segunda-feira, novembro 12, 2012

Paquerar como um brasileiro - SETH KUGEL

FOLHA DE SP - 12/11


É muito diferente, em nenhum país se beija tanto em público. E é esquisito como os casais não desgrudam em ocasiões sociais. Sentar longe? Mas nem pensar


Bar, Belo Horizonte, 2009. Uma mineira está paquerando meu amigo, um norte-americano vindo de Nova York. Quando ela se vira brevemente para as amigas, eu aproveito para dar um conselho urgente.

"Você precisa beijá-la", insisti. "Daqui a cinco minutos ela vai achar que você não gosta dela."

"Aqui?", respondeu ele. "Na sua frente? De jeito nenhum!" E não beijou mesmo. Mais tarde, a mineira me diria: "Seu amigo me esnobou."

Como jornalista, já estive em muitos países. O Brasil é de longe o país do mundo onde as pessoas mais se beijam em público. Para um estrangeiro, chega a ser difícil entender essa característica da cultura local. Beijar alguém com amigos ao lado vendo tudo? Nossa, nem pensar. Sério, meu amigo não esnobou ninguém.

Ele estava acostumado com o padrão americano: conversar, pegar o telefone, ligar, jantar, evitar pratos com alho porque talvez vá beijar -mas talvez não. Se for, que seja em um cantinho escuro ou após um "vamos para outro lugar". O padrão brasileiro é outro: gostou, beijou.

Como visitante, morador ou "beijador", conheço o Brasil há anos. (Primeiro beijo: no dia 15 de agosto de 2004, com uma dançarina de forró em Manaus.) Não acho que algum dos "sistemas" seja melhor, mas como são diferentes...

Infelizmente, muitos dos meus amigos ou conhecidos americanos de fato viajam ao Brasil com o preconceito de que vão arranjar facilmente várias mulatas. Quando descobrem que não conseguem dominar o jeito de paquerar brasileiro, ficam aterrorizados com a ideia de voltar sem histórias para contar.

Neste ano, acompanhei dois amigos americanos no Carnaval de São Luiz do Paraitinga (SP). Eu sempre tento dar uma aulinha de como agir, mas ainda assim meus amigos ficaram impressionados com a persistência dos brasileiros em soltar cantadas constantes -frequentemente, com uma insistência e certa agressividade que a um americano parecem bastante descabidas, mas que pelo visto funcionam.

Muitos dos nossos compatriotas, nos EUA, desistiriam após o primeiro sinal de "não" ou nem tentariam algo com moças que não conhecem. Pelos padrões americanos, poderiam até encarar a convicção dos homens brasileiros como assédio sexual.

Meus amigos estranharam bastante, mas um deles até que pegou o jeito e provavelmente jamais vai esquecer uma certa loira. (E, no dia seguinte, quando, já mais ambientados, nos vestimos de bebês para um bloco, esse meu amigo também fez grande sucesso -só que, no caso, com homens que paqueravam e davam tapas na fraldinha dele.)

Além do beijo e dos tapas na fraldinha no Carnaval de Paraitinga, há outras diferenças entre as culturas.

Sempre achei esquisito que casais brasileiros, quando saem com amigos ou para uma festa, nunca se soltam. No meu país, o casal pode chegar junto, mas se separa para socializar. Num restaurante pode até não sentar ao lado do parceiro, ideia que alguns brasileiros acham bizarra.

O brasileiro explica isso assim: "Nos somos mais carinhosos do que vocês". O gringo explica de outra forma: "Não, vocês são possessivos e ciumentos". A verdade, acho, tem um pouco das duas coisas.

Anos atrás, fui a um almoço com uma namorada brasileira e um grupo de amigos. Apesar de estar sentado ao lado dela, passei o tempo conversando com o amigo do lado. Ela, conversando com a mulher do lado dela. Todo mundo feliz, achei.

Depois, ela me deu uma grande bronca. Eu a tinha deixado "sozinha". Pedi desculpas, mas por um tempo fiquei perplexo. E caiu a ficha: eu precisava de um braço brasileiro.

É o seguinte: eu sempre serei norte-americano. Mas quando namoro uma brasileira, um dos meus braços vira brasileiro. O braço brasileiro se dedica a pegar a mão da menina, tocar o braço, fazer cafuné. O resto do corpo é liberado para ser americano.

Funciona. Às vezes até tão bem que consigo evitar o beijo em público, na frente dos amigos. Só às vezes.

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