domingo, agosto 12, 2012
Juros rastejantes - CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 12/08
Enquanto os países mais endividados e em crise, como Espanha e Itália, enfrentam disparada insuportável do custo financeiro, nos demais países avançados os juros no mercado global nunca foram tão baixos por tanto tempo. Há alguns anos, bastava que se mantivessem nos atuais níveis por oito ou nove meses para que se formassem bolhas ou, então, a inflação disparasse. Não é o que está acontecendo.
Uma das causas da atual crise foram os baixíssimos juros básicos praticados nos Estados Unidos entre agosto de 2001 e junho de 2003. Eles foram apontados como responsáveis pela formação da bolha imobiliária e pelo estouro da crise em 2007. Mas, no momento, não há sinal nem da formação de bolhas nem de inflação alarmante.
Quatro são as principais explicações para esses juros tão baixos ou até negativos (não compensam a inflação). A primeira delas é a contrapartida da rejeição dos títulos emitidos por países com problemas. É a concentração da demanda dos investidores em opções que proporcionam mais segurança, caso dos títulos dos Estados Unidos e da Alemanha.
Segunda razão: a própria política monetária dos grandes bancos centrais, a do Federal Reserve, o Fed (Estados Unidos), e a do Banco Central Europeu, o BCE (área do euro), de enorme despejo de moeda, eleva a demanda pelos mesmos títulos e derruba sua remuneração real.
O terceiro maior fator de baixa dos juros não é recente, mas, em alguns casos, se intensificou nos últimos três anos. É a política de formação de reservas externas pelos emergentes, especialmente China, Brasil e Índia. Fazem o mesmo alguns países ricos, como Japão e Suíça, e importantes produtores de petróleo, como Arábia Saudita e Rússia. Essas reservas são imediatamente aplicadas em títulos de grande margem de segurança e, nessa operação, contribuem para aumentar a demanda por eles. A maior procura por esses títulos de alta qualidade aumenta seu preço (exige mais recursos para comprá-los) e, em consequência, os juros neles embutidos desabam.
O quarto fator de baixa dos juros dos títulos é a própria recessão global, à medida que deixa dinheiro sobrando no mercado - as grandes empresas adiam seus investimentos. Preferem perder recursos com aplicações de seu caixa a juros negativos do que colocar em marcha projetos de expansão da produção, que depois poderão ficar parados por falta de mercado.
Essa enorme abundância é a principal causa do tal tsunami cambial de que tanto a presidente Dilma vem se queixando. (O ministro da Fazenda, Guido Mantega, prefere chamá-lo de guerra cambial.)
Esses juros rastejantes vêm sendo o pesadelo dos administradores de fundos de pensão e de carteiras patrimoniais porque já não conseguem, como antes, apresentar resultados satisfatórios para os cotistas. Como os animais que se cansam de permanecer entocados durante o inverno, esses administradores já começam a mostrar certo cansaço de seguir em posições tão defensivas e ensaiam a busca de algum risco.
No entanto, a perspectiva de um desastre na área do euro está longe de ter sido afastada e é o que impede uma avaliação mais segura sobre a duração desse ambiente de aversão ao risco e juros no chão.
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