segunda-feira, maio 21, 2012

Sem empurrão, não vai - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 21/05

Certas coisas só funcionam quando a sociedade cobra. Estão nessa lista a extinção de benesses, como os salários extras, o rigor da CPI de Cachoeira e o julgamento do mensalão

É interessante observar como se comportam os nossos parlamentares. Geralmente, ficam por ali, no Congresso fazendo “cara de paisagem” para os anseios da população. Até que, um belo dia, quando sentem cheiro de fumaça e fagulhas sobre o seu mandato, eles decidem agir. A extinção do 14º e do 15º salários das excelências está nesse rol. E o levantamento do Correio Braziliense é a prova disso: Dos 513 deputados, 310 responderam a enquete e, desses, 258 se mostraram a favor de acabar com os extras. Ufa! Quase que essa bola bate na trave, uma vez que são necessários 257 votos para aprovar a proposta.

O jornal procurou todos os deputados. O fato de 209 não responderem a esse contato é sintomático. Indício de que, se deixar o assunto exclusivamente por conta das excelências, a benesse continuará. A sorte de quem deseja acabar com essa mordomia — e é de se duvidar que alguém, a não ser, é claro, os congressistas, considere normal um parlamentar receber 15 salários por ano — é o fato de essa votação ser aberta. Se fosse fechada, ou seja, no voto secreto, desconfio que, se chegasse a 257 votos a favor seria tão surpreendente quanto foi a eleição de Michel Temer para presidente da Câmara em 1997. Numa votação fechada, o então deputado e hoje vice-presidente da República foi eleito presidente sem uma margem folgada, daí a surpresa.

Por falar em fechada…
O levantamento nos deixa a lição de que o cidadão, se quiser mesmo acabar com o 14º e 15º tem que correr atrás. E isso vale para qualquer coisa vinda dos Poderes constituídos. Graças à tecnologia e àqueles que foram aplicados na área de inovação, há redes sociais, e-mails. Ainda me lembro do tempo em que as convocações eram feitas por panfletos distribuídos nos restaurantes, bares, clubes, praias e centros das grandes cidades. Ou na base do boca a boca, como naquele 16 de agosto de 1992.

Dias antes, o então presidente Fernando Collor de Mello, hoje senador e integrante da CPI de Carlos Cachoeira, discursou no Palácio do Planalto pedindo um basta ao processo contra ele. Chamou a CUT — hoje tão quietinha — de central única dos conspiradores. Ao final, apelos aos brasileiros que saíssem às ruas de verde e amarelo no domingo. O Brasil se vestiu de preto naquele 16 de agosto. Brasília, principalmente. A turma da UNE — hoje tão caladinha — deflagrou os “cara pintadas”. As pessoas comuns, “maioria silenciosa”, não precisaram da convocação de sindicatos batendo à sua porta e nem do PT — quem diria, hoje aliado de Collor. Um mês e meio depois, o Congresso aprovaria a abertura de processo em votação aberta, que gerou muita polêmica se deveria ser secreta.

Por falar em Cachoeira…
Há outros braços que só se movem mediante um empurrãozinho da sociedade, tais como o julgamento do mensalão e a CPI encarregada de investigar os negócios e relações políticas do contraventor Carlos Cachoeira. A CPI revelou-se um show de tiros de festim. Veremos como será esta semana em que a comissão tentará, mais uma vez, ouvir o contraventor Carlinhos Cachoeira. O PT, da sua parte, tem ainda a missão de definir o que fazer com Cândido Vaccarezza (PT-SP) e sua troca de torpedos com o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral — que nesse episódio parece ter vestido a fantasia de abajur apagado, torcendo para ser esquecido. Até agora, a única manifestação de Cabral foi dizer não ter nada a comentar a respeito da mensagem recebida. Se ninguém cobrar, vai ficar aí.

Quanto ao mensalão, é lícito cobrar o julgamento, mas os ministros deve decidir à luz da lei, sem se deixar levar por paixões de um lado ou de outro. Que seja feita Justiça. Aliás, se os Poderes agirem com justiça, já está de bom tamanho.

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