segunda-feira, julho 02, 2012

Fanfarra populista - VINICIUS MOTA


FOLHA DE SP - 02/07

SÃO PAULO - A crise que, em 2008, se disseminou a partir dos países ricos -reincidindo mais branda, porém mais duradoura, em 2011- abalou o valor do livre-comércio. Iniciativas, a começar dos EUA, de empurrar a conta para os outros avivaram nacionalismos e enfraqueceram blocos econômicos supranacionais.

Se a agonia europeia dá mostras diárias desse novo ambiente, ele não afeta só o velho continente. Aqui, no extremo Ocidente, uma leva de governantes adversários da livre circulação de mercadorias pôde lambuzar-se em populismo econômico tão logo a condição global permitiu.

A entrada da Venezuela chavista no Mercosul coroa esse movimento. E desloca o eixo do projeto na direção da parolagem anti-imperialista, enquanto o comércio entre Brasil e Argentina -responsável por mais de 80% das trocas no bloco- é objeto de uma guerrilha protecionista.

O Brasil nunca foi capaz de exercer uma liderança forte o suficiente nessa relação. Não porque lhe faltasse apetite expansionista. Faltou escala econômica e poder financeiro para, por exemplo, apoiar a Argentina na derrocada do início da década passada -ou para sustentar saldos negativos no comércio com o parceiro.

Agora, sentado em mais de US$ 370 bilhões de reservas internacionais, o Brasil poderia usar seu cacife financeiro para auxiliar o vizinho, mais uma vez em agrura cambial. Também poderia ceder renda comercial à Argentina, em troca de salvaguardas para investimentos brasileiros crescentes no sul do continente.

Mas ninguém em sã consciência passaria um cheque em branco desse tamanho ao governo Kirchner. A probabilidade de o Brasil ver-se sabotado no meio do caminho seria total.

Acabou, na prática, a confiança bilateral para tocar o projeto comum. Com regiões inteiras para desenvolver dentro de seu próprio território, não é de todo ruim que o Brasil deixe o Mercosul transformar-se numa fanfarra populista -e inócua.

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