segunda-feira, outubro 15, 2012

CPI na vala comum - EDITORIAL FOLHA DE SP


Folha de S. Paulo - 15/10


Acertar uma previsão feita com meses de antecedência pode fazer a fama de um analista. Não no caso da CPI do Cachoeira, pois o desfecho estéril era esperado. Resulta consternador, ainda assim, que mais uma investigação parlamentar venha a terminar "em pizza", como diz o lugar-comum.

Instaurada no primeiro semestre com o incentivo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a CPI pretendia apurar as ligações de membros da oposição com o empresário Carlos Augusto Ramos, o famigerado Carlinhos Cachoeira.

Desse ponto de vista, pode parecer surpreendente que PT e PMDB, partidos que comandam a comissão, tenham, agora, feito um acordo para encerrar os trabalhos sem aprofundar justamente as investigações sobre o envolvimento de políticos no esquema de Cachoeira.

A aparente contradição se desfaz quando são levados em conta os objetivos reais do PT com a CPI e os caminhos imprevisíveis que a comissão poderia tomar.

A inspiração inicial de Lula era explorar as obscuras relações de Cachoeira com nomes da oposição, a fim de alvejar seus adversários e tentar, com isso, desviar as atenções do julgamento do mensalão.

O plano, entretanto, não funcionou como o ex-presidente imaginava. As sessões da CPI mostraram que o trabalho, se levado a sério, atingiria não só o PSDB (Marconi Perillo, governador de Goiás) e o DEM (Demóstenes Torres, ex-senador), mas também o PT (Agnelo Queiroz, governador do Distrito Federal) e o PMDB (Sérgio Cabral, governador do Rio de Janeiro).

O potencial lesivo da comissão incomodava particularmente o governo federal, atulhado de contratos com a Delta. Segundo a Polícia Federal, Carlinhos Cachoeira era sócio oculto da construtora.

Eis por que, desde o início, membros da CPI se esforçaram para esterilizar os instrumentos de investigação: convocações de depoentes, quando feitas, não levaram a nada, e centenas de pedidos de quebra de sigilo foram recusadas. Coroando tais artifícios, a própria Delta escapou de ter as contas abertas.

O conluio dos parlamentares chegou ao ponto de a CPI ficar parada por mais de um mês durante a campanha eleitoral. Agora, quando as atividades forem, de fato, retomadas, restarão duas semanas de trabalho, tempo que será usado apenas para a apresentação de um inócuo relatório final.

É improvável que, nesse prazo, surja, enfim, uma mobilização para prorrogar a atividade de uma CPI ameaçadora para tantos partidos. Quando se trata de proteger os próprios interesses, à revelia do bem público, quase nada distingue a situação da oposição.

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