terça-feira, outubro 09, 2012
Sem solução para a crise - CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 09/10
As novas projeções sobre o desempenho da economia global que acabam de ser divulgadas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) são bem mais pessimistas (veja tabela). Em vez de ceder, a crise tende a se aprofundar, sem sinais de reversão.
Não se vê disposição política entre os dirigentes do mundo para resolver o principal problema: o excessivo endividamento dos países avançados - principalmente dos Estados Unidos e de praticamente toda a área do euro.
As únicas instituições que mantêm a iniciativa na busca de uma saída são os grandes bancos centrais: Federal Reserve (Fed, dos Estados Unidos), Banco Central Europeu (BCE, da área do euro) e Banco do Japão (BoJ).
No entanto, eles vêm agindo no que se vê hoje como a fronteira da irresponsabilidade. Estão determinados a emitir moeda ilimitadamente para recomprar títulos de dívida com o objetivo de assegurar tomador para eles. E isso acontece numa conjuntura em que os investidores vêm rejeitando um número progressivo de ativos soberanos, até recentemente considerados de alta qualidade, mas, agora, carregados de suspeitas.
O argumento sobre o qual se apoiam os grandes bancos centrais para essa ação fora de padrão é o mesmo que guiava as autoridades da Roma antiga quando, no seu esforço para defender a cidade, eram acusadas de atropelar certas leis da República. "A salvação do povo (da moeda) é a suprema lei", poderiam declarar os atuais presidentes desses bancos centrais.
O FMI está entre as instituições globais que cobrem de elogios essa atitude até agora inusitada dos bancos centrais, como esforço consistente capaz de estancar o colapso econômico mundial.
Por motivos diferentes, as ortodoxas autoridades do Banco Central da Alemanha (Bundesbank) e as bem menos ortodoxas do governo brasileiro são as únicas que condenam sistematicamente essas políticas. Os alemães denunciam a disposição do BCE de agir como emprestador de última instância aos tesouros dos países da área do euro como fonte de problemas presentes (encorajamento a mais despesas irresponsáveis por parte dos governos) e futuros (sobretudo mais inflação).
Enquanto isso, a presidente Dilma Rousseff e seu ministro da Fazenda, Guido Mantega, denunciam essa política monetária expansionista como causadora de distúrbios cambiais. Tanto para a presidente como para o ministro, além de não tirar a economia mundial da encalacrada, esse jogo dos bancos centrais gera efeitos colaterais perversos. Certo volume dessas enormes emissões desembarca no câmbio dos países emergentes e os inunda de moeda estrangeira. É o que a presidente Dilma chama de tsunami monetário e o ministro Mantega, de guerra cambial. Ou seja, ambos reclamam de que parte desse despejo de moeda estrangeira nos mercados acaba desembarcando por aqui e que esse afluxo valoriza a moeda nacional (derruba a cotação do dólar) e, ao mesmo tempo, tira competitividade do produto brasileiro, porque barateia em reais o importado.
Outro jeito de analisar o mesmo fenômeno é ponderar que, embora não tenha removido o impasse central, a atuação dos grandes bancos centrais impediu um mergulho no imponderável. Também pode-se dizer que, em compensação, vem amortecendo o ajuste, agora sem prazo visível para se completar. Esse é o tipo do sempre adiado desfecho que o Fausto de Goethe condena quando adverte: "Melhor um fim com terror do que um terror sem fim".
Com base nesse princípio, alguém ainda perguntará se um fim mais rápido da crise, ainda que mais doloroso, não seria melhor do que esse arrastar sem fim, mesmo que aparentemente menos dolorido. Nesse caso, a política dos grandes bancos centrais terá contribuído para o adiamento de uma solução.
Mais para o chão brasileiro, a notável piora exposta agora pelo FMI do desempenho da economia mundial pode ser o empurrão final de que o Banco Central do Brasil carecia para justificar uma nova redução dos juros básicos (Selic), a ser decidida amanhã. A conferir.
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