terça-feira, julho 10, 2012

Pressão da CUT - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 10/07

A ameaça que o novo presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas — o primeiro bancário a assumir o cargo —, fez ontem, em entrevista à “Folha”, de levar às ruas seus associados caso considerem que o julgamento do men-salão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) foi “político” e não “técnico”, é mais um dos vários movimentos de pressão que os petistas estão levando a cabo nos últimos meses.

A CUT e os sindicatos estão perdendo força no governo Dilma, que, segundo ele, tem sido “inflexível” nas negociações com os servidores federais, em greve há um mês por aumento de salários.

O ex-presidente Lula deve participar da posse do novo presidente da CUT, mas não está prevista a presença da presidente Dilma.

A ameaça, que certamente é um erro estratégico que já foi abandonado por José Dirceu, pode ser uma maneira de a CUT fortalecer os laços com o PT e forçar uma negociação em melhores bases com o governo federal.

Mas, em relação ao Supremo, o resultado deve ser o mesmo incômodo que Dirceu provocou ao conclamar a Juventude Socialista e a UNE a sair às ruas para defendê-lo no processo do mensalão.

Ameaçar o Supremo, especialmente com a truculência dos sindicalistas, não é a melhor posição para os réus, e isso os advogados já haviam prevenido a eles.

E o que seria um julgamento “técnico”? Um cujo resultado seja a absolvição de todos os mensalei-ros? E uma eventual condenação de petistas seria indicativo de que o julgamento foi “político”?

Lula teve uma trajetória interessante da sua fase de líder sindicalista até a Presidência da República. Ele defendia o fim da Era Vargas, dizia que a CLT é o “AI-5 dos trabalhadores” e ironizava Vargas como sendo o “pai dos pobres e mãe dos ricos”.

Hoje, a CLT e a unicida-de sindical (apenas um sindicato por categoria em cada município), marcos da Era Vargas, persistem e foram aprofundados com o reconhecimento das centrais sindicais e o aparelhamento do Estado, atualizando o pele-guismo e o corporativismo.

A lei sancionada pelo presidente Lula que reconhece as centrais sindicais teve um veto ao artigo que determinava ao Tribunal de Contas da União (TCU) a fiscalização do imposto sindical compulsório que passaram a receber, sob a alegação de que o governo respeita a autonomia e a liberdade sindicais.

Essa é apenas uma desculpa esfarrapada, pois, na medida em que as centrais sindicais passaram a receber um dinheiro da contribuição compulsória dos trabalhadores, por força de uma decisão governamental, a independência já está comprometida.

O dinheiro é público, porque ele é tirado à força a partir de um poder que só o Estado tem. O dinheiro que o trabalhador é obrigado a dar aos sindicatos deixa de ser privado, passa a ser um imposto, afirmam especialistas.

O imposto sindical é um resíduo do sindicalismo pelego, criado por Getulio Vargas, que considerava os sindicatos como entidades “auxiliares do Estado”.

Essa verdadeira “república sindicalista” foi sendo moldada à medida que decisões ampliaram o espaço de atuação e revitalizaram as finanças do sistema sindical brasileiro.

O governo Lula passou a negociar diretamente com os sindicalistas o aumento do salário mínimo, por exemplo, antes de enviá-lo ao Congresso. Autorizou também os sindicatos a criar cooperativas de créditos.

Além disso, permitiu-lhes instituir, na reforma da Previdência Social, planos de previdência complementar. Como as regras só permitem planos de previdência fechados, os sindicatos não terão muita concorrência privada.

Uma medida em especial reforçou o poder de fogo das centrais sindicais: a autorização para que empréstimos sejam dados com desconto na folha de pagamento, com a intermediação dos sindicatos, o famoso crédito consignado.

A lei 11.648/2008 ressuscitou o papel do Estado como indutor da organização sindical, criando as centrais, que não existiam legalmente. O PT e a CUT, do deputado Vicen-tinho, aliaram-se à Força Sindical, do deputado Paulinho, do mesmo PDT do ministro do Trabalho, e aprovaram a lei a título de “reconhecimento histórico” das centrais.

Na Constituinte de 1988, o modelo sindical da Era Vargas foi superado em parte, e a associação profissional ou sindical passou a ser “livre”, determinando ainda a Constituição que “a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical”.

As centrais sindicais não faziam parte da pirâmide organizacional sindical, espelhavam uma realidade (e, sobretudo a CUT, tinham grande força de coordenar os sindicatos e a ação sindical), mas não faziam parte do arcabouço jurídico que estruturara esse modelo sindical.

Pela Constituição, o Estado “não tem de legitimar ou autorizar o funcionamento de entidades sindicais e fica-lhe vedado interferir ou intervir em qualquer organização sindical”. A “legalização” das centrais sindicais foi chamada de “pelegalização”.

É nesse ambiente que o novo presidente da CUT tomará posse, já com uma vasta agenda política que se encaixaria melhor no governo Lula do que no de Dilma.

Na coluna de domingo usei a expressão “fundos de pensões”, quando o correto é “fundos de pensão”.

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