domingo, dezembro 23, 2012

Duas leituras da desaceleração - SAMUEL PESSÔA

FOLHA DE SP - 23/12


A 1ª visão atribui a queda às dores do parto de um novo padrão de crescimento; a 2ª vê recuo na produtividade


O crescimento do PIB de 0,6% no terceiro trimestre ante o segundo consolidou o prognóstico de que o resultado de 2012 será próximo de 1,0%.

Considerando que o crescimento em 2011 foi de 2,7%, a média no primeiro biênio da presidente Dilma foi de 1,9% ao ano.

Também sabemos que essa forte redução do crescimento não foi compartilhada por nossos pares da América Latina -somente o Paraguai fechará 2012 com resultado inferior ao nosso-, além de ter sido produzida, pela ótica da demanda agregada, por uma fortíssima redução do investimento.

Pouco menos de 70% da queda do crescimento que ocorreu no último biênio em comparação com o período 2004-2010, quando a expansão média foi pouco acima de 4% ao ano, resultou da redução do investimento em capital fixo e dos estoques.

Assim, parece ser consensual que a causa próxima da desaceleração foi o baixíssimo dinamismo do investimento. As projeções do Ibre indicam que no quarto trimestre o investimento apresentará retração de 1,2% ante o terceiro, totalizando o sexto trimestre com crescimento do investimento no vermelho.

Há dúvida e polêmica quanto à interpretação da desaceleração e, portanto, com relação às causas últimas do fenômeno do baixo dinamismo. Parece haver no debate público duas visões. Nesta coluna, apresento meu entendimento delas e meu posicionamento.

A primeira visão, apresentada na entrevista do secretário de Política Econômica ao "Valor Econômico" na segunda passada, argumenta que a queda do dinamismo é consequência das dores de parto de um novo padrão de crescimento. Parece que o secretário diz que a redução dos juros e a desvalorização do câmbio ensejaram um processo de ajustamento das empresas que requer tempo para se completar.

O ex-ministro e professor emérito da USP Delfim Netto parece defender uma variante dessa argumentação. A presidente teria, com sucesso, ajustado as principais variáveis macroeconômicas, mas, simultaneamente, por problemas de comunicação, houve, por parte do empresariado, o entendimento de que a política econômica seria muito contrária aos interesses do capital. O professor tem o entendimento de que esse não é o caso, mas é necessário que o governo melhore seus canais de comunicação com o empresariado para que o investimento decole.

A segunda visão, da qual compartilho, considera que a aceleração do crescimento no período Lula foi consequência de um regime construído nos oito anos em que esteve à frente da gestão da política econômica o ministro Malan e pelos três anos do ministro Palocci.

Esse regime de política econômica se pautava por estabelecer regras gerais. Além disso, evitava-se forte ativismo na escolha de setores e/ou empresas beneficiadas pela política econômica.

Com a troca de Palocci por Mantega e mais recentemente de Lula por Dilma, a política econômica elevou muito o papel do Estado na economia, além de ter exagerado no microgerenciamento. Isto é, em um conjunto de medidas tópicas que visam estimular um setor e/ou a produção de um tipo de bem e, por outro lado, acaba criando problemas para outros setores.

O efeito negativo sobre a produtividade sistêmica da economia do microgerenciamento é maior do que o efeito benéfico sobre o setor que é o foco da medida. A produtividade cai, e, com ela, o crescimento e o investimento. A causalidade ocorre da piora institucional para o baixo crescimento e deste para a redução do investimento.

A segunda visão reconhece que o crescimento muito baixo de 1% em 2012 não é consequência só de perda de dinamismo da oferta da economia. Parte significativa desse péssimo desempenho é fruto de um choque negativo de demanda que foi corretamente enxergado pelo Banco Central em agosto de 2011.

O ponto é sabermos se a cara do PIB em 2013 está mais para 3% ou para 4%. Os que defendem a primeira visão creem que os 4% de crescimento estão no jogo. Para os que acreditam que o estatismo exagerado em associação com o microgerenciamento limitam as possibilidades da economia, o crescimento em 2013 será mais para 3% do que para 4%.

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