segunda-feira, setembro 03, 2012

Data venia... - RICARDO NOBLAT


“O Brasil quer um Judiciário independente, um juiz que não tema pressões”
Ricardo Lewandowski, ministro do STF

É com gosto de jiló no céu da boca, de mandioca-roxa e de berinjela crua, que passo a contar a história nada edificante de um prefeito do PT cassado pela Justiça Eleitoral do seu estado. E de dois ministros do Supremo Tribunal Federal que, por omissão, palavras e obras, contribuíram até aqui para que o prefeito permanecesse no cargo, dando-se até ao luxo de concorrer a novo mandato em outubro próximo.

O PREFEITO ATENDE 
pelo nome de Francisco Antônio de Souza Filho, o Chico do PT. E a cidade que ele governa se chama Esperantina. Com menos de 40 mil habitantes, ela existe há 90 anos e fica no norte do Piauí, a 174 quilômetros de Teresina. Seu orçamento anual é de quase R$ 56 milhões, sendo que R$ 36,5 milhões são repassados pelo governo federal.

QUANDO O atual senador Wellington Dias (PT) se reelegeu governador do Piauí em 2006, Chico foi nomeado secretário de Articulação e Gestão. De longe era o secretário mais poderoso. Ambicionava governar Esperantina a partir de 2008. E, para facilitar sua eleição, arrancou de Dias dinheiro e obras para a cidade.

ESPERANTINA
 ganhou pontes, poços artesianos e ruas asfaltadas. Os programas de assistência social do governo estadual foram ampliados ali para atender o maior número possível de pessoas — de preferência eleitores. Chico derrotou meia dúzia de adversários — entre eles o prefeito da época, candidato à reeleição.

A PORTA DO inferno se abriu para Chico assim que ele tomou posse. O Ministério Público Eleitoral pediu sua cassação por abuso do poder político e prática de conduta vedada. As obras feitas às pressas na cidade configuraram abuso de poder político. E o fato de Chico ter alardeado que era o pai das obras, prática de conduta vedada.

NO DIA 28 DE fevereiro de 2011, por quatro votos contra três, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Piauí cassou os diplomas de Chico e do seu vice. Afastado do cargo de imediato, Chico entrou com ação cautelar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Pediu a concessão de liminar para reocupar o cargo enquanto recorria da decisão do TRE.

A LIMINAR FOI concedida pela ministra Nancy An-drighi, no dia 30 de junho daquele ano. Quase seis meses depois, o TSE começou a julgar o recurso especial impetrado por Chico contra a decisão do TRE. Nancy acatou o recurso. Um a zero para Chico. O ministro Gilson Dipp, não. Um a um. O ministro Marcelo Ribeiro pediu vista do processo.

EM 28 DE FEVEREIRO deste ano, ao devolver o processo, Ribeiro acatou o recurso. Os ministros Cármen Lúcia e Arnaldo Versiani, não. Placar no fim da sessão daquele dia: três votos contra a pretensão de Chico de reaver o mandato cassado um ano antes pelo TRE do Piauí; dois votos a favor. Aí foi a vez de o ministro Marco Aurélio Mello pedir vista do processo.

SÃO SETE OS ministros titulares do TSE. Com quatro votos se decide qualquer parada. Um mês depois, Marco Aurélio devolveu o processo e rejeitou o recurso, cassando Chico. O voto que faltava ser dado não faria a menor diferença. O dono do voto que faltava, ministro Ricardo Lewandowski, era o então presidente do TSE.

O QUE ELE FEZ? Pediu vista do processo no dia em que Marco Aurélio o devolveu — 29 de março. No dia 18 de abril, esgotou-se o mandato de Lewan-dowski à frente do TSE. Ele passou o cargo para a ministra Cármen Lúcia. E foi embora sem votar o recurso de Chico. Reunido no dia 8 de maio, o TSE despachou o recurso para o ministro que ocuparia vaga de Lewandowski.

QUEM MESMO? José Dias Toffoli, ministro substituto no TSE, que costumava votar na ausência de algum titular. Toffoli estava familiarizado com os assuntos tratados ali. O recurso de Chico lhe foi entregue no dia 11 de maio. E esquecido por Toffoli até hoje no fundo de alguma gaveta. Enquanto isso...

ENQUANTO ISSO
 Chico lidera as pesquisas de intenção de voto para prefeito. Diz que vencerá a batalha no TSE. Só haveria uma chance de isso acontecer: se algum ministro que recusou o recurso mudasse o voto. Difícil. E se Toffoli acatasse o recurso. Bem...

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