segunda-feira, maio 21, 2012

Com juros menores, atingir objetivos financeiros demora mais - MARCIA DESSEN

Folha de S. Paulo - 21/05


O consumo imediato proporciona o prazer de ter o que se deseja. Eu quero, eu posso, eu compro. Com dinheiro nosso ou emprestado, é possível desfrutar desse prazer, muitas vezes breve e fugaz, que faz bem para a alma -embora seja péssimo para nossas finanças. O prazer de alguns poucos minutos pode levar meses para ser pago.

O brasileiro disciplinado controla suas despesas na ponta do lápis e tem o hábito de poupar parte de sua renda para atingir objetivos que pretende alcançar no médio e longo prazos.

O esforço de abrir mão do consumo imediato não é simples. Demanda um controle enorme que nos impede de gastar agora o dinheiro disponível em prol de uma meta maior a ser alcançada.

Precisamos de dois aliados importantes que, associados ao esforço de poupar, tornarão possíveis a realização de nossos objetivos: o tempo e a taxa de juros que incide sobre o capital poupado.

A queda da taxa de juros no país é uma boa notícia para os milhões de brasileiros que precisam tomar empréstimo para viabilizar suas necessidades e desejos.

É perfeita também para as empresas que precisam de capital para gerir seus negócios, gerar empregos e mover a economia.

Entretanto, trata-se de notícia ruim para o investidor brasileiro, acostumado a receber uma taxa de juros elevada, bem acima da dos padrões internacionais.

O ritmo de queda da taxa de juros básica da economia se acentuou nos últimos meses e reduziu substancialmente a taxa de juros nominal e a taxa de juros real praticadas no mercado.

A taxa de juros real é a taxa que o investidor recebe acima da inflação e representa um "prêmio" pelo esforço de poupar e adiar o consumo para uma data futura.

A taxa de juros real amplia o poder de compra do investidor, que pode comprar no futuro mais produtos ou serviços do que o seu capital consegue comprar hoje.

Quando essa taxa cai, cai também o incentivo do investidor, que pode avaliar ser esse "prêmio" insuficiente para remunerar seu esforço e os riscos do investimento. Quando isso acontece, o consumo ganha e pode contribuir para a elevação dos preços e, portanto, gerar inflação.

ENTRE AS MAIORES

Historicamente, a taxa de juros real do Brasil sempre se colocou entre as mais altas do mundo. Diversos planos econômicos implementados na década de 1990 para tentar controlar a inflação pagaram "prêmios" elevados aos investidores na tentativa de reduzir o consumo e incentivar a poupança.

O quadro ao lado nos ajuda a recordar quão generosa foi a taxa de juros real no Brasil nos últimos anos.

Se considerarmos a média da década de 1990, de cerca de 15% ao ano, cinco anos eram suficientes para dobrar o capital investido.

Um investidor que fez um só aporte de R$ 100 em janeiro de 1990 resgatou R$ 200 em janeiro de 1995, depois de descontar a inflação desses cinco anos.

Aliás, não por acaso, o brasileiro pouco investiu em renda variável durante esse período. Com um "prêmio" tão elevado na renda fixa, por que correr o risco da Bolsa, não é mesmo?

Se considerarmos a média da taxa de juros real dos últimos cinco anos no Brasil, de 5,40% ao ano, são necessários 14 anos para duplicar o capital. Ou então, para ter os mesmos R$ 200 em cinco anos, seria necessário depositar R$ 153.

TEMPO OU RISCO?

Apesar da queda significativa, ainda é possível encontrar ativos que pagam juros reais elevados se comparados aos padrões internacionais. Na semana passada, por exemplo, podíamos comprar uma NTN-B, via Tesouro Direto, com cupom de juros na faixa de 4,40% ao ano.

A capitalização de juros elevados funcionou no passado como potente alavanca que gerava resultados em curto espaço de tempo.

Agora, diante do novo cenário de juros menores, precisamos aprender a usar outra alavanca, que não depende do governo ou da economia, mas exclusivamente da nossa disciplina e persistência: o tempo.

Para acelerar o processo de capitalização, muitos investidores tomam a decisão de correr mais risco para tentar ganhar mais. É uma estratégia válida, não há dúvida.

Mas não avance sem antes saber de que tipo de risco se trata. Quanto do seu capital aceita esse risco?

Risco não combina com objetivos de curto prazo tampouco com objetivos que exigem liquidez a qualquer momento. E nunca tome a decisão de investir em alternativas mais arriscadas e voláteis com base na rentabilidade passada.

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