terça-feira, outubro 30, 2012

Uma cidade que é um país - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 30\10


A eleição de Fernando Haddad para prefeito em São Paulo representa o segundo sucesso de um projeto do ex-presidente Lula: lançar novos quadros políticos no país. Os partidos precisam de renovação, e o PSDB deveria fazer o mesmo, como bem lembrou o ex-presidente Fernando Henrique. A cidade de São Paulo e seus gigantescos problemas precisam muito que ele dê certo no cargo.

Haddad deixou a desejar como ministro da Educação. Cada problema que teve na execução dos testes de avaliação pode ter uma boa explicação; todos juntos mostram falha evidente de gestão. Lembra os casos de apagão. Cada um é um raio, um incêndio em subestação, um acaso; juntos mostram que há problemas graves de manutenção e de operação da rede interligada.

Se fossem só os vazamentos das provas do Enem, poderia até ser aceitável. O problema é que houve pouco avanço nos indicadores educacionais e, em alguns casos, retrocesso. Os dados da última Pnad mostraram piora em indicadores como os do ensino médio, onde houve aumento da evasão e uma queda do percentual de jovens na escola. Isso é completamente inconcebível.

A cidade de São Paulo é um país. Grande, difícil de governar, com sua força e seus descaminhos. Tem graves dificuldades de mobilidade urbana, agravadas pela política econômica de uma nota só: incentivar a compra de automóvel.

Haddad, como Dilma, foi chamado de poste. Convenhamos: ninguém se elege no Brasil só porque um líder, por mais popular que seja, indica, aposta ou faz campanha. Para confirmar isso, basta ver que o ex-presidente Lula e a presidente Dilma tiveram derrotas em outras cidades, mesmo se esforçando pela vitória. Haddad não seria prefeito sem a decisão de Lula de indicá-lo, impô-lo ao partido e fazer campanha para ele. Mas se ele não tivesse acertado - e os adversários, errado - não seria eleito em São Paulo.

Nesta trajetória, que o levou dos 3% de intenção de votos no começo da campanha aos 55% de votos no segundo turno, provavelmente aprendeu mais do que em qualquer curso que fizesse sobre como governar São Paulo. E essa é a vantagem da democracia e do voto direto.

Tomara que não cometa muitos erros ao governar, porque São Paulo, pelo seu gigantismo, não comporta o aprendizado via tentativa e erro. Tomara também que o governo federal não erre ao tratar os assuntos da cidade.

Um deles é a gigantesca dívida municipal, de R$ 72 bilhões, quase duas vezes o orçamento anual da cidade. Nos últimos dois anos, a arrecadação não tem conseguido chegar ao projetado porque na indústria é que está o impacto maior do baixo crescimento.

A dívida de São Paulo tem crescido muito. E os administradores, de qualquer partido, têm pedido uma mudança do indexador ou redução dos juros. Outras cidades pagam menos, mas, em grande parte, porque trabalharam para isso.

A dívida foi renegociada na gestão Maluf-Pitta. Na época, o município tomou a decisão equivocada de aceitar juros de 9%. Foram oferecido a todos os entes federados endividados juros de 6%, caso dessem um pagamento inicial de 20% através de receitas de privatização. Maluf, hoje aliado de Haddad, foi parte do endividamento e era o orientador do prefeito que cometeu esse erro. Vários estados e cidades preferiram quitar uma parte e ter a dívida mais barata. Recentemente, o município do Rio tomou empréstimos externos para reduzir o custo da dívida. Seria lamentável se a administração Haddad fosse tratada de maneira diferente de outras. O problema existe, a solução tem que ser para todos, e não um acerto entre Haddad e Dilma.

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