segunda-feira, junho 18, 2012

A China perene e pós-moderna - CANDIDO MENDES

FOLHA DE SP - 18/06


Não se queira, na vertigem da mudança, buscar, na China de hoje, a memória da revolução cultural ou das jornadas heroicas de 1949


Demorará, em tempos de multiculturalismo, imaginar-se, finalmente, um vis-à-vis entre o Ocidente e a China, a partir da chegada do subcontinente ao mundo contemporâneo.

Este não é o ponto de remate a partir do qual se poderia falar em coexistências da modernidade, e esse, na mesma medida em que o Império do Meio, manteria o seu tempo social, e não o nivelamento a uma mesma civilização do consumo.

Megalópoles como Pequim ou Xangai estão em permanente metamorfose, num jogo de escalas de seus edifícios e da mudança do seu skyline, a desorbitar das alturas clássicas de Nova York ou Chicago.

Nem se queira, na vertigem dessa mudança, buscar, na China de hoje, a memória da revolução cultural ou das jornadas heroicas de 1949. Tal como não se procure lideranças carismáticas no que é a decisão, tão sensível quanto anônima, da política pública chinesa.

O carisma fica como uma construção definitiva e pedagógica desta memória, que bane as lembranças de Zhou Enlai e Deng Xiaoping, para concentrar-se na onipresença de Mao Tse-tung, tratado, invariavelmente, de "chairman Mao" pelas novas gerações.

Nem se procurem equivalências do nosso desenvolvimento sustentável na política em que a nova prosperidade chinesa trabalha os contrapontos entre as dimensões política, social, econômica ou cultural da mudança.

A democracia se contrapõe ao deslanche conjunto da mobilidade coletiva e cultural, na enormidade acelerada da urbanização e na ruptura de toda inércia de suas periferias pela vida cultural.

São 250 milhões de chineses que, anualmente, frequentam os museus do país. A universidade absorve, hoje, 25% de um mesmo grupo etário. Mas, sobretudo, a China tem consciência da densidade da sua comunicação na quase complacência com que cita a "barbárie" das línguas ocidentais.

Mal nos damos conta do que representa, para a dita civilização do meio, o que seja traduzir os idiomas do Ocidente ou, sobretudo, garantir às ditas culturas do progresso a riqueza do sentido da expressão chinesa, a mudança de sua expressão pelos fonemas e a multiversão, que permite na intelecção o seu recado. Tal para não se adicionar o culto da caligrafia num plus da expressão de cada um.

O universo chinês pode prescindir de toda transcendência, buscar a realização de valores numa ética ou numa prudência de princípio contra todos os extremos, a que responde o confucionismo. Quer encontrar no meio do caminho a regra de toda a convivência ou de uma visão de mundo que já neutralizou todos os excessos e acolhe, de vez, com a toda a tolerância, os extremos e arroubos das jovens culturas ocidentais.

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