terça-feira, agosto 21, 2012

Questões de ordem - Falta de criatividade - MARCELO COELHO

FOLHA DE SP - 21/08


Barbosa citou uma acusação pouco lembrada contra Marcos Valério -a de que lhe faltou 'arrojo criativo'


Afinal de contas, o que é "peculato"? O crime está definido no artigo 312 do Código Penal, e atinge muitos dos envolvidos no mensalão.

Significa "apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio".

Na sessão de ontem do Supremo, Joaquim Barbosa deu um exemplo. Seria o caso de um carcereiro que se apropria dos bens que estavam no bolso de um preso, os quais fora encarregado de guardar.

O caso serviu para Barbosa refutar uma tese utilizada pelos advogados de Henrique Pizzolato, diretor de marketing do Banco do Brasil. Ele é acusado de desviar R$ 73 milhões em proveito de agência publicitária de Marcos Valério.

O dinheiro vinha da Visanet, um fundo que tem como principais acionistas o Banco do Brasil e o Bradesco. Os recursos desse fundo servem para custear anúncios dos cartões de crédito Visa, em associação com esses bancos.

"Não se trata de dinheiro público", dizem os advogados. Mesmo se fosse dinheiro particular, respondeu Barbosa, ainda assim haveria peculato. A lei não fala só de bens públicos.

Joaquim Barbosa tem um jeito curioso de demonstrar seu contentamento. Como fica de pé na maior parte do tempo, dado seu problema nas costas, ele se apoia numa poltrona giratória.

Quando lhe parece que o ponto está suficientemente provado, ele deixa escapar um movimento mínimo do corpo para os lados. Desse modo, é a poltrona que parece dar seus sorrisinhos de triunfo, enquanto a leitura do voto não se altera.

Não houve sorriso, mas poderia haver, quando Barbosa citou uma acusação até agora pouquíssimo lembrada contra Marcos Valério.

A de que lhe falta "arrojo criativo". Num relatório sobre os serviços de sua agência de publicidade ao Banco Brasil, fala-se também de impontualidade, de textos sem acabamento...

Mesmo assim, Pizzolato a privilegiou. E recebeu R$ 326 mil, em dinheiro vivo, oriundo de um cheque assinado por um sócio de Marcos Valério.

E a questão dos famosos "bônus de volume"? A defesa diz que esses descontos, oferecidos por jornais, revistas, emissoras de TV, vão mesmo para as agências de publicidade, e que Pizzolato não desviou nada ao entregá-los a Marcos Valério. E diz que a acusação confunde esses "bônus" com as "bonificações" de volume, essas sim destinadas ao Banco do Brasil.

Para Barbosa, trata-se de jogo de palavras -e citou, a exemplo da acusação, os contratos entre o BB e a agência de Valério.

Citou muito mais, de resto, num voto bastante repetitivo. Talvez apenas para irritar a defesa, Barbosa reproduziu trechos puramente retóricos de parlamentares da CPI dos Correios, como Delcídio Amaral e Onyx Lorenzoni.

A defesa contesta a validade judicial desse tipo de pronunciamentos. Decerto, mostram mais o estado de espírito do ministro Joaquim Barbosa do que algo de concreto sobre o caso.

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