terça-feira, julho 10, 2012
Mal das pernas - CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 10/07
Os economistas tentam agora explicar por que a indústria está mergulhada na estagnação, mesmo depois de nove pacotes de estímulo, redução dos juros de cerca de 20% e de desvalorização cambial, também de 20%, num ambiente de crescimento do consumo da ordem de 5% a 6% ao ano e de fase inédita de quase pleno emprego.
Depois de ter alardeado que a economia brasileira passaria relativamente incólume pela crise global, a presidente Dilma Rousseff e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, insistem agora em que o mau desempenho da indústria é consequência da paradeira global, que sufocou o espírito animal dos empresários brasileiros.
Tanto essa explicação não satisfaz que o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, apelou para um diagnóstico psicanalítico. Em entrevista publicada domingo pela Folha de S. Paulo, atribuiu a paradeira ao comportamento ciclotímico do empresário. Mas ele também debita a baixa competitividade da indústria a bloqueios estruturais que começam a ser removidos, embora muito lentamente: excessiva carga tributária, juros e preços da energia elétrica altos demais, precariedade da infraestrutura - enfim o velho custo Brasil, excessivo demais.
Em artigo publicado ontem no jornal Valor, o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, David Kupfer, também reconheceu que a questão não é nem conjuntural (crise externa) nem de falta de apoio do governo. O mal das pernas de que sofre a indústria tem a ver com "rigidez estrutural", apontou ele. É outro jeito de dizer que o problema está no custo Brasil, cuja solução consiste em "colocar em marcha um firme processo de mudança estrutural".
Na análise publicada em coluna no Estado de domingo, o ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore adverte que o contágio da crise mundial explica apenas parte da prostração.
Ele mostra que dois dos fatores que o governo mais exalta na economia brasileira - o forte crescimento do consumo e o pleno emprego - trabalham hoje em círculo vicioso contra a indústria.
O crescimento do consumo contribuiu para a expansão do setor de serviços, que passou a empregar cada vez mais gente - daí o pleno emprego. O mercado de trabalho aquecido, por sua vez, puxa para cima os custos da mão de obra industrial. A indústria não investe por não conseguir repassar seu aumento de custos para os preços, porque enfrenta concorrência ainda mais feroz do produto importado. Uma desvalorização mais intensa do real poderia resolver esse problema porque encareceria o produto importado, mas esbarra em limites macroeconômicos - porque produziria mais inflação.
Dá para acrescentar outro limite de uma eventual desvalorização mais forte do real: o do aumento proporcional de custos da indústria caso houvesse essa acentuada alta do dólar. Hoje a indústria depende cada vez mais de suprimentos externos, pagos em moeda estrangeira, como insumos, matérias-primas, componentes, peças, conjuntos e capital de giro.
É um quadro de adversidades que vai persistir durante muito tempo. Não dá para embarcar na aposta da presidente Dilma e do ministro Mantega, de que basta esperar mais algumas semanas ou, vá lá, mais alguns meses, para que a situação complicada da indústria se reverta. A saída implica a derrubada do custo Brasil, empreitada que precisa ser atacada o quanto antes.
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