às 10h40, o Encontro com Fátima Bernardes, fruto de oito meses de planejamento, entre pesquisas, reuniões e ideias que pareciam não acabar mais. De fato, não acabam, garante ela.
A essência do programa é a conversa. É a informação a serviço do entretenimento e vice-versa, sob variados pontos de vista e o testemunho de uma plateia de 60 pessoas que só estarão ali sob a condição de acrescentar algo ao conteúdo. "Não é uma plateia de espectadores, é uma plateia de convidados que podem ser entrevistados", conta. "E dá um trabalho danado montar essa plateia todos os dias." Quem disse que seria fácil deixar a bancada do maior telejornal do País? Eis um resumo da nossa conversa.
Apresentar um programa que promove conversa ao vivo aumenta o risco de o apresentador expor sua opinião, o que não ocorria no JN. Está preparada?
É um risco controlado, estou preparada para essa exposição. Talvez seja um vício de jornalista, mas ainda acho que, muito mais importante do que eu dizer se gosto ou não, é levar informação para aquela pessoa que está em casa e não teria condição de ter. Transmito muito mais quando passo conteúdo do que quando passo opinião, é disso que as pessoas precisam. O público pode pensar com a própria cabeça. Vou até dizer, em algumas situações, o que penso, porque numa conversa, não tem como, é natural, mas a minha preocupação é que a gente busque muita informação sobre o assunto em discussão para acrescentar ao repertório de quem vê. Quando saí do jornal, minha ideia era levar a rua que encontrava lá fora para dentro do estúdio.
Todo planejado, o programa poderá ser interrompido a qualquer momento em função do factual. Como virginiana, como você sobrevive a isso?
Mas eu sou toda programada na minha vida pessoal, não profissional. Olha que engraçado: no trabalho, sou uma pessoa corajosa, fiz coisas que jamais imaginaria fazer, não tenho o menor problema com a questão do ao vivo, corri atrás disso a vida inteira. Na vida pessoal já é outra coisa, quando chego ali já gosto de fazer minha listinha, fico desesperada por não saber o que vou fazer no dia seguinte, gosto de ter isso sob controle. Já no trabalho, gosto de ser desafiada, é um exercício para mim, que sou tão controladora, saber que não está tudo sob controle.
Quem escolhe o figurino, agora exibido da cabeça aos pés?
A figurinista responsável pelo programa é a Claudia Kopke, mas ela me dá toda a liberdade para participar desta escolha. Parte dos acessórios, por exemplo, são pessoais, que no começo eu trouxe como sugestão e ela decidiu incorporar. O que me deixa feliz é que o figurino que o telespectador verá inclui peças que também tenho semelhantes em casa, são roupas que realmente uso fora do estúdio.
Sente falta de trabalhar ao alcance do Bonner, ou a mudança de rotina é até bem-vinda?
Quando dividíamos a bancada do Jornal Nacional, nem sempre estávamos juntos o dia inteiro. Ele chegava mais cedo à emissora, almoçava por lá e eu não. É claro que estávamos dentro de um mesmo ambiente, mas cada um tinha suas responsabilidades, suas funções. Essa mudança permitiu que tivéssemos uma troca diferente. Fico curiosa sobre o que vejo no JN e ele também quer saber das novidades desta minha nova rotina. Toda mudança é sempre bem-vinda, dá um gás novo.
Essa faixa matinal na TV é recheada de conteúdo muito distinto do oferecido pelo JN, no melhor estilo útil-fútil. Como escapar disso?
Temos tentado encontrar outros temas que também possam interessar ao público. Acho que as pessoas têm pouco tempo e querem aproveitá-lo da melhor maneira possível. Nossa equipe está obsessivamente procurando encontrar esses assuntos que não precisam ser pesados, mas que sejam interessantes para uma boa conversa.
Um caso como o da mulher que esquartejou o marido ocuparia qual espaço no programa?
Todo assunto pode ser tema do programa. Se estreássemos esta semana, por exemplo, é claro que a Rio+20 estaria inserida ali de alguma forma. Não necessariamente com entradas ao vivo, mas certamente traríamos o tema para essa grande roda. Já o crime, só se tivéssemos um diferencial, algo que não estivesse sendo mostrado nos telejornais. Ou numa pauta mais ampla que tratasse de outros crimes passionais ou por motivação financeira.
Patrícia Poeta, ao assumir seu lugar no JN, admitiu que estava sorrindo menos do que no Fantástico, já que as notícias não ajudam. Você espera sorrir mais?
Passei exatamente pelo que Patrícia Poeta passou quando saí do Fantástico, é natural. Sobre meu novo programa, certamente estarei pronta para sorrir e me emocionar, dependendo da situação, é claro.
Se você não fosse Fátima Bernardes, quem gostaria de ser?
Uma bailarina clássica de muito sucesso. Como sou brasileira, a Ana Botafogo.
William Bonner já não precisa mais perguntar à mulher, em rede nacional: "Onde está você, Fátima Bernardes?" Agora ela fica no Projac, o complexo de estúdios da Globo em Jacarepaguá, todo santo dia, de segunda a sexta, sem motivo para aparecer na TV em outro endereço que não seja o seu estúdio high tech. Depois de 13 anos dizendo "boa-noite", é hora de enfatizar que seu negócio agora é "bom-dia".
Perto de completar 50 anos, a virginiana Fátima promoveu uma virada rigorosa na rotina, para estrear amanhã, às 10h40, o Encontro com Fátima Bernardes, fruto de oito meses de planejamento, entre pesquisas, reuniões e ideias que pareciam não acabar mais. De fato, não acabam, garante ela.
A essência do programa é a conversa. É a informação a serviço do entretenimento e vice-versa, sob variados pontos de vista e o testemunho de uma plateia de 60 pessoas que só estarão ali sob a condição de acrescentar algo ao conteúdo. "Não é uma plateia de espectadores, é uma plateia de convidados que podem ser entrevistados", conta. "E dá um trabalho danado montar essa plateia todos os dias." Quem disse que seria fácil deixar a bancada do maior telejornal do País? Eis um resumo da nossa conversa.
Apresentar um programa que promove conversa ao vivo aumenta o risco de o apresentador expor sua opinião, o que não ocorria no JN. Está preparada?
É um risco controlado, estou preparada para essa exposição. Talvez seja um vício de jornalista, mas ainda acho que, muito mais importante do que eu dizer se gosto ou não, é levar informação para aquela pessoa que está em casa e não teria condição de ter. Transmito muito mais quando passo conteúdo do que quando passo opinião, é disso que as pessoas precisam. O público pode pensar com a própria cabeça. Vou até dizer, em algumas situações, o que penso, porque numa conversa, não tem como, é natural, mas a minha preocupação é que a gente busque muita informação sobre o assunto em discussão para acrescentar ao repertório de quem vê. Quando saí do jornal, minha ideia era levar a rua que encontrava lá fora para dentro do estúdio.
Todo planejado, o programa poderá ser interrompido a qualquer momento em função do factual. Como virginiana, como você sobrevive a isso?
Mas eu sou toda programada na minha vida pessoal, não profissional. Olha que engraçado: no trabalho, sou uma pessoa corajosa, fiz coisas que jamais imaginaria fazer, não tenho o menor problema com a questão do ao vivo, corri atrás disso a vida inteira. Na vida pessoal já é outra coisa, quando chego ali já gosto de fazer minha listinha, fico desesperada por não saber o que vou fazer no dia seguinte, gosto de ter isso sob controle. Já no trabalho, gosto de ser desafiada, é um exercício para mim, que sou tão controladora, saber que não está tudo sob controle.
Quem escolhe o figurino, agora exibido da cabeça aos pés?
A figurinista responsável pelo programa é a Claudia Kopke, mas ela me dá toda a liberdade para participar desta escolha. Parte dos acessórios, por exemplo, são pessoais, que no começo eu trouxe como sugestão e ela decidiu incorporar. O que me deixa feliz é que o figurino que o telespectador verá inclui peças que também tenho semelhantes em casa, são roupas que realmente uso fora do estúdio.
Sente falta de trabalhar ao alcance do Bonner, ou a mudança de rotina é até bem-vinda?
Quando dividíamos a bancada do Jornal Nacional, nem sempre estávamos juntos o dia inteiro. Ele chegava mais cedo à emissora, almoçava por lá e eu não. É claro que estávamos dentro de um mesmo ambiente, mas cada um tinha suas responsabilidades, suas funções. Essa mudança permitiu que tivéssemos uma troca diferente. Fico curiosa sobre o que vejo no JN e ele também quer saber das novidades desta minha nova rotina. Toda mudança é sempre bem-vinda, dá um gás novo.
Essa faixa matinal na TV é recheada de conteúdo muito distinto do oferecido pelo JN, no melhor estilo útil-fútil. Como escapar disso?
Temos tentado encontrar outros temas que também possam interessar ao público. Acho que as pessoas têm pouco tempo e querem aproveitá-lo da melhor maneira possível. Nossa equipe está obsessivamente procurando encontrar esses assuntos que não precisam ser pesados, mas que sejam interessantes para uma boa conversa.
Um caso como o da mulher que esquartejou o marido ocuparia qual espaço no programa?
Todo assunto pode ser tema do programa. Se estreássemos esta semana, por exemplo, é claro que a Rio+20 estaria inserida ali de alguma forma. Não necessariamente com entradas ao vivo, mas certamente traríamos o tema para essa grande roda. Já o crime, só se tivéssemos um diferencial, algo que não estivesse sendo mostrado nos telejornais. Ou numa pauta mais ampla que tratasse de outros crimes passionais ou por motivação financeira.
Patrícia Poeta, ao assumir seu lugar no JN, admitiu que estava sorrindo menos do que no Fantástico, já que as notícias não ajudam. Você espera sorrir mais?
Passei exatamente pelo que Patrícia Poeta passou quando saí do Fantástico, é natural. Sobre meu novo programa, certamente estarei pronta para sorrir e me emocionar, dependendo da situação, é claro.
Se você não fosse Fátima Bernardes, quem gostaria de ser?
Uma bailarina clássica de muito sucesso. Como sou brasileira, a Ana Botafogo.
Pindaíba - SONIA RACY
O ESTADÃO - 24/06
O vencedor de um páreo comum leva perto de R$ 5 mil duasvezes e meia o custo mensal do criador para manter seu cavalo nas baias do clube.
Procurado, Eduardo da Rocha Azevedo, presidente do Jockey, não quis se pronunciar.
Pindaíba 2
Tem gente dizendo que a penúria seria proposital. Uma maneira de justificar, no futuro, venda de ativos do clube.
Nuvem cinza
A PF estava só esperando o fim da Rio+20 para voltar a pressionar o governo por aumento. A categoria desistiu de fazer protesto durante o evento depois de conversa com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.
Uma das principais queixas é a falta de uma gratificação para quem trabalha na fronteira.
Na expectativa
Mais uma vítima da Operação Maré Vermelha. O Le Pain Quotidien não consegue abrir, porque os móveis – importados da França estão presos na alfândega desde 14 de abril.
Risos em Paraty
Gary Shteyngart, que vem para a Flip, é a grande aposta de humor para este ano. O escritor americano, nascido na Rússia, já usou o galã James Franco para gravar um trailer sobre seu último livro, Super Sad True Love Story.
Risos 2
Shteyngart escreveu carta, em 2006, na qual se derretia em elogios ao País. Em especial, a Salvador.
Responsabilidade social
•Acontece hoje o Campeonato de Tranca Beneficente em prol do Instituto Eu Quero Viver. Organizado por Alice Carta. Na Casa Petra.
•A Procter & Gamble avisa: fez parceria com a Fundação Abrinq, que beneficiará crianças atendidas por creches pelo País. A iniciativa é parte do projeto Creche para Todas as Crianças.
•A Liquigás está apoiando o Cinema BR em Movimento, projeto da Petrobrás que exibe, gratuitamente, filmes para alunos de escolas públicas e colaboradores.
•A Rhodia ampliou seu apoio ao projeto Escolas Sustentáveis. Pretende atender, este ano, cerca de 10 mil estudantes de 27 escolas municipais de São Paulo.
•A Bonafont lançou a hashtag #vaidoaroupa, para motivar internautas a renovar o guarda-roupa – num gesto de solidariedade e participar do Bazar Vida + Leve, que acontece no Q! Bazar até 1º de julho. No Jockey Club de São Paulo.
•A CCR AutoBAn inicia, quarta-feira, a campanha Saúde na Estrada na rodovia Anhanguera. Com dicas de alongamento na boleia, palestras e distribuição de brindes para caminhoneiros.
•A Fundação Estudar acaba de divulgar lista com nomes de 29 estudantes que receberão contribuição financeira para fazer intercâmbio e cursos de graduação ou pós-graduação. No Brasil e no exterior.
•Fátima Pires fará o Bazar do Bem em seu ateliê, com parte da renda revertida para obras assistenciais do Lar Vinícius. Quarta e quinta-feira, no Itaim.
Detalhes nem tão pequenos...
A noite era de lançamento. Mas houve tempo para dúvidas existenciais: “Ser ou não ser?”
2. Os braceletes lembram a heroína She-Ra. Já o esmalte vermelho é da Maria Machadão.
3. “Feliz de quem possui/Uma rosa em seu jardim/A minha amiga com certeza/Pensa agora só em mim.”
4. Apesar de alguns itens da decoração, o evento não foi uma bomba!
5. Tudo pronto para começar.
6. Nem todo bichinho estava impedido de entrar...
O sonho da blindagem própria - JOÃO UBALDO RIBEIRO
O GLOBO - 24/06
Antigamente, desde os bons tempos do Banco Nacional da Habitação, no século passado, falava-se muito no sonho da casa própria, todo mundo tinha o sonho da casa própria. Hoje, quase não se escuta mais a expressão. Imagino que é porque, como verificamos todos os dias em comerciais de televisão e pronunciamentos oficiais, o governo já resolveu o problema da moradia. Os brasileiros (e brasileiras, vivo esquecendo a nova regra; atualmente, falou no macho, tem que falar na fêmea e, portanto, acostumemo-nos: alunos e alunas das escolas públicas, passageiros e passageiras do voo tal, cavalos e éguas do Jockey Club, cachorros e cadelas do Kennel Club, motoristos e motoristas, fisioterapeutos e fisioterapeutas, governantes e governantas, delinquentes e delinquentas, etc.), os brasileiros e brasileiras, dizia eu, agora são mostrados em filmetes radiosos, cheios de dentes, envergando trajes impecáveis e estampando nos rostos a felicidade. Como os demais compatriotas e compatriotos seus, já moram em espaçosas casas próprias, com área de lazer, esgoto tratado, água encanada, transporte acessível, assistência médica e tudo mais que os governos fazem pelo bem público, com os quatro ou cinco meses de nossos salários que na marra afanam. Abate-se o porcentual normal de ladroagem, de desperdício e de propaganda e o que sobra, embora por vezes não muito, é rigorosamente aplicado em investimentos e serviços públicos.
O sonho da casa própria chega perto da obsolescência (perdão por estes novos parênteses, sei que são chatos e sinal de má escrita, mas é somente uma coisinha rápida: alguma entidade malévola me sugeriu escrever "obsoletibilizado", mas segurei a mão a tempo - deve ser porque, não faz muito, ouvi entrevistados na televisão dizendo "proporcionabiliza" e "originalizou", esse negócio pega), mas outro vem ocupar seu lugar, ditado pela eterna insatisfação do brasileiro, que, depois de conseguir uma casa, ainda quer ter o direito de que ninguém a invada para furtar, violentar ou matar. Por essa razão, meu palpite, também baseado em diversas notícias e reportagens que vêm circulando, é que abraçaremos um novo sonho, bem mais moderno, qual seja o sonho da blindagem própria. O Brasil está assumindo a liderança mundial, não só na fabricação e utilização de blindagens de todos os tipos, como no desenvolvimento de tecnologias avançadas, já se prevendo a formação de uma vastíssima cadeia produtiva e comercial.
Creio que a novidade começou em São Paulo, que é onde mora o dinheiro, mas está se espalhando por todo o País. Primeiro vieram os automóveis, cujos fabricantes, em breve, certamente oferecerão (perdão mais uma vez, mas aproveito para conclamar a solidariedade dos amigos, admiradores e usuários do operoso verbo "oferecer", ora vivendo seus últimos dias esquecido e abandonado, pois que ninguém mais oferece nada e, sim, disponibiliza) modelos blindados, diretamente da linha de montagem. E algum empreendedor pode estar pensando em fechar um convênio com o Exército, para produzir a versão civil do Urutu. Blindam-se vitrines, vidraças, guichês, portarias, bilheterias, portas, paredes e, enfim, praticamente tudo. O número de firmas especializadas aumenta, o de técnicos também, declara-se um boom do blindado.
E, diz aqui um jornal, a novidade mais palpitante, no panorama geral da blindagem, é o cada vez mais cobiçado quarto do pânico. Não basta que o edifício tenha garagem, portaria e elevador blindados e que as portas e janelas do apartamento também sejam blindadas. O indispensável agora é o quarto do pânico, bastante inspirado nos abrigos contra armas nucleares que os americanos construíam no quintal, na época da Guerra Fria. No caso dos apartamentos brasileiros, é facilmente previsível uma, digamos, mudança de paradigma. As antigas dependências de empregadas, cada vez mais inúteis, agora terão seu espaço reservado para o quarto de pânico.
Nunca vi um quarto de pânico, mas sei que o essencial, evidentemente, é total blindagem contra ataques de fora. Podem atirar, tocar fogo, meter o pé de cabra à vontade, que não entram. E, lá dentro, tudo depende da imaginação e, principalmente, do dinheiro do dono. Água encanada e banheiro, claro, geladeira, alimentos para alguns dias, equipamento de comunicação com o exterior, ar condicionado, televisão e o que mais se queira. A ideia, me parece, é, ao acontecer no edifício um arrastão, ninguém ficar nervoso por causa de uma ameaça afinal tão corriqueira quanto um jacaré no Pantanal. Os moradores ganham tempo com suas portas blindadas e se socam no quarto do pânico durante dias, se for necessário, até se assegurarem de que podem sair em segurança.
Para os e as que têm muito medo de assaltos ou já passaram por um, as perspectivas não deixam de ser alvissareiras. A classe média deverá contentar-se com apenas um quarto de pânico básico, modelo econômico, mas capaz de enfrentar comodamente um arrastão de até uma semana. Já os ricos e ricas poderão ter, não quartos, mas apartamentos de pânico. Ou edifícios de pânico, ou condomínios de luxo de pânico, quarteirões de pânico, bairros de pânico. O sujeito ou a sujeita que bolar e patentear um restaurante de pânico fica milionário ou milionária, porque é meio estressante o que está acontecendo com quem vai jantar fora, sabendo que vai, mas não sabendo se volta, como os que embarcavam numa caravela do tempo de Pedro Álvares. Melhor dizendo, quem souber aproveitar as oportunidades vai dar-se bem. As perspectivas são bastante mais promissoras do que se houvesse um plano nacional de segurança pública, como muitos e muitas reclamam, sem enxergar que a blindagem gera emprego e renda, de longe superando as ações de segurança pública. E quem quiser segurança terá toda a liberdade para nunca sair do seu quarto de pânico.
No coração de um buraco negro - MARCELO GLEISER
FOLHA DE SP - 24/06
É incrível que buracos negros tenham sido inventados antes de ser descobertos pelo homem
O que acontece com quem cai num buraco negro? Imagino que muitos de vocês perderam muitas horas de sono com isso. Especialmente agora, quando sabemos que existe um buraco negro gigante no centro da maioria das galáxias, inclusive na nossa, um monstro de 4 milhões de massas solares. No dia 13 de Junho, a sonda espacial NuSTAR -equipada com um telescópio que detecta raios X- foi lançada para examinar em detalhe o que ocorre no nosso gigantesco ralo cósmico.
Segundo a teoria da relatividade geral de Einstein, a gravidade pode ser explicada como resultado da curvatura do espaço em torno de um objeto com massa: quando maior a massa do objeto, mais curvo o espaço à sua volta, e maior sua atração sobre corpos vizinhos. Quanto mais curvo o espaço, mais difícil é escapar da sua gravidade.
O buraco negro é o caso no qual o espaço é tão curvo que nada escapa de sua atração, nem mesmo a luz. Para "ver" um buraco negro é preciso olhar para o entorno dele.
Para Einstein e a maioria dos físicos, os buracos negros são um grande desafio. A maioria deles são restos de estrelas que, ao morrer, implodem como balões furados. O problema é que, durante a implosão, a gravidade vai ficando cada vez mais forte. E a implosão não para. No centro da estrela em colapso se forma uma "singularidade", um ponto onde a gravidade é infinitamente forte e as leis da física deixam de fazer sentido.
A singularidade é circundada pelo "horizonte", a esfera que separa a estranheza do buraco negro do mundo exterior. Se você ultrapassar o horizonte, nunca mais escapa: seu destino é continuar até a singularidade, onde será triturado por completo. Mas não há nada a temer, pois bem antes disso seu corpo será esticado feito espaguete e rasgado.
Einstein nunca gostou de teorias que deixam de fazer sentido. Em 1935, escreveu um artigo com Nathan Rosen no qual sugeriu que o centro de um buraco negro é uma ponte para outro local no Universo (ou mesmo para outro universo), e que do outro lado existe um "buraco branco", o oposto do buraco negro, um ponto de onde surge matéria, como uma cornucópia cósmica.
Esses "buracos de minhoca", como ficaram conhecidas as pontes de Einstein-Rosen, vêm inspirando incontáveis histórias e filmes de ficção científica, pois, em princípio, permitem viagens a velocidades maiores do que a da luz. Infelizmente, fora a total falta de evidência de buracos brancos, para manter as duas bocas do buraco de minhoca abertas é necessário um tipo de matéria que tem energia "negativa", até hoje nunca vista.
A coisa piora se a teoria de Stephen Hawking, que prevê que buracos negros evaporam lentamente, estiver correta. Afinal, se evaporarem, tudo o que resta é a singularidade nua, o ponto absurdo. Horrorizados, físicos propuseram que algo protege essa nudez, a Conjectura de Censura Cósmica.
Qualquer que seja o destino da singularidade, é incrível que buracos negros tenham sido inventados antes de ser descobertos, um casamento quase mágico da imaginação com o Cosmo. É como se a natureza nos dissesse: arrisquem mesmo, sonhem alto. E estejam sempre abertos para o inesperado, pois ele está sempre à espreita.
É incrível que buracos negros tenham sido inventados antes de ser descobertos pelo homem
O que acontece com quem cai num buraco negro? Imagino que muitos de vocês perderam muitas horas de sono com isso. Especialmente agora, quando sabemos que existe um buraco negro gigante no centro da maioria das galáxias, inclusive na nossa, um monstro de 4 milhões de massas solares. No dia 13 de Junho, a sonda espacial NuSTAR -equipada com um telescópio que detecta raios X- foi lançada para examinar em detalhe o que ocorre no nosso gigantesco ralo cósmico.
Segundo a teoria da relatividade geral de Einstein, a gravidade pode ser explicada como resultado da curvatura do espaço em torno de um objeto com massa: quando maior a massa do objeto, mais curvo o espaço à sua volta, e maior sua atração sobre corpos vizinhos. Quanto mais curvo o espaço, mais difícil é escapar da sua gravidade.
O buraco negro é o caso no qual o espaço é tão curvo que nada escapa de sua atração, nem mesmo a luz. Para "ver" um buraco negro é preciso olhar para o entorno dele.
Para Einstein e a maioria dos físicos, os buracos negros são um grande desafio. A maioria deles são restos de estrelas que, ao morrer, implodem como balões furados. O problema é que, durante a implosão, a gravidade vai ficando cada vez mais forte. E a implosão não para. No centro da estrela em colapso se forma uma "singularidade", um ponto onde a gravidade é infinitamente forte e as leis da física deixam de fazer sentido.
A singularidade é circundada pelo "horizonte", a esfera que separa a estranheza do buraco negro do mundo exterior. Se você ultrapassar o horizonte, nunca mais escapa: seu destino é continuar até a singularidade, onde será triturado por completo. Mas não há nada a temer, pois bem antes disso seu corpo será esticado feito espaguete e rasgado.
Einstein nunca gostou de teorias que deixam de fazer sentido. Em 1935, escreveu um artigo com Nathan Rosen no qual sugeriu que o centro de um buraco negro é uma ponte para outro local no Universo (ou mesmo para outro universo), e que do outro lado existe um "buraco branco", o oposto do buraco negro, um ponto de onde surge matéria, como uma cornucópia cósmica.
Esses "buracos de minhoca", como ficaram conhecidas as pontes de Einstein-Rosen, vêm inspirando incontáveis histórias e filmes de ficção científica, pois, em princípio, permitem viagens a velocidades maiores do que a da luz. Infelizmente, fora a total falta de evidência de buracos brancos, para manter as duas bocas do buraco de minhoca abertas é necessário um tipo de matéria que tem energia "negativa", até hoje nunca vista.
A coisa piora se a teoria de Stephen Hawking, que prevê que buracos negros evaporam lentamente, estiver correta. Afinal, se evaporarem, tudo o que resta é a singularidade nua, o ponto absurdo. Horrorizados, físicos propuseram que algo protege essa nudez, a Conjectura de Censura Cósmica.
Qualquer que seja o destino da singularidade, é incrível que buracos negros tenham sido inventados antes de ser descobertos, um casamento quase mágico da imaginação com o Cosmo. É como se a natureza nos dissesse: arrisquem mesmo, sonhem alto. E estejam sempre abertos para o inesperado, pois ele está sempre à espreita.
O inexorável pragmatismo da Silva - GAUDÊNCIO TORQUATO
O Estado de S.Paulo - 24/06
"Fica atento às circunstâncias, observa se elas te são favoráveis ou não. Com aqueles cujos partidos a que pertencem os tornam poderosos ou com aqueles que estão bem na corte usa de todos os meios para fazê-los teus amigos." A recomendação é do cardeal Mazarino, autor do célebre Breviário dos Políticos, sucessor de Richelieu como primeiro-ministro de Luis XIII e, após a morte deste, senhor absoluto do Reino da França por 20 anos.
Foi este, seguramente, o conselho que guiou um dos perfis mais execrados do País a se juntar a um dos perfis mais admirados de nossa história em torno do candidato do PT, Fernando Haddad, a prefeito de São Paulo. A arquitetura de conquista do poder a qualquer custo não apenas sela inusitada parceria entre históricos adversários, o ex-presidente Luiz Inácio e o deputado Paulo Maluf, mas põe em relevo malefícios e desvios proporcionados pelo sistema eleitoral.
Ante perturbadora pergunta sobre a razão para justificar a união dos contrários, o próprio Maluf pinça de seu breviário da política o argumento: "Hoje não existe direita nem esquerda; o que há são minutos e segundos de TV e rádio". Maneira de dizer que o socialismo apregoado pelo PT é lorota; que as luzes do passado não iluminam o presente; e que a política, para usar terminologia do dramaturgo Nelson Rodrigues e reinventada pela presidente Rousseff, é conduzida, hoje, pelas mãos de um senhor chamado Inexorável Pragmatismo da Silva. O "silva" se refere a ele mesmo, o todo-poderoso Luiz Inácio Lula da Silva, que comanda no petismo a era pragmática, cujos reflexos estão em todas as partes. É sabido que a esquerda e a direita têm mais serventia para orientar o trânsito do que para criar divisões no arco ideológico. E mais: o estado da política, principalmente nos ciclos eleitorais, resulta da midiatização, fenômeno que leva em conta os tempos dos candidatos no rádio e na TV.
A política, desde os anos 60, ganhou ares de espetáculo. Nos espaços circenses, a imagem dos atores é o que fica gravado na mente dos espectadores. Daí a observação de que a imagem se sobrepõe à verbalização do discurso. A questão ganhou ênfase com o famoso debate entre John Kennedy e Richard Nixon, em 26/9/1960. Os telespectadores viam um Nixon de "pele pálida, branca e transparente e os cabelos negros como azeviche", contraste que dava impressão de abatimento. Ao seu lado, um Kennedy exuberante, sorridente e jovial, a demonstrar confiança e determinação. Lula aprendeu que a imagem anima ou desanima o eleitor. Intuiu que Dilma, sem nunca ter obtido um voto, conquistaria, com larga exposição, a simpatia popular para ganhar o pleito de 2010. Por isso se esforça para ganhar um minuto e meio de TV. Mas Haddad não poderá perder votos por causa da...magem de Lula nos jardins da casa do seu novo (ou velho?) companheiro? Afinal, não foi a foto de Lula congraçando-se com Maluf que afastou Erundina do cargo de vice na chapa petista? Ora, os pragmáticos chegaram à conclusão de que eventuais perdas poderão ser compensadas com a visibilidade aumentada do candidato petista.
O fato é que as campanhas eleitorais se banham nas águas das imagens de candidatos. Para desajustar ainda mais as engrenagens tradicionais da política, dispomos de um sistema eleitoral que privilegia a forma, não o conteúdo. O contato direto com o eleitor se estreita. A mobilização de massas ocorre na esteira dos programas eleitorais. São os comícios eletrônicos que aproximam o candidato do eleitorado. Por suas ondas, o eleitor se depara com a eloquência dos competidores, o tom de voz, os traços fisionômicos, o sorriso, o aprumo da roupa, as cores dos partidos. Toma corpo o que se chama de telegenia, cujos efeitos surgem nas expressões: "Fulano é simpático, carismático; sicrano não tem classe, é grosseiro; beltrano é vago, genérico".
O resultado é uma operação política - para usar expressão atual - terceirizada, pois os candidatos (produtos) são escolhidos pelas cúpulas ou principais lideranças (proprietários), depois de negociações, barganhas, jogo de recompensas (feira, mercado), e "vendidos" (expostos, apresentados) ao eleitor (comprador) pelos intermediários (partidos e meios de comunicação). A democracia direta, sob esse prisma, fica a ver navios. A consagração nas urnas passa, assim, por um sistema de filtros.
O neologismo pode parecer estranho, mas é realista: vive-se o ciclo da midiocracia, a democracia eleitoral engendrada nos laboratórios midiáticos. A inflexão entre midiocracia e mediocracia (a democracia que privilegia a mediocridade) se estabelece naturalmente. Forma-se a teia que José Ingenieros assim descreve: "Enquanto o hipócrita saqueia na penumbra, o inválido moral se refugia nas trevas". Maluf escancarou a vertente quando, menosprezando as clássicas posições do espectro ideológico, enalteceu a visibilidade dos candidatos como condição sine qua non para a eficácia eleitoral. Se o tempo de TV fosse totalmente usado para debates entre candidatos - não para apresentação de escopos autoelogiativos -, teríamos um processo mais democrático.
Mas é lamentável constatar que o engessamento da política ao marketing se torna mais forte a cada eleição. O toque de mestre é dado pelo poder pessoal. Expliquemos. A moldura do Estado Espetáculo, como se sabe, propicia o fenômeno chamado de personalização do poder, que aparece quando uma pessoa, mesmo não detendo o domínio institucional, demonstra agregar imensa capacidade de influenciar. Isso é ainda mais significativo quando o figurante tem carisma, passando a ser visto como pessoa capaz de realizar extraordinárias façanhas, como a eleição de uma mulher para o cargo mais importante do País. A ciência política chama a atenção para os perigos do paternalismo sob uma liderança carismática. O culto à personalidade, a alienação das massas, a embriaguez do poder são alguns deles. Qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência.
Macarronada - LUIS FERNANDO VERISSIMO
O Estado de S.Paulo - 24/06
Helena e Marcos decidiram se casar. Helena avisou a família e ouviu uma queixa do avô:
- Eu não conheço o moço.
Em seguida o avô se lembrou dos tempos em que estamos vivendo e emendou:
- Suponho que seja um moço.
- É, nono. É homem. Vai ser um casamento tradicional.
- Mas eu nem conheço o moço!
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Combinaram que haveria um jantar para o avô conhecer o moço. E mais: o nono cozinharia. Faria a sua elogiada macarronada com molho de ragu secreto. A macarronada era elogiada pela família para agradar ao velho, pois o ragu era intragável. Desconfiavam que o ingrediente secreto fosse grapa. Felizmente, o velho só fazia a macarronada para ocasiões especiais. Como um jantar para conhecer o moço que casaria com sua neta.
- Não deixe de elogiar a macarronada dele - instruiu Helena.
- Certo.
- Fale alto porque ele está ficando surdo.
- Tá.
- E não fale em política.
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O velho admirava o Mussolini. Dissessem o que dissessem dele, Mussolini trouxera ordem e progresso à Itália. Só Mussolini conseguira que os trens italianos andassem no horário. O Brasil precisava de alguém como o Mussolini. O mundo precisava de muitos Mussolinis.
- Vou declarar que eu sou fascista desde pequeno - propôs Marcos.
- Não precisa tanto. Só não toca no assunto.
- Certo.
- Lembre-se: elogiar a macarronada, falar alto e não tocar em política.
- Perfeito.
0 0 0
Mas Marcos sentou-se para o jantar nervoso. Não conseguia decifrar o olhar com que o velho o examinava. Aprovação, desaprovação, desconfiança? O velho não falava. Quando chegou a macarronada Marcos se sentiu na obrigação de dizer alguma coisa.
- Ah - disse. - A famosa macarronada com o molho secreto. Sua neta me falou a respeito.
- Quem? - disse o velho.
- Sua neta. Helena.
O velho olhou em volta da mesa como se pedisse socorro. O que aquele moço estava dizendo? Marcos, cada vez mais nervoso, falou mais alto.
- O molho secreto! Maravilhoso! Ainda não provei, mas só a cor...
- Ahn - fez o velho. - Vermelho. Você gosta de vermelho?
- Não! Não! E tem mais...
Marcos estava tomado de uma espécie de frenesi. Quase gritou:
- Eu acho que o que este país precisa é de alguém que faça os trens andar no horário!
O velho sorriu. Gostara do rapaz. Fez questão que ele repetisse a macarronada com molho de ragu secreto. E o ragu estava pior do que nunca.
As infrações leves - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 24/06
Ao regulamentar o artigo 267 do Código Brasileiro de Trânsito (CBT), que prevê a pena de advertência por escrito, o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) finalmente propiciou uma alternativa para a punição das infrações classificadas como "leves" e "médias".
Sob o pretexto de que o artigo 267 do CBT não podia ser aplicado por falta de regulamentação de alcance nacional e por problemas técnicos, em muitos Estados e municípios as autoridades de trânsito multam indiscriminadamente, quando poderiam advertir por escrito os motoristas flagrados dirigindo sem documentação do veículo, guiando com farol aceso ou luzes queimadas, falando ao celular, fechando cruzamentos, desrespeitando o rodízio municipal ou estacionando em calçadas e faixas de pedestres.
A legislação de trânsito classifica as infrações em três níveis - leves, médias e gravíssimas - e prevê sanções diferenciadas para cada uma delas. Contudo, as autoridades de trânsito há muito tempo desfiguraram o espírito do Código, convertendo as multas em fonte de arrecadação - inclusive com a imposição de metas de produtividade aos órgãos e agentes de fiscalização.
A Prefeitura Municipal de São Paulo, por exemplo, tem até previsão de receita de multa de trânsito. Para este ano, por exemplo, ela estima arrecadar R$ 800 milhões. Mais da metade desse valor decorre de aplicação de multas por excesso de velocidade em até 20% acima do limite da via, desrespeito ao rodízio e estacionamento irregular - ou seja, infrações que a lei classifica como "leves" e "médias" e que podem ser punidas com advertência por escrito. Só nos primeiros cinco meses de 2012, a CET aplicou 187.686 multas - no valor de R$ 85,13 cada uma - a motoristas flagrados falando ao celular. Essa também é uma infração que o CBT classifica como "média".
As sanções de trânsito têm um caráter basicamente educativo, procurando disseminar a condução responsável. É por esse motivo que a legislação de trânsito exige que o produto das multas seja aplicado em campanhas de sensibilização, orientação e educação - determinação que vem sendo descumprida de forma sistemática e acintosa por muitos Estados e municípios.
As regras impostas pela regulamentação do artigo 267, pelo Contran, começarão a valer em 1.º de janeiro do próximo ano. Elas beneficiam os motoristas "primários" - aqueles que não foram flagrados cometendo a mesma infração de trânsito nos últimos 12 meses. A regulamentação também dá aos motoristas sem antecedentes o direito de pedir que a multa seja convertida em advertência por escrito em até 15 dias depois do recebimento da notificação da infração.
No entanto, se o pedido for indeferido, a regulamentação não permite que o motorista ingresse com recurso administrativo e a multa será aplicada automaticamente. Esse é o ponto mais falho e polêmico da resolução baixada pelo Contran. O julgamento dos pedidos de conversão da multa em advertência será feito por órgão do poder público que não quer perder qualquer fonte de receita.
Assim, apesar de ter aspectos positivos, a resolução do Contran não significa um basta à "indústria da multa". Nesse sentido, as reações do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) de São Paulo e da Secretaria Municipal de Transportes de São Paulo à regulamentação do artigo 267 do CBT são ilustrativas. O Detran informou que a conversão da multa em advertência é "facultativa ao órgão atuador". Em nota, a secretaria comunicou que está estudando como "viabilizar" a resolução do Contran, mas não esclareceu se enviará a advertência diretamente aos motoristas infratores ou se vai esperar que eles recorram. Autoridades de trânsito de outros municípios alegam que, por falta de investimento em informática, terão dificuldades técnicas para acessar o prontuário dos condutores, para saber se eles têm infrações "leves" e "médias" registradas nos últimos 12 meses. É uma forma de manter a indústria da multa em funcionamento.
Um ourives e luthier de poesia penetrante - HERMÍNIO BELLO DE CARVALHO
O GLOBO - 24/06
No princípio, era o choro, quase que apenas o choro. Explica-se: a casa, no bairro de Botafogo, era dominada pelo majestoso violão de Benedito Cesar, pai de Paulo Cesar Baptista de Faria, que futuramente ganharia nome artístico: Paulinho da Viola. Na casa viviam a avó, a mãe e o irmão caçula de Paulo Cesar, Chiquinho. Este aí ficava de lado com seu cavaquinho, ou então consertando rádios, vitrolas, gravadores e também instrumentos musicais. Era uma paixão adolescente que, acho eu, iria influenciar o irmão mais velho quando ele, já famoso, entulharia a garagem de sua casa na Barra com carcaças de carros antigos, ou se enfurnava numa imensa e bem fornida oficina de marcenaria, onde se transfigurava, entre outras coisas, em luthier.
O ambiente era dominado quase que apenas pelo choro. Mas convenhamos que era impossível não ouvir as rádios Nacional e Tupi nem ficar indiferente, quando se aproximava o carnaval, aos sons que vinham dos blocos de rua do bairro de Botafogo. Paulinho se escafedia para Jacarepaguá, onde ajudou a organizar o bloco Foliões da Anália Franco. Mas foi seu tio, Oscar Bigode, quem fez com que o jovem entrasse para a Portela, sua escola de coração. O mundo musical de Paulo Cesar ia ganhando esses contornos, abastecendo-se dessas informações, captando esses sinalizadores que incorporaria, depois, à sua carreira.
Tudo mudava quando Benedito Cesar tomava, coincidentemente, o rumo de Jacarepaguá -- mas longe dos tamborins, ganzás e cuícas que fascinavam o filho mais velho. A casa-alvo da visita era enorme, circundada por um grande muro e cheia de árvores -- e a mais frondosa e tonitruante tinha nome e sobrenome: Jacob Pick Bittencourt, o Jacob do Bandolim. E as rodas de choro rapidamente se formavam em torno do anfitrião. Quem passou pelos saraus do Jacob jamais esquecerá aquelas noites. Paulinho, inclusive.
E aí já estamos em meados da década de 1950.
"Olá, como vai?" "Eu vou bem, e você?" Poderia ter sido o diálogo quando fui pagar uma fatura no banco onde Paulinho dava expediente no balcão. Ele conta melhor esse nosso encontro do que eu. A partir dali, amigos e parceiros -- e ele adentrando no "já vi tudo" onde eu morava no Beco do Rio, vizinho à Taberna da Glória e ao maestro Moacir Santos. Minha casa tinha visitantes ilustres, e um deles era Ismael Silva. Os violões clássicos adentravam no apartamentinho que tinha apenas sala, banheirinho e uma quitinete sem-vergonha, onde mal cabia uma geladeira. Reza a lenda que ali, naquele moquifo, fui seu primeiro parceiro. Que Paulinho relembre essa história.
Estamos já na década de 1960. Não, Paulinho ainda não se aventurara a ir profissionalmente ao encontro da música. Isto se deu quando o levei para o então recém-aberto Zicartola, na Rua da Carioca, e onde Cartola deu a ele seu primeiro cachê como músico. Definia-se, ali, o seu destino. E por lá ficou tocando ao lado de Zé Keti, Nelson Cavaquinho, Ismael Silva, Clementina de Jesus, Cartola e os convidados ilustres que iam receber a Ordem da Cartola Dourada, artifício que criei de parceria com Zé Keti para impulsionar as rodas de samba que ele, Zé, criara.
E o que fazia o tímido Paulinho naquele palco diminuto? Acompanhava, simplesmente acompanhava ao violão. Até o descobrirem cantor e compositor levou um tempo.
Os blocos de rua que fizeram com que Paulinho cruzasse seu caminho com o grande Mauro Duarte (Mauro Bolacha), Zorba Devagar, depois Jorge Mexeu e Catoni, não o fizeram afastar-se do choro. E Zé Keti, quietinho, estava sempre por perto, ardilando coisas, botando lenha na fogueira. Era um agregador.
Em dezembro de 1964, vamos assestar os refletores do teatro Jovem na figura extraordinária de Clementina de Jesus, numa série chamada "Menestrel", criada por mim -- e que juntava um músico popular a um erudito. Acompanhando-a, quem? Paulinho da Viola, Elton Medeiros, Benedito Cesar. Turíbio Santos abria o recital. Kleber Santos, dono do teatro Jovem, me chama a atenção: "Você tem um show pronto em suas mãos." Nascia o "Rosa de Ouro", com Clementina, Aracy Cortes e os Cinco Crioulos: Paulinho da Viola, Elton Medeiros, Jair do Cavaquinho, Anescarzinho do Salgueiro e Nelson Sargento, além de um palco despojado, onde projetávamos slides e as vozes de Almirante, Pixinguinha, Lúcio Rangel, Jota Efegê, Elizeth Cardoso e quem mais se possa imaginar. Enfim, a antítese de tudo o que estava na moda. Era uma estética que rádios e TVs ignoravam.
A carreira solo de Paulinho foi iniciada com um disco em que colocamos, com intensa alegria, a música de Valzinho -- entre outros compositores. Valzinho passaria a ser um símbolo de tudo aquilo que não era midiático, sinônimo de total invisibilidade musical. Admirado por Radamés Gnattali e Tom Jobim, ainda assim vivia nas sombras.
Época de festivais, da bossa nova, da jovem guarda de Erasmo e Roberto, o choro praticamente declinando após a morte de Jacob em 13 de agosto de 1969. Falei em 69? Pois um ano depois nosso Paulinho ilumina a década de 1970 produzindo um LP arrebatador com a Velha Guarda de sua amada Portela, e de uma certa forma retomando a linha estética trazida pelos discos do "Rosa de Ouro" e pela discografia de Clementina, da qual participa ativamente.
Há que se revirar a ampulheta, deixar que a areia escorra e nos faça relembrar todas as vertentes que se atravessaram em sua vida, desde o choro tocado com solenidade em sua casa por Benedito Cesar e na de Jacob do Bandolim, e também as sonoridades dos blocos de Botafogo e Jacarepaguá, mais todas as informações trazidas por Valzinho e outros músicos iguais a ele e a Elton Medeiros, seu parceiro mais constante, fizeram com que fosse esculpido esse grande personagem que é Paulinho da Viola, preso à tradição do samba e ao mesmo tempo adentrando a vanguarda ao compor "Sinal fechado", repleto de signos e sinais metafóricos, para, em seguida, despir-se dessa ruptura e de novo vestir, com orgulho, os seus paramentos de sambista.
Vejo-o assim: ourives e luthier a bordar no pentagrama melodias de uma aparente simplicidade. Ourives e luthier de versos desprovidos de arabescos, mas de poesia penetrante que jamais rasteja para a vulgaridade. Nenhuma informação desperdiçada, tudo reciclado em sua arte enxuta, antimidiática por natureza.
Aspiradores de mixarias - HUMBERTO WERNECK
O ESTADÃO - 24/06
À minha frente, na fila do banco, o cidadão de terno gira o pescoço para cá, para lá, periscópio a espreitar perigo - e, num movimento atlético, juvenil, se curva para apanhar no chão alguma coisa que, num relance, pude ver.
Um clips.
Sim, aquilo que o dicionário chama de clipe. Foi isso que o engravatado cavalheiro se deu ao trabalho de catar, antes de reassumir um ar empertigado de pessoa jurídica. (Já reparou? Tem gente que, mesmo sem CNPJ, tem cara de pessoa jurídica. Quando morre, a família poderia anunciar: fulano foi "descontinuado".) Um clips, e nem dos graúdos, nem colorido. Daqueles, vai ver, de metal vagabundo, que enferrujam os papéis.
Mais um marmanjo - pensei eu, fitando a nuca que já grisalhava -, mais um marmanjo incapaz de resistir à tentação de embolsar qualquer coisa que se ofereça de graça, ainda que se trate, como no caso, de insignificância.
Minutos depois de pinçar com mão de pivete semelhante tesouro, chegou a sua vez de ser atendido; pediu notas de cem, as quais, no bolso do seu paletó de grife, foram fazer companhia ao clips. De lá extraiu um iPhone de última geração, e nele desandou a dizer coisas graves, empresariais (quase posso jurar que ouvi "debêntures").
Toda essa conversa para chegar a esta crucial pergunta: você se abaixaria para recolher um clips, mesmo não tendo duas folhas de papel para juntar? A borrachinha em cima do balcão, quando a atendente sai para imprimir a guia dos exames? O lápis, a canetinha ordinária que encontrou na mesa de reunião?
Tudo bem, compreendo que não queira responder. Também eu, devo confessar, eventualmente correria o risco de agravar meu problema de coluna para cometer o que em linguajar jurídico se chama apropriação de coisa achada. Me lembro de ter feito algo assim, muitos anos atrás - mas não só a coluna estava em ordem como o móvel do venial delito vinha a ser mais que um clips ou uma borrachinha: 280 francos, a antiga moeda francesa, que vi na areia à minha frente ao sair da praia em Montecarlo. Não era uma fortuna - ou era, pois correspondia a quase 40% do valor da bolsa que o governo da França me pagava. (O que fiz com a grana superveniente? Torrei toda, e mais um pouco, num caça-níqueis do cassino, ensandecido que estava pelo som dessa caixa de música dos pobres que é o retinir das moedas despencando na cuia metálica das máquinas ao lado. Posso ouvir você dizendo: Deus, ou alguém por Ele, castiga...).
Fernando Sabino falou da mania que dele por um tempo se apossou, de catar moedas na rua. Não para engordar seu porquinho, que disso não carecia, mas pelo gosto menineiro da brincadeira. Bem mais inocente que aquela dama endinheirada de minhas relações, a qual nas suas incursões por lojas de roupas finas sempre dá um jeito de arrancar o botão reserva de blusas e camisas - para deles, admite envergonhada, fazer coisa alguma. Diferente de outros gatunos: dos meus tempos da Playboy, me lembro de uma peladona que assaltou a maquininha de guloseimas num hotel londrino, e, apanhada, teve que bancar cada bombom devorado.
Tem gente que não faz o check-out no hotel sem antes enfiar na mala o conteúdo do kit à disposição do hóspede, não necessariamente cleptomaníaco, no banheiro do apartamento. Sei de um que nunca deixa de empalmar xampu, condicionador e touca de banho - embora já não lhe reste no coco um solitário fio de cabelo. Nunca se sabe, justifica esse sebastianista do imaginário capilar.
"Do hotel, carrego tudo a que tenho direito", vangloria-se outro viajante contumaz, que para otimizar a diária seria capaz de não pregar o olho. Sai do café da manhã com uma provisão de geleia, mel e requeijão nos bolsos e um par de bananas na mão. No apartamento, não deixa para trás os sacos da lavanderia, os envelopes e os papéis de carta e, mesmo não tendo prendas domésticas, o estojinho com agulha, linhas e botões. "Só não levo aquela Bíblia da gaveta do criado-mudo, que essa ninguém leva mesmo", desdenha nosso aspirador de mixarias, entre as quais, revela, há uma boa quantidade de clips, coletados, informa, em circunstâncias que você não pode imaginar.
Contra o relógio - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 24/06
A data da liberação do processo do mensalão pelo revisor Ricardo Lewandowski pode adiar o início do julgamento, marcado para 1º de agosto. Para que o calendário seja cumprido, o ministro precisa entregar o relatório até amanhã. Pelo regimento do Supremo Tribunal Federal, a devolução tem de ser publicada. A partir daí, o STF tem 48 horas para comunicar aos 38 réus e ao Ministério Público. Se o revisor liberar o voto na sexta, esse procedimento fica para depois do recesso.
Um a menos Como a volta do recesso é justamente 1º de agosto, o julgamento começaria no dia 6, com os novos prazos. Isso pode impedir que Cezar Peluso, que faz 70 anos em 3 de setembro, vote antes de se aposentar.
Pote até aqui... Por sua vez, Lewandowski não esconde de colegas do Supremo e de advogados a insatisfação com o rito fixado para o caso. Diz que o calendário foi definido à sua revelia e que pela primeira vez na corte um julgamento é marcado antes que o revisor libere os autos.
... de mágoa Queixando-se de trabalhar "20 horas por dia", Lewandowski avisou que o voto ainda não está pronto, mas que deve conclui-lo até o fim da semana. Ele recusou a oferta de mais juízes assistentes feita pela presidência do Supremo há algumas semanas.
Nova... Mulher de Carlinhos Cachoeira, Andressa Mendonça diz que o marido relatou ter sido chantageado pelo jornalista Luiz Bordoni, que ameaçou divulgar a relação do contraventor com o senador Demóstenes Torres. Segundo ela, os R$ 45 mil depositados na conta de Bordoni foram "provavelmente'' pagos por Cachoeira.
... versão Aliados de Marconi Perillo (PSDB) esperam que Andressa repita isso em depoimento à CPI do Cachoeira, ainda não marcado. Até agora, Bordoni tem dito que o dinheiro foi depositado por um assessor do governador, Lucio Gouthier, em 2010.
Tipo exportação Do deputado Eduardo Cunha (RJ), fazendo piada com o impeachment a jato no vizinho Paraguai e aproveitando para extrair caráter didático do episódio: "Fernando Lugo percebeu a falta que faz um PMDB na base de apoio".
Rebolado Guardado a sete chaves pelo QG tucano, um dos jingles da campanha de José Serra será apresentado hoje durante a convenção. Versão do hit "Eu quero tchu, eu quero tchá", da dupla João Lucas e Marcelo, diz em seu refrão: "Eu quero Serra, eu quero é já!"
Antes não tinha Para subsidiar seu discurso, Serra consultou ex-secretários de pastas estratégicas na prefeitura, como Educação, Saúde e Transportes. A ideia é usar números comparativos da gestão tucana nas searas sensíveis ao debate eleitoral.
Indeciso Desafeto de Serra, o secretário estadual de Energia, José Aníbal, diz que irá à convenção, mas tergiversa sobre sua escolha nas urnas: "O voto é secreto".
Trampolim Presidente do PTB, Roberto Jefferson prevê a manutenção da candidatura da sigla. "O D'Urso está doido para ser vice do Haddad." Segundo ele, o presidente da OAB-SP procura "vitrine" para se lançar a deputado federal em 2014.
Tô fora Jefferson diz que a aliança com o PT melindraria Geraldo Alckmin. "Mas com o Serra não dá", avisa.
Lição de casa Alckmin passou a ler o clipping do governo munido de caneta marcadora de textos vermelha, com a qual assinala todos os problemas que demandam resposta emergencial de sua equipe. "Temos recebido muita nota vermelha dele", diz um secretário.
Tiroteio
O Congresso paraguaio decretou o impeachment de Lugo e, ao mesmo tempo, deixou o país com um pé fora do Mercosul.
DO DEPUTADO DR. ROSINHA (PT-PR), que integra o Parlasul, analisando as consequências diplomáticas para o Paraguai após o afastamento do presidente.
Contraponto
Leitura subliminar
Reunidos em sessão do Conselho de Ética, senadores ouviam atentamente o presidente da comissão, Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), relatar a decisão do ministro José Antonio Dias Toffoli de postergar a votação do relatório de cassação do mandato de Demóstenes Torres (sem partido-GO). Em determinado momento, Valadares cometeu ato falho, levando todos aos risos:
-O ministro exagerou, quer dizer, exauriu decisão!
Presente à sessão, o senador Eunício Oliveira (PMDB-CE) prontamente interveio:
-Olha o subconsciente, senador!
É hoje! Forró do Rala Rola! - JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 24/06
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Oba! Hoje é São João! Olha este convite direto de Salvador: "Arraiá das Mariposas Andantes. Forró Pesado. Participação especial: Mulher Perereca". E perereca pula fogueira?
E a Dilma proibiu o forró pé de Serra. Agora só pode o forró pé de Dilma! E eu vou ralar o bucho até arriar a fivela! E a Polícia Federal prendeu tanta quadrilha que só falta o pinhão, a pinga e a paçoca.
Aliás, se depender de quadrilha, vai ter festa junina o ano inteiro. Em vez de fogueira, Cachoeira. E em Natal tem um forró pra terceira idade chamado Forró da Pêia Mole! E tudo o que a terceira idade quer é comer sal, torresmo e mulher.
Aliás, tudo o que a terceira idade quer é não estar na terceira idade. Rarará! E o traje é camisa xadrez de sanfoneiro de puteiro!
Turco-circuito em Sampa! Esta é a foto da semana: Lula, Haddad e Maluf! Aliança do Lula com o Maluf não é aliança, é algema. Rarará! O Lula achou o Maluf antes da Interpol! E tão dizendo que, se o Lula quer mais tempo de TV, devia fazer aliança com o Chaves!
E diz que o Lula vai na Ana Maria Braga ensinar a receita de frango à Maluf: primeiro você rouba o frango, depois faz como você quiser mesmo!
E o Maluf nunca mentiu: "Eu não tenho dinheiro no exterior". E não tem mesmo. Porque o dinheiro não é dele, é NOSSO! Rarará! E como disse um amigo no meu Twitter: quem é o vice do Haddad? ERA UNDINA! Rarará!
E tô adorando "Avenida Brasil"! Novela barraco! UFC das nove! Ultimate Barraco Fighting! E a Nina parece a Noiva-Cadáver. E a Carminha dando piti parece Carrie, a Estranha! E se a Suelen viesse numa carroça, a gente começava a chupar pelo burro! Rarará!
E em Manaus tem um forró chamado Gemido da Cabrita. E em Itaitinga, no Ceará: O Fungado da Jiboia! E em Contagem, Minas, tem um forró superanimado: Forró do Rala Rola! Mas animado mesmo é o do Bar do Ceará, em São Bernardo do Campo: Forró da Mulher Feia!
E animado mesmo é no interior de Pernambuco: Forró do Rogério Bomba. E, por último, no Maranhão, tem um forró de fim de noite chamado Derrubando e Comendo Logo! Deve ser do Sarney! Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
Mítica do articulador - DORA KRAMER
O Estado de S.Paulo - 24/06
Muito tem se falado sobre os recentes atos políticos imperfeitos do ex-presidente Lula.
Ora os tropeços são atribuídos a presumidos efeitos de medicação decorrente do tratamento de um câncer na laringe, ora a uma suposta crise aguda de onipotência pós-Presidência da República.
Seja qual for a tese defendida, seus autores partem do princípio de que Lula sempre acertou e de repente começou a errar sem uma explicação plausível para as falhas em seu instinto tido como infalível.
Há um assombro geral com a desfaçatez do ex-presidente ao passar por cima de tudo e de todos, da lógica, dos procedimentos institucionais sem a menor preocupação com as circunstâncias de seus companheiros de partido e com a repercussão de suas ações sobre a opinião pública.
Da mesma forma que se acha capaz de submeter processos eleitorais à sua vontade, não avalia consequências, não dá ouvidos às críticas preferindo enquadrá-las na moldura da conspiração engendrada por adversários políticos dos quais a imprensa seria agente engajado.
Falta, nessas análises, um exame mais acurado do ambiente político como um todo e do histórico de ações de Lula.
Se olharmos direito, não é de hoje que age assim - fez e disse barbaridades enquanto estava na Presidência - nem é o único a atuar de costas para o contraditório como se qualquer ação estivesse a salvo de reações.
O Congresso vem construindo há muito tempo sua crescente desmoralização agindo exatamente da mesma forma: toma decisões que excluem o interesse público, voltadas para seus próprios interesses como se a sociedade simplesmente não existisse.
Os escândalos ali produzem no máximo recuos temporários, promessas não cumpridas e recorrentes avaliações de que o Parlamento é um Poder aberto e, por isso, vítima de ataques injustos.
Sob essa argumentação os erros se acumulam, mas não cessam. Quando se imagina que deputados e senadores tenham ciência do repúdio que provocam, eis que de novo tentam patrocinar uma farra de salários mal saídos de crises em série decorrentes de farras de privilégios outros.
Lula achou que pudesse descartar impunemente a senadora Marta Suplicy, aproximar-se de Gilberto Kassab ao custo do constrangimento da militância e do discurso petista, anular uma prévia reconhecida como legal no Recife, pedir bênção a Paulo Maluf, direcionar a posição de um ministro do Supremo Tribunal Federal e administrar uma comissão de inquérito ao molde de seus interesses como se não houvesse amanhã.
E escolheu agir assim por quê? Porque é assim que as coisas têm funcionado na política.
Lula não é o espetacular articulador que se imagina. Apenas tinha, e agora não tem mais, todos os instrumentos de poder nas mãos, os quais utilizou com ausência total de escrúpulos. Quem age ao arrepio das regras ganha sempre de quem é obrigado a segui-las.
Assim como faz o Congresso quando inocenta parlamentares de culpa comprovada, adapta a Constituição às suas conveniências, adia a reforma política, não acaba com o voto secreto para processos de cassação de mandatos e inventa regras segundo as quais a comprovação de desvios de vida pregressa não serve como critério de avaliação da conduta presente.
Nem Lula comete erros novos nem o Parlamento deixa de ser reincidente.
Ambos se unem no mesmo equívoco, imaginando que seja possível fazer a opção por atos erráticos acreditando que não chegará o momento em que aquilo que parece sempre certo começa irremediavelmente a dar errado.
Borralheiro. Caladinho, o PMDB se ressente do isolamento imposto pelo PT na eleição de São Paulo.
Até a volta. Duas semanas de intervalo, antes da eleição e do julgamento do mensalão.
Mais reformas - ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 24/06
O Ministério da Previdência fechou uma proposta de reforma que prevê restrição de benefício a pensionistas. Ela pretende reduzir as pensões do INSS para quem ficar viúvo de agora em diante em até 50% do seu valor. Uma das regras prevê que um novo casamento extingue o direito à pensão. O ministro Garibaldi Alves justifica: “Não basta a Previdência inaugurar prédio. A Previdência tem que ser sinônimo de justiça social.”
Colocando panos quentes
A presidente Dilma pediu à ministra Maria do Rosário (Direitos Humanos) para solucionar um problema com a família de Vladimir Herzog. O Brasil afirmou à Organização dos Estados Americanos (OEA), semana passada, que é impossível abrir investigação criminal para apurar sua morte. Rosário telefonou sexta-feira para Ivo, filho de Vlado, e acertou reunião com ele na segunda-feira à tarde, no Instituto Herzog, em São Paulo, para evitar mais constrangimentos. Ivo reclamou da decisão do governo brasileiro e ameaça devolver prêmio concedido ao instituto ano passado pela Presidência da República.
“O PT ficar com os três líderes no Parlamento, o da Câmara (Arlindo Chinaglia), o do Congresso (José Pimentel) e o do Senado, é uma engenharia difícil” — Walter Pinheiro, líder do PT no Senado (BA)
VAI SER DURO. Acostumado a ver o crescimento do número de prefeituras, o PT se prepara para uma queda eleitoral nas capitais este ano. Atualmente, o partido tem sete prefeitos: Recife, Fortaleza, Palmas, Vitória, Goiânia, Porto Velho e Rio Branco. As análises internas são desanimadoras. Além das dificuldades, em Recife e Fortaleza, devido a desacertos internos e com os partidos aliados, as candidaturas na maior parte das capitais não são consideradas competitivas.
Sem convite
O prefeito de Recife, João da Costa, vai à reunião do diretório nacional do PT, segunda-feira, para defender sua candidatura. Não teria direito a participar, pois não é do diretório. Mas a direção abrirá exceção e permitirá que ele fale.
Qual dos irmãos?
O PT decide na reunião do diretório se apoiará em Campina Grande (PB) Veneziano do Rêgo (PMDB), irmão do presidente da CPI do Cachoeira, Vital do Rêgo, ou Daniella Ribeiro ( PP), irmã do ministro das Cidades, Aguinaldo Ribeiro.
No encalço de Marconi Perillo
O relator da CPI do Cachoeira, Odair Cunha (PT-MG), está decidido a desvendar a venda da casa do governador Marconi Perillo. Esteve duas vezes em Goiânia, semana passada, e aposta no depoimento do arquiteto Alexandre Milhomem. Ele foi contratado pela mulher de Cachoeira, Andressa, por R$ 50 mil, para fazer a reforma da mansão. Para Odair, quem mora em casa emprestada não desembolsa uma quantia destas só para fazer um projeto, além dos custos da obra.
E agora?
O governo se depara esta semana com assembleias de diversas categorias que pressionam por aumento. PF e Receita ameaçam fazer greve, se não tiverem seus salários reajustados. O governo resiste. Difícil chegar a um entendimento.
Trabalho sem fim
A CPI aprova requerimentos sem parar. A sala-cofre está entupida de documentos, muitos nem tocados. A quebra do sigilo telefônico da Delta ampliará o problema: extratos de 2.447 linhas de celular chegarão nos próximos dias.
FORÇA-TAREFA: De posse de todos os áudios das operações Vegas e Monte Carlo, a CPI escalou 15 técnicos para ouvir e comparar com o material editado, que está nos dois inquéritos.
A DESTITUIÇÃO do presidente do Paraguai, Fernando Lugo, vai salvar a próxima reunião do Mercosul, dias 28 e 29, em Mendoza, na Argentina. Antes, a reunião seria esvaziada e apenas para cumprir tabela.
SESSÃO DE CINEMA. Integrantes da CPI do Cachoeira estão ávidos para assistir às dezenas de vídeos de políticos que foram gravados pelos estúdios Carlos Cachoeira. A torcida é grande.