O ESTADÃO - 15/12
As especulações acerca da possibilidade de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ser candidato ao governo do Estado de São Paulo em 2014, ou até mesmo à Presidência da República, suscitam a oportunidade para discutir o papel político de um ex-presidente. Antes de tudo, há que registrar que essas especulações têm sido negadas pelo próprio Lula.
Na contemporaneidade, dois americanos - Jimmy Carter e Bill Clinton - poderiam ser adotados como modelos analíticos para se discutir uma possível tipologia de conduta de ex-presidentes. Jimmy Carter constitui o modelo por excelência: depois de sair derrotado na busca de um segundo mandato presidencial, ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 2002 e o reconhecimento e a admiração gerais por se dedicar a causas humanitárias universais. Bill Clinton, numa escala talvez um pouco menor, também exerce atividades nada desprezíveis, mobilizando recursos e vontades ligadas a causas humanitárias e a necessidades de grupos específicos. Esses dois ex-presidentes dos Estados Unidos criaram fundações ou institutos, preservam o seu legado e proferem palestras, levantando recursos seja para fins humanitários ou particulares.
Como exemplos de causas humanitárias e universais podem ser indicadas a luta pela paz mundial ou pela paz em conflitos localizados; o desarmamento nuclear; as lutas pela redução da fome, da miséria e da pobreza; a luta contra epidemias; o combate ao racismo e às discriminações; a luta pelo reconhecimento e por direitos de grupos sociais, sexuais e minorias étnicas; a questão ambiental, etc.
Se levarmos em conta apenas a atividade dos ex-presidentes brasileiros que foram eleitos diretamente e terminaram os seus mandados - Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Lula (PT) -, podemos dizer que, grosso modo, não chega a haver uma diferença substantiva entre ambos. Fernando Henrique e Lula constituíram institutos, proferem conferências, intervêm em assuntos políticos conjunturais, participam de campanhas e desenvolvem atividades em seus respectivos partidos. O que há é uma variação de ênfases e de intensidade: Lula é mais assertivo na atividade política cotidiana. Já Fernando Henrique tende a se vincular a causas mais gerais.
Lula saiu do governo com um capital político maior do que o levado por Fernando Henrique. Por isso mesmo corre maiores riscos e terá de dedicar mais empenho para preservá-lo. O que pareceria recomendável, nessas circunstâncias, é uma ação orientada pela prudência, visando a manter o que alcançou e, na medida do possível, ampliar o que já tem em termos de reconhecimento e de conteúdo historicamente significativo. Mas o petista, ao que parece, dispõe-se a pôr o seu capital político em risco, com intervenções e apostas impetuosas. Mais cauteloso, Fernando Henrique, buscando preservar o que obteve, dispõe-se a correr riscos calculados e, na medida do possível, acrescentar algo mais ao que já conquistou.
Ser ex-presidente parece não ser uma tarefa nada fácil. Depois de ter ocupado a magistratura máxima do país, tudo o que fizer em termos políticos hodiernos terá um significado menor do que aquilo que já fez como presidente e correrá maiores riscos de desgaste. É justamente por isso que o aconselhável é que um ex-presidente se volte para atividades e causas de caráter humanista e universalizante. Do ponto de vista da política interna, deveria tornar-se uma espécie de conselheiro da nação, do povo, e do presidente em exercício. Deveria também conter-se para se pronunciar apenas em momentos históricos decisivos, em situações de crise, de dúvidas, emitindo conselhos positivos e expressando uma conduta exemplar. Essa tipologia de conduta acrescentaria a um ex-presidente mais reconhecimento e respeito.
O problema da conduta de um ex-presidente diz respeito ao que ele quer deixar como legado histórico. É de supor que uma pessoa que alcança a Presidência da República, além de deixar uma obra significativa para a História, busque alcançar a honra e a glória imorredoura, que era o objetivo perseguido pelos grandes líderes e estadistas do mundo antigo. Nesse sentido, um presidente que não seja um mero aproveitador das circunstâncias nem aja movido por vaidade e cobiça, que exerça a política por vocação e queira deixar um legado, buscará imprimir aos seus atos um sentido de grandeza e heroicidade.
O protótipo de herói, como nos mostra Hannah Arendt, foi Aquiles, que, depois de realizar grandes feitos, morreu jovem, impedindo que o tempo arruinasse o que havia conseguido. Alcançou assim a imortalidade da glória eterna.
Ninguém pode exigir a mesma coisa de um presidente ou de um ex-presidente. Com o desaparecimento do sentido trágico da existência (e da política), os políticos que não sucumbem à fama efêmera do momento têm a alternativa de buscar o heroísmo épico com o qual se procura contribuir de forma singular para a construção da História da nação. Ulisses, guiado pela astúcia e pela prudência, poderia servir de modelo.
Resta discutir o retorno de Lula. Ser governador de um Estado brasileiro é algo menor do que ser presidente da República, fator que representaria uma descapitalização do significado histórico do ex-presidente. Quanto ao retorno à Presidência, excetuando a trágica normalidade da pobreza e da desigualdade, o Brasil não vive um momento de excepcionalidade que requeira a presença de um "homem imprescindível", aos moldes de um Franklin Delano Roosevelt, que teve quatro mandados sucessivos.
A volta proporciona o risco de produzir resultados aquém daquilo que já se realizou. No retorno não há mais o vigor e a força do primeiro momento. Uma volta só se justificaria se o Brasil corresse grande perigo ou sofresse grave ameaça. Na experiência brasileira, na volta ao poder Getúlio Vargas teve de se resgatar com um tiro no coração.
Não sei , sinceramente , o que credencia LULA a um 3º mandato. Depois de tantos escândalos, ver na figura desse Senhor, o nome mais apropriado para assumir as rédeas de um país em desenvolvimento, é como alçar um ex-presidiário ao cargo de diretor da penitenciária.
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