quinta-feira, outubro 11, 2012

A hora e a vez do gás natural - ADRIANO PIRES



O Estado de S. Paulo - 11/10


Dando continuidade às tentativas de reduzir o custo Brasil, surgem notícias de que o governo, depois de anunciar o pacote da energia elétrica, estaria preparando medidas para reduzir o preço do gás natural. O produto passa por grandes revoluções que, provavelmente, o levarão a ser a fonte de energia que fará a transição de uma matriz energética suja para uma mais limpa. Afinal de contas, o gás natural é a mais limpa entre as energias fósseis.

A primeira grande revolução foi o advento do chamado Gás Natural Liquefeito (GNL), que transformou diversas reservas espalhadas pelo mundo em econômicas. Até então, como o gás só era consumido através de gasodutos, isso impedia a sua transformação em commodity, inviabilizando o crescimento da oferta. Por meio do processo de liquefação no campo produtor, seu transporte em navios e sua regaseificação no mercado consumidor, o gás natural vai-se tornando uma commodity, e atualmente os contratos de GNL já superam aqueles feitos por gasodutos.

A segunda revolução vem ocorrendo no mercado americano e leva o nome de shale gas. O shale gas é extraído de rochas por meio de uma tecnologia de fratura. Hoje já representa 23% do consumo de gás nos EUA.

O que diferencia essas duas grandes revoluções é que, enquanto o preço do GNL ainda é alto, o do shale gas é extremamente baixo e tem provocado mudanças estruturais no cenário energético americano. O preço do GNL gira em torno de US$ 14/milhão de BTU e o do shale gas, em torno de US$ 2/milhão de BTU. Isso tem gerado uma série de distorções e indagações. O preço do gás está regionalizado: é muito baixo no mercado americano, e ainda alto na Europa e no mercado asiático. Na medida em que o gás se torna uma commodity, os preços tenderão a se uniformizar? O shale gas será produzido em grande escala em outros países, superando atuais problemas ambientais, como a possível contaminação dos lençóis freáticos?

A atual política de gás natural no Brasil não tem levado em conta essas grandes mudanças que vêm ocorrendo no mercado mundial. Portanto, o que se espera é que as medidas que vierem a ser anunciadas se enquadrem nesta nova realidade. E quais deveriam ser essas medidas? A primeira seria o governo promover políticas que incentivem um aumento da oferta interna de gás. A volta dos leilões que foram paralisados em 2008 é fundamental. Além dos leilões tradicionais, o governo, por meio da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), poderia promover leilões específicos em terra visando à produção de shale gas. Nesse sentido, seria importante criar uma legislação que desse benefícios fiscais e tributários aos produtores de shale gas.

Uma segunda medida é modificar a atual política de preços do gás natural. A maior parte do gás produzido no País é associada ao petróleo, o que o torna um subproduto do petróleo. E como tal, o seu preço deveria ser inferior ao gás não associado, tanto o de origem nacional como o importado. Na Colômbia, por exemplo, a Ecopetrol vende o gás associado 50% mais barato do que o não associado. Além disso, o investimento necessário para escoar o gás associado até o mercado consumidor deveria ser pago pelo petróleo, dado que é o petróleo, e não o gás, que viabiliza a exploração do campo. Não basta incentivar a oferta, no caso do gás é fundamental criar demanda regular para o seu consumo.

O governo deveria mexer na atual regulação do setor elétrico, promovendo leilões por fontes e colocando térmicas a gás na base do sistema elétrico, além de incentivar a cogeração. Objetivando uma melhor utilização dos gasodutos de transporte, tanto do ponto de vista econômico quanto do da transparência, é muito importante criar a figura de um operador independente para os gasodutos de transporte, algo similar ao que existe no setor elétrico na figura do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Quanto aos Estados, a sua contribuição seria no sentido de privatizar as suas empresas de distribuição, criar agências reguladoras e figuras como as do consumidor livre.

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