segunda-feira, dezembro 03, 2012

Infantilidade da democracia - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 03/12


Com a Constituição de 1988 próxima de completar um quarto de século de vigência, já é tempo de uma discussão séria sobre a pulverização partidária, confundida por alguns como sinal de vigor do regime democrático. Se assim fosse, quanto mais legendas tivessem representação plena no Congresso, mais sólida seria a democracia. EUA e Inglaterra seriam terríveis ditaduras. Compreende-se que, com a volta de governos civis, a partir de 1985, todo um anseio de liberdade reprimido pela ditadura militar tenha levado o Congresso a aprovar, na Constituição e fora dela, normas e regras irreais no campo da representatividade política, entre outros.

Veio daí o afrouxamento excessivo para a criação de outros entes federativos. Surgiu, então, uma indústria de criação de municípios, contida tempos depois. Mas o mal já estava feito: a grande maioria das 5.265 prefeituras não consegue sobreviver com recursos fiscais próprios. Muitas sequer arrecadam o principal imposto municipal, o IPTU. Vivem dos repasses federais e estaduais. Existem apenas para os desígnios clientelistas de caciques regionais.

A fundação de partidos padeceu da mesma contaminação dessa espécie de doença infantil da democracia. Como, na ditadura, tudo estava proibido — partidos à esquerda foram para a clandestinidade, qualquer tipo de manifestação social era reprimido —, seria natural que, na redemocratização, ocorresse o oposto. Foi o que aconteceu. Mas surpreende que, diferentemente do que aconteceu na formação de municípios, as normas sobre a instituição de partidos tenham continuado frouxas. Surpreende, porém não espanta. Até porque as cifras do fundo partidário exercem grande atração sobre certos políticos.

A pulverização partidária cria evidentes dificuldades na formação das alianças, cuja negociação terminou resvalando para o campo aberto da negociata — o mensalão é parte desta história. O Congresso tentou resolver o problema, ao estabelecer, em 1995, para entrar em vigor em 2006, uma “cláusula de desempenho” ou de “barreira” para os partidos terem plena representatividade no Parlamento: na Câmara federal, um mínimo de 5% dos votos válidos nacionais, em pelo menos nove estados, com não menos que 2% em cada um. Dos 29 partidos existentes em 2006, restariam PT, PMDB, PSDB, PFL (DEM), PP, PSB e PDT.

Os nanicos — “ideológicos” ou “históricos” incluídos — gritaram e a regra caiu, por unanimidade, no Supremo. Alegou-se que a cláusula feria “direito das minorias”, e o Congresso ainda cometeu o erro de tratar do assunto por meio de projeto de lei ordinária. Teria de ser por emenda constitucional, caminho indicado para também contornar a questão das minorias. Afinal, a cláusula não extingue partidos, apenas limita sua atuação no Congresso.

O fato é que hoje são 30 partidos, muitos vivendo da traficância de várias mercadorias (hora de TV etc.). Queira-se ou não, a democracia brasileira tem grave problema de representatividade. Tanto que existem movimentos no Congresso para pelo menos barrar a produção da indústria de legendas. Deve-se é resgatar a ideia da emenda constitucional.

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