sábado, dezembro 29, 2012

Entre avanços e carências - EDITORIAL ZERO HORA

ZERO HORA - 29/12


Os últimos anos confirmam que, assim como a China está para o crescimento econômico, o Brasil está para o desenvolvimento social, como sintetizou o presidente do Instituto de Política Econômica Aplicada (Ipea), Marcelo Neri. Ainda assim, nem as radicais transformações socioeconômicas registradas desde o início da estabilidade, há quase duas décadas, foram suficientes para aproximar os dois Brasis que outro economista, Edmar Bacha, definiu há algum tempo como Belíndia _ o lado Bélgica, rico, e o Índia, pobre. Uma aproximação consistente entre esses dois polos, com a redução dos abismos sociais, exige que o país tenha capacidade de levar sua população a depender menos das políticas de transferência de renda e mais dos ganhos do trabalho, reforçados pela maior rentabilidade em consequência de uma educação de mais qualidade.
De todas as transformações registradas no país depois da estabilização econômica, nenhuma alcançou tanta repercussão quanto a notável ascensão social dos brasileiros e, em consequência, o salto do país na direção de padrões semelhantes aos de nações adiantadas. Favorecidas pelas políticas de inclusão social, mais de 30 milhões de pessoas _ o equivalente a toda a população da Venezuela _ ascenderam para as classes A, B e C. Desse contingente, 20 milhões, quase duas Bolívias, saíram da pobreza. Em consequência, 53% da população brasileira, agora, é de classe média e desfruta de um país mais democrático, mais justo, menos desigual, mais alfabetizado, mas também mais velho. O crescimento no número de idosos impôs desafios novos tanto no âmbito educacional quanto no da Previdência, para os quais será preciso buscar soluções urgentes. Os problemas, porém, não se resumem a esses dois aspectos, estendendo-se a uma série de outros pontos igualmente preocupantes.
Nos últimos anos, o poder público tem dado prioridade a bolsas de auxílio financeiro e a socorros eventuais que ajudam a melhorar o poder aquisitivo das faixas de menor renda, mas pouco contribuem para suprir falhas no atendimento a demandas básicas. A mais gritante das carências é a que persiste na área de saúde pública _ tema apontado sistematicamente como a maior preocupação dos brasileiros em pesquisas de opinião pública. A chaga, em total desacordo com o Brasil emergente, resulta do descaso contumaz do poder público a essa área, contaminada por gestões ineficientes e por práticas de corrupção.
O mesmo país que avança economicamente e, apesar da frustração do Produto Interno Bruto (PIB) em 2012, amplia renda e reduz desigualdades não se dispôs a enfrentar questões relacionadas à saúde e ao bem-estar da população. Ainda hoje, quase 40% das residências brasileiras não têm qualquer tipo de saneamento básico. Nos Estados Unidos, por exemplo, apenas 0,6% das casas não contavam com água encanada e vaso sanitário com descarga nos dados do último Censo. O comparativo dá uma ideia de quanto o Brasil ainda precisa avançar para atender pontos elementares numa área que tem tudo a ver com a saúde da população.
Uma simples elevação na média de anos de estudo é suficiente para tornar os cidadãos mais bem informados e, portanto, mais exigentes em relação a seus direitos, entre os quais se incluem ações para assegurar maior qualidade de vida. O poder público, por sua vez, deve se comprometer em fazer a sua parte em relação a esses e outros aspectos essenciais para suprir carências da população, com ênfase sobretudo em educação de qualidade. O país precisa criar as condições para apostar mais nos ganhos do trabalho, com ênfase na educação, e menos em ajudas oficiais como alternativa para a redução de desigualdades.

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