domingo, junho 24, 2012

As aparições de 'Inexorável da Silva' - ELIO GASPARI


FOLHA DE SP - 24/06

Lula acha que pode tudo, conversa pouco, ouve menos e, daqui a pouco, encrencará a doutora Dilma



Atribuem ao filósofo húngaro Giorgy Lukacs a seguinte afirmação: "O erro de Stálin não foi ter assinado um acordo com Hitler, foi ter acreditado nele". Em 1939, Stálin aliou-se ao Reich e comeu um pedaço da Polônia. Dois anos depois, Hitler invadiu a Rússia, e o Guia Genial dos Povos, incrédulo, entrou em estado de catatonia.
Pensando bem, Stálin não acreditou no pacto (tanto que acelerou a produção de armas), acreditou em si. Desprezou pelo menos 80 avisos de que Hitler atacaria, inclusive dois deles com a data.
Lula cavalga uma desastrosa autoconfiança. Longe dos mecanismos do poder, com os movimentos e a oratória limitados, investiu-se de um desembaraço autocrático que, em seis meses, produziu três desastres:
1) Sem discutir os prós e contras da ideia, participou de uma cenografia para abrilhantar a adesão de Paulo Maluf à candidatura de Fernando Haddad à Prefeitura de São Paulo. Humilhou Luiza Erundina e detonou a chapa petista, levando os companheiros a catar vice até no falecido movimento "Cansei", teoricamente destinado a combater a corrupção. (A ex-prefeita aceitava o apoio de Maluf, desde que não houvesse espetáculos como o do jardim do palacete da rua Costa Rica. O mesmo se pode dizer do tucanato, que buscava intermediações para negociar com Maluf.)
2) Sem ouvir os interessados, meteu-se num périplo, catituando junto a ministros do Supremo a postergação do julgamento do mensalão. Foi detonado pela exposição da manobra.
3) Impôs ao PT uma aliança com o prefeito Gilberto Kassab, atropelando a senadora Marta Suplicy, que não queria "acordar de mãos dadas" com seu adversário. Dias depois, Lula acordou sozinho e viu Kassab abraçado ao PSDB.
Deixando-se de lado o conteúdo das decisões (o que não é pouca coisa), cometeu três erros. Chutou três vezes e três vezes marcou contra o próprio gol.
A doutora Dilma acha que a crise financeira mundial é influenciada pelo fator "Inexorável da Silveira". Seu governo terá que lidar com outro fator, o do "Inexorável da Silva". Por enquanto, ele restringiu-se à casa de louças petista, mas o perigo é que vá além, encrencando o governo.
Os "inexoráveis" acham que podem tudo.
José Dirceu
Um escorpião malvado diz que ainda não entendeu se teve um sonho ou um pesadelo:
"Em agosto, os ministros do Supremo Tribunal Federal estão reunidos para o julgamento do mensalão e o primeiro réu, José Dirceu de Oliveira e Silva, informa que fará sua própria defesa. Veste a beca e diz:
'Senhores magistrados, nunca um advogado teve que exercer seu ofício em condições tão difíceis, nunca contra um acusado cometeram-se tantas irregularidades. (...) Condenai-me, não importa. A história me absolverá.'
Essas foram palavras de Fidel Castro no tribunal de Moncada em outubro de 1953".
Eremildo, o Idiota
Eremildo é um idiota e ainda usa as camisetas velhas das campanhas de Paulo Maluf a presidente, governador, prefeito e deputado. Encantou-se com o artigo do presidente do PT paulista, o sociólogo Edinho Silva, publicado na Folha de sexta-feira.
É uma acrobática defesa da aliança do comissariado com o Partido Popular na disputa pela Prefeitura de São Paulo.
Menciona Luiza Erundina, Gramsci e cita Paulo Freire.
No artigo, o doutor referiu-se três vezes ao Partido Popular, mas não mencionou Paulo Maluf, objeto do desejo da aliança, dono do PP de São Paulo e do jardim onde Nosso Guia e Fernando Haddad foram fotografados selando o pacto lulo-malufista.
O idiota acha que foi distração.
Ao ler a citação de Paulo Freire, frequentemente repetida por Lula, "vamos juntar os diferentes para vencermos os antagônicos", acreditou que seria melhor reordená-la: "Vamos juntar os antagônicos para vencermos os diferentes".
Conta do Enem
Um curioso recebeu duas estatísticas dos inscritos para a nova prova do Enem.
A conta do Inep, que organiza o exame, informava que havia 6.497.466 inscritos.
A conta do MEC dava outro número: 6.495.454.
Não batia. Ele teve um palpite e subtraiu 2012.
Bingo. Haviam somado a data.
Aviso amigo
Os çabios de Brasília resolveram jogar bruto com o funcionalismo público.
Fabricaram uma greve no sistema de ensino público, mas isso é pouco. Estão fabricando uma greve de servidores. Depois, culparão os sindicatos.
Aos poucos, a greve da Justiça Federal vai se espalhando. Em todos os casos, os servidores querem um plano de carreira, e o governo responde com embromatina.
Se os comissários demarcassem o que podem conceder, levando as lideranças dos servidores a um debate público, o jogo seria sério.
Sem dinheiro
O comissário Gilberto Carvalho está sem sorte. Depois de dizer que o problema dos trabalhadores demitidos da Delta não devia ser levado para o "epicentro do governo", justificou a adesão de Paulo Maluf à chapa de Fernando Haddad informando que "não houve dinheiro".
Disse isso no dia em que o Judiciário aceitou a denúncia contra os "aloprados", a tropa do cheque da campanha de Aloizio Mercadante ao governo de São Paulo.
Dois deles foram presos com R$ 1,2 milhão e US$ 249 mil em mochilas e sacolas às vésperas da eleição de 2006.
Seria o caso de dizer que os aloprados mercadejavam dinheiro, mas não cargos.
O triste retrato do Colégio Pedro 2º
Os mestres do Colégio Pedro 2º, joia da coroa do ensino público desde o tempo do Imperador, aderiram à greve dos professores federais. Tornaram-se um exemplo do que o comissariado faz com sua rede de ensino.
Expandiram a estrutura do colégio, que hoje reúne 14 unidades. A de Realengo foi inaugurada por Lula em 2007 e reinaugurada em maio passado pelo comissário Aloizio Mercadante. O quadro docente da franquia Pedro 2º tem 1.179 professores. Deles, 251 são contratados temporários, boias-frias do magistério público.
Se um mestre avulso vai-se embora, uma turma pode ficar sem professor de matemática por meses. Faltam inspetores, técnicos e vigias. Depois da greve de 52 dias do ano passado, o governo prometeu um plano de carreira. Até hoje, nada.
A percentagem de temporários oscila entre 10% (Humaitá 1) e 37,5% (Realengo 1). Na unidade de educação infantil de Realengo 1, só 2 dos 14 professores são efetivos. De 17 contratados, 7 foram embora. Parte do mobiliário ainda não chegou. A sala de informática tem 18 laptops sem mouse, nem internet.
Governo marqueteiro faz política de educação inaugurando e reinaugurando escolas, contratando obras, encomendando equipamentos que não chegam e prometendo 600 mil tablets inúteis.
Professor, que é bom, nada.
Graças à internet, professores de Stanford e do MIT dão cursos sem escolas. O comissariado tenta inventar escolas sem professores.

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