sexta-feira, novembro 09, 2012
Quem tem tempo não tem pressa - MARIA CRISTINA FERNANDES
Valor Econômico - 09/11
Ao voltar ao Brasil em 1979 sob a maior manifestação popular recebida por um exilado, Miguel Arraes de Alencar viu-se premido na retomada da ação política.
Como em todo o país, em Pernambuco a esquerda que havia resistido à ditadura também delimitava terreno em relação aos exilados.
Com o MDB pernambucano loteado, Arraes acabou recuando de um protagonismo em 1982, primeira eleição direta para governador desde a redemocratização, para disputar uma vaga na Câmara dos Deputados.
O bonde de 30 anos que separa Arraes de Eduardo Campos
Quando, em 1986, voltou ao governo do qual havia sido apeado pelo golpe, já havia perdido o bonde nacional do PMDB para Ulysses Guimarães.
Essa história é lembrada em Pernambuco como lição de avô para neto. A comparação tornou-se parte do repertório de alguns dos defensores de sua candidatura em 2014. Dado que seu partido bombou nas eleições municipais e a oposição ainda não parece unida em torno do senador tucano Aécio Neves, teria chegado a hora de Eduardo não deixar passar o bonde que, 30 anos atrás, passou acelerado diante de Arraes.
De tão distintas, as circunstâncias que separam neto e avô só corroboram com a hipótese de que Eduardo não esteja em corrida desabalada por uma candidatura.
Arraes tinha 66 anos quando perdeu a oportunidade de disputar protagonismo nacional. Eduardo tem quase vinte anos a menos.
A prudência de quem lhe recomenda vagar inspira-se em dito de Marco Maciel, o ex-presidente da República que, à época do retorno de Arraes, governava Pernambuco. Maciel, que hoje leva vida discreta no Recife, foi escolhido por Geisel para ocupar o Palácio do Campo das Princesas com a mesma idade (39) que Eduardo tinha ao eleger-se pela primeira vez. Costuma dizer que quem tem tempo não tem pressa.
Não que faltem lições do bonde perdido pelo avô. Algumas já foram tiradas pelo próprio Arraes quando decidiu que, a ficar sujeito aos humores pemedebistas, seria preferível mudar de partido.
Outras têm balizado a ascensão de Eduardo dentro e fora do PSB. Cuidou de obter hegemonia no partido que nem a entrada de um ex-candidato à Presidência como Ciro Gomes foi capaz de abalar.
Depois cercou a oposição. Dos poderosos pefelistas que tinham em Pernambuco um de seus mais fortes redutos os que não viraram seus aliados estão de fogo morto.
Reaproximou-se de Jarbas Vasconcelos e impôs derrota acachapante aos antigos aliados petistas no Estado que não se circunscreveu ao Recife.
O cerco ainda não garantiu candidatura nata à sua sucessão, mas lhe deixou em situação mais confortável em 2014 que a do senador tucano Aécio Neves.
Além de não ter um candidato nato à disputa pelo governo de Minas, o PSDB deve enfrentar o mais próximo ministro de Dilma, Fernando Pimentel (PT).
Se a recuperação da economia tornar Dilma Rousseff imbatível, tanto Eduardo quanto Aécio poderiam se lançar em nome de uma projeção em 2018.
O problema é se, além da derrota nacional, sobrevier a perda do Estado, condição de sobrevivência política. Se é possível fazer alguma previsão com dois anos de antecedência, este é um cenário mais provável para Aécio do que para Eduardo.
O que as eleições de 2012 trouxeram de mais negativo para o futuro de Eduardo Campos foi a disposição do PT de criar anticorpos à principal bandeira com que o governador do PSB conta para se lançar nacionalmente: uma gestão baseada em metas para dar eficiência a um serviço público que se pretende inclusivo.
Além de Dilma já encarnar essa disposição, o PT decidiu investir nessa toada na campanha municipal. O prefeito eleito de São Paulo, Fernando Haddad, é o principal representante da geração que pretende fazer frente à demanda por gestores que conciliam modernidade e inclusão.
A derrota do governo nos royalties mostra como a outra bandeira com que Eduardo espera contar, a da questão federativa, tem espaço político. Mas as eleições fluminenses, em que o PSB foi tratado como o partido que quer empobrecer um dos maiores colégios eleitorais do país, mostrou o quanto o tema ainda precisa ser burilado antes de se transformar em mote de campanha.
Mas se o PSB não lhe contesta a hegemonia, o Estado está sob controle, o empresariado começa a se encantar com sua gestão, o maior adversário de sua geração não exibe fôlego de maratonista e o PT já começa a fomentar futuros adversários, o que Eduardo teria a perder em 2014?
Parece óbvio que pouco. Mas a pergunta também pode ser construída de outra forma: o que ele teria a ganhar?
O mais evidente é o desgaste de antecipar em quatro anos a oposição a um partido que, no Planalto, abriu as portas para muitos dos investimentos que fizeram bombar a economia de Pernambuco.
Há outros riscos como a possibilidade de se desperdiçar uma tarefa federal que além de projeção nacional pudesse colocar seu nome como opção da própria base governista.
Tampouco é possível divisar hoje com que aliados contaria já que o PSD sinaliza apoio a Dilma
Como as perdas e ganhos ainda parecem pouco tangíveis o jogo não poderia deixar de ser este que se viu com o jantar de ontem entre o governador e a presidente da República: o PSB é aliado e assim permanecerá até 2014. A nenhum dos dois interessa antecipar o jogo.
A; s dificuldades de Barack Obama para enfrentar a muralha Republicana em seu primeiro mandato não foi capaz de tirar o fascínio que o presidente americano exerce no Brasil. O que foge da análise de muitos dos admiradores é que Obama manteve a divisão do país entre pobres x ricos, negros e hispânicos x brancos já registrada em 2008. Entre os que ganham até US$ 30 mil anuais, por exemplo, teve quase o dobro dos votos de Mitt Romney. Ao se reeleger em 2006, Luiz Inácio Lula da Silva também teve o dobro dos votos de Geraldo Alckmin na faixa até dois mínimos mensais, um terço do ganhos dos mais pobres considerados pelos institutos americanos. Em democracia, conflito de interesse se resolve no voto, mas no Brasil a pauta da divisão do país virou peça de acusação.
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