sexta-feira, setembro 21, 2012

Um empate à vista - MARCELO COELHO

FOLHA DE SP - 21/09


O tema de lavagem foi responsável pela votação mais apertada até agora: 6 a 5, condenando João Paulo


LAVAGEM DE dinheiro ou simplesmente recebimento de propina? A discussão é complicada, e envolveu vários ministros durante a leitura do voto de Joaquim Barbosa, condenando o peemedebista José Borba.

Como tantos outros, o deputado foi retirar o dinheiro do mensalão numa agência do Banco Rural. Só que não quis se identificar para os funcionários do banco. Foi preciso que Simone Vasconcelos, representando Marcos Valério, pegasse o dinheiro ela mesma e o entregasse a José Borba.

Marco Aurélio Mello levantou a dúvida: não seria apenas um caso de corrupção? O fato de a propina ter sido dada dentro do banco significaria que, além de corrupção, houve também lavagem de dinheiro? Faz diferença o lugar onde se realizou o crime?

Ayres Britto interveio, lembrando um preceito teórico, e Luiz Fux apoiou a tese.

Para ambos, a lei está defendendo "bens jurídicos" diferentes. Pune-se a corrupção porque agride a administração pública. Pune-se a lavagem de dinheiro, a tramoia para ocultar o recebimento de dinheiro ilícito, para defender "o sistema financeiro nacional".

Um mesmo ato, portanto, pode implicar dois crimes distintos. E José Borba pode ser condenado a mais alguns anos em função disso.

Marco Aurélio Mello discorda: seria estender demais o conceito de "lavagem de dinheiro". Pegar o dinheiro com Simone Vasconcelos nada mais é do que... pegar o dinheiro com Simone Vasconcelos. O crime de corrupção se consumou nesse ato, e nada mais; é o "exaurimento do crime".

Barbosa repetiu a sua tese. Se recebesse o dinheiro direitinho, em conta bancária, o acusado seria apenas corrupto, mas envolver-se nos caminhos tramados por Marcos Valério representa mais do que isso.

Corrupção, resumiu, é o fato de o parlamentar receber quantias "estonteantes" de dinheiro. E a lavagem é a engenharia, a "mise en scène", o teatro que se pôs em funcionamento para ocultar o fato.

O tema se presta a muita polêmica. Nem todos os juristas, por exemplo, consideram que, no crime de lavagem de dinheiro, está em jogo o sistema financeiro nacional.

O "bem jurídico" em causa é outro, dizem por exemplo Pierpaolo Bottini e Gustavo Badaró, em livro recém-lançado. A lavagem, na verdade, atenta contra a investigação policial, a ação do Ministério Público, mas nem sempre põe em risco, digamos, a saúde financeira do país.

Seja como for, debates sobre este ou aquele "bem jurídico" podem muito bem justificar a criação ou não de uma lei, diferente das que já existem. Outra coisa é saber se um ato concreto se enquadra no que a lei prevê.

O assunto da lavagem já foi responsável pela votação mais apertada até agora no STF: seis a cinco, condenando João Paulo Cunha.

Os que absolveram o ex-presidente da Câmara nesse ponto foram Lewandowski, Rosa Weber, Toffoli, Marco Aurélio e Cezar Peluso, agora aposentado. Caso Gilmar Mendes se incline contra a condenação de José Borba por lavagem, como parece ser o caso, teremos o primeiro empate no julgamento.

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