quinta-feira, setembro 27, 2012
EUA 'primarizam' importação - ALBERTO TAMER
O Estado de S.Paulo - 27/09
Os Estados Unidos ainda são o mais importante parceiro comercial do Brasil, representam quase 11,2% das exportações, um fato que ultrapassa esse contencioso verbal entre os dois governos sobre quem protege mais o seu mercado. É evidente que Obama encena para um eleitorado que se angustia com o aumento do desemprego de 8,1%, que só pode recuar com mais produção. Não reage aos estímulos, não se aventura a comprar mais - apesar de juros praticamente negativos - e quer eleger um presidente que lhes garanta menos incerteza e mais emprego e salário.
E a economia mundial precisa desesperadamente da recuperação dos Estados Unidos, que representam quase 25% do PIB global. Tem a China, sim, mas seu PIB de US$ 6 trilhões é apenas 10% do mundial.
Pesamos pouco. Afinal, o Brasil, não representa ameaça maior aos produtores americanos. Os Estados Unidos importam anualmente cerca de US$ 2 trilhões e o Brasil exportou para eles US$ 25,7 bilhões em 2011. A questão não é saber quem é mais protecionista, mas avaliar a qualidade, o perfil, das nossas exportações para o mercado americano. E é o que o governo faz agora, abrindo uma grande frente de redução da carga tributária e estímulo ao investimento e produção. É o caminho certo que a presidente Dilma Rousseff decidiu seguir. Aqui, a grande novidade e o desafio. Antes, eles importavam mais produtos industrializados; agora, commodities, principalmente petróleo. A pauta bilateral está sendo "primarizada".
Há algo mais. É este o desafio que o governo decidiu enfrentar, com protestos, sim, contra medidas protecionistas, mas ações especificas para aumentar a competitividade do produto nacional.
O confronto verbal entre os dois países deixou de lado um aspecto essencial: os Estados Unidos eram - e ainda são - um parceiro extremamente importante para o Brasil não só pelos valores, mas porque, ao contrário da China, foram sempre grande importador de manufaturados, que geram emprego.
As exportações de manufaturados para o mercado americano ainda estão crescendo, mas se retraem enquanto as de commodities e básicos aumentam ano após ano. O processo de "primarização"da pauta brasileira, que domina o comércio com a China, está contaminando as exportações para os Estados Unidos. Será? Sim, informam os números do comércio exterior do Ministério do Desenvolvimento. Entre janeiro e agosto, as exportações para os EUA cresceram 13,4%, compensando a queda de 16,2% nas vendas para o Mercosul, mas por causa essencialmente de um expressivo aumento das commodities.
O déficit americano. Apesar da forte desaceleração econômica mundial, eles ainda continuam importando muito. Nos últimos 12 meses, registram um déficit comercial com o mundo de US$ 744 bilhões, enquanto o Brasil não participa desse déficit; tem não um "superávit", mas um "déficit" comercial de US$ 2,8 bilhões. Ou seja, eles importam mais, nós exportamos menos. E o nosso déficit só não foi maior por causa das exportações de petróleo. Em 2011, elas representaram nada menos que 22,5% das vendas para os Estados Unidos. E tendem a crescer com o pré-sal. Segundo a Agência Nacional de Petróleo, em 2008, a Petrobrás exportou para o mercado americano 49,6 milhões de barris por dia e, no ano passado, 59,3 milhões b/d. Não é um fato novo, mas vem se acentuando, diz o economista da Funcex, Rodrigo Branco.
Ele acrescenta que, entre 2005 e 2011, as vendas brasileiras representavam 1,51% das compras externas americanas; hoje, apenas 1,27%. Ou seja, há uma dupla deterioração de presença e qualidade porque a queda é mais acentuada entre os produtos manufaturados (queda de 1,31% para 0,73% em 2011) e semimanufaturados (queda de 8,11% para 5,13%) exportados para o mercado americano. Os números do comércio bilateral entre os dois países confirmam que a "primarização"da pauta, que existia com a China e a União Europeia, começa agora a contaminar as exportações para os Estados Unidos. Antes, um fato restrito, agora mais amplo alcançando o nosso mercado mais importante.
Branco admite que "no Brasil de hoje há a consolidação do perfil exportador, focado principalmente em produtos básicos, porque possuímos vantagens comparativas para a produção destes e porque nos aproveitamos das altas de preços internacionais desses produtos, as commodities". É esse o novo cenário do comércio com os Estados Unidos. É hora de se defender sim - estamos nos defendendo -, mas contra-atacar também.
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